in Ciência Florestal
Macrofauna epiedáfica em áreas submetidas a tecnologias de restauração florestal no sul do Brasil
Resumo
Objetivou-se caracterizar a composição da macrofauna epiedáfica, em áreas em processo inicial de restauração florestal, por meio de diferentes tecnologias restauradoras e comparar esses parâmetros com uma floresta-referência. O estudo foi realizado na área experimental de Restauração ecológica da UTFPR, Dois Vizinhos, Paraná, em blocos casualizados, composto por três tratamentos (RP-restauração passiva, PAD-plantio em alta diversidade e NC-nucleação) com quatro repetições. Adjacente, encontra-se o fragmento de floresta nativa secundária (FL), usado como referência. As coletas foram realizadas em novembro/2010 e abril/2011, sendo instaladas em cada parcela três armadilhas pitfall. A riqueza e abundância foram submetidas a testes de normalidade, homogeneidade das variâncias e análise de variância e calcularam-se os índices de Shannon e Pielou. Os dados de abundância dos grupos taxonômicos foram submetidos à análise de componentes principais (ACP). Para verificar as diferenças na composição da macrofauna entre a floresta e as tecnologias de restauração, foi realizada a análise de similaridade (ANOSIM) e o percentual de similaridade (SIMPER). Amostraram-se 12.681 indivíduos, sendo 3.018 em novembro/2010 e 9.663 em abril/2011, distribuídos em 23 ordens. A abundância e riqueza da floresta diferiram significativamente das tecnologias restauradoras, em ambas as avaliações. A elevada abundância observada nas técnicas restauradoras refletiu a dominância de Hymenoptera, Coleoptera e Polyxenida. FL apresentou maior diversidade e equitabilidade, independentemente da época de amostragem. A ACP separou as tecnologias da floresta, pelas diferenças na composição da fauna edáfica, sendo que o mesmo não ocorreu entre as técnicas de restauração. Na ANOSIM e SIMPER, as principais ordens que contribuíram para a diferenciação da floresta das tecnologias em novembro/2010 foram Diptera, Coleoptera, Orthoptera, Blattodea, e em abril/2011 Polyxenida, Hemiptera, Hymenoptera e Orthoptera. A macrofauna edáfica foi influenciada pelo grau de interferência antrópica, sendo um bom indicador das alterações ambientais e da sucessão ecológica observada em áreas em processo inicial de restauração florestal.
Main Text
1 INTRODUÇÃO
A intensa exploração dos recursos naturais, pela ação antrópica, teve como consequência a conversão de paisagens e o uso intensivo do solo, conduzindo a alterações na qualidade do solo, afetando seus componentes químicos, físicos e biológicos (BARTZ et al., 2014; ROSA et al., 2015). Nesse sentido, a restauração ecológica de ambientes degradados pode assumir um importante papel no restabelecimento dos processos ecológicos e serviços ambientais (BRANCALION et al., 2010). A detecção de alterações nos ecossistemas e do avanço do processo de restauração, pode ser analisada por meio de indicadores de qualidade ambiental (WINK et al., 2005), dentre estes cita-se o componente biológico do solo (MAJER, 2009; BARETTA et al., 2011).
A fauna edáfica compreende a comunidade de invertebrados que vive de forma permanente ou passa um ou mais ciclos de vida no solo (AQUINO; CORREIA, 2005). Está subdividida em três categorias de acordo com o diâmetro corporal, sendo a microfauna (inferior a 0,2 mm), mesofauna (0,2 e 2,0 mm) e macrofauna (2,0 e 20 mm) que compreende organismos visíveis a olho nu (MELO et al., 2009; BARETTA et al., 2011). Esses organismos, presentes no solo e serrapilheira, são influenciados pela qualidade e quantidade da cobertura vegetal no solo (BARTZ et al., 2014). Exercem importante função nos processos de decomposição da matéria orgânica e ciclagem de nutrientes, promovendo modificações nas características químicas e físicas do solo (formação de poros, estabilidade de agregados) (LAVELLE et al., 1997; AQUINO; CORREIA, 2005; LAVELLE et al., 2006; BARETTA et al., 2011) e atuam no controle biológico de invertebrados no solo (MACHADO et al., 2015).
