Narrativas de uma cidade em ruínas: caminhando com paisagens, educações e alianças multiespécies

 

Narratives of a city in ruins: walking with landscapes, educations and multispecies aliances

 

Narrativas de una ciudad en ruinas: caminar con paisajes, educaciones y alianzas multiespecies

 

Marcos Allan da Silva Linhares1

Universidade Federal de Uberlândia

 

Keyme Gomes Lourenço2

Universidade Federal de Uberlândia

 

Lúcia de Fátima Dinelli Estevinho3

Universidade Federal de Uberlândia

 

 

Resumo

Este ensaio, escrito ao modo narrativo e experimentativo, procura flagrar alianças que emergem do espaço urbano e que interseccionam natureza-cidade-educação, compondo paisagens multiespécies que nos mostrem caminhos possíveis para pensarmos educações-outras. Para criar uma escrita em experimentação fizemos alianças epistemológicas com as antropólogas Anna Tsing e Donna Harawaye com trabalhos do campo da filosofia da diferença de Deleuze e Guattari. Dessa forma esse trabalho foi tecido como se caminha por aí, atravessando as dobras da cidade, nas vielas ora de cimento, ora de palavras. Caminhamos com o corpo ao subir e descer ruas, produzíamos uma conversa contínua entre nós e os seres das cidades, humanos e não-humanos. Esses encontros foram disparadores potentes para a criação de narrativas que se expressam através de imagens, textos, grafias, contos, enredos que compõem aquilo que nos marcou e nos fez vibrar pelo caminhar. A caminhada como método para produção de narrativas de uma cidade em ruínas, nos abre a possibilidade de conhecer e também de participar de negociações que produzem as paisagens-multiespécies na cidade. Produzir narrativas que permitem serem permeadas pelo fluxo de devir-escrita-caminhar significa atentar-se enquanto pesquisadores-professores-artistas a escutar mais do que falar, de tornar-se acolhedor daquilo que é pequeno e passa despercebido, de reaprender a todo momento, de expor-se aos inesperados das descobertas que vão ecoar não dos grandes prédios, mas sim daquilo que estará entre eles, nas frestas que eles deixam na composição da paisagem que são preenchidas e arrochadas pelos habitantes humanos e não-humanos.

 

Palavras-chave: Pesquisa em Educação; Fabulação; Paisagens multiespécies; Compostagem; Cidade.

 

 

Abstract

This essay, written in a narrative and experimental mode, seeks to capture alliances that emerge from the urban space and that intersect nature-city-education, composing multispecies landscapes that show us possible ways to think about other-educations. To create a writing in experimentation we made epistemological alliances with the anthropologists Anna Tsingand Donna Haraway and with works from the Field of philosophy of difference by Deleuze and Guattari. In this way, this work was woven as one walks around, crossing the folds of the city, in the alleys, sometimes made of cement, sometimes made of words. We walked with our bodies going up and down the streets, producing a continuous conversation between us and the beings of the cities, human and non-human. These encounters were powerful triggers for the creation of narratives that are expressed through images, texts, spellings, stories, plots that makeup what marked us and made us vibrate along the way. Walking as a method for producing narratives of a city in ruins opens up the possibility of getting to know and also participating in negotiations that produce multi-species landscapes in the city. Producing narratives that allow them to be permeated by the flow of becoming-writing-walking means paying attention as researchers-teachers-artists to listening more than talking, to becoming welcoming of what is small and goes unnoticed, to relearn at all times, of exposing oneself to the unexpected discoveries that will echo not from the great buildings, but from what will be between them, in the cracks they leave in the composition of the landscape that are filled and tightened by human and non-human inhabitants.

 

Keywords: Research in Education; Fabulation; Multispecies landscapes; Composting; City.

 

Resumen

Este ensayo, escrito en modo narrativo y experimental, busca plasmar alianzas que emergen del espacio urbano y que se entrecruzan naturaleza-ciudad-educación, componiendo paisajes multiespecies que nos muestran caminos posibles para pensar otras-educaciones. Para crear una escritura en experimentación hicimos alianzas epistemológicas con las antropólogas Anna Tsing y Donna Haraway y con trabajos del campo de la filosofía de la diferencia de Deleuze y Guattari. Así, esta obra se tejió al caminar, atravesando los pliegues de la ciudad, en los callejones, a veces de cemento, a veces de palabras. Caminábamos con nuestros cuerpos subiendo y bajando las calles, produciéndose una conversación continua entre nosotros y los seres de las ciudades, humanos y no humanos. Estos encuentros fueron poderosos detonantes para la creación de narrativas que se expresan a través de imágenes, textos, grafías, relatos, tramas que conforman lo que nos marcó y nos hizo vibrar en el camino. El caminar como método para producir narrativas de una ciudad en ruinas abre la posibilidad de conocer y también participar en negociaciones que producen paisajes multiespecies en la ciudad. Producir narrativas que permitan dejarse permear por el fluir del devenir-escribir-caminar significa prestar atención como investigadores-docentes-artistas a escuchar más que a hablar, a acoger lo pequeño y lo que pasa desapercibido, a reaprender en todo momento, a exponerse a los descubrimientos inesperados que resonarán no de los grandes edificios, sino de lo que habrá entre ellos, en las grietas que dejan en la composición del paisaje que son llenados y apretados por habitantes humanos y no humanos.

