Apresentação do dossiê temático: “Uma análise crítica dos impactos da pandemia na educação em países da América Latina: possibilidades de caminhos emancipatórios”
Wanda Maria Junqueira de Aguiar
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.
Universidade da Região de Joinville, Joinville, SC, Brasil
jane.mery@univillebr.onmicrosoft.com
Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, Mossoró, RN, Brasil.
julioribeirosoares@yahoo.com.br
A pandemia da Covid-19, mesmo que de forma desigual, provocou danos globais, sendo que até o momento não temos a clareza dos seus desdobramentos sanitários, políticos e sociais nos diversos segmentos de atuação humana na sociedade. Frente a esta constatação, corroborada por pesquisas que buscam compreender esta realidade, nos dedicamos neste dossiê a apresentar um conjunto de pesquisas realizadas no Brasil e em dois países da América Latina (México e Colômbia), tendo em comum o objetivo de discutir os impactos da pandemia da Covid- 19 na educação.
Os artigos que enfocam os impactos da pandemia na realidade brasileira provêm de quatro universidades, de diferentes regiões do país (nordeste, sul e sudeste), que integram o projeto “Pandemia da Covid-19 e seus impactos na educação básica no Brasil: diagnóstico e proposições interventivas na escola”, aprovado no “Edital de Seleção Emergencial IV CAPES - Impactos da Pandemia” (Edital nº 12 – CAPES, 2021). São artigos que abordam: pressupostos teóricos e metodológicos que fundamentam as pesquisas realizadas pelos autores brasileiros, práticas pedagógicas, relações vividas na escola e processos de ensino e aprendizagem, no período pandêmico e pós-pandêmico. O dossiê traz três autores Latino-Americanos – dois do México e um da Colômbia –, que discutem a pandemia na relação com as questões sociais, educação e juventudes. Vale destacar que, apesar das diferenças entre os países, os autores dos textos têm em comum uma análise crítica da realidade, reafirmando um compromisso ético-político com o direito
O primeiro artigo, de autoria de Marly Krüger de Pesce, Jane Mery Richter Voigt e Aliciene Fusca Cordeiro Machado, pesquisadoras da Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE), apresenta como título “Discussão de resultados de pesquisas sobre impactos da pandemia nas práticas pedagógicas da educação básica”. As autoras estabeleceram como objetivo discutir, numa perspectiva sócio-histórica, resultados de uma busca por produções acadêmicas sobre os impactos da pandemia, provocadas pela Covid-19, nas práticas pedagógicas na educação básica entre os anos de 2020 e 2022. Para isso, foi realizado um levantamento de produções científicas no portal de Periódicos Acadêmicos do Electronic Library Online – SciELO e no Portal de Periódicos da Capes, cuja análise se pautou nos princípios da análise de conteúdo. Das análises, as autoras depreenderam duas temáticas: a responsabilização e a intensificação do trabalho docente e, as mediações no processo de ensino e aprendizagem. Os resultados indicam que, como consequência da lógica neoliberal, o individualismo foi reforçado, pois o professor foi responsabilizado pelo processo educativo dos estudantes mesmo tendo restrições de condições objetivas para desenvolver sua atividade profissional. Contudo, os professores tiveram que realizar mudanças em suas práticas, o que, num movimento dialético, acabou transformando os sujeitos envolvidos nos processos.
