Imagens da arte e antirracismo na sala de aula
Images of art and anti-racism in the school context
Luísa Guazzelli Sirangelo [1]
Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Karine Storck [2]
Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
Taís Ritter Dias [3]
Secretaria de Educação de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil
Resumo
Este texto tem por objetivo refletir sobre as imagens da arte utilizadas em contexto escolar, especialmente nas aulas de Artes Visuais, e sobre seu papel na propagação do racismo ou, na contramão desse, em atuação na luta antirracista. Para tanto, inicia-se a reflexão a partir da obra "A Redenção de Cam" (1895), de Modesto Brocos y Gómez, pintura pertencente ao acervo do Museu Nacional de Belas Artes (MNBA) e símbolo da tese do branqueamento no Brasil. São referenciais para a problematização dessa imagem os estudos de Lotierzo (2013; 2017), acerca do racismo na pintura brasileira entre 1850-1940; a ideia de olhar opositor/oposicional, de bell hooks (2019); e o conceito de imagens de controle, de Patrícia Hill Collins (2019). Ao final, são apresentadas produções das artistas Aline Motta, Renata Sampaio e Renata Felinto dos Santos, como imagens que podem provocar modos de se compreenderem as relações raciais no Brasil e, talvez, contribuir para o exercício de uma docência mais reflexiva e comprometida com a luta antirracista no que se refere ao trabalho com imagens da arte na escola.
Palavras-chave: Imagens da arte; Antirracismo; Ensino de Artes Visuais; Docência.
Abstract
This work aims to reflect on the images of art used in the school context, especially in art class, and their role in either perpetuating racism or working against it, with the anti-racist movement. To do so, a reflection begins based on the piece "The Redemption of Cam" (1895) by Modesto Brocos y Gómez, painting located on the National Museum of Fine Arts (MNBA) and a symbol of the whitening thesis in Brazil. As references for problematizing this artwork we have the studies by Lotierzo (2013; 2017), about racism in Brazilian painting between 1850-1940; the idea of an oppositional/oppositional gaze, by bell hooks (2019) and the concept of controlling images, by Patrícia Hill Collins (2019). At the end of this work, productions by artists Aline Motta, Renata Sampaio and Renata Felinto dos Santos are presented, as images that can provoke our ways of understanding racial relations in Brazil and perhaps even contribute to the exercise of teaching that is more reflective and committed to the anti-racist fight when it comes to working with art images at school.
Keywords: Art images; Anti-racism; Art education; Teaching.
A construção e a naturalização do racismo e imagens da arte
Este trabalho surge a partir da dúvida em relação à potência das representações visuais na escola, em particular, no contexto de uma aula de Artes Visuais. Poderiam as imagens da arte produzir ou perpetuar o racismo no ambiente escolar? De que modos podemos problematizar imagens racistas em sala de aula? Como as imagens da arte, ou a própria arte, podem atuar na luta antirracista na escola? Esses são questionamentos que, de certo modo, foram permeando e movimentando o desejo de pesquisa, escrita e reflexão presentes neste artigo. Importante pontuar, desde já, que este texto parte de três mulheres brancas, professoras de Artes Visuais, algo que, involuntária e consequentemente, permeará a escrita. Em um país racialmente diverso como o Brasil, é fundamental que discussões raciais não se limitem a professoras/es negras/os, sendo crucial o envolvimento de toda a classe docente nas pautas relevantes ao nosso país. Somos, as autoras em questão, uma doutora, uma doutoranda e uma mestranda, que, juntas, realizamos uma disciplina sobre branquitude e negritude em um programa de pós-graduação em Educação. Somos três professoras de Artes Visuais que, no movimento de pensarmo-nos como pessoas brancas, buscamos também situarmo-nos na luta cotidiana do antirracismo. A disciplina foi ministrada por duas professoras doutoras negras, sendo essa uma experiência inédita para muitas/os das/os estudantes que, até então, não haviam tido professoras negras na graduação ou na pós-graduação.
Iniciamos esta escrita instigadas pela leitura da tela “A redenção de Cam”, de 1895, do pintor espanhol Modesto Brocos, obra emblemática, que simboliza o pensamento racista proveniente de diferentes áreas (religião, ciência, história, política, relações sociais, entre outras). A discussão a partir dessa tela foi proposta em uma disciplina do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul[i], considerando o trabalho de investigação de Tatiana Lotierzo (2017) acerca da pintura, de seu uso e do contexto que, de certo modo, refletiu sua produção, aceitação e naturalização durante um período histórico.