A atividade, abundância e diversidade da fauna edáfica podem ser influenciadas por fatores climáticos (temperatura, umidade, precipitação), edáficos (tipo de solo, textura, estrutura, pH, matéria orgânica e temperatura do solo), históricos (uso do solo), geológicos, topográficos e aspectos relacionados à vegetação (cobertura, fisionomia) (MACHADO et al., 2015; BROWN et al., 2015). Além disso, a presença de cobertura no solo contribui na redução do efeito de variações microclimáticas (insolação, temperatura e umidade do solo) favorecendo a colonização desses organismos (BARETTA et al., 2011; MACHADO et al., 2015). Dessa forma, as alterações antrópicas no manejo e uso do solo e o grau de degradação exercem forte influência na sobrevivência e composição da comunidade invertebrada do solo, afetando a disponibilidade de alimentos e abrigo (LAVELLE; SPAIN, 2001; BARETTA et al., 2006; SILVA et al., 2006; BARETTA et al., 2011; BARTZ et al., 2014).
Assim, devido à sensibilidade da fauna edáfica as mudanças no uso e manejo do solo, que ocasionam alterações na abundância e diversidade, esses organismos podem ser considerados bons indicadores da qualidade do solo e dos níveis de impacto ambiental e perturbação (WINK et al., 2005; CUNHA NETO et al., 2012). Dentre os macroinvertebrados indicadores, citam-se os indivíduos pertencentes às ordens Hymenoptera (formiga, abelha), Coleoptera (besouro), Isoptera (cupim) e Oligochaeta (minhoca) (LAVELLE et al., 2006), sendo também conhecidos como “engenheiros do ecossistema do solo”, devido à formação de biogalerias, depósito de coprólitos e modificação da estrutura física e química do solo (LAVELLE et al., 1997; LAVELLE et al., 2006; BARETTA et al., 2011).
No entanto, apesar de sua importância, ainda são incipientes os estudos no Brasil sobre a macrofauna edáfica em áreas de florestas secundárias e antropizadas em diferentes estágios de sucessão e restauração florestal (MACHADO et al., 2015; BROWN et al., 2015). Dessa forma, o presente estudo teve como objetivo caracterizar a diversidade, abundância e composição da macrofauna edáfica de áreas em processo inicial de restauração através de diferentes tecnologias e comparar esses parâmetros com uma área de floresta em estágio secundário de sucessão florestal, no município de Dois Vizinhos, Sudoeste do Paraná.
2 MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi conduzido na área experimental de Restauração ecológica da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Campus Dois Vizinhos, Paraná, e no fragmento de floresta nativa adjacente, situados nas coordenadas geográficas 25°41’44.50”S e 53°06’07.33”O, em uma altitude que varia de 495 e 504 m (Figura 1). O clima da região é do tipo Cfa, subtropical úmido mesotérmico, com verões quentes e temperatura média no mês mais quente superior a 22°C, e nos meses mais frios com temperaturas variando entre -3°C a 18°C, e a precipitação média anual varia de 1.800 a 2.200 mm (ALVARES et al., 2013). O solo é classificado como Nitossolo Vermelho Distroférrico (BHERING et al., 2007), e a vegetação é caracterizada como um ecótono entre Floresta Ombrófila Mista e Floresta Estacional Semidecidual (TRENTIN et al., 2018).
A área experimental de restauração apresenta um total de 7,2 ha, a qual era utilizada até 2009 para o cultivo de culturas anuais, como milho (Zea mays L.), trigo (Triticum sp. L.) e soja (Glycine max L.), além de pastagens e, a partir de 2010, foi isolada dos fatores de perturbação. O delineamento experimental foi em blocos casualizados, composto por três tratamentos (RP = restauração passiva, NC = nucleação e PAD = plantio em alta diversidade) e quatro repetições. As parcelas experimentais apresentam área de 40 x 54 m (2.160 m²), sendo espaçadas aproximadamente 10 m entre si. Cada parcela foi subdividida em 24 subparcelas de 9 x 10 m (90 m²) e três regiões: inferior, média e superior (TRENTIN et al., 2018). Após o isolamento da área, foi realizada a roçada total da área, dessecação com herbicida Glifosato, reparo do solo com subsolagem e gradagem (11/2010) e após essas intervenções, a implantação dos tratamentos de NC e PAD foram realizados (12/2010).
