Alfabetização e decolonialidade: compreender e (re)existir

Literacy and decoloniality: understanding and (re)existing

Alfabetización y decolonialidad: comprensión y (re)existencia

 

Vania Fátima Vassoler

Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó – SC, Brasil.

vaniav@unochapeco.edu.br

Martin Kuhn

Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó – SC, Brasil.

martk@outlook.com.br

Recebido em 09 de novembro de 2024

Aprovado em 09 de agosto de 2025

Publicado em 05 de setembrp de 2025

 

RESUMO

A escola, na América Latina, foi construída sintonizada com os processos de colonização, marcada pela matriz imperialista ibérica. Esse modelo de educação e alfabetização contribuiu e contribui para a construção das desigualdades econômicas, sociais e culturais na América Latina, mas também em nosso país. O artigo propõe como problemática: O que compreende propor uma alfabetização desde uma perspectiva epistemológica decolonial? Busca-se, desse modo, tensionar ou alargar a compreensão das possibilidades de uma alfabetização orientada desde uma epistemologia decolonial. Trata-se de uma discussão teórico-reflexiva orientada desde uma epistemologia decolonial. A reflexão está organizada em 3 movimentos. O primeiro movimento explora as noções de colonização, descolonização, colonialidade e decolonialidade. O segundo movimento aproxima as noções de colonialidade e de decolonialidade do campo educativo. Por fim, retoma-se o conceito de alfabetização e letramento estreitando o diálogo com a proposição epistêmica decolonial. Sustenta-se que uma alfabetização decolonial abre caminhos para o diálogo, para a escuta, para a vivência, para o olhar, para a sensibilidade, para o pensar e, desse modo, questiona a matriz colonial que subalterniza historicamente nossos estudantes.

Palavras-chave: Decolonialidade; Educação; Alfabetização.

 

ABSTRACT

The school, in Latin America, was built in tune with the processes of colonization, marked by the Iberian imperialist matrix. This model of education and literacy has contributed and contributes to the construction of economic, social and cultural inequalities in Latin America, but also in our country. The article proposes as a problem: What does proposing literacy from a decolonial epistemological perspective include? In this way, it seeks to tension or broaden the understanding of the possibilities of a literacy oriented from a decolonial epistemology. It is a theoretical-reflexive discussion guided by a decolonial epistemology. The reflection is organized in 3 movements. The first movement explores the notions of colonization, decolonization, coloniality, and decoloniality. The second movement brings the notions of coloniality and decoloniality closer to the educational field. Finally, the concept of literacy and literacy is resumed, narrowing the dialogue with the decolonial epistemic proposition. It is argued that a decolonial literacy opens paths for dialogue, for listening, for living, for looking, for sensitivity, for thinking and, in this way, questions the colonial matrix that historically subordinates our students.

Keywords: Decoloniality; Education; Literacy.

 

RESUMEN

La escuela, en América Latina, se construyó en sintonía con los procesos de colonización, marcados por la matriz imperialista ibérica. Este modelo de educación y alfabetización ha contribuido y contribuye a la construcción de desigualdades económicas, sociales y culturales en América Latina, pero también en nuestro país. El artículo plantea como problema: ¿En qué consiste proponer la alfabetización desde una perspectiva epistemológica decolonial? De esta manera, se busca tensionar o ampliar la comprensión de las posibilidades de una alfabetización orientada desde una epistemología decolonial. Se trata de una discusión teórico-reflexiva guiada por una epistemología decolonial. La reflexión se organiza en 3 movimientos. El primer movimiento explora las nociones de colonización, descolonización, colonialidad y decolonialidad. El segundo movimiento acerca las nociones de colonialidad y decolonialidad al campo educativo. Finalmente, se retoma el concepto de alfabetización y alfabetización, estrechando el diálogo con la propuesta epistémica decolonial. Se argumenta que una alfabetización decolonial abre caminos para el diálogo, para la escucha, para el vivir, para la mirada, para la sensibilidad, para el pensamiento y, de esta manera, cuestiona la matriz colonial que históricamente subordina a nuestros estudiantes.

Palabras clave: Decolonialidad; Educación; Alfabetismo.

 

 

 

 

Introdução

            Vivemos em um país com grande desigualdade social, esta produzida desde a colonização e reforçada pelas opções políticas, econômicas e educacionais que acompanharam a nossa história (Shiroma; Moraes; Evangelista, 2004). Assim, conhecendo um pouco mais a nossa história da educação e, principalmente, como se deu a sua produção, é possível compreender como a educação contribui na produção das desigualdades que imperam em nosso país.

Para Krainer e Chaves (2023), o sistema educativo, a escola e a universidade se consolidaram na França a partir do século XVIII, com o objetivo principal de desenvolver a cidadania, igualdade, liberdade, progresso, princípios à construção dos estados nacionais. Nesse contexto, a escola consolidou-se como ferramenta para a transmissão de uma cultura homogênea e universalista, desenvolvendo um saber, uma identidade, um idioma, uma forma de produção de sujeitos que predomina e domina o que é diferente. É o contexto do iluminismo, da constituição dos estados nacionais e das revoluções industriais, que requerem à produção de novas subjetividades e a educação teria uma tarefa importante nessa empreitada.

Longe de se esgotarem à modernidade, a proposição de modelos universalistas e homogeneizadores de educação têm nos acompanhado. No Brasil, no momento, essa pretensão está presente nas habilidades e competências propostas pelas políticas curriculares reformistas (Kuhn; Almeida, 2024). No âmbito da alfabetização esse fenômeno também é recorrente, expresso em um ensino prescritivo e orientado a partir da avaliação de larga escala anunciada por Ravitch (2011). Nesse sentido, como ponderam Kuhn e Frantz (2013, p. 5), “[...] en el ámbito de la educación básica, se estrecha la relación con la profesionalización precoz de los hijos de trabajadores por medio de la formación profesional técnica”.