O segundo artigo, de autoria de Júlio Ribeiro Soares, da Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN), Ana Mercês Bahia Bock, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e Eliana de Sousa Alencar Marques, da Universidade Federal do Piauí (UFPI), intitula-se “Impactos da pandemia da covid-19 na educação básica: a questão do fracasso escolar”. Os autores propõem compreender os impactos da pandemia da Covid-19 na produção do fracasso escolar na educação básica no Brasil. O estudo foi realizado a partir da análise de documentos do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) que tratam de resultados da avaliação da educação básica no período de 2018 a 2021, intervalo este abrange os primeiros dois anos da pandemia, e dois anos antes, para efeito de comparação com a realidade pandêmica. Para complementar informações, outras fontes documentais também foram consultadas, como do Fundo das Nações Unidas para a Infância é uma agência das Nações Unidas (Unicef) e do Conselho Nacional de Educação (CNE). O estudo mostra que, mesmo que indicadores de fracasso escolar, como reprovação, abandono e distorção idade-série não estejam quantitativamente definidos de forma confiável nos relatórios consultados, os impactos da pandemia na educação básica são imensuráveis, o que denota urgência de planejamento, ação e políticas públicas para reverter a situação.
O terceiro texto, de Wanda Junqueira de Aguiar, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), Luciana de Oliveira Rocha Magalhães, da Universidade de Taubaté (UNITAU) e de Vilani Cosme de Carvalho, da Universidade
ISSN: 1984-6444 | http://dx.doi.org/10.5902/1984644486021
Federal do Piauí (UFPI) contempla a temática “A pesquisa intervenção mediando o 3
processo de superação dos impactos da pandemia na educação básica”. As autoras
discutem pressupostos teórico-metodológicos que buscam a superação de contradições, dificuldades e desvios no que se refere à função da escola, decorrentes das contradições geradas na pandemia. Para tanto, destacam a importância da criação de processos de transformação de educadores por meio da formação intencionalmente crítica. O texto inicia com uma breve apresentação de aspectos do contexto pandêmico, dando ênfase aos impactos ocorridos na educação. Na sequência são discutidos alguns pressupostos teórico-metodológicos do Materialismo Histórico-Dialético, proposta metodológica entendida como base para a construção das principais categorias da Psicologia Sócio-histórica, perspectiva que também fundamenta a proposta sistematizada neste artigo, qual seja, a da Pesquisa-Trans- Formação. A discussão realizada argumenta em favor da necessidade de se produzir conhecimentos que possam orientar o planejamento e desenvolvimento de práticas e pesquisas que tenham por finalidade colaborar na formação e transformação de educadores, sobretudo em contexto de pós-pandemia.
A seguir, apresentamos os autores estrangeiros, cujos textos compõem este dossiê. São pesquisas em contextos colombianos e mexicanos.
O primeiro deles é de autoria de Germán López Noreña, da Fundación Red para la Educación en Iberoamérica (Red FREI) - Universidad Santiago de Cali (USC), Colombia e Cicerón Erazo Cruz, da Universidad Santiago de Cali (USC) – Universidad del Cauca (UniCauca), Colombia. O tema do artigo é “La escuela y la educación colombiana en el contexto de la post-pandemia. Una propuesta pedagógica crítica”. De acordo com os autores, a nova dinâmica provocada pela pandemia global do SARS-CoV-2 radicalizou as falhas do sistema educativo colombiano. Assim, neste artigo, eles propõem uma reflexão sobre: Como pensar criticamente a escola e a educação num contexto pós-pandemia? Metodologicamente, os autores realizaram uma busca textual em diversas bases de dados, em seguida foi realizada uma Análise de Conteúdo Documental. Dessa forma, o assunto é abordado a partir de três cenários. Primeiro, são evidenciados o trabalho escolar antes da pandemia (anacronismos, clausura, descontextualização e tecnificação-padronização). Em segundo lugar, são reveladas as realidades reveladas pela Covid 19 (as grandes desigualdades sociais) e as lições aprendidas (a escola não queria mudar). Terceiro, são apresentadas algumas propostas relativas à educação pós-pandemia (humanização do ato pedagógico, contextualização da escola, implementação de pedagogias latino-americanas críticas e mudança de conteúdos). Para os autores, outras pedagogias e escolas, antes da utópica e encoberta pandemia, hoje são necessárias e não podem ser adiadas.