Adjacente à área de restauração florestal, está localizado o fragmento de floresta nativa secundária utilizado como área-referência neste estudo (FL). Este apresenta uma área de 48 ha, sendo a vegetação classificada como Floresta Ombrófila Mista com influência de Floresta Estacional Semidecidual, em estágio médio da sucessão florestal, com manchas em estágios inicial e final. Tal floresta já sofreu extração de madeira, durante as décadas de 1950 a 1980, houve grande taxa de desmatamento na região sudoeste, com a remoção de extensas áreas de floresta nativa para criação de novas vilas e cidades, expansão de cultivos agrícolas e pecuária, além da própria exploração madeireira de espécies com valor comercial, como a Araucaria angustifolia. A partir da década de 1990, com a criação da Escola Agrotécnica Federal, que posteriormente iria tornar-se UTFPR, o fragmento florestal em questão não foi mais manejado.
No tratamento RP, a área de cada parcela experimental, isolada dos fatores antrópicos, foi deixada para que regenerasse naturalmente, de acordo com sua própria capacidade de resiliência. Em NC, foram utilizadas sete técnicas nucleadoras, implantados em 62 núcleos por parcela, em faixas de três metros de largura, de modo a cobrir um terço da área total. As técnicas empregadas foram: 1 - poleiros artificiais para atração da avifauna, confeccionados com postes de Eucalyptus sp.; 2 - abrigos artificiais para atração da fauna, confeccionados com madeira empilhada (1 m3); 3 e 4 - plantio de placas de mudas oriundas do banco e chuva de sementes coletados em uma floresta de referência (seis núcleos de banco e seis de chuva), com área de 1 m²; 5 - plantio de espécies arbóreas em grupos de Anderson, na qual foram plantadas cinco mudas em espaçamento 1 x 1 m (forma de cruz), sendo a planta central de diversidade (não pioneira) sombreada por quatro plantas pioneiras do grupo de preenchimento; 6 - plantio de cobertura com feijão-guandú (Cajanus cajan (L.) Huth) em núcleos de 3 x 4 m; e 7 - plantio de cinco mudas de bromélias (Bromelia antiacantha Bertol.) em forma de cruz, sob espaçamento de 0,5 x 0,5 m. No PAD, foram plantadas 71 árvores nativas em linhas, alternando-se espécies de preenchimento (pioneiras de rápido crescimento e boa produção de copa) e diversidade (não pioneiras de crescimento lento), sob um espaçamento de 3 x 2 m (Tabela 1).
O estudo da macrofauna edáfica foi conduzido nos meses de novembro de 2010 (antes do preparo do solo, sendo então considerado como avaliação de caracterização) e abril de 2011, quatro meses após a implantação dos tratamentos. Para a captura dos organismos, foram instaladas em cada tratamento 12 armadilhas de queda pitfall-traps, compostas por um recipiente plástico transparente (750 ml) enterrado com a borda nivelada ao solo, contendo solução conservante de formol 4%. Para evitar o risco de perda da solução interna com possíveis precipitações, foram inseridas sobre cada armadilha uma estrutura de alumínio fixada ao solo por palitos de madeira (Figura 2AB). Foram instaladas de forma aleatória três armadilhas por parcela, sendo alocadas na porção superior, média e inferior das mesmas. No fragmento florestal, as armadilhas foram distribuídas de forma a contemplar a maior extensão e heterogeneidade da área.