 

Palabras clave: Investigacion en Educacion; Fabulación; Paisajes Multiespecies; Compostaje; Ciudad.

 

Introdução

Caminhar. Traçar caminhos por entre espaços ora desconhecidos, ora por trajetos corriqueiros e comuns. Mas sempre com alguma novidade, um acontecimento que torna toda a caminhada, algo novo e diferente. Somos ensinados a caminhar como necessidade fisiológica desde que nascemos. Assim como comer e beber, caminhar se torna uma das primeiras atividades que desenvolvemos quando nos tornamos parte dessa experiência de mundo.

Experienciar o mundo também faz parte do caminhar e caminhar é experienciar o mundo. Acabam se tornando duas coisas simbióticas e interligadas. A experiência de mundo se faz no caminhar, nos proporcionando a construção de ideias, sentimentos, pertencimentos e relações com o espaço e com a vida que nos cerca.

Habitar o espaço urbano, por exemplo, nos ajuda a construir diversas relações com o mundo, como a nossa vivência com os outros semelhantes a nós; com o céu que chega de manhã ao acordarmos e que funciona como despertador natural; com a terra que se torna cimento e matéria prima para a construção das casas e dos prédios; com a vida que por vezes é desabitada dos seus berçários para dar lugar a outras composições.

Caminhando pela cidade construímos em nosso imaginário as paisagens comuns que o espaço urbano nos oferece, colocando nosso corpo em contato com as sensações que ele nos permite sentir: o calor do asfalto, o vento seco que corre dos prédios, as calçadas desniveladas que dão textura aos nossos pés. Sentimos e vivemos esse espaço, somos educados por ele. Mas quais educações-outras podem se fazer nas paisagens hum/urb/anas?

Propomos agora a pensar com as plantas, com o sol, o céu. Como percebemos e fazemos (co)relações com essas entidades não-humanas nos espaços urbanos? Como temos construído um fazer-viver-outro nos espaços engessados e acinzentados das cidades? Como perceber a cidade como um espaço de criação e intercessão de educações-menores nos caminhos que trilhamos cotidianamente?

As espécies não-humanas existem e excedem na cidade, transbordam e fogem as expectativas planejadas e criadas para um espaço dito urbanizado e “desenvolvido”. Não se espera, ao construir uma cidade, que plantas nasçam pelas frestas ou que o sol bata na janela às 08h da manhã. Lidar com esses sujeitos mais que humanos nesses lugares é enfrentar uma força que não se encaixa nos espaços projetados, nos caminhos demarcados.

O sol, a terra, as plantas, o céu são elementos que pertencem a cidade, mas ao mesmo tempo rompem com a lógica de planejamento do uso desses espaços, provocando deslocamentos e mudanças nas paisagens, mas abrindo brechas para a existência de habitantes clandestinos (VAZ, 2018).

Pensamos então, através de nosso caminhar, em como criar composições, sobreposições e instalações que emergem dos encontros entre cidade e as multiespécies. Esses encontros enquanto algo que excede e extravasa o espaço urbano nos provoca a dizer algo que ainda não foi dito sobre educações, vida, modos de estar no mundo e com o mundo ou “dizer de outros modos aquilo que, por excesso, se calou” (VAZ, 2018, s/p).

Desejamos nesse ensaio, escrito ao modo narrativo e experimentativo, flagrar alianças que emergem no espaço urbano e que interseccionam natureza-cidade-educação, compondo paisagens multiespécies que nos mostrem caminhos possíveis para pensarmos educações-outras através dos encontros que nos atravessam pelo habitar e caminhar na cidade.

Para criar uma escrita em experimentação fizemos alianças epistemológicas que se alinham com as escritas das antropólogas Anna Tsing, Donna Haraway e com os trabalhos do campo da filosofia da diferença de Deleuze e Guattari e seus comentadores. Perpassamos por conceitos trazidos pelas leituras como paisagem multiespécies, assemblages[1], espécies companheiras, cidades em ruínas, compostagem, devir, mapa, acontecimento e...

Com isso desejamos pensar outros modos de educações sorrateiras, naturais e vegetais que resistem a ditadura urbana para construir conosco outros modos de movimentar pensamentos e à revelia das novas gestões da vida que buscam a homogeneização em escala mundial, fazer ver modos de existência singulares, humanos e não-humanos, que povoam nossos cosmos com suas maneiras próprias de se transformar e nos transformar (PELBART, 2014).