Em nosso país identificamos uma dívida histórica com as classes populares, com os povos originários, com os afrodescendentes, com os grupos socialmente excluídos da sociedade. Nesse cenário, os estudos decoloniais têm se mostrado importantes à essa compreensão, pois apresentam uma crítica e rompimento com as bases epistemológicas e socioantropológicas da ciência moderna, levando em conta outros saberes, outras cosmologias, presentes nas compreensões dos chamados subalternos e excluídos da sociedade (Santos, 2006). 

As leituras decoloniais, desse modo, abrem caminhos para pensar o campo educacional na contemporaneidade (Faria et al, 2015). Entre os muitos processos tensionados por esta perspectiva epistemológica e socioantropológica (saber, poder, gênero, diversidade, multiculturalidade, infâncias, linguagem) podem-se incluir também os múltiplos processos de alfabetização. É relevante refletir sobre os processos de alfabetização, tradicionalmente colonizadores, alargando possibilidades de diálogo com a diversidade cultural (Ocaña; Conedo; Arias; 2018), propondo espaços para a construção das identidades das crianças. Assumindo a perpectiva epistemológica decolonial, a intenção é pensar possibilidades de alfabetização, interrogando a matriz colonial presente na história da educação latino-americana.

O artigo anuncia como problemática: O que compreende propor uma alfabetização desde uma perspectiva epistemológica decolonial? Buscamos, desse modo, tensionar ou alargar a compreensão das possibilidades de uma alfabetização orientada desde uma epistemologia decolonial. Trata-se de uma discussão teórico-reflexiva orientada desde uma epistemologia decolonial. A reflexão está organizada em 3 movimentos. O primeiro movimento explora as noções de colonização, descolonização, colonialidade e decolonialidade. O segundo movimento aproxima as noções de colonialidade e de decolonialidade do campo educativo. Por fim, retomamos o conceito de alfabetização e letramento estreitando o diálogo com a proposição epistêmica decolonial. Compreendemos que uma alfabetização decolonial abre caminhos para o diálogo, para a escuta, para a vivência, para o olhar, para a sensibilidade, para o pensar e, desse modo, questiona a matriz colonial que subalterniza historicamente nossos estudantes.

 

Colonização e colonialidade

Reconhecemos que a colonização marcou os processos epistemológicos e socioantropológicos de nossa história e constituiu marca presente em nossa educação. O que propriamente compreendemos pelo termo colonização? De acordo com Kuhn, Arenhart e Salva (2024, p. 3) “[...] a colonização diz respeito às várias formas de dominação dos povos colonizados pelas metrópoles”. No contexto da modernidade colonial, apresentou-se como forma de dominação política, militar e econômica de Estados e de empresas, chanceladas por estes, sobre outras comunidades étnico-culturais, do próprio território e de outros. No caso do formato europeu, mais ou menos predatória, saqueadora e destrutiva em relação a modos de vida dos povos originários da América, África e Ásia, a colonização constituía-se uma condição necessária em seu projeto expansionista e civilizador. Conforme Bonatti e Battestin (2023, p. 11) a colonização influenciou decisivamente

 

[...] na definição das identidades colonizadas, a presença de outras identidades, que não a europeia, sempre estiveram subjugadas à subalternização das experiências coloniais dos povos nativos em Abya Yala. Produzindo nos povos colonizados [...] a existência de uma dupla consciência – conquistador e conquistado – afetando conjunturalmente nos padrões de organização social e de relações econômicas de poder desde a colonização.

 

Ao produzir a subalternização nos processos de identificação dos povos colonizados, classificou as pessoas considerando diversos aspectos, raciais, religiosos, culturais, políticos, econômicos etc. Tais traços colonizantes estão presentes nos rótulos raciais/físicos produzidos entre os séculos XVII, XVIII e XIX, na dominação das comunidades indígenas, na escravidão dos povos africanos, na perseguição cultural e religiosa, no menosprezo de saberes e cosmologias de povos originários, como apontam Bonatti e Battestin (2023).

Quijano (2019), nesse sentido, compreende que a colonização está na constituição da América Latina. Talvez não mais exista o colonialismo clássico, mas este refere-se às formas de exercício do poder em que um determinado centro subjuga e instrumentaliza comunidades socioculturais diferentes. Assim, o controle do trabalho, do gênero, da autoridade, da subjetividade e intersubjetividade, está arraigado à racionalidade moderna, que se oculta sob a face da colonialidade. Assim, o discurso colonizador legitimou “[...] alegações de tipo salvacionista, na pretensão de convencer os povos ‘atrasados’ de que o processo civilizador lhes é ou será econômica, política e culturalmente benéfico” (Kuhn; Arenhart; Salva, 2024. p. 4). No contexto do Brasil colonial, a colonização teve por “[…] intenção demarcar e conquistar territórios, explorar os recursos, dominar povos originários, subjugar comunidades étnicas, etc, […]” (Kuhn; Arenhart; Salva, 2024, p. 4). Desse modo, traduziu-se na imposição de configurações socioculturais, imaginários, crenças, modos de pensar, ideologias eurocêntricas, aspectos que persistem em nossa cultura. Ressaltam Paim e Souza (2018, p. 14) que essa postura epistemológica invisibiliza “[…]  os conhecimentos e saberes dos povos indígenas, dos povos afro-brasileiros, dos quilombolas, ciganos, povos do campo, ribeirinhos, entre outros”.

No caso dos países da América do Sul, esclarece Quijano (2019), que os povos originários, africanos e os pobres não foram integrados à sociedade. Foram obrigados a trabalhar de maneira disciplinada para os mais abastados, situação e estrutura que permanece mesmo após o processo de independências das colônias. Então, durante 200 anos buscou-se um caminho para nacionalização das sociedades latino americanas, contudo “[…] la colonialidad del poder aún ejerce su dominio, en la mayor parte de América Latina, en contra de la democracia, la ciudadanía, la nación y el Estado-nación moderna” (Quijano, 2019, p. 293).