O segundo artigo, intitulado “Postpandemia, interacción social y efectos psicosociales en la población de un mundo globalizado”, é de autoria de Raúl Rocha
ISSN: 1984-6444 | http://dx.doi.org/10.5902/1984644486021
Romero, Facultad de Estudios Superiores Zaragoza, UNAM: Ciudad de México, MX. 4
O autor destaca que a pandemia da Covid-19 afetou as interações sociais entre as
pessoas e que isso trouxe graves consequências que estão se expressando no pós- pandemia. Em suas considerações, o autor escreve sobre como a pandemia que têm ocorrido neste mundo globalizado, e em algumas das áreas mais importantes da vida social: política, económica, educacional, familiar e pessoal. O texto é organizado em três eixos de análise: o institucional, o relacionado aos processos sociais e o dos resultados tanto da estrutura quanto dos processos sociais. Finaliza-se apontando que, para enfrentar os estragos da pandemia, é necessário promover interações sociais mais positivas, que sejam permeadas por comportamentos empáticos e cooperativos e, desta forma, proteger a saúde física e mental das pessoas.
O terceiro texto, o último deste dossiê, intitula-se “Manifestaciones de estrés e indicadores de riesgo y protección en tiempos de pandemia en estudiantes adolescentes”, de autoria das pesquisadoras mexicanas Blanca Estela Barcelata- Eguiarte e Raquel Rodríguez-Alcántara, da Universidad Nacional Autónoma de México. Para as autoras, a pandemia de covid-19 é um acontecimento estressante, não normativo e representa um risco para o funcionamento psicológico dos adolescentes. O objetivo da pesquisa foi analisar os potenciais fatores de risco e de proteção, em função do sexo, da idade e do estado, em estudantes com idades compreendidas entre os 13 e os 21 anos na Cidade do México e no Estado do México. O inquérito de percepção dos jovens sobre a covid-19 foi administrado em linha, consistindo em oito fatores ou áreas (por exemplo, pressões escolares, dinâmica familiar, medidas preventivas, mudança de rotinas, socialização virtual, relaxamento) e um formulário de consentimento informado. As análises multivariadas (MANOVA) revelaram diferenças significativas na percepção da pandemia em função do sexo (FRoy=4,155; p ≤0; η=,080), da faixa etária (FRoy=4,889; p ≤0; η=,093) e do estatuto (FRoy=3,061; p =,002; η=,060) no que respeita ao medo de contágio, à mudança de rotinas e às pressões escolares. Verificaram-se também efeitos de interação sexo*estado (F= 2,281; p=.022; η=.046) e de interação idade*estado (F=2,748; p=.006; η=.054), bem como efeitos de sexo*idade*estado apenas no medo de contágio (F=3,147; p=.044; η=.016). Em suas conclusões, as autoras destacam que as mulheres obtiveram pontuações mais elevadas em todos os fatores do que os homens, especialmente entre os 16 e os 18 anos. Estes resultados podem servir de base para programas de intervenção em função do género, da idade e do estatuto.
Ao finalizar a organização deste dossiê, esperamos que sua leitura provoque reflexões, diálogos e novas pesquisas, permitindo problematizar a realidade vivida a fim de contribuir com uma educação que promova transformação, formação humana e crítica, comprometida com uma sociedade democrática.
Como organizadores, agradecemos aos pesquisadores/autores que aceitaram participar deste dossiê, dedicando-se a escrita de textos que contemplam seus
ISSN: 1984-6444 | http://dx.doi.org/10.5902/1984644486021
estudos e reflexões, produzindo artigos qualificados em consonância com as políticas 5
da Revista Educação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), atendendo às
recomendações dos avaliadores, colaborando com o processo de revisão.
Agradecemos aos editores, à equipe técnica da revista e aos avaliadores, pela acolhida na nossa proposta e nos esforços para produção e publicação do dossiê. Desejamos que os leitores tenham uma agradável e propositiva leitura!
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