Universidade Federal de Santa Maria
Voluntas, Santa Maria, v. 15, n. 1, e89383, 2024
Submissão: 16/10/2024 • Aprovação: 02/12/2024 • Publicação: 03/12/2024
Resenhas
Resenha do livro Schopenhauer e a filosofia indiana, de Fábio Mesquita
IUniversidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil
Resenha de MESQUITA, Fábio. Schopenhauer e a filosofia indiana. Curitiba: Editora LOYOLA, 2023.
A aproximação da obra schopenhaueriana com a filosofia indiana, em especial o hinduísmo e o budismo, é evidente na leitura d’O mundo como vontade e como representação. Conceitos de tradições orientais são utilizados ora de maneira apropriativa, ora de maneira mais aproximada do significado original, tais como Maya (utilizado muitas vezes na famosa expressão véu de Māyā), nirvāṇa, saṃsāra, ātman, assim como a expressão recorrente de sua ética da compaixão: tat tvam asi (isto és tu). Para isso, Fábio Mesquita - seguindo o exemplo de pesquisadores contemporâneos, por exemplo o autor suíço Urs App - realiza uma distinção sobre o modo de se realizar pesquisas sobre este tema, descrevendo os dois modos de investigar a relação entre o Ocidente e o Oriente nas obras dos filósofos europeus: a abordagem histórica e a abordagem apropriativa.
A obra de Mesquita, intitulada Schopenhauer e a filosofia indiana, escrita inicialmente como tese de doutorado e publicada em 2023 em forma de livro, investiga as influências que o filósofo sofreu no processo de elaboração d’O mundo ou, nos termos do autor da pesquisa, no período de gênese da filosofia de Arthur Schopenhauer, dado que a referida obra constitui o principal trabalho do pensador alemão e é considerada sua contribuição mais importante para a história das ideias.
Schopenhauer e a filosofia indiana apresenta, de maneira fluida e direta, um repertório atualizado das pesquisas sobre a aproximação do filósofo com as tradições da Índia, enquanto se serve de evidências históricas para indicar o modo como tal assimilação ocorreu na prática. Tendo analisado as fontes que Schopenhauer utilizou, Mesquita faz comparações rigorosamente contextualizadas, sugerindo possibilidades de leitura dos conceitos indianos encontrados nos Manuscritos e n’O mundo Para isto, distingue o que se sabe contemporaneamente sobre a Índia e o que Schopenhauer sabia a partir das fontes que ele próprio consultou, principalmente as obras Asiatisches Magazin (dois volumes), Asiatick Researches (nove primeiros volumes) e Mythologie des Indous (dois volumes).
Outro ponto de contribuição da obra de Mesquita advém de uma breve discussão acerca da assimilação, por parte dos pensadores europeus e em especial de Schopenhauer,das chamadas “filosofias orientais”, como tentativa de aproximar dois universos culturais que, apesar de incomensuráveis, poderiam - aos olhos de indólogos do século XIX como William Jones e Coronel Antoine de Polier - ser comparadas. Tal abordagem muitas vezes apontava para a possibilidade de, por exemplo, se entender as divindades da mitologia hindu à luz de suas supostas semelhanças com aquelas encontradas nas mitologias grega e romana. Por sua vez, fazendo referências ao filósofo contemporâneo palestino Edward Said, a consideração desse contexto por Mesquita não deixa de analisar esse tipo de postura da Indologia no século XIX a partir da crítica pós-colonialista ao fenômeno discursivo que hoje conhecemos como Orientalismo.
O livro conta, ainda, com a bibliografia organizada das obras sobre o Oriente que Arthur Schopenhauer possuía em sua estante, com destaque às três obras principais, ajudando a esclarecer o debate a respeito de quais referências o filósofo teria utilizado para pensar a (sua) Índia. Além disso, ele traz um anexo cujo conteúdo é a tradução de notas e trechos escritos por Schopenhauer relativos a sua leitura da Asiatick Researches — uma das obras mais relevantes, tanto no geral, para a consolidação do chamado “renascimento oriental” na Europa, quanto em particular, para a gênese da filosofia expressa n'O mundo como vontade e como representação (1819).
É importante dizer, ainda, que Schopenhauer e a filosofia indiana não apenas descreve conceitos a partir de uma investigação histórica: o livro examina profundamente como se deu o encontro de Schopenhauer às chamadas “filosofias orientais”, além de oferecer um vislumbre sobre como teria ocorrido o processo apropriação de ideias indianas por parte desse autor em sua consulta das três obras indológicas acima referidas.. Portanto, constitui um primoroso trabalho acadêmico inédito em língua portuguesa, o qual todo pesquisador interessado em desvendar a relação entre a filosofia de Arthur Schopenhauer e a Índia deveria conhecer.
Contribuição de autoria
1 – Vinícius Edart
Mestrando em Filosofia pela Universidade Federal do Paraná
https://orcid.org/0009-0002-8362-2798 • f.vinicius.edart@gmail.com
Contribuição: Escrita – Primeira Redação
Como citar este artigo
EDART, V. Resenha do livro Schopenhauer e a filosofia indiana, de Fábio Mesquita. Voluntas: Revista Internacional de Filosofia, Santa Maria - Florianópolis, v. 15, n. 1, e89383, p. 01-03, 2024. Disponível em: https://doi.org/10.5902/2179378689383. Acesso em: dia mês abreviado. ano.