Imagem 1 – Modesto Brocos y Gómez. A Redenção de Cam, 1895. Óleo sobre tela, 199 cm x 166 cm. Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro (MNBA).
Fonte: https://artsandculture.google.com/asset/reden%C3%A7%C3%A3o-de-c%C3%A3-0022/_gH_m-s_zK3Wzg. Acesso em: 28 jun. 2024.
Na pintura de Brocos, observamos uma família composta por uma avó, de pele negra retinta; uma mãe “mestiça” (provavelmente fruto de uma relação da avó com um homem branco); um pai e uma criança de pele clara, brancos. Ainda que façamos uso do termo “mestiça/o” para a descrição da mãe, vale destacarmos as problematizações de autoras como Grada Kilomba (2019), sobre a construção de uma linguagem colonial que, reiteradamente, associou a negritude à animalidade. Termos como “mulata”, “mestiça” ou “cabrita”, com frequência utilizados para referir-se às pessoas que são frutos de relacionamentos inter-raciais, advêm, originalmente, do contexto animal para sinalizar o cruzamento entre espécies. No caso da palavra “mestiça/o”, segundo Kilomba (2019, p. 19), “tem sua origem na reprodução canina, para definir o cruzamento de duas raças diferentes, que dá origem a uma cadela ou um cão rafeira/o, isto é, um animal considerado impuro e inferior”.
A senhora negra representada na pintura está posicionada com as mãos para cima, como sinal de agradecimento aos céus, por ter conseguido completar o ciclo de embranquecimento de sua família ao longo de duas gerações. Essa lógica de branqueamento se fez muito presente no imaginário brasileiro ao longo dos séculos XIX e XX, relacionando-se a teorias eugenistas, às quais o próprio artista espanhol nunca negou seu apoio (Lotierzo, 2017).
A obra foi premiada com medalha de ouro na Exposição Geral de Belas Artes, em 1895, parte do salão organizado pela Escola Nacional de Belas Artes, em que Brocos foi professor de desenho a partir de 1891. Em decorrência da premiação, o trabalho passou a integrar o acervo do MNBA. Dezesseis anos depois, foi utilizada em referência à tese de branqueamento no contexto brasileiro. Na ocasião, foi apresentada por João Batista de Lacerda, diretor do Museu Nacional em 1911, representante brasileiro no I Congresso Internacional das Raças, realizado em Londres, na Inglaterra, para ilustrar seu artigo "Sobre os mestiços no Brasil". A tese presente no artigo tratava
sobre a mestiçagem extremada existente no país e o processo de branqueamento considerado mandatório no Brasil [...]. Segundo o antropólogo, em três gerações, a ‘seleção sexual’ permitiria alcançar o branqueamento da raça negra e, quiçá, explicar sua extinção (Schwarcz, 2017, p. 15).
O título da obra faz referência ao conto bíblico da maldição de Cam (Lotierzo, 2017), já que a criança teria se livrado por completo da maldição da negritude. Nessa história, Noé acaba se embriagando e ficando nu, e, enquanto seus outros filhos tentam tapá-lo, Cam, o filho mais novo, zomba de seu pai. No dia seguinte, com raiva, Noé lança uma “maldição” sobre a linhagem de Cam e seu filho Canaã, dizendo que ele seria o “servo dos servos”.
Ele disse: “Maldito seja Canaã! Que ele seja, para seus irmãos, o último dos escravos!” E disse também: “Bendito seja Iahweh, o Deus de Sem, e que Canaã seja seu escravo!”[ii]. Que Deus dilate Jafé, que ele habite nas tendas de Sem e que Canaã seja seu escravo!” (Bíblia de Jerusalém, 2002, Gn 9, 25-27).
Assim, cientes de que tais imagens fazem parte de nossa história, e refletindo sobre o ensino de Arte no Brasil contemporâneo, como podemos explorar a arte produzida neste contexto racista, para entendermos mais sobre nossa história? Que discussões podem surgir em sala de aula a partir de obras como essa? Primeiramente, é fundamental que instiguemos um olhar problematizador para essa e outras imagens racistas que permeiam nossa cultura, relacionando o imaginário racista à discriminação ainda presente em nosso país, inclusive nas escolas, mas sem gerar mais dor e discriminação. Pensando ainda na lógica de que as imagens racistas podem perpetuar o racismo na educação, como podemos utilizar imagens da arte como potências na luta antirracista?