 

Paisagens mais que hum/urb/anas.

No trajeto, somos convidados a notar as paisagens. E o desafio maior, notar as paisagens para além do urbano e do humano. Tarefa difícil. Principalmente porque não fomos ensinados a olhar para as paisagens. Cotidianamente passamos por elas sem perceber suas relações, dinâmicas e principalmente o nosso papel nessa composição.

Geralmente acredita-se que não é possível encontrar espaços de vida nos ambientes urbanos, uma vez que, tomados pelo “progresso” e pelo “desenvolvimento” acabam por perder inúmeros modos de vida que antes existiam em um meio natural anterior. Mas, movimentados pelo pensamento de AnnaTsing (2019;2022), nos propomos a ver as paisagens para além do imaginário de um ambiente como algo degradado e destruído para dar atenção as margens indomáveis, aquilo que resiste e emerge em uma paisagem em constante transformação.

Tsingnos ensina que as paisagens são fluxos vitais de seres vivos e não-vivos, humanos e não-humanos, são condições atmosféricas, sonhos, memórias... é a emergência de novos modos de existir face à destruição dos emaranhados que dão forma à paisagem, como a cidade (CARDOSO; DEVOS, 2019).Novos modos de existir que resistem as intempéries, ao capital e as ondas de homogeneização da vida. Paisagens como linhas de fuga que escapam pelos entres das cidades, das construções.

Uma paisagem é constituída por padrões de atividades humanas e não-humanas, é um acontecimento, um ato de encontro que mostra como os não-humanos, principalmente, respondem às práticas humanas diferente do design humano que pretendemos que aconteça como o levantamento de prédios, a construção de condomínios, a construção de muros, dentre outros (TSING, 2019).

Caminhar, habitar e estudar as paisagens é fazer ver as heterogeneidades que emergem da composição das múltiplas espécies na intercessão de uma paisagem ora ecológica, ora cultural/política. Tsingnos mostra que a paisagem ecológica é um mosaico de fragmentos florestais, com agregadas formas de vida em constante simbiose. Já a paisagem cultural/política entende a paisagem enquanto um sistema singular e característico que apresenta princípios estruturais e estéticos que a caracterizam (TSING, 2019).

Assim as paisagens que interseccionam ecologia e cultura, política e natureza são compostas por assemblages, ou seja, por uma composição de organismos (humanos e não-humanos) em constante produção de ritmos e sinfonias. Para Tsing (2019) a assemblage baseada em paisagens não se limita somente a uma criatura ou a uma relação, mas a polifonia construída nos encontros entre as espécies que tornam um local habitável.

Se pensamos na cidade, por exemplo, temos um conjunto de elementos em nossa imaginação que nos remetem a paisagem urbana e que estão longe de interseccionar o natural com o urbano. Porém ao se deparar com uma grama ou com uma árvore que resiste em meio ao asfalto, toda a assemblage se modifica ao considerarmos outras espécies companheiras que dividem a existência com esse ser: pássaros, fungos, insetos, roedores, microrganismos, entre outros.

As espécies companheiras como nos diz Haraway (2021) não estão em polos opostos, mas unem de forma inesperada humanos e não-humanos, diversidade e esgotamento, natureza e cultura, rompendo com as limitações que se anseiam entre as espécies, borrando as fronteiras e criando outras formas de se relacionar na atualidade.

Logo, uma assemblage é um agrupamento aberto, é uma performance do habitar que nunca será a mesma em momentos diferentes do tempo. Sempre em um efervescente frenesi a assemblage é articulada pela composição de múltiplas espécies que criam temporalidades, arranjos e designs que constituem inéditos projetos de fazer-mundo, nos ensinando outros modos não-humanos de habitar os espaços da cidade.

Ao caminhar, percebemos projetos de fazer-mundo que se sobrepõem, se entrelaçam, miscigenam-se abrindo espaços para outras formas de vida e para um mundo multiespécie que agora não foca mais no “em frente”, mas na composição coletiva, no caminhar juntos, no pulsar da vida que cotidianamente nos acaricia com a sua presença e companhia.

 

Caminhar como método para narrar: pensando com paisagens urbanas no Antropoceno.

Este trabalho foi tecido como se caminha por aí. Atravessando as dobras da cidade, entrando em seus interstícios, nas vielas ora de cimento, ora de palavras, farejando todo tipo de realidades possíveis de habitar nesse habitat. O caminhar e a imaginação fazem parte do texto assim como do nosso cotidiano urbano, onde, para onde quer que vamos, primeiro de tudo, é preciso que ganhemos movimento. Para a escrita também, cada passo, que tece uma linha-escrita, contém acontecimentos que origina no movimento de passar.