Quijano (2019) compreende inclusive, que mesmo após a independência das nações latino-americanas, outras formas de colonialidade foram produzidas. Ressalta que o poder fundado na colonialidade implicava num padrão cognitivo, uma perspectiva de conhecimento em que o não europeu era considerado inferior, não civilizado, primitivo. Tal postura teve duas implicações: primeiro que os povos foram tirados de suas identidades históricas singulares; a segunda que sua identidade racial era negativa por isso não podiam continuar nela.

 

En otros términos, el patrón de poder fundado en la colonialidad implicaba también un patrón cognitivo, una nueva perspectiva de conocimiento dentro de la cual lo no-europeo era el pasado y de ese modo inferior, siempre primitivo (Quijano, 2019, p. 278).

 

Ressaltam Paim e Souza (2018) que essas formas de colonialidade são reproduzidas nos contextos educativos na forma de colonialidade do poder ou política, da colonialidade epistêmica, da colonialidade do ser, da colonialidade linguística, entre outras.

Tensionando o processo de colonialidade, Ocaña, Arias e Conedo (2018, p. 40), ponderam que “[...] nos han colonizado desde la epistemología, el lenguaje, la investigación, la mente e incluso desde las palabras”. Acrescentam que “[...] no hay nada más colonizante que las palabras; por medio de éstas - y la educación es un vivo ejemplo - se emplean códigos sígnicos y lingüísticos solapados, que nos permiten configurar discursos adoctrinantes”. Ou seja, o poder atravessa todo tecido social por meio de uma linguagem colonizada.

Desse modo, a colonialidade do poder ou política, segundo Ocaña, Arias e Conedo (2018, p. 34), “[...] promueve el no poder, la sumisión y subordinación al amo, el dominado es un súbdito, un subalterno, un esclavo. Se hipoteca su libertad y felicidad”. Como tal, promove a submissão e subordinação do sujeito dominado, transformando-o em escravo, tirando sua liberdade e felicidade. Tal poder de doutrinamento, de subalternização, compreende Krainer e Chaves (2023), compõem o conhecimento da educação formal, as relações sociais, as formas de produção e consumo, a apropriação do território etc.

A colonialidade do saber ou epistêmica é outra forma de dominação ou subalternização dos povos. A colonialidade do saber ou epistêmica,

 

[...] estimula el no saber, la ignorancia. El conocimiento personal, empírico y espontáneo, no tiene validez. Se invalida la doxa. Solo vale el conocimiento del docto, el conocimiento. El epistemicidio es el homicida de las creencias y concepciones del colonizado (Ocaña; Arias; Conedo, 2018 p. 34-35,).

 

Nessa forma de expressão da colonialidade somente tem validade o conhecimento do dominante, ou seja, os saberes dos colonizadores. Os saberes e conhecimentos do outro, como diriam Santos e Meneses (2009), as epistemologias do sul, as suas crenças e culturas diversas são mortas e deletadas. O não reconhecimento desses saberes é “[...] desperdício de experiência social e que poderiam se afirmar como alternativas a uma vida e sociedade mais sustentável”, como apontam Kuhn e Kuhn (2018, p. 310). Reis (2022, p. 6) salienta que essa não validade dos conhecimentos, saberes, vozes extra ocidentais, “[...] sustenta a colonialidade do saber, com suas hierarquias e critérios valorativos monoculturais”. Para Reis (2022), esse não dar credibilidade a práticas e saberes do sul, é revestido de ideologias e tem base nas estruturas de poder moderno/colonial.

A colonialidade do saber, para Ocaña, Arias e Conedo (2018), é o ato pelo qual o colonizador reprime outros saberes que não são europeus, nega-se o conhecimento epistêmico e histórico dos outros povos. Seus conhecimentos são considerados não racionais, míticos e arcaicos. Prevalece nessa lógica a monocultura do saber e do rigor científicos que tem de ser “[…] questionada pela identificação de outros saberes e de outros critérios de rigor que operam credivelmente em contextos e práticas sociais declarados não-existentes” (Santos, 2002, p. 250).

Assim, para além da colonialidade do poder e do saber, impôs-se “[...] a colonialidade do ser, em que os povos subalternizados impregnaram de tal forma a episteme do europeu que se torna difícil radicalizar e romper com essas formas de conhecimento” (Paim; Souza, 2018, p.14). Esse modo de ser impactou e ainda impacta todos nós, nas escolas, nas igrejas, nos livros, nas revistas, nas mídias. “En la historia de la modernidad colonial, la colonialidad del ser es pensada, por lo tanto, como una negación del estatuto humano, aplicada a africanos e indígenas” (Walsh, 2012, p. 253). A colonialidade do ser inferioriza, subalterniza e desumaniza para além dos corpos, da cor da pele, da orientação sexual, uma vez que coloniza a subjetividade, os aspectos afetivos, as práticas culturais, os valores éticos etc.

Ocaña, Arias e Conedo (2018) sintetizam a colonialidade do ser afirmando que o colonizado não sabe mais quem é, pois sempre foi lhe negado a sua cultura e subjetividade. A colonialidade do ser “[...] potencia el no ser, la no existencia, la des-ontologización humana. El ser humano se multiplica por 0 y desaparece, no tiene valor, no existe” (Ocaña; Arias; Conedo, 2018, p. 35). O ser humano perde seu valor, como se não existisse. Tal modo de ser/existir está em sintonia com o entendimento epistemológico simplificador sugerido por Morin (2001) que nega a diversidade humana.

Por fim, a colonialidade linguística impõe noções e categorias eurocêntricas importadas do ocidente que não refletem a identidade da América Latina. A colonização da linguagem “[...] impone nociones y categorías eurocéntricas, importadas desde Occidente, que no reflejan la identidad latinoamericana y enmascaran el colonialismo y la colonialidad política y epistémica” (Ocaña; Arias; Conedo, 2018, p. 35). Nesse sentido, a Europa configurou, por meio de sua linguagem, um mundo universal baseado em seu modo de viver, ignorando e silenciando outros modos de vida e de expressão, impedindo que o subalterno falasse, ocultando a realidade plural existente. Compreendem Ocaña, Arias e Conedo (2018), que o ato linguístico discursivo é o principal processo epistemológico da corrente crítica decolonial, pois o discurso decolonial tensiona a prerrogativa epistêmica linguística da modernidade. A inferiorização da língua do outro e de suas formas de expressão, anuncia-se como uma das formas mais eficientes de destruir os modos de ser, de pensar e de existir da alteridade. Nesse cenário, concordando com Krainer e Chaves (2023), a decolonialidade linguística surge como uma proposta que busca resistir e mudar a lógica colonial, descobrindo, valorizando e construindo formas distintas de relações políticas, de reconhecimento de outros conhecimentos e epistemes, de outros modos de ser, existir, de valorar, de agir e de se expressar.