Nesse sentido, um caminho válido para o enfrentamento dos discursos racistas presentes no senso comum, sobretudo na escola, é justamente expor a historicidade e a arbitrariedade desses discursos, refutando o sentido naturalizado que vão adquirindo ao longo do tempo. O vasto e rico estudo de Lotierzo (2017) pode ser um material a referendar tal enfrentamento, uma vez que a autora dedica-se a realizar uma genealogia de muitos discursos racistas ainda presentes e naturalizados em nosso presente histórico. Um dos pontos centrais de sua investigação, por exemplo, é evidenciar que a vinculação entre Cam e a população negra africana não estava preconizada no texto bíblico, mas foi construída a posteriori, a partir de discursos advindos de diferentes áreas.
A autora procura enfatizar que a escritura bíblica, ao falar da maldição de Cam, não faz qualquer referência à cor da pele (ou a outros traços corporais) de seus personagens, tampouco menciona o pertencimento geográfico deles. No cerne de sua investigação, ressalta que, no texto bíblico (historicamente utilizado como argumento fundacional e legitimador dos discursos racistas), não está expresso que a maldição de Cam refere-se às populações negras africanas. A maldição que Noé lança sobre Cam e seus descendentes alude tão somente à posição social de servidão a que eles estariam condenados, sem qualquer menção à negritude.
Em vista disso, a pesquisa de Lotierzo (2013; 2017) buscará mostrar, a partir de robustas fontes e registros históricos, como Cam foi transformado em negro ao longo da história. Assim, aos poucos, o povo de Cam foi adquirindo uma imagem que enlaçava cor da pele e escravidão. A maldição bíblica foi interpretada como a causa para que todos os descendentes de Cam tivessem a pele negra. Posteriormente, a partir desse trecho bíblico, a escravidão do povo negro justificou-se entre os cristãos como uma penalidade por um crime ancestral, associando-se a pele negra à degeneração extrema.
Lotierzo (2017) reforça o papel preponderante que as imagens da arte exerceram na estabilização da condição de servidão e inferioridade dos sujeitos negros, endossando as interpretações sobre a maldição de Cam. Como podemos observar na pintura de Brocos, a representação do negro, especificamente das duas mulheres negras, é exposta em lugar de servidão e inferioridade. Ambas descalças; a senhora negra retinta pisa o chão de terra, enquanto sua filha, no lugar central, com o bebê (menino branco), está sentada entre a transição do chão de terra para o chão de pedra. Observa-se também uma desproporção entre as mãos da mãe do menino, com a que aparece do lado direito (de quem vê) maior, destacando-se a aliança dourada em seu dedo. O homem, branco, não é apresentado descalço e está completamente situado sobre o chão de pedra. Ele olha para o menino, quase de fora da cena, com um leve sorriso, que aparenta satisfação.
Ainda que, talvez, não seja um aspecto tão escancarado, como pode ser visto em imagens que explicitam o racismo científico e a animalização dos corpos negros, que persistem até hoje em produções visuais[iii], a desumanização do negro está presente nessa imagem de modo avassalador ao pensar e retratar sua eliminação. Tal necessidade de eliminação é gerada por teorias diversas[iv], sustentada, nesse caso, pela tese do branqueamento e retratada como se fosse um milagre de salvação na expressão da senhora, avó do menino, e nos ares de satisfação perceptíveis da expressão do pai, 'homem branco salvador'. Essa imagem pode ser interpretada como uma das narrativas criadas após a abolição da escravatura no Brasil, a fim de produzir, segundo Marinho e Cruz (2021, p. 09), um "entendimento conciliador da memória da escravidão com a identidade nacional brasileira". Ainda segundo as autoras, há uma tentativa de conciliação que é evidenciada na produção das imagens, e:
que se deu pela exaltação do papel ‘fundador’ dos colonos escravistas; pela tentativa de acomodação da tensão entre casa-grande e senzala nas relações cotidianas; pela romantização do processo de miscigenação das ditas ‘três raças’, sob a afirmação de uma pretensa democracia racial (Marinho; Cruz, 2021, p. 09).