Ao atravessarmos a cidade, a pé, de carro, de bicicleta, de cadeira, de skate, de patins, de ônibus, de trem... somos simultaneamente atores e espectadores dessa paisagem que se forma. Ao mesmo tempo que a contemplamos enquanto espectadores, estamos compondo suas formas, cores e curvas como personagens no momento em que vamos atravessando.

Caminhamos com o corpo e conforme passavam-se paisagens, nós as devorávamos. Ao subir e descer ruas, produzíamos uma conversa contínua entre nós e os seres das cidades, humanos e não-humanos. E esses encontros foram disparadores potentes para criação das narrativas produzidas neste trabalho, que se expressam através de imagens, textos, grafias, contos, enredos que compõem aquilo que nos marcou e nos fez vibrar pelo caminhar.

A caminhada como método para produção de narrativas de uma cidade em ruínas, nos abre a possibilidade de conhecer e também de participar de negociações que produzem as paisagens-multiespécies (TSING, 2019) na cidade, no sentido de podermos compor junto de suas assemblages.

Experimentando tal conceito de Tsing (2019) e nos entendendo como parte dele, pensamos ser possível de nos abrir aos diálogos, às práticas ávidas de contato com outro e às formas criativas de narrar o mundo, conectando as histórias e camadas formadas na paisagem pelos humanos e não-humanos. A fim de desenvolvermos narrativas ficcionais, que produzem ou se desdobram em perspectivas educativas, artísticas, corporais e... que se tornem uma compostagem que fermente ideias com as paisagens do Antropoceno, carregadas de forças capturadas pelo processo de caminhar e também o de escrever-criar.

 

Caminhando pela cidade forrageando encontros.

Produzir narrativas que permitem serem permeadas pelo fluxo de devir-escrita-caminhar significa atentar-se enquanto pesquisadores-professores-artistas a escutar mais do que falar, de tornar-se acolhedor daquilo que é pequeno e passa despercebido, de reaprender a todo momento, de expor-se aos inesperados das descobertas que vão ecoar, principalmente, não dos grandes prédios, grandes bancos, grandes mercados citadinos modernos, mas sim, daquilo que estará entre eles, nas frestas que eles deixam na composição da paisagem que são preenchidas e arrochadas pelos habitantes humanos e não-humanos que também desejam fazer assemblages.

Entendemos que a criação de narrativas que buscam derramar as contaminações do caminhar possui uma dimensão afetiva na sua produção que consideramos importante ressaltar, que é o respeito à criação de vínculos com os lugares percorridos e das relações que podemos estabelecer com aqueles que compõem a paisagem. Os pássaros, as árvores, os matos-tiririca, as flores de cosmos e vinca, as gramas, as joaninhas, os calangos-verdes, as abelhas, os pernilongos, os cartazes rasgados, os tijolos, as lixeiras.

Tsing (2022), comenta muito sobre essa atenção àquilo que não é percebido nem pela ecologia, nem pelos estudiosos de paisagem. Há nas assemblages muito movimento que pode fugir num desatento, elas vão se transformando com o movimento, se dissolvendo e por isso a atenção passa a ser uma prática de escuta do que há nesses entres. Para Tsing (2022), narrar as histórias nessas assemblages é um exercício que requer conhecer. Por isso, segundo a autora devemos “utilizar todas as práticas de aprendizagem possíveis [...] formas combinadas de atenção plena, mitos, contos, modos de vida, arquivos, relatórios científicos e experimentos” (TSING, 2022, p, 236).

As narrativas que foram tecidas nesse texto são baseadas no compromisso com a atenção na observação daquilo que vinha até nós pelo caminhar. Essa prática não se impõe como uma maneira de salvar a narrativa, nem mesmo nos salvar. Porém ela pode vir a abrir nossa imaginação, fluir outras atenções. Todo esse movimento nos ajuda a visualizar as histórias que vão se difundindo nas paisagens urbanas em ruínas. Vamos narrando atentos aos mundos que vão sendo produzidos e destruídos nas assemblages.

O caminhar atento permite-nos transformar o afeto do espaço da cidade caminhada em habilidades de acolher a alteridade e de sermos acolhidos por ela. Isso nos levou a pensar o caminhar como uma busca por formas de narrar e ao mesmo tempo mapear devires, encontros, e acontecimentos que surgem e reexistem nesse espaço de negociação entre seres, dos quais vão criando compostagens com as paisagens do Antropoceno. Compondo narrativas carregadas de possibilidades de vida, resistência e colaboração nas ruínas do capitalismo.

O território a cada vez que é explorado, recompensa a si mesmo se expandindo. Por isso não devemos lançar olhares simplistas para o território das cidades se quisermos conhecer suas histórias. Mas ao mesmo tempo que o território permite vaguear por si, ele carrega consigo um certo tipo de aprisionamento das diversidades dentro do próprio território que se comprimem em padrões fáceis de gerenciar pela modernidade.