As 48 armadilhas pitfall de cada avaliação permaneceram no campo por um período de sete dias, sendo posteriormente retiradas do solo e encaminhadas ao laboratório de controle biológico I da UTFPR, para a realização da triagem das amostras e identificação dos indivíduos em nível de ordem taxonômica, com auxílio de um estereomicroscópio Quimis Q7714Z, chaves dicotômicas e bibliografia especializada. Quando não foi possível a identificação em nível de ordem (ex. Classe Diplopoda), foram atribuídos morfotipos (ex. Dipl. 1; Dipl. 2).
2.1 Análise de dados
Após a contagem e identificação em nível de ordem dos organismos capturados, foram calculadas a frequência relativa, riqueza, abundância média e total dos grupos amostrados. Para os dados de riqueza e abundância, foram realizados os testes de normalidade (Lilliefors), homogeneidade das variâncias (Bartlett) e quando os pressupostos não eram atendidos, os dados foram transformados. Após, os dados foram submetidos à análise de variância (ANOVA). Para a comparação das médias, entre as técnicas de restauração utilizou-se o teste de Tukey (p≥0.05), e a comparação das médias de cada técnica com a floresta-referência foi realizada por meio do teste de Dunnett (p≥0.05), sendo as análises realizadas no programa Statistica 7.0 (INFORMER..., 2004).
Para a comparação dos tratamentos em termos de diversidade, foram calculados os índices ecológicos de Shannon-Wiener (SHANNON, 1948) e equitabilidade de Pielou (PIELOU, 1966). Por meio do programa estatístico CANOCO versão 4.5 e utilizando-se a abundância total de cada grupo taxonômico por parcela experimental, foi realizada uma Análise de Correspondência Destendenciada para obtenção do comprimento do gradiente e como esse foi menor que 3 (resposta linear) realizou-se a seguir uma Análise de Componentes Principais (ACP) (BRAAK; SMILAUER, 2002). Para essas análises, os dados foram transformados por log (x+1) e utilizaram-se os blocos experimentais como covariável, a fim de excluir a influência desses sobre os dados.
Com o intuito de verificar as diferenças na composição da macrofauna edáfica entre a floresta e as tecnologias de restauração, foi realizada a análise de similaridade, por meio do teste de ANOSIM. Quando os valores foram significativos pela ANOSIM, realizou-se a análise de porcentagem de similaridade (SIMPER) aos pares (FL*RP; FL*NC; FL*PAD), verificando-se a contribuição de cada ordem na separação dos tratamentos analisados, sendo estas realizadas no programa Primer 5.2.6© (PRIMER-E, 2001).
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram amostrados um total de 12.681 organismos, sendo 3.018 indivíduos na coleta de novembro de 2010 e 9.663 indivíduos na coleta de abril de 2011. Esses invertebrados estão distribuídos em 23 ordens taxonômicas: Araneae, Blattodea, Coleoptera, Diplopoda (ordem Polyxenida e Morfotipos Diplop. 1, 2, 3 e 4), Dermaptera, Diptera, Haplotaxida, Hemiptera, Hymenoptera, Isopoda, Isoptera, Lepidoptera (larvas), Neuroptera, Opillionida, Orthoptera, Psocoptera, Scolopendromorpha, Thysanoptera e Trichoptera (Figura 3).
Na primeira avaliação (novembro/2010) foram identificadas 21 ordens taxonômicas, sendo 12 ordens na Restauração Passiva (RP), 13 na Nucleação (N), 16 no Plantio em Alta Diversidade (PAD) e 15 na Floresta (FL). O PAD foi o único a apresentar os morfotipos Diplop 2 e 3. Da mesma forma, as ordens Blattodea e Psocoptera ocorreram exclusivamente no fragmento florestal adjacente às áreas em processo de restauração. Na avaliação (abril/2011), também foram registradas 21 ordens taxonômicas, sendo 19 ordens no tratamento RP, 16 em NC, 14 em PAD e 10 na FL. Araneae, Coleoptera, Diptera, Hemiptera, Hymenoptera e Orthoptera foram as ordens mais frequentes em ambas as coletas (Figura 3A-B). Já a ordem Polyxenida (Diplopoda) foi observada apenas na coleta de abril de 2011. Hymenoptera foi a ordem mais frequente, em ambas as coletas nas tecnologias de restauração, e Coleoptera foi a segunda mais frequente na primeira coleta e a terceira com maior ocorrência na segunda coleta, sendo também a mais frequente na floresta em ambas as coletas.