A obra, nas palavras de Lotierzo[v], intenciona situar “o espectador no meio ou no centro de uma perspectiva que é racista, porque o primeiro impulso que essa tela faz a gente ter é de fato se colocar como alguém que está apreciando esse momento, essa defesa do embranquecimento”. Mas, e como saímos desse lugar passivo, do espectador que apenas contempla o que lhe é oferecido?
A partir de seus estudos, Lotierzo aponta uma pista, que se refere à busca por artistas e representações que estão pensando de outra maneira e produzindo “outras formas de ver e perceber as relações raciais no Brasil”, relacionando essas produções à ideia de “olhares oposicionais”, da feminista negra bell hooks, que engendrariam resistências ao racismo. Em sua dissertação de mestrado, Lotierzo apresenta algumas obras dos pintores Antônio Rafael Pinto Bandeira e Arthur Timótheo da Costa, “num processo de construção de olhares oposicionais na pintura brasileira produzida entre os anos 1880 e as primeiras décadas do século XX" (Lotierzo, 2013, p. 278-279).
Confrontar representações visuais racistas, confrontar narrativas naturalizadas
A ideia de “olhar oposicional” ou “olhar opositor” (a depender da tradução), de acordo com bell hooks, parte de sua experiência como mulher negra espectadora e faz pensar a partir do lugar da representação do corpo negro em produções culturais (especialmente o cinema), nas relações estabelecidas com tais produções pelas espectadoras negras, assim como na função e na força de um olhar insubordinado, de um olhar que confronta, que desafia e impõe resistência ao que se apresenta.
Ao abordar a questão do olhar, hooks comenta, inicialmente, suas experiências na infância, quando “entendeu, por meio de repetidos castigos, que um olhar pode ser perigoso. Uma criança que aprendeu muito bem a desviar o olhar quando necessário” (hooks, 2019, p. 183). Na sequência, compartilha seu maravilhamento ao saber (pelas aulas de história na escola) que pessoas negras escravizadas eram punidas por seus donos brancos apenas pelo ato de olhar e, então, passa a se perguntar “o quanto esse relacionamento traumático com o olhar influenciou a criação de filhos e a atitude das pessoas negras enquanto espectadoras” (hooks, 2019, p. 183).
Na mesma direção, a autora ainda nos chama atenção para o fato de que as tentativas de repressão ao direito das pessoas negras de olhar produziram-lhes
um desejo avassalador de ver, um anseio rebelde, um olhar opositor. Ao olhar corajosamente, declaramos em desafio: ‘Eu não só vou olhar. Eu quero que meu olhar mude a realidade’. Mesmo nas piores circunstâncias de dominação, a habilidade de manipular o olhar de alguém diante das estruturas de poder que o contêm abre a possibilidade de agência (hooks, 2019, p. 183).
E é esse olhar, esse tipo de olhar, insubordinado, situado, gerado pela mulher negra que se reconhece como humana e digna de olhar, que nos interessa para aprender a (re)ver as imagens da arte, ou, ainda, para aprender a escolher ou a problematizar as imagens da arte que comporão nossas aulas e nossa docência, de modo que elas não colaborem com a perpetuação do racismo, mas, ao contrário, possam contribuir com o antirracismo. Para trabalhar com as imagens da arte de modo que elas nos instiguem a olhares opositores, ou para que esses nos sejam também apresentados por essas “novas” imagens, a fim de revermos nossas histórias e escrevermos novas histórias.
Em referência a bell hooks, Marinho e Cruz (2021, p. 06) apontam três características que compõem o que seria uma “estética opositora”: o “enquadramento de seu público-alvo, ou seja, o espectador precisa se reconhecer positivamente em representações que emerjam de concepções de beleza compartilhadas por sua comunidade”; uma estética que “anuncia seu propósito de existência, pois a arte, ao invés de delimitar, amplia os nossos horizontes de possibilidades existenciais e práticas”; e a ideia de oposição “calcada numa memória que oriente o sentido da história que deseja comunicar, uma vez que a arte opositora funciona como testemunho da resistência que desvela outras narrativas ao espectador: é política, porque sempre existiu, e sempre existiu, porque é política” (2021, p. 06).