Assim, o “[...] pensamento decolonial é também uma brecha epistêmica, que se localiza nas fendas da ferida colonial e emerge para propor seu rompimento diante de um revisitar crítico de nossa razão de ser, existir, sentir e dos modos de relacionar-se com o mundo” (Dariva; Lima; Battestin,  2022, p. 10). Nesse sentido, acrescenta Krainer e Chaves (2023, p. 31) que o “[…] giro decolonial vem como uma proposta na busca de modificar a lógica colonial e construir formas distintas de conhecimento, valorizando todos os saberes existentes com intuito de transformar o mundo”.

 

2 Decolonialidade e educação

 

A epistemologia decolonial assumida transcende historicamente a modernidade e tensiona os processos de colonialidade. Luta por novas configurações de poder, de saber, de ser, de fazer e agir, de viver. Dialogando com Walsh (2012), Ocaña, Arias e Conedo (2018, p. 39) anunciam que

 

[...] no asume la decolonialidad como una meta o fin en sí misma sino como una herramienta política y conceptual. La decolonialidad permite comprender el problema colonial en su complejidad y explicar la ruta teórica y praxiológica de la lucha insurgente.

 

Sob esse olhar, a decolonialidade tensiona e desarticula a configuração do poder, do saber, de ser e do dizer o colonial e da colonialidade. Significa reconhecer os estados coloniais e a partir deles resistir e transgredir (Ocaña; Arias; Conedo, 2018). Nas palavras de Faria et al (2015, p. 13), o pensamento decolonial ou pós-colonialista “[...] promove a desconstrução dos essencialismos, diluindo as fronteiras culturais e fazendo críticas ao processo de criação do conhecimento científico [...]”, bem como, as múltiplas formas de subalternização que continuam operantes”.

Assim, o decolonial, segundo Walsh (2012, p. 25), denota “[...] um caminho contínuo de luta, no qual se pode identificar, visibilizar e encorajar ‘lugares’ de exterioridade e construções alternativas”. Os estudos pós-colonialistas rompem com as bases epistemológicas das disciplinas científicas modernas “[...] acolhendo e amplificando as vozes dos(as) excluídos(as), os(as) outros(as) ausentes dos discursos dominantes, desconstroem as fronteiras disciplinares, articulando história, sociologia, antropologia, literatura e arte” (Faria et al., 2015, p. 12). Enquanto um modo de pensar fronteiriço anuncia uma epistemologia e ontologia de (re)existência que aponta outros rumos para tratar das diferenças.

Compreende Walsh (2012) que  o pensamento de fronteira instiga diferentes formas de pensar que não seja o pensamento dominante. Acrescentam Krainer e Chaves (2023, p. 31) que  “[…] uno de los elementos centrales para lograr este giro decolonial, es reconocer la validez que poseen los saberes que están fuera de la esfera del conocimiento científico, como actualmente lo compreendemos”. Uma educação decolonial, nesse sentido, tensiona a colonialidade presente no cotidiano das diferentes práticas sociais e da propria escola.

Assumir pressupostos decolonais à educação é um desafio, já que a nossa tradição foi e é colonial. No entender de Arroyo (2015), é importante entender a história da educação para perceber como desde os primórdios as classes subalternas foram injustiçadas. Que garantias às crianças, adolescentes, jovens, adultos indígenas, afrodescendentes, pobres, quilombolas tiveram ao direito educativo ao longo de nossa história da educação? Interroga Arroyo (2015, p. 2): “A garantia do seu direito à educação, ao conhecimento, à cultura, aos valores, às identidades, à diversidade está melhorando? Mas não vai melhorar sozinho! Quais responsabilidades nos cabem”?

Pensar e praticar uma educação decolonial pressupõe o reconhecimento da interculturalidade. Nesse movimento, muitos grupos contribuíram para a discussão das relações entre educação e interculturalidade. No cenário brasileiro, Arroyo (2015, p. 4), aponta que nas últimas décadas acentuaram-se “[...] os movimentos sociais em defesa de seus direitos à terra, teto, renda, a identidades positivas e culturais atrelaram o direito à educação e o direito à vida às lutas pela garantia dos direitos humanos [...]” de grupos (campesinos, indígenas, quilombolas, sem tetos, pobres) que foram historicamente excluídos do direito à educação. Nesse contexto, Arroyo (2015, p. 6), acrescenta uma diversidade de movimentos sociais que lutam pelo “[...] direito à vida, trabalho, terra, território, teto, identidades, igualdade, diversidade, justiça... direitos atrelados a outro projeto de sociedade, de campo, de cidade, de padrão de trabalho e de poder”.

Nesse movimento de reconhecimento e afirmação da interculturalidade, incluíram-se na educação ações políticas de ingresso e permanência na escola, de valorização das identidades culturais, incorporaram aos currículos escolares materiais pedagógicos e componentes próprios da cultura negra, indígena, quilombola e seus processos de resistência e contribuições na construção histórica do país. Em alguma medida, trata-se do esforço de assegurar aos historicamente privados dos direitos sociais básicos, não só do direito à educação, mas o próprio reconhecimento de sua cultura e identidade. Trata-se, fundamentalmente, de questionar as diferenças e desigualdades construídas ao longo da história entre diferentes grupos socioculturais, étnico-raciais, de gênero, orientação sexual, entre outros. Nesse sentido, compartilhamos com o princípio de que a interculturalidade contribui com a construção de uma sociedade que assuma as diferenças como constitutivas da democracia e que é possível construir relações igualitárias entre diferentes grupos socioculturais, historicamente excluídos e inferiorizados.