Sobre isso Deleuze (1999, p.12) comenta:

Com uma estrada não se enclausuram pessoas, mas, ao fazer estradas, multiplicam-se os meios de controle. Não digo que esse seja o único objetivo das estradas, mas as pessoas podem trafegar até o infinito e “livremente”, sem a mínima clausura, e serem perfeitamente controladas. Esse é o nosso futuro.

Os mapas das estradas, vias, avenidas e ruas nesse sentido tornam-se uma ferramenta essencial para a arte de governar na modernidade. Mas podemos unir outras forças aos mapas e entendê-los como algo capaz de construir ramificações sempre abertas à outras entradas, contribuindo para conexão de uma infinitude de caminhos. O mapa pode não ser algo preso sobre ele mesmo, ele é vivo e nas brechas e rachaduras se constrói. Como comentam Deleuze e Guattari (2011, p, 30);

O mapa é aberto, é conectável em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente. Ele pode ser rasgado, revertido, adaptar-se a montagens de qualquer natureza, ser preparado por um indivíduo, um grupo, uma formação social. Pode-se desenhá-lo numa parede, concebê-lo como obra de arte, construí-lo como uma ação política ou como uma meditação.

 

No sentido levantado por Deleuze e Guatarri (2011) que nos aventuramos experimentar esses mapas que ora seguíamos para caminhar, ora que se criavam após serem descobertos e percorridos.

O mapa com inúmeras entradas, nunca fechado, criativo e vivo, faz possível trazer à tona realidades informais, marginais e incodificáveis, que pela nossa observação ganha espaço nesse território, antes invisível. Pesquisar, caminhar e observar permite vivenciar uma outra temporalidade espacial. A lentidão da jornada feita com o corpo, cria o tempo, aquele mesmo que é roubado pelo capitalismo diariamente de nós, para encontrar e ler fenômenos complexos que formam as paisagens da cidade. Caminhar, mapear e narrar, traz questões metodológicas à tona que nos faz questionar o espaço, as formas de saber enraizadas na experiência de viver na cidade, a fim de conseguir ver aquilo que escapa despercebido nesse território.

A cada percurso cumprido, de maneira coletiva ou individual, pensamos ser possível experimentar a habitação, produzir outros conhecimentos a partir desse encontro e assim reapropriar a cidade habitada. A arquitetura da cidade que vai criando fragmentos de história no território, se revela para nós no passar dos bairros, ao longo das pracinhas típicas de cidades de interior, entre os prédios do espaço público e do privado, entre portões deixados abertos e aqueles encadeados, entre os jardins de calçadas, entre os terrenos abandonados, baldios ou não. Observar esse transitar, essas compostagens, moldaram nossas explorações, viraram húmus para criação de narrativas que contam paisagens inesperadas.

 

Que narrativas queremos? Errantes.

Caminhando se percebe com o corpo. Que vai acolhendo movimentos que escapam até ele no espaço que se atravessa. Esses territórios são espaços potenciais, que muitas vezes não são observados com atenção. Nesta escrita propomos, portanto, nos permitir a sermos capturados por esses escapes e criar com eles narrativas.

Narrativas que relatam os múltiplos entrelaçamentos entre humanos e não humanos. Que deixam emergir as intrincadas relações culturais e territoriais visualizadas.

Narrativas que emergem e provocam e levam a repensar o ambiente urbano. Revelando os fluxos em rede compositores das paisagens que vimos. Fluxos que narram e contam histórias interrelacionadas e socioecológicas que produzem espaços tanto de exclusão, quanto de participação. Narrativas que carregam em seu interior a multiplicidade das relações que elas narram.

Nesse sentido, insistiremos na necessidade de superar as formações binárias da natureza e da sociedade, para desenvolver práticas que mantenham a dialética dos processos. E isso implica na construção de múltiplas narrativas. Sentimos a necessidade de ir além dos dualismos humano-natureza, cidade-não-cidade, para ir ao encontro com a complexidade, e como uma forma de produzir conhecimento que traz à tona as interações e as fricções produzidas pelas paisagens das cidades em ruínas. Errantes. Composto.

Experimentamos a errância tanto para caminhada quanto para as escritas das narrativas atravessando a cidade porosa, nos deixando levar por um contínuo entrar e sair por aí. Novas formas de narrar tornam-se possíveis explorando a cidade e a vida cotidiana. Percorrer a pé leva a uma maior sensibilização daquilo que caracterizam alguns locais da cidade. É necessário ir com o corpo a esses lugares para experimentá-los depois por meio da criação de narrativas, e assim fizemos.

A intenção, portanto, é divulgar a prática da caminhada, redescobrir caminhos e desenhar outros novos que nunca foram explorados. Possibilidades para atravessar a cidade.

 

Narrativando: A sopa de cidade servida num prato de erva daninha.