Rosa et al. (2015) destacam que a ocorrência dos grupos Formicidae, Coleoptera, Blattodea entre outros está associada às características físicas e químicas do solo, dentre essas, a quantidade de bioporos e de material orgânico no solo. Formicidae possui grande importância nos processos de redistribuição de compostos orgânicos, o que contribui na melhoria da estrutura física (formação de poros e aeração) do solo (MACHADO et al., 2015). Além de Hymnoptera, destacaram-se nas tecnologias de restauração as ordens Coleoptera, Orthoptera, Polyxenida, Araneae e Hemiptera. Na floresta, as ordens mais frequentes foram Coleoptera, Diptera, Hymnoptera, Orthoptera, Araneae e Blattodea, sendo semelhante ao resultado obtido nos trabalhos de Bartz et al. (2014) e Rosa et al. (2015). Diptera foi a segunda ordem de maior densidade, apesar de ser considerado não edáfico na fase adulta, são abundantes em áreas em estágio médio a avançado de sucessão (MACHADO et al., 2015; ROSA et al., 2015).
Em relação à abundância média de organismos, na primeira coleta, ao serem comparadas as técnicas de restauração entre si, nenhum grupo apresentou diferença significativa, porém, ao serem comparadas as técnicas com a área de referência (FL), os grupos Coleoptera, Diptera e Orthoptera apresentaram diferenças significativas, sendo sua abundância superior na FL. Na segunda coleta, apenas a ordem Hemiptera diferiu significativamente entre as técnicas de restauração, sendo as médias de RP e NC significativamente distintas de PAD. Na comparação das tecnologias com a FL, as ordens Hemiptera, Hymenoptera, Orthoptera e Polyxenida apresentaram diferenças significativas, tendo maior abundância nos tratamentos restauradores. Com relação à riqueza, não foram observadas diferenças entre as tecnologias e floresta em novembro. No entanto, na avaliação de abril, as técnicas de restauração passiva e nucleação diferiram significativamente da floresta (Tabela 2).
Em ambas as avaliações nas tecnologias de restauração, observou-se o predomínio de indivíduos da ordem Hymenoptera, principalmente formigas do gênero Atta sp., que são consideradas organismos generalistas, por requererem apenas condições físicas estáveis (ROSA et al., 2015). No entanto, a alta abundância não reflete um ambiente com estrutura complexa, uma vez que esses organismos apresentam elevada capacidade de adaptação aos ambientes (SILVA et al., 2006), sendo frequentemente amostrados em agregados, com alta densidade (MENEZES et al., 2009). Esses autores também atribuíram a elevada abundância de indivíduos em seus estudos a uma maior ocorrência de formigas e térmitas na amostragem.
A maior abundância de Coleoptera no ambiente em estágio médio de sucessão florestal deve-se à maior complexidade de hábitats, nichos ecológicos e alimentares, que suportam uma cadeia alimentar mais estruturada, com a presença de indivíduos de diferentes grupos tróficos (GANHO; MARINONI, 2003; SILVA et al., 2006). Esses autores também observaram maiores valores de diversidade e abundância em áreas de vegetação nativa em comparação com os outros tratamentos de uso e manejo do solo, e atribuíram esse resultado às condições mais favoráveis na floresta, como a maior disponibilidade de recursos e abundância de micro-habitats.
A utilização de armadilhas pitfall mostrou-se eficiente na caracterização da abundância e diversidade da macrofauna nas épocas e tratamentos analisados, sendo as variações observadas decorrentes possivelmente do grau de interferência antrópica, tipo de cobertura do solo e estágio sucessional. Em novembro/2010, a baixa densidade de indivíduos nas tecnologias de restauração em comparação com a floresta pode ser explicada pela baixa disponibilidade de recursos e abrigo para a fauna, devido à presença de pouca cobertura vegetal nos tratamentos PAD, NC e RP. Em abril, quatro meses após a implantação das técnicas de restauração, verificou-se o aumento da diversidade e abundância de indivíduos nas tecnologias restauradoras, denotando a importância de processos como o recobrimento do solo por espécies pioneiras com ciclo de vida curto na incorporação de resíduos orgânicos sobre o solo e sombreamento (BRANCALION et al., 2009), aumentando-se assim a diversidade vegetal e ambiental, disponibilidade de alimentos, contribuindo na melhoria das condições microclimáticas e propriedades do solo (MOÇO et al., 2005; MENEZES et al., 2009).