Quanto a uma ação educativa que incorpore tal estética opositiva, segundo as autoras, é preciso “levar em conta se tais características compõem o conjunto de fontes visuais utilizadas em sala de aula e, sobretudo, considerar as possíveis recepções de tais imagens pelos discentes” (Marinho; Cruz, 2021, p. 06). Ou seja, não há fórmula pronta ou prescrição prévia de quais imagens deverão estar presentes em nossas salas de aulas. É necessário que, como docentes, estejamos atentas à criação dessa composição, que pode variar de acordo com as experiências das/os estudantes e com os percursos de aprendizagens já vivenciados ou que ainda desejamos gerar.
Em investigação sobre a relação das mulheres negras espectadoras com o cinema, hooks destaca o fato de “parar de olhar” como um gesto de resistência (hooks, 2019, p. 190), e essa escolha de não olhar, afastar-se, representa também uma forma de protestar, rejeitando a negação e a falta de reconhecimento nas imagens. Entretanto, acreditamos que, no caso de pessoas brancas, desenvolver e exercitar esse olhar é condição fundamental para pensarmo-nos enquanto mulheres brancas e posicionarmo-nos de modo a contribuir com a luta antirracista.
Também apresentamos neste debate a ideia de “imagens de controle”, desenvolvida por Patricia Hill Collins. No livro “Pensamento feminista negro” (2019), a autora afirma que as “imagens de controle” têm por objetivo “fazer com que o racismo, o sexismo, a pobreza e outras formas de injustiça social pareçam naturais, normais e inevitáveis na vida cotidiana” (Collins, 2019, p. 136). Para ela, essas imagens fazem parte do pensamento binário ocidental, que fundamenta relações de dominação e hierarquização em que a mulher negra é situada como 'o Outro'. No interior da lógica binária, que estabelece uma oposição não complementar entre pares como masculino/feminino, branco/preto, razão/emoção, cultura/natureza, fato/opinião, mente/corpo, sujeito/objeto, as mulheres negras são colocadas não só como “contraparte” (Collins, 2019, p. 137) dos homens e dos brancos, mas também, a partir de um processo reiterado de desumanização e objetificação, são vinculadas à natureza, vistas como passionais e emotivas, portanto, incapazes de produção de conhecimento e criação.
Desse processo, resulta uma relação de dominação baseada na objetificação, em que as imagens exercem papel preponderante. Na objetificação, “a realidade da pessoa é definida por outras, sua história é nomeada apenas de maneiras que definem sua relação com pessoas consideradas sujeitos” (bell hooks apud Collins, 2019, p. 138). Portanto, acreditamos que reside na ideia de "olhares oposicionais" a possibilidade de encarar e afrontar respondendo a essa violência da objetificação e desumanização da população negra, produzida e perpetuada também através das imagens da arte. Trata-se, porém, de uma resposta não com mais violência, e sim com um modo estético e ético capaz de causar um abalo ou um alargamento de nossas formas de entendimento já cristalizadas, provocando, quem sabe, outros meios de agir frente às imagens e às representações de racismo presentes em muitas delas, relacionados a uma postura também política, ética e estética.
Produções artísticas e a inauguração de outros imaginários
Para darmos continuidade à reflexão aqui proposta, escolhemos três produções artísticas contemporâneas, de artistas negras, que acreditamos que podem provocar nossos modos de compreender as relações raciais no Brasil e, talvez, contribuir para o exercício de uma docência mais reflexiva e comprometida na luta antirracista, no que se refere ao trabalho com imagens da arte na escola.
É importante dizermos que, ao apresentarmos tais produções, não desejamos reforçar o histórico apartado da presença de artistas negras e negros no ensino de arte, assim como da “história da arte”, ou, ainda, criar um capítulo ou aula específica, que aborde arte negra, como nos alerta Renata Felinto dos Santos (2013; 2019). De acordo com a autora, a representação do negro nas produções de arte brasileira passa por grandes transformações ao longo do tempo, e, portanto, existem
muitas formas de pintar, desenhar, esculpir e fotografar o negro para os professores de Educação Artística apresentarem aos seus alunos, com especial atenção aos conceitos e contextos contidos nessas representações. Se nas primeiras imagens o negro era representado alegoricamente visto por olhos estrangeiros, agora são os próprios negros que dão o tom dessa representação, assumindo seus próprios discursos, sendo, simultaneamente, criadores e criação de suas histórias pessoais e de seus antepassados (Santos, 2013, p. 06-07).