Líquido, arranha-céus, velocidade, calçadas, atrevido,

Semáforos, táxis, metrópole, ônibus,

Caminhar, bicicletas, parar, postes, andar,

Parques, sonhar, praças, olhar, museus,

Cantar em um mesmo trampo.

Paisagens, bancos, deserto, edifícios, cenários,

Shoppings, montanhas, avenidas, imagens movimentadas de emoção.

Narrativas, carros, silêncio, monumentos,

Histórias, letreiros, vidas, luminosos,

Poesias, fachadas, verdades, na via certa, na via em contramão.

 

Numa cidade agitada e repleta de contrastes, onde o concreto dominava cada centímetro, uma sopa inusitada fervilhava em seus caldeirões invisíveis. Era a sopa de cidade, preparada com ingredientes peculiares colhidos em meio às rachaduras do asfalto. No entanto, o ingrediente principal era erva daninha, uma planta resiliente, um mato da família das Poaceae, que desafiava as normas estabelecidas e crescia em meio ao caos urbano. Se pararmos pra pensar, há algo verde sempre emergindo dos interstícios do concreto, contrastando com a dureza e a monotonia do ambiente urbano.

Vou zanzando...Entre essas ruas ora vazias, mas sempre cheias ao mesmo tempo, se considerarmos os não humanos.

Caminho sem saída, ciclofaixas,

rota, de sonho, de diversão.

Vinho, feiras, brilho, livres, na trajetória, mercados.

Devir, estações, permanecer, do ano, de circular, tornar-se, em profusão.

Sorrir, galerias, existir, de arte, de descoberta, de centros, de coração.

Exploração, descoberta, campos.

Habitar, valas, desabitado, baldios, residir, reinserir, regurgitar,

Aguardando pelo caminho, coletando dos lixos molduras.

 

Deleuze e Guatarri (2011) em “Mil platôs -vol. 1”, utilizam as ervas daninhas, para construírem metáforas que se referem às forças que ocupam e emergem nas margens, nas frestas, nas aberturas, nas rachaduras, nos deslizamentos e nos interstícios dos sistemas, cimentos, pixe, barro, tijolo, entulho, ferragens, ideias, normas e tradições estabelecidas.

A única saída é a erva [...] a erva existe exclusivamente entre os grandes espaços não cultivados. Ela preenche os vazios. Ela cresce entre, e no meio das outras coisas. A flor é bela, o repolho útil, a papoula enlouquece. Mas a erva é transbordamento [...] (DELEUZE e GUATTARI, 2011, p, 40 - grifo nosso).

Essas forças são caracterizadas por sua capacidade de subverter as estruturas de poder e criar novas possibilidades de existência. Entendemos que podemos nos pôr em movimento de cocriação com essas forças criadoras que falam Deleuze e Guattari (2011), na intenção de compor narrativas com paisagens que se dão nesses entres e nesses encontros, assemblages.

 

No meio da cidade, entre o concreto e o asfalto,

Um simples ato, quase um ritual, é feito a cada dia.

Pessoas curvadas, mãos calejadas, arrancando o mato

Que teima em brotar, como um sinal de vida que teima em existir.

 

A paisagem é cinza, e marrom, o ar é seco e carregado,

Mas ali, naquele pedacinho de chão, há vida, há verde.

E as mãos que arrancam o mato são como um ato de resistência

Contra a dureza da cidade.

Contra o brotar das frestas

Contra o rachar do cimento.

Contra o monocromático.

 

No caminho sem saída,

Uma rota de sonhos brilhantes,

Devir permanecer, tornar-se, sorrisos serrados e radiantes.

Exploração esperançosa, descoberta o corpo-todo.

Habitar o desabitado, residir com afecção.

 

E assim, a cada arranco, uma ficha nova lançada a sorte.

Tomara que brote de novo.

Um ato de amor pela natureza, que é o que dá trabalho às mãos.

As plantas sempre retribuem e resistem.

Causam a impressão de que, apesar da cidade cimentadas,

E dos movimentos das mãos.

A vida das plantas sempre encontra um jeito de brotar.

 

Um encontro leva a outro. E ao ser apresentado aos outros personagens dessa paisagem, avisto entre camadas, movimentos ligeiros com as mãos que arrancam habilidosamente os matinhos que ocupam as rachaduras das calçadas. Essas mãos, que outrora seguram cobertas, caixas, um livro, um isqueiro, dois talheres, garrafas de vidro e vasilhas vazias, eram força que agia contra os matos que cresciam, modificando a paisagem quando passavam pelas calçadas que davam entradas aos prédios espelhados gigantes. Essas mãos, enquanto capinavam as ervas daninhas, pensamento: – Deviam sonhar com dias de estabilidade: mais matos por todos os cantos crescendo exageradamente na sociedade.