O tipo de cobertura e o grau de intensidade de uso do solo influenciam a densidade e diversidade de organismos amostrados no solo, sendo as áreas com menor interferência antrópica as mais estáveis em relação às condições de temperatura e umidade do solo e manutenção de material orgânico sobre o solo (SILVA et al., 2006; ROSA et al., 2015). Dessa forma, pode-se inferir que a maior semelhança na abundância e riqueza da macrofauna nas tecnologias pode ser efeito das interferências antrópicas sobre o solo, que podem ter favorecido a homogeneização das propriedades do solo e serrapilheira, determinando os recursos disponíveis para o estabelecimento dos organismos (MENEZES et al., 2009).
Quanto ao índice de diversidade de Shannon, que considera a riqueza e a abundância relativa dos grupos taxonômicos, os maiores valores foram encontrados para a floresta-referência (FL) na coleta de novembro e abril, com valores de 1,548 e 1,514, respectivamente. Já o índice de equabilidade de Pielou, que indica a uniformidade da distribuição dos indivíduos entre grupos, apresentou variações nos períodos amostrados, sendo os maiores valores observados em novembro para as técnicas RP e FL (0,57), seguida de NC (0,46) e PAD (0,39), enquanto, na segunda avaliação, os maiores índices foram observados para FL (0,65), PAD (0,55), NC (0,51) e RP (0,47), com a predominância de uma ou poucas espécies na amostragem.
A maior diversidade em áreas de floresta também foi verificada em outros estudos (MOÇO et al., 2005; BARTZ et al., 2014; ROSA et al., 2015). Já as técnicas de restauração apresentaram pequena variação dos índices entre si, sendo os menores valores registrados em PAD e RP, em função da elevada dominância dos grupos Hymenoptera, Orthoptera e Polyxenida. Moço et al. (2005) também verificaram menores valores do índice de Pielou em áreas de capoeira com alta dominância de Hymenoptera (formigas), e destacam a influência da densidade e riqueza nesses índices, enquanto a baixa densidade e o aumento da riqueza favorecem a equitabilidade. Por outro lado, o aumento da densidade e redução da riqueza diminui esse índice. No entanto, Menezes et al. (2009) destacam que a elevada equitabilidade não indica que a comunidade tenha maior diversidade, sendo o maior valor desse índice observado para a área de menor riqueza, assim como o observado no presente estudo para a área de floresta em abril.
Por meio do teste de permutação ANOSIM foi possível separar as áreas por suas diferenças na composição da comunidade da macrofauna edáfica. Na avaliação realizada em novembro/2010, a ANOSIM (R = 0,594; p = 0,01) apontou diferenças significativas entre as três técnicas de restauração e a floresta. O SIMPER mostrou que Diptera, Coleoptera, Orthoptera e Blattodea foram os grupos que mais contribuíram para a diferenciação das tecnologias da floresta, nas interações Regeneração Passiva x Floresta (RP X FL), Nucleação x Floresta (NC x FL) e Plantio em Alta Diversidade x Floresta (PAD X FL) (Figura 4A). Na avaliação realizada em abril/2011, a ANOSIM (R = 0,554; p = 0,02) também apontou diferenças significativas entre as técnicas de restauração e a floresta e o SIMPER mostrou que Polyxenida, Hemiptera, Hymenoptera e Orthoptera (Figura 4B) foram as ordens que mais contribuíram na diferenciação da macrofauna nas mesmas interações citadas anteriormente.