Portanto, as produções artísticas que apresentamos a seguir foram escolhidas no intuito de ampliar o repertório das/os docentes, a quem se dirige este texto, de modo a dar visibilidade a outras representações e discursos sobre as pessoas negras brasileiras.
A primeira produção é o trabalho “Filha Natural”, de Aline Motta (Rio de Janeiro, 1974).
Imagem 2 – Aline Motta. Filha Natural, 2018-2019. Detalhe de instalação fotográfica, performance, vídeo.
Fonte: https://alinemotta.com . Acesso em: 28 jun. 2024.
Imagem 3 – Aline Motta. Filha Natural, 2018-2019. Instalação Fotográfica, Performance, vídeo.
Fonte: https://alinemotta.com . Acesso em: 28 jun. 2024.
Produzindo uma interface poética entre pesquisa histórica e uso de linguagens como fotografia, vídeo e performance, Aline Motta tem desenvolvido uma série de trabalhos em que reflete sobre as raízes de sua ancestralidade, em particular, e o impacto da colonização e do escravismo na formação familiar das populações negras, de modo mais geral. A busca pelas origens e histórias das mulheres de sua família tem se desdobrado em diversas obras, tais como "Pontes sobre abismos" (2017), "Se o mar tivesse varandas" (2017), "Outros (fundamentos)" (2017-2019) e "Filha Natural" (2018-2019). A partir de relatos orais e da investigação em documentos públicos, Motta busca elementos para reconstituir a história de sua mãe, sua avó, bisavó e tataravó. É a partir de um atestado de óbito que passa a ter indícios de que sua tataravó, Francisca, teria sido uma mulher escravizada em uma fazenda cafeeira na cidade de Vassouras (Rio de Janeiro), durante o século XIX. Reunindo documentos sobre a fazenda, a artista observa que o nome de Francisca consta como um dos “bens” dos proprietários da fazenda, ao qual se somariam os nomes de mais 200 escravizados, aproximadamente.
Em meio a essas investigações, Motta conhece Claudia Mamede, líder comunitária de Vassouras, que participa da performance, vídeo e fotografias de Filha Natural (imagens acima). Assim, a artista sobrepõe imagens de Claudia e imagens encontradas de uma mulher que fora escravizada na referida fazenda de Vassouras, podendo ser ela sua própria tataravó, Francisca. Tal sobreposição de imagens, que também é uma sobreposição de tempos distintos, busca expor que, a despeito das trajetórias singulares dessas mulheres, Francisca e Claudia, há uma história e um trauma compartilhado: “a relação ancestral que existe entre as mulheres negras, por partilharem histórias em conexão, iniciando-se na África, passando pela diáspora, escravidão e a realidade atual da população negra no Brasil” (MASP, 2019, p. 256).
Outro trabalho que acreditamos contribuir para a reflexão proposta é a performance “Duro”, de 2016, da artista, arte-educadora e curadora Renata Sampaio (Rio de Janeiro, 1988), em que são exploradas questões a partir do corpo negro, sua presença e suas relações com o mundo. A obra esteve presente no Estúdio Sobre Olhar/SP, onde Sampaio penteou seus cabelos e, conforme alguns fios iam caindo, ela os recolhia, colocava em sacos plásticos e os distribuía aos espectadores. Duro[vi] critica a visão branca sobre o cabelo crespo, que os coloca em um lugar exótico, com constante permissão para o toque. Posteriormente, a performance desencadeou também no projeto que deu vida à obra “Nenhum fio a menos”, contando com foto performance da artista.
Imagem 4 – Renata Sampaio. Duro, 2016. Performance de longa duração.
Fonte: https://cargocollective.com/sampaiorenata/Duro . Acesso em: 28 jun. 2024.
Imagem 5 – Renata Sampaio. Nenhum fio a menos, 2018. Foto-performance.
Nenhum fio a menos é sobre a violência que mulheres negras se autoinfligem na tentativa de alcançarem um padrão de beleza branco, tido como universal. A foto-performance nasce do relato da artista Senzy Garcês ao ver a performance Duro, de Renata Sampaio: ela confessa que arrancava seus próprios fios de cabelo na tentativa de que estes nascessem lisos, e lhe mostra as falhas até então presentes no seu couro cabeludo. Uma forte amizade entre as duas artistas se dá a partir de então. (site da artista)
Fonte: https://cargocollective.com/sampaiorenata/Nenhum-fio-a-menos . Acesso em: 28 jun. 2024.