A ideia de pagar moradores de rua para capinar calçadas com ervas daninhas, por si só, já levanta diversas questões éticas e sociais. Essas pessoas, que já eram vítimas da exclusão social, agora se tornavam mão de obra barata, exploradas em nome da suposta revitalização da cidade.  – Mas ainda bem que há mato, enquanto houver mato eles vão precisar de nós. Ouvimos enquanto os moradores de rua se curvavam sob o sol escaldante, capinando as ervas daninhas que se multiplicavam incansavelmente.

A visão das calçadas sendo capinadas pelos moradores de rua, com o suor escorrendo por seus rostos marcados pelo olhar focado no movimento rápido das mãos. Era uma cena que nos revelava as inúmeras camadas que compunham essa paisagem. E nos retornava uma ideia de como movimentavam suas assemblages. São as forças que se dão entre os contratos, moradores de rua, mato, sarjeta, rachaduras, cimento e moradores dos prédios guardados pelas calçadas que dão forma e fertilizam a vida que há nesse enquadramento. Nos retornava o caos do capitalismo e da modernidade.

Passando por uma rua cheia de rachaduras e arranha-céus. Notavelmente, aquele caminho exibia calçadas limpas, sem matos, sem verde só concreto e grafitti. Nas assemblages percebidas pelo caminhar, aquilo que não é visto, que continuava invisível aos olhos à primeira vista, também nos remetem as histórias que formam paisagens: o sofrimento de mãos velozes que buscam uma única cor que está entre o cinza, preto, e marrom das calçadas das cidades. Mãos velozes que ao mesmo tempo que dão fim àquelas plantinhas que só queriam crescer e ocupar tudo, torcem para que sementes, rizomas ou raízes ainda tenham sobrado por baixo da terra, para que possam trabalhar novamente. E se fazerem necessárias, para se fazerem presentes. – Se o mato acabar, eles não precisam mais de nós. E eu durmo por aqui, não gostaria de ter que mudar de lugar não. Ouvimos.

 

 

 

 

 

 

 

Imagem 1Plantas ocupando terrenos e frestas e rachaduras.

 

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

 

Cidade, livros e plantas tecendo composições ferais[2].

Verão.16:45h. Tarde de um mês de maio quente e ensolarado, principalmente quando se anda no asfalto e se é cercado por muros e portões de metais. Caminho de cabeça baixa habitando a cidade como uma pequena erva daninha que não quer ser notada para não ser morta. Com os fones de ouvido na cabeça crio um outro mundo para não notar esse ao qual eu coexisto. Mas é impossível não se deixar afetar pelas paisagens que narram histórias e que querem nos contar os seus causos.

Nesse trajeto, esbarro com um livro abandonado na calçada e abraçado pela grama que resistia no pequeno espaço que conseguiu encontrar em meio a selva de pedra. Me assustei com aquele livro, ali, parado, do nada, à espera das intempéries do clima e do espaço. Era um guia. Tinha como ato ou efeito de guiar. Geralmente é utilizado para fornecer soluções, informações e serviços. Mas ali estava perdido. Não estava no seu lugar de conforto. Distante de toda as suas funções primeiras. Estava sendo guiado pelos matos que surgiram na cidade. Estava aprendendo outra forma de se relacionar.

Imagem 2: Guia SEI em comunhão com as plantas.

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

 

Não imaginava que ao longo do trajeto encontraria outros livros que queriam compor comigo aquela jornada. Notei mais três ou quatro livros em simbiose com as gramas e os pastos. Pareciam que queriam se fundir a eles, como se tentassem encontrar uma nova forma de educar ou quem sabe de aprender com elas outras formas de falar sobre a vida.

Alguns encontravam-se abertos, com as páginas estendidas como mãos abraçando os vegetais. Outros, ainda resistentes, esperavam com o tempo fugir das normativas acadêmicas e científicas para se permitir aprender novos modos de viver. As plantas os ensinavam isso, livres das margens das páginas ou dos limites dos livros, fugiam e se esgueiravam pelas menores e singelas frestas, trazendo ar para a cidade e cor para as capturas que eu fazia do espaço urbano.

Não muito distante de toda essa experimentação, outro vegetal me chamou atenção. Era uma árvore maior, com um porte de mais velha. Ela segurava entre seus galhos um outro livro. Agora um VadeMecum, conhecido por ser um livro de referência e que traz consigo códigos, leis e constituições vigentes. Ele parecia que já estava ali há um bom tempo. Suas folhas já estavam transformadas através do contato com a água e no seu interior os musgos já apagavam as letras que ali existiam para escreverem outras palavras.

Agora não se desejava mais um VadeMecum que falasse de leis e normalizações, mas um livro que estivesse aberto a ensinar outras miudezas, a aprender outros significados, a falar de obras que não sejam mais a das Ciências Jurídicas mas aquelas que se aprendem no contato com outras educações que resistem ao Antropoceno e a vida na cidade em ruínas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Imagem 3: Sobreposições ferais.