Sob essa premissa, a educação intercultural não pode ser reduzida a situações e atividades realizadas em momentos específicos, uma vez que se trata de um enfoque global que requer incorporar todos os atores e todas as dimensões do processo educativo nos diferentes contextos que se desenvolvem, como compreende Walsh (2012). A perspectiva de escola colonial permeou historicamente e ainda permeia o currículo, a organização escolar, a linguagem, as práticas didáticas, as atividades extraclasse, o professor, a relação com a comunidade etc. Tensionar o modelo colonial de educação impõe romper com uma determinada perspectiva epistemológica e pedagógica. Nossos modelos de educação e de alfabetização foram coloniais e ainda são atravessados pela colonialidade.

 

3 Alfabetização decolonial: tensionando formas e conteúdos

 

A intenção de pensar alternativas para a alfabetização colonial requer uma primeira aproximação do conceito de alfabetização e letramento e, em um segundo momento, propor alguns encaminhamentos acerca do ser, do saber, do poder e da linguagem como pressupostos à alfabetização decolonial. Compreendemos que a aprendizagem da leitura e da escrita não estão alheias às estruturas de poder que estão postas, como compreende parente (2022). No tocante à revisão dos processos de alfabetização, compreendemos que tensionar as formas e os conteúdos que estruturaram e estruturam a produção do pensar, do ser, do sentir e de se expressar, entre outros, abrem possibilidades para (re)significar o trabalho pedagógico nos contextos de alfabetização.  No entender de Parente (2022, p. 23) “[...] o contato com o diferente potencializa as possibilidades de construção de novas formas de se colocar frente ao mundo

Magda Soares (2020), p. 27) compreende o conceito de alfabetização como o

 

Processo de apropriação da tecnologia da escrita, isto é, do conjunto de técnicas procedimentos habilidades necessárias para a prática da leitura e da escrita: domínio do sistema de representação que é a escrita alfabética e das normas ortográficas habilidades motoras de uso de instrumentos de escrita (lápis, caneta borracha…); Aquisição de modos de escrever e de modos de ler aprendizagem de uma certa postura corporal adequada para escrever ou para ler; habilidade de escrever ou ler, seguindo convenções da escrita, tais como: a direção correta da escrita na página (de cima para baixo, da esquerda para a direita); a organização espacial do texto na página; a manipulação correta e adequada do suporte em que se escreve nos quais se lê - livro, revista, jornal, papel etc.

 

Nas palavras de Soares e Batista (2005), o conceito de alfabetização se amplia ao longo do século XX em decorrência das transformações sociais, políticas, econômicas e educacionais, considerando alfabetizado aquele que além de ler e escrever consegue usar a leitura e a escrita em suas práticas sociais. Desse alargamento hermenêutico do processo de alfabetização, temos o conceito de letramento que “[...] designa, então, o conjunto de conhecimentos, atitudes e capacidades envolvidos no uso da língua em práticas sociais e necessários para uma participação ativa e competente na cultura escrita” (Soares; Batista, 2005, p. 50). Assim, a alfabetização e o letramento dos sujeitos são requisitos às demandas da sociedade atual. Ser letrado requer o domínio de um conjunto de capacidades complexas como ler, escrever, informar, orientar, interpretar, ampliar, compreender etc, produzidas pelo processo de alfabetização.  Alfabetização e o letramento, desse modo, anunciam-se como complementares na compreensão do mundo, conforme Soares (2020).

Tradicionalmente em suas formas, as práticas pedagógicas vinculadas à escola moderna tradicional não reconheciam a criança como ativa, como capaz de receber e reelaborar a cultura. Denominadas de transmissivas/repetitivas, essas formas coloniais de alfabetização não acolhiam as crianças com seus saberes, em suas diferenças, em suas singularidades (Kuhn; Arenhart; Salva, 2024). A revisão dos conceitos de criança e infância, reconhecendo-as como criativas, como participantes, tensionam os processos pedagógicos, tanto em suas formas como em seus conteúdos. Como ponderam Kuhn, Arenhart e Salva (2024, p. 7), “[...] os processos pedagógicos que submetem a criança ao exercício estrito de poder dos adultos, legitimados por discursos sobre a infância, são colocados em questão pela perspectiva decolonial”.

Nesse sentido, compreende Cohn (2005, p. 21) que “[...] ao contrário de serem incompletos, treinando para a vida adulta, encenando papéis sociais enquanto são socializados ou adquirindo competências e formando sua personalidade social”, as crianças participam e se envolvem em diferentes práticas sociais. Ela “[...] interage ativamente com adultos e as outras crianças, com o mundo, sendo parte importante na consolidação dos papéis que assume e de suas relações sociais” (Cohn, 2005, p 28-29). Acrescenta Faria et al, (2015, p. 13), que a criança passa a ser compreendida como “[...] um sujeito histórico, participante ativo da construção da realidade social, produto e produtora de cultura, criadora de conhecimentos e saberes”. Repensar os processos de alfabetização e letramento, em suas formas e conteúdos requer, igualmente, a revisão de nossa compreensão de criança e infância.

Assim, uma perspectiva decolonial de alfabetização/letramento implica entender a criança como ativa, como sujeito que participa a aprendizagem. Desse modo, o desvelamento de conceitos reivindicados pelo processo pedagógico torna-se importante para pensarmos uma perspectiva decolonial. Tensionar a forma (métodos, metodologias, estratégias), sem dúvida, é importante, contudo, sem tensionarmos o conteúdo (pressupostos epistemológicos, ontológicos e pedagógicos) pouco avançamos em direção a uma postura decolonial para os processos de alfabetização e letramento. Compreendemos que assumir uma postura decolonial requer assumir como prerrogativas o desvelamento do poder, do saber, do ser e da linguagem, entre outros, que atravessam as formas pedagógicas que permeiam as práticas educativas das professoras/es.