A ACP, na coleta de novembro/2010, explicou 68,3% da variabilidade dos dados, dos quais 58,3% foram observados na CP1 e 10% na CP2. Assim como na ANOSIM, a ACP separou as tecnologias de restauração da floresta-referência, pelas diferenças na composição da macrofauna, em ambos os períodos de amostragem, refletindo as condições ambientais distintas das áreas. Já na coleta de abril/2010, a ACP explicou 81,9% da variabilidade dos dados, dos quais 73,8% foram observados na CP1 e 8,1% na CP2, apresentando também a separação da floresta das tecnologias de restauração (Figura 5A-B).
Com relação às tecnologias restauradoras, não foram observadas diferenças significativas na composição da macrofauna entre os tratamentos. No entanto, cabe destacar a elevada diversidade amostrada na restauração passiva em ambos os períodos de amostragem. Neste tratamento, realizou-se apenas o isolamento dos fatores de perturbação, resultando em uma maior cobertura inicial do solo, em relação às técnicas PAD e NC, em que foi necessária a condução de manutenção da área (e.g. roçada, capina, coroamento de mudas), para o controle da matocompetição, essencial na sobrevivência das mudas implantadas (TRENTIN et al., 2018). Assim, com base nos resultados obtidos, para esta área a técnica RP mostrou-se eficiente na restauração do componente biológico do solo (macrofauna), visto que não diferiu dos demais tratamentos e não requer a realização de tratos culturais, apresentando menor intervenção e custo (TRENTIN et al., 2018). No entanto, verifica-se a necessidade de monitoramento espaço-temporal na análise da influência do método de restauração na composição da macrofauna edáfica com o avanço do processo sucessional.
Devido ao fato da fauna edáfica ser influenciada pelo estágio sucessional, grau de degradação, manejo e uso do solo, bem como pela sazonalidade (MENEZES et al., 2009; MACHADO et al., 2015), estudos que compreendam o monitoramento sazonal e temporal dos organismos, bem como a análise das propriedades químicas e físicas do solo, se constituem importantes ferramentas na compreensão de aspectos relacionados à melhoria da qualidade do solo, os quais já vem sendo foco de alguns estudos no Brasil (BARETTA et al., 2006; CUNHA NETO et al., 2012; ROSA et al., 2015; MACHADO et al., 2015). Este trabalho constitui o marco zero na caracterização da macrofauna edáfica antes da instalação dos tratamentos PAD e NC e quatro meses após o isolamento das áreas aos fatores de perturbação. Espera-se que, ao longo da trajetória sucessional das áreas analisadas, ocorram variações na composição da macrofauna, em função do aumento da complexidade estrutural da vegetação, aumento de biomassa, alterações do hábitat (GUARIGUATA; OSTERTAG, 2001) e mudanças nas propriedades físicas e químicas do solo (BARETTA et al., 2011). Dessa forma, estudos a curto e longo prazo da heterogeneidade ambiental das áreas em processo de restauração (BRANCALION et al., 2010) são de suma importância, bem como a análise dos indicadores biológicos do solo durante a sucessão florestal (BARETTA et al., 2011).
4 CONCLUSÃO
A riqueza e abundância da macrofauna epiedáfica foram influenciadas pelo grau de interferência antrópica, sendo um bom indicador das alterações ambientais associadas. A elevada abundância da macrofauna nas técnicas restauradoras refletiu a dominância das ordens Hymenoptera, Coleoptera e Polyxenida na amostragem. A floresta apresentou a maior diversidade e equitabilidade independentemente da época de amostragem. Na ACP, foi observada a separação nas tecnologias de restauração da área de floresta nativa secundária, pelas diferenças na composição da fauna edáfica, e a ANOSIM destacou os principais grupos que contribuíram na distinção de RP, NC e PAD da FL. Em ambas as avaliações, a abundância e riqueza da floresta-referência diferiram significativamente das tecnologias de restauração, porém, não foram observadas diferenças entre as tecnologias, em função de ambas estarem em processo inicial de restauração.
Resumo
Main Text
1 INTRODUÇÃO
2 MATERIAL E MÉTODOS
2.1 Análise de dados
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
4 CONCLUSÃO