Em suas produções, cenas que já foram vividas são confrontadas, ao ressignificar o ato de violência praticado consigo mesma que fora sofrido em decorrência do racismo. Na produção e exibição desses trabalhos artísticos, surge a possibilidade de expor um problema histórico e de reflexão a partir de outras perspectivas, incluindo-se aí a mobilização de outras narrativas, que se somam a uma perspectiva antirracista e ao necessário trabalho de reparação histórica.
A terceira produção artística por nós escolhida é um trabalho de Renata Felinto dos Santos (São Paulo, 1978), artista e professora universitária que tem se dedicado, no âmbito da pesquisa, à produção artística de negras e negros, explorando modos de registrar, propagar e reconhecer tais produções não hegemônicas nas artes visuais. Em sua produção artística, tem abordado temas relacionados “à questão da identidade negra feminina, deslocamentos e conexões como a globalização em diálogo com a história ancestral”, conforme se lê no site da artista.
Imagem 6 – Renata Felinto dos Santos. Embalando Mateus ao som de um hardcore, 2017. Fragmento de instalação.
Fonte: https://renatafelinto.wordpress.com/embalando-mateus/ . Acesso em: 28 jun. 2024.
Essa obra, segundo informações obtidas no site da artista, é uma instalação que reúne notas fiscais e recibos decorrentes de gastos com a criação de duas crianças, sem auxílio algum do progenitor, durante o período de um ano. Os documentos fiscais passam a compor uma estampa de tecido, que será utilizada na produção de enxovais de bebês e, ainda, explorados materialmente, na forma de gravuras digitais, apresentadas junto de frases recorrentemente ditas às mães que vivenciam a realidade de criar seus filhos sozinhas.
Mãe solo de Benedita e Francisco, Felinto dos Santos incorpora a própria experiência da maternidade à sua obra, levando à reflexão a naturalização da violenta sobrecarga da maternidade solo, que tem impactado, de forma decisiva, tanto a liberdade como a própria vida das mulheres nessa condição. Questões de gênero, violência, sobrecarga materna e, ao mesmo tempo, afeto, mesclam-se nessa obra, assim como os custos, que não são apenas financeiros.
Os trabalhos aqui apresentados problematizam questões ligadas ao corpo negro feminino e, de certo modo, têm potencial de denúncia da violência por eles sofrida. Trata-se de um modo de denúncia que não se limita somente ao próprio ato de denunciar, mas que propõe a reflexão de quem se depara com os trabalhos e convoca ao ato reflexivo, para além da violência ali explicitada. São produções que se apropriam da dor vivida como matéria de uma criação que a confronta e transforma (e nem por isso ela deixa magicamente de existir), mas que, no compartilhamento, pode encontrar também uma forma de reelaboração ou cura, como também convocar o/a espectador/a à responsabilidade coletiva de encará-la, tratar dela, repará-la, deixando de propagar ou reproduzir tais violências e instaurando outros modos de atuar frente a elas.
Parafraseando o questionamento da professora Rosane Borges[vii], perguntamo-nos: “quais são os imaginários que a arte pode reforçar, construir, romper e inaugurar?” Assim como os artistas e as produções escolhidas pelas professoras Marinho e Cruz (2021), para o “uso da estética opositiva em sala de aula”[viii], acreditamos que Aline Motta, Renata Sampaio e Renata Felinto dos Santos são artistas negras brasileiras cujas produções artísticas nos sensibilizam e levam a pensar de outros modos a diáspora africana e a questão do negro brasileiro. Isso se dá especialmente pela “forma como questionaram e representaram a violência escravocrata, como ela se reatualiza no tempo presente e nos afeta cotidianamente” (Marinho; Cruz, 2021, p. 09) e pelo modo como provocam a construção de outras narrativas sobre a realidade das negras e negros no Brasil, em contraponto à tão difundida e naturalizada perspectiva da servidão. Trata-se de um não conformismo diante das referências que nos foram transmitidas, seja na escola ou até mesmo na graduação em Artes Visuais, e de uma busca ativa por novas movimentações e representações na arte e na vida. Como professoras brancas, percebemos que o diálogo com artistas negras desempenha um papel importante na docência das Artes Visuais, não de forma que se ausente da discussão racial, mas para que se pense no protagonismo do artista negro que conta sua própria história através da arte.