Pensar em formas que envolvam efetivamente as crianças nos processos de construção dos conhecimentos passa a ser uma prerrogativa. Entendemos por forma o conjunto de procedimentos que a/o professor/a põe em movimento em seu trabalho pedagógico. Tensionar o currículo prescritivo, lista de conteúdos a serem desenvolvidos ao longo da formação, é imperativo para uma perspectiva de alfabetização/letramento decolonial. Contudo, compreendemos que uma alfabetização decolonial requer tensionar os pressupostos epistêmicos e ontológicos que tem acompanhado o fenômeno educativo e da própria alfabetização.

 

Desvelar o poder

 

Quijano (2005) esclarece que tradicionalmente a colonialidade do poder estava ligada a ideia de raça e sexo. Assim, conforme a raça e o sexo os seres humanos são classificados com identidades sociais ou em grupos sociais superiores ou inferiores. Essa forma de compreensão, conforme Quijano (2019), é um eixo fundamental do padrão de poder colonial. Durante muito tempo e ainda nos dias atuais, essa colonialidade promoveu a submissão e a subordinação de grupos e seres humanos. Desvelar e tensionar essas formas de poder é requisito de uma postura decolonial.

Walsh (2012) destaca que o pensamento de Paulo Freire avançou em uma ideia central, que o oprimido poderia ser libertar ao se reconhecer na sua condição existencial de oprimido, tensionando as relações de poder instituídas. Desvelar o poder requer criar condições epistêmicas e políticas para desenvolver o processo de conscientização produzindo uma consciência crítica, de forma a superar a contradição entre opressor e oprimido. Segundo Freire, (2018, p. 52), “[...] a realidade opressora, ao constituir-se como um quase mecanismo de absorção dos que nela se encontram, funciona como uma força de imersão das consciências”. A proposta de uma educação popular decolonial para Walsh (2012), requer a recuperação coletiva da história. Compreender e apreender o mundo com sensibilidade crítica, de forma a desenvolver uma consciência conhecedora dos processos e das dinâmicas de transformação. Esse é o sentido propriamente de uma alfabetização que questiona as múltiplas formas de poder.

Walsh (2012) compreende a pedagogia não somente como transmissão de conhecimento, mas como uma postura indispensável e necessária à transformação. O pensar desde a realidade, do lugar onde estamos vivendo é um caminho a ser trilhado aos poucos, transgredindo as fronteiras de uma pedagogia bancária. Decolonizar o poder requer traçar caminhos, construir novos conhecimentos, novas relações de convivência, requer se apropriar da palavra. Paulo Freire (2018, p. 30) enfatiza isso em seus escritos: “Nessa situação os dominados, para dizer a sua palavra, têm que lutar para tomá-la. Aprender a tomá-la dos que a detém e a recusam aos demais é um difícil, mas imprescindível aprendizado [...]”.

Alfabetizar para desvelar o poder é também alfabetizar para desvelar o mundo que nos cerca. Segundo Freire (2018), em um primeiro momento o oprimido precisa perceber o mundo opressor vivido e após expulsar esses mitos criados e desenvolvidos pela e na estrutura opressora. “Com a palavra o homem se faz homem. Ao dizer a sua palavra, pois o homem assume conscientemente sua essencial condição humana” (Freire, 2018, p. 17). Também é pela palavra que desvelamos as estruturas de poder, pois ao apropriar-se da linguagem, o educando desvela as relações de poder instituídas e instituintes. Assim, ao desvelar o poder na educação propiciamos a tomada de consciência para transformar a realidade vivida. Alfabetizar para desvelar o poder é buscar novas formas de viver no mundo com justiça, igualdade e possibilidades para todos. Decolonizar o poder compreende tensionar, desde a infância, as contradições sociais que regulam o nosso modo de ser e existir. Significa desenvolver posturas que percebam o mundo como classe, como disputa. Nesse sentido, Freire (2018, p. 93), pondera que “[...] a libertação autêntica, que é a humanização em processo, não é uma coisa que se deposita nos homens. [...] é práxis, que implica a ação e reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo”.

 

Desvelar o saber

 

O modelo da ciência ocidental eurocêntrica tornou-se a única forma de conhecimento legitimado. Segundo Walsh (2012), foi estimulado como não saber, como ignorância os conhecimentos dos povos originários, dos afrodescendentes, enfim, os conhecimentos e saberes diferentes foram subalternizados ou considerados primitivos ou mágicos. Santos e Meneses (2009), ressaltam que somente o conhecimento dominante (eurocêntrico) tinha valor, razão utilizada para dominar os “povos não civilizados” ou “atrasados”. Esses conhecimentos foram transformados em conteúdos e saberes escolares e, desse modo, subalternizam os demais saberes.

Pensar uma alfabetização que interrogue o saber e as formas de saber instituídos, certamente não é novidade, pois outros pensadores e pedagogos já o fizeram, contudo, tal entendimento constitui um requisito decolonial. Para Salas et al. (2022), o saber colonial remete ao ensinar um saber que vem de fora, acabado, unicamente prescritivo, um saber que não dialoga com o ser/existir dos sujeitos. Compreende Freire (2018) que construir uma pedagogia para e com os subalternizados requer questionar os saberes/conhecimentos instituídos, dos dominantes, pois só assim, a educação problematiza, dá voz ao oprimido e anuncia possibilidades de libertação. A pedagogia pode desenvolver uma consciência crítica, ser humanizadora e libertadora, contudo, essa pretensão passa pelo questionar dos saberes instituídos nos currículos escolares.

Em contextos de alfabetização, segundo Salas et al. (2022), pressupõe compreender o que a criança diz, o que conhece, oportunizar a reelaboração de seu pensar. Compreende-se, então, que através da escuta, do diálogo, podemos nos aproximar dos saberes da criança. Nas palavras de Santos (2002), colocar o que está ausente no presente, trazer o presente que está silenciado, revelar e credibilizar a diversidade a multiplicidade das práticas sociais. Ao oportunizar às crianças espaços que possibilitem o reconhecimento das diversidades existentes, propor soluções para as tensões que surgem na interação com o outro, interrogar os conhecimentos e saberes cotidianos, recriam-se processos de aprendizagem significativos. Quando subalternizadas ou compreendidas como imaturas, como inferiores e ou incapazes (Faria et al., 2015) reproduzem-se práticas colonizadoras. Quando as crianças passam a ler esse mundo, passam a dominar o saber, abrem-se possibilidades de interrogar os processos de dominação e de exclusão.

