Apresentação do Dossiê.

Authors

  • Daniel Gustavo Mocelin Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS
  • José Carlos Martines Belieiro Junior Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Santa Maria, RS
  • Marcus Ianoni Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ

DOI:

https://doi.org/10.5902/2236672526319

Abstract

Na trajetória do desenvolvimento no Brasil, o Estado cumpriu, até o final dos anos 1970, um papel importante como indutor do crescimento, seja viabilizando projetos para o setor privado, nacional ou estrangeiro, através de várias políticas nas áreas fiscal, cambial e creditícia, por exemplo, seja como parceiro deles ou como produtor, por meio das companhias mistas e bancos de fomento.  A mudança da estrutura produtiva primário-exportadora, hegemônica na República Oligárquica, em direção à produção industrial, foi executada com base em um modelo denominado nacional-desenvolvimentismo, centrado na substituição de importações e na oferta dos produtos, sobretudo, para o mercado interno.

Ainda que o protecionismo tenha propiciado a formação de um grande parque produtivo, sua perseverança, no longo prazo, desvinculada de uma efetiva estratégia exportadora de produtos manufaturados, limitou as iniciativas em inovação. Os avanços nas exportações durante o regime militar não foram suficientes para reverter a tendência geral de descompasso da industrial nacional diante da terceira revolução tecnológica e do fim do fordismo.

A crise do nacional-desenvolvimentismo, desde os anos 1980, coincidiu com o início das políticas neoliberais nos EUA e no Reino Unido, expressando uma tendência de mudança nas condições estruturais e institucionais da economia política internacional, especialmente o regime macroeconômico existente desde o final da Segunda Guerra Mundial, com base nos acordos de Breton Woods. Essa onda liberalizante reforçou-se nos anos 1990, após a queda do muro de Berlim.  A partir do Governo Collor e, principalmente, desde o Plano Real, em 1994, foram implementadas as reformas orientadas para o mercado, de modo que, em resposta à crise do Estado e à crise do padrão de inserção do país na economia internacional, o Brasil foi pressionado, por forças internas e externas, a adequar-se a políticas macroeconômicas e setoriais (comércio internacional, indústria, agricultura, tecnologia etc) baseadas em uma relação passiva do Estado com o desenvolvimento. Nessa alteração do papel econômico do Estado, coube a ele, sobretudo, uma função regulatória. Outra medida liberalizante impactante foi a desregulamentação financeira, a partir da gestão fazendária de Marcílio Marques Moreira, em 1991. A ampliação da exposição do empresariado brasileiro ao ambiente da concorrência externa implicou em aumento da desnacionalização, ou seja, na expansão da presença do capital estrangeiro na estrutura produtiva e nas empresas do setor de serviços.

Os governos encabeçados pelo PT, a partir de 2003, procuraram retomar uma ação desenvolvimentista, embora em um contexto nacional e internacional diferente do nacional-desenvolvimentismo. Buscou-se resgatar o papel do Estado na indução do crescimento, mas, com uma novidade, a perspectiva do combate à desigualdade social presente na Constituição de 1988, mas até então insatisfatoriamente colocada em prática. Esse novo cenário da ação governamental instigou o debate acadêmico e público sobre o desenvolvimento, especialmente sobre as relações entre o Estado e os agentes econômicos, uma vez que algumas das novas políticas públicas implementaram parcerias entre o Estado e a iniciativa privada, seja na política industrial, na política creditícia dos bancos estatais etc. Foram promovidas também novas políticas de estímulo ao crescimento do mercado interno, como a política de elevação do salário mínimo e estímulos estatais à ciência, tecnologia e inovação, entre outras ações. Um dos objetivos dos agentes governamentais foi fomentar a competitividade das empresas e, em alguns casos, sua internacionalização.

Contudo, várias das tentativas de retomada do desenvolvimento, entre 2003 e 2014 (Lula 1 e 2 e Dilma 1), esbarraram em impasses de ordem macroeconômica (juros altos e câmbio valorizado), técnica e institucional (capacidades estatais), ideológica e cultural (forte oposição dos economistas neoclássicos e da mídia, por exemplo), tanto na esfera governamental, como na esfera empresarial e nas relações entre ambas as esferas. A partir de 2015, a mudança da agenda pública no sentido da austeridade fiscal e monetária, consolidada com o impeachment, implica, por assim dizer, em um sepultamento das tendências desenvolvimentistas (ao menos no sentido do discurso de algumas de suas lideranças políticas e policy-makers das agências estatais) dos três primeiros governos petistas.

Visando debater e avaliar alguns dos problemas, a começar sobre o quanto o desenvolvimentismo efetivamente ocorreu, uma vez que a indústria manufatureira regrediu ao longo do período, a Século XXI: Revista de Ciências Sociais apresenta o Dossiê Estado, Empresariado e Sociedade, que reuniu alguns trabalhos visando contribuir para a interpretação sociológica e política da referida experiência de políticas públicas e instituições dos governos petistas. Os artigos transitam analiticamente entre uma dimensão macro, focada nas orientações políticas gerais do Estado e outros fatores estruturais, e outra mais próxima das instituições e das relações entre elas, a burocracia pública e os agentes econômicos.

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Published

2017-03-24

How to Cite

Mocelin, D. G., Belieiro Junior, J. C. M., & Ianoni, M. (2017). Apresentação do Dossiê. Século XXI: Journal of Social Sciences, 6(2), 07–09. https://doi.org/10.5902/2236672526319