Como afirmam Marinho e Cruz (2021, p. 16) não se trata de “obras que apaziguam nem encerram a discussão sobre o passado”; são, antes, produções que “nos convidam a refletir sobre o processo histórico que levou à constituição da sociedade brasileira e à criação de novas visualidades para discussão de estruturas complexas que impactam a população negra até hoje” (Marinho; Cruz, 2021, p. 16-17). Portanto, as artistas aqui apresentadas são também pensadoras negras, “intérpretes da história do Brasil” e produtoras “de saberes emancipatórios por meio das artes visuais” (Marinho; Cruz, 2021, p. 17). Que com elas e com tantas outras, possamos aprender a rever as imagens e referenciais que compõem nossas aulas e nossa docência.
REFERÊNCIAS
BÍBLIA de Jerusalém. Edição revisada e ampliada. São Paulo: Paulus, 2002.
COLLINS, Patricia Hill. Pensamento feminista negro: conhecimento, consciência e a política do empoderamento. São Paulo: Boitempo, 2019.
FELINTO, Renata. Renata Felinto. Site da artista, 2017. Disponível em: https://renatafelinto.wordpress.com/embalando-mateus/. Acesso em: 13 jun. 2024.
GOMES, Nilma Lino. O Movimento Negro educador: saberes construídos nas lutas por emancipação. Petrópolis: Vozes, 2017.
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Notas
[1] Mestranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil (2024). Orcid: https://orcid.org/0009-0004-8808-7856. E-mail: luisasirangelo@gmail.com
[2] Doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil (2024). Professora do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Orcid: https://orcid.org/0000-0001-5948-7472 . E-mail: karinestorck@gmail.com
[3] Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Brasil (2024). Professora na Rede Municipal de Porto Alegre. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-3758-5551. Email: tais.ritter@gmail.com
[i] Intitulada "Seminário Avançado: Tornar-se negro(a) e pensar-se branco(a) possibilidades de coexistência da luta antirracista", ministrada pelas professoras Gládis Elise Pereira da Silva Kaercher e Tanara Forte Furtado.
[ii] Sem e Jafé são os irmãos mais velhos de Cam e filhos de Noé na literatura cristã.
[iii] Para saber mais sobre isso, sugerimos a fala da professora e artista Rosana Paulino na live "Ideias - Descolonização do olhar" (disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ps8Yrrut0rc), em que a professora atenta para o fato de que "a construção dessas imagens obedece a um ideário político", e, através delas "a humanidade vai criando mecanismos para justificar a exploração dos corpos negros". Como um exemplo dessas imagens de criação da animalização dos corpos negros, sugerimos: https://www.sciencephoto.com/media/431875/view/1854-nott-gliddon-racist-anthropology-2 Acesso em: 13 jun. 2024.
[iv] Para saber mais, sugerimos estudos de Lotierzo (2013; 2017) acerca das teorias racistas desenvolvidas a fim de explicar, a qualquer custo, os diferentes (negros) e, por consequência, justificar sua condição de servidão e/ou escravização.
[v] Em vídeo intitulado "Exemplo de racismo na pintura brasileira", a autora apresenta brevemente sua pesquisa de mestrado acerca da obra "A redenção de Cam", de Modesto Brocos. O estudo foi, posteriormente, publicado em livro (2017). Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9_my6ZU7RBw. Acesso em: 13 jun. 2024.
[vi] A vídeo-performance integra o acervo do Museu de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS), localizado em Porto Alegre/ RS.
[vii] A questão surgiu quando a professora referiu-se à potência da produção literária, em conversa com o escritor Jeferson Tenório no podcast Amplitudes - Instituto Tomie Ohtake, episódio "O que é a representatividade ou como disputar imaginários?", Disponível em: https://open.spotify.com/episode/2zXWoY8LsJ4a39pveAuDb2?si=170BQa3vSSub_RZbHhqLKQ Acesso em: 14 abr. 2023.
[viii] A saber: Rosana Paulino, com "¿História Natural?", 2016; Sidney Amaral, com "Incômodo", 2014; e Yuri Cruz, com "Anastácia livre", 2018 (2021, p. 09).