Salas et al. (2022), compreendem que o conhecimento e a forma de perceber, de olhar o outro e o mundo enriquece nossos convívios. Segundo Freire (2008), o diálogo é a forma mais produtiva para a educação para liberdade. O processo pedagógico baseado no diálogo entre educador e educando torna-se o itinerário para o processo de conscientização e de superação de opressão. A proposta de uma educação popular, decolonial, conforme Walsh (2012), requer a recuperação coletiva da história. Compreender e apreender o mundo com sensibilidade crítica, de forma a desenvolver uma consciência conhecedora dos processos e das dinâmicas de transformação. Ao pensar em pedagogias decoloniais falamos de processos diferentes, um caminho a ser trilhado aos poucos, transgredindo as fronteiras de uma pedagogia transmissiva e receptiva.

Em nossa estrutura social, os modos de pensar, conhecer e de participar têm cor e gênero. Uma pedagogia decolonial busca algo distinto, criar espaços de dignidade humana, de justiça social, de reconhecimento da diversidade humana, de outras formas de viver com a natureza, outras formas de conhecer e pensar. Explicita Walsh (2012), que a pedagogia precisa inspirar, desenvolver o pensamento crítico, motivar para desvelar as culturas e conhecimentos sem medos, segregações ou menosprezos.

 

Decolonizar o ser

 

A colonialidade do ser ao longo da história ocidental negou a humanidade de povos, especialmente povos originários e afrodescendentes (Walsh, 2012). A cultura, os saberes, as cosmologias, as subjetividades desses povos foram subalternizadas. O homem de cor foi estigmatizado quando confrontado com o homem branco (Santos 2009), o indígena “não civilizado” ao “civilizado europeu”. O modo de ser de africanos e de indígenas foi colonizado pelo modo de ser europeu, foi silenciado por um projeto civilizatório, como apontam Ocaña, Arias e Conedo (2018). Ao longo dos séculos outros grupos foram subalternizados e invisibilizados em sua forma de ser/existir, quilombolas, ciganos, povos do campo, ribeirinhos, pobres, sem-teto, moradores de rua etc. Assim, para além da cor, de saberes, de cosmologias, outras formas de subalternização acompanham a constituição do ser do outro.

Reconhecer as demandas e as necessidades dos sujeitos, deixar que se expressem das mais variadas formas é condição para as aprendizagens. As crianças demonstram sua posição no mundo, na escola, na família ou na comunidade. Desde pequenas criam brincadeiras, transformam brinquedos, exploram tudo o que está ao seu redor, criam possibilidades sobre objetos, rompem fronteiras para explorar e conhecer mais. Reconhecer o ser/sentir desde criança, o valor de suas culturas, de suas vozes, de suas subjetividades é requisito para uma alfabetização decolonial. De acordo com Macedo (2016), é através das múltiplas linguagens que as crianças se comunicam, produzem cultura, descobrem novas oportunidades e desfrutam de sensações, reconhecem sua existência.

Macedo (2016) afirma que as culturas infantis são construídas na relação direta com pessoas de sua convivência. As crianças lutam diariamente para estarem entre elas, querem brincar por mais tempo e resistem aos padrões de reprodução. A abertura ao ser da alteridade requer a escuta à fala dos estudantes. Isso recorda que independente da função que se ocupa na relação pedagógica, é escutando que todos nós aprendemos a falar, desse modo, a escuta como princípio da fala ou, no princípio, uma escuta. Desse modo, escutar é mais do que capacidade auditiva, escutar “[...] significa a disponibilidade permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro, ao gesto do outro, às diferenças do outro” (Salas et al., 2022, p. 11), ou seja, a abertura ao modo de ser do outro.

Acrescenta Salas et al. (2022) que para escutar é preciso disponibilizar tempo, atenção, entrega. É preciso compreender e respeitar o tempo singular da infância, sua curiosidade, sua criatividade, dar condições para o desenvolvimento de sua autoestima, de seu empoderamento. Dar um tempo livre para que a criança pense, compartilhe, vivencie suas interrelações, para que possam se afirmar em suas singularidades e potencialidades. Para escutar,

 

[...] é preciso saber que existem muitos modos de ser, pensar e agir e que a troca e a criação que acontece na comunicação durante a prática educativa começa por permitir-se aceitar a diferença do outro  que ecoa em mim (Salas et al, 2022, p. 11).

 

Nas palavras de Walsh (2012), a escuta se faz importante nesse momento, pois ela nos dota de sensibilidade para viver as culturas diferentes dos mundos que estão presentes pela palavra. Assim, o ato de escutar é uma possibilidade de lembrar, reviver as memórias e sabedorias das comunidades, seus modos de ser e existir. É uma maneira de aprender valorizando o território e a tradição que gera o ser humano e seus modos de viver no coletivo, uma forma de construção do espaço existencial, uma forma de apropriar-se das heranças e das tradições culturais.

Assim, uma alfabetização que reconheça a criança como alter (outro/outra) anuncia uma postura decolonial. Jorge Larrosa (2006, p. 184) acentua a alteridade da infância: “[...] sempre além de qualquer tentativa de captura, inquieta a segurança de nossos saberes, questiona o poder de nossas práticas e abre um vazio em que se abisma o edifício de nossas instituições de acolhimento”. Reconhecer o modo de ser do/da outro/a, da criança, abre a “[...] possibilidade de os sujeitos e sujeitas se constituírem em singularidades autônomas e emancipadas” (Arenhart; Kuhn, 2023, p. 5). Pensar uma prática de alfabetização que reconheça cada criança como ser potente, capaz de resistir à homogeneização ou a normalização, alarga a possibilidade de uma perspectiva decolonial de educação. Reconhecer essa condição de singularidade de cada cultura, de cada ser criança, é postura para ser professor/a que constrói a sua docência a partir de pressupostos decoloniais.

