O ILÍCITO DO ESTADO:

UM PROBLEMA DE “ESTÉTICA DO PENSAMENTO” (A PROPÓSITO DE HANS KELSEN, O ILÍCITO DO ESTADO)

Resumo

No presente trabalho, tentaremos entender o notável valor estratégico que a tese da impossibilidade (Nichtkönnen) para o Estado de cometer ilícitos possuía na obra do jurista austríaco Hans Kelsen. Tal tese, afirmada pela primeira vez em 1911 nos Hauptprobleme e depois explicada em detalhes no ensaio Über Staatsunrecht (“Sobre o ilícito do Estado”) de 1913-14, nasce ainda totalmente imersa na estática jurídica e é uma consequência logicamente necessária da unidade da vontade estatal (Staatswille), constituindo uma passagem argumentativa obrigatória para evitar uma grave antinomia interna do sistema e a ruptura da unidade entre Estado e ordenamento jurídico. A questão é, sobretudo, de estética conceitual e sua solução encontra-se na ideia de ilícito do órgão, que, não representando a totalidade do ordenamento jurídico, não incorre em nenhuma contradição lógica ao violar o direito: no órgão que viola o direito, cessa de agir o Estado. Abrem-se, assim, as portas também para a responsabilidade do Estado pelos danos causados por seus próprios órgãos sob a forma de responsabilidade civil por fato de outrem.