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

 

Parecia que o livro e a planta agora eram um só. Uma composição feral que fricciona educações, modos de vida e resistência na cidade. Uma verdadeira performance. Quem olha de longe poderia dizer que foi uma montagem ou que teve uma intervenção humana. Quem vai saber? Ali a paisagem contava uma história que não interessava o autor, mas as afetações e sensibilizações que causavam em mim.

Olhei, fotografei e desde então fiquei curioso e atento para as formas como a natureza também me acolhia no espaço urbano, assim como aqueles livros. Passei a caminhar e procurar aquelas educações-menores que compunham esse espaço-vida comigo. E com isso quem sabe aprender outras coisas com elas e fazer elas construírem em mim outras educações.

Por entre esses caminhos performáticos e urbanos, procurei enxergar esse mundo em constante mutação/correlação e deixei ser afetado pelas cores, pelas sutilezas da natureza que preenchem em minha existência os espaços vazios, transmutando minhas estruturas, causando torções no pensamento, modificando hábitos e formas. Colorindo. Como quem deseja sabor, avivamento, ânimo para retomar a alegria da vida.

 

Imagem 4: Composições multiespécies na cidade.

Fonte: Arquivo pessoal dos autores.

 

São composições. Uma colcha de retalhos que resistem ao tempo, a cidade e ao Antropoceno construindo uma paisagem coletiva, múltipla, um mosaico de (inter)ações multiespécies, interseccionando o humano e o não-humano em que é possível perceber que o mundo é fluxo e nada pode estar separado em nossas coexistências.

Depois de um tempo experimentando, caminhando, habitando e fotografando a cidade, parei para escrever esse texto e fiz algumas pesquisas. Descobri que VadeMecum tem dois significados. Um deles descrito de forma superficial nos parágrafos anteriores e outro que significa “vamos juntos”, “vai comigo” ou “vem comigo”.

Também descobri que os guias são materiais que acompanham as pessoas ou as coisas. Mostram composições das cidades. Mapas, linhas e teias que nem sempre indicam um caminho correto ou uma direção a seguir. Podem mostrar os becos sem saídas, os bosques, os matagais, a curva lá onde a vida sorrir, onde as plantas nascem nas frestas e afastam o tédio que é viver e habitar as cidades.

Será que esses novos sentidos foram aprendidos pelos encontros com as plantas e flagrados por mim nessa narrativa? Será que o guia e o VadeMecum finalmente se permitiram aprender outras educações com as plantas e as outras espécies companheiras que surgiram em seu trajeto? Será que temos construído nossa experiência no mundo “indo junto” e criando frestas que afastam o tédio das cidades? Fica o convite para também aprendermos educações-outras com as paisagens, com as plantas e com o caminhar na cidade.

 

REFERÊNCIAS

CARDOSO, Thiago Mota; DEVOS, Rafael Victorino. Apresentação dos editores. In: TSING, Anna. Viver nas ruínas: paisagens multiespécies no antropoceno. Brasília: IEB Mil Folhas, 2019.

DELEUZE, Gilles e GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2, vol. 1 /Tradução de Ana Lúcia de Oliveira, Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. 2 ed. São Paulo: Editora 34, 2011.

DELEUZE, Gilles. O ato de criação [Palestra de 1987, tradução José Marcos Macedo]. São Paulo: Folha de São Paulo, 1999. Disponível em: <https://lapea.furg.br/material-pedagogico/oficina-devideo>. Acesso em: 22 set. 2023.

HARAWAY, Donna. O manifesto das espécies companheiras: cachorros, pessoas e alteridade significativa. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2021.

PELBART, Peter Pal. Por uma arte de instaurar modos de existência que “não existem”. Revista Concreta, 2014.

TSING, Anna. O cogumelo no fim do mundo. São Paulo: N-1 Edições, 2022.

TSING, Anna. Viver nas ruínas: paisagens multiespécies no antropoceno. Brasília: IEB Mil Folhas, 2019.

VAZ, Tamiris. Devir-descarte: habitar transbordamentos. ClimaCom [online], Campinas, ano 5, n. 11, 2018. Disponível em: <http://climacom.mudancasclimaticas.net.br/?p=8992>. Acesso em: 01 jun. 2023.

 

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[1]Decidimos manter o termo em inglês, pois, mencionado por Tsing (2019, p. 17), a tradução para o português limitaria a compreensão do conceito, uma vez que usar o termo "assembleia" comumente implica a se referir apenas a encontros de seres humanos. Em inglês, esse termo possui um significado mais amplo e inclui também os não humanos nessas reuniões, contemplando o conceito no sentido discutido por Tsing.

[2] “Feral” aqui se refere a reações não projetadas de não-humanos às infraestruturas humanas (TSING, 2019, p.14).