 

Desvelar a linguagem

 

A colonialidade linguística impôs noções e categorias importadas do ocidente. Ocaña, Arias e Conedo (2018) destacam que a Europa configurou o mundo pelo discurso, baseado num modo de viver, ignorando e silenciando outros modos de vidas e modos de expressão, impedindo que o subalterno falasse. Alfabetizar para desvelar os múltiplos sentidos presentes na linguagem e nos processos comunicativos é parte de uma alfabetização decolonial. Significa desenvolver a linguagem com a criança no sentido de que ela possa utilizá-la para demonstrar suas compreensões, para reconstruir sua aprendizagem, para significar e ressignificar seu mundo. Uma alfabetização que propicia relações estreitas com o sentido, com a expressão, oportuniza que a criança perceba o sentido da escrita e possa utilizá-la no dia a dia.

Aprender a ler e escrever é uma tarefa desafiadora para as crianças, razão pela qual é importante o cultivo do desejo de querer saber, a curiosidade, instigada através de trocas, interações, práticas sociais e diálogos. Segundo Miniac (2023), para se apropriar de uma escrita é necessário desenvolver uma relação individual com ela, com seus diferentes usos. Freire (2018), nos diz que a educação bancária nos proibiu de ser, de sentir, pois deposita conteúdo sem sentido, descontextualizados, deixando as massas oprimidas, sempre à margem, desumanizadas. Nesse sentido, desde a alfabetização é importante uma linguagem com sentido, uma apropriação dos sentidos, pois somente assim os educandos poderão refletir sobre esse mundo. A aproximação dos sentidos assumidos pela realidade ocorre com a apropriação da linguagem, uma vez que a criança só aprende e interpreta o mundo se ela se apropria da linguagem em suas múltiplas formas.

Para Miniac (2023), espera-se que a escola trabalhe a relação singular de cada indivíduo com a escrita, com suas práticas e seus usos sociais. Então, não se trata apenas de transmitir conhecimento, mas utilizar a linguagem escrita/falada como possibilidade de interlocução com o dia a dia da escola e com o mundo. Oportunizar experiências com a linguagem, em suas várias possibilidades, alarga as possibilidades de as crianças se expressarem. Nesse movimento de uso social da linguagem ela se cria, se transforma e se constrói como humana desvelando os porões do mundo cotidiano.

A criança aprende a ouvir, a entender o outro, aprende a falar, a dizer o que quer também pela escrita, então, a alfabetização/letramento é a apropriação de um processo discursivo. Segundo Barbosa, Mesquita e Castro (2023) a aprendizagem da escrita e leitura se desenvolvem em momentos discursivos, nas interações, nas interlocuções entre os estudantes e também estes com seus professores. Freire (2018, p.119) enfatiza que “[...] será a partir da situação, existencial, concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo programático da educação ou da ação política”. Por isso, ouvir o que a criança diz e tem a dizer, perceber o que ela sente se faz importante no trabalho pedagógico, ali pode se apresentar um conhecimento importante e significativo para a criança (re)significar seu mundo.

O/A professor/a alfabetizador/a trabalha com o ensino da língua. Dessa forma, é importante refletir sobre suas práticas pedagógicas com objetivo de auxiliar as crianças na apropriação significativa da língua. Em nossa sociedade marcada por informações, novas demandas de leitura e escrita emergem cotidianamente e que vão além do saber ler e escrever. Nas palavras de Almeida e Oliveira (2023), saber ler e escrever, fazer seu uso transforma a vida das pessoas. Assim, os termos fazer uso social e compreensão aparecem ligados diretamente a conhecimento e leitura do mundo. Para que a inserção social aconteça de fato, os sujeitos necessitam saber fazer uso da leitura e da escrita no contexto social. Ou seja, um dos sentidos de ser letrado é ser capaz de compreender e interagir com o mundo por meio de práticas de linguagem. Significa, igualmente, que ao desvelar o sentido das palavras, desvelamos as múltiplas formas de poder, de dominação, de subalternização que estão presentes em nossa língua.

 

Considerações finais

Compreendemos com a reflexão as múltiplas formas de como a colonialidade marcou e continua marcando a educação, homogeneizando, desvalorizando outras possibilidades de saber, ser, viver e existir. A educação decolonial, desse modo, se anuncia como uma proposta de valorização das subjetividades, das diferenças, concentrando-se na existência e nos saberes dos invisibilizados. Desse modo, pensar uma alfabetização decolonial significa interrogar os pressupostos epistemológicos e ontológicos de uma alfabetização colonial, ou seja, as formas de poder, do saber, do ser e da linguagem, entre outras dimensões que orientaram e orientam os processos pedagógicos (forma e conteúdo) da alfabetização. O percurso reflexivo permite afirmar que as desigualdades em nossa sociedade foram e são produzidas e reproduzidas pelos processos de alfabetização/letramento.

Com palavras alfabetizamos, aprendemos fonemas, grafemas, dizer o que pretendemos dizer, o que sentimos, a palavra nos dá poder. A alfabetização decolonial talvez aconteça em muitos espaços, posta em movimento por professoras que transgridem o currículo estabelecido, nas experiências que, muitas vezes, não são registradas, tampouco publicizadas. A/O professora/or ao desvelar as formas de poder, de saber, de ser e da linguagem tensiona a alfabetização colonial. Perceber o educando enquanto ser e estar no mundo, valorizar seus saberes, assegurar-lhe o direito a voz, são requisitos para uma alfabetização decolonial. Quando os pressupostos epistêmicos e ontológicos decoloniais dialogam com os pressupostos pedagógicos, forma e conteúdo, em turmas de alfabetização podemos dizer que somos o povo na resistência, na luta contra a desigualdade, contra a injustiça, contra o preconceito, contra a homogeneização.

 

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