Emoção, neurociência e educação: revisão da produção acadêmica brasileira de 2018 a 2022
Emotion, neuroscience and education: review of brazilian academic production from 2018 to 2022
Emoción, neurociencia y educación: revisión de la producción académica brasileña de 2018 a 2022
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil
marciagrossi@terra.com.br
Universidade Federal da Fronteira Sul, Chapecó, RS, Brasil
lerlyra@gmail.com
Recebido em 20 de julho de 2023
Aprovado em 26 de agosto de 2023
Publicado em 24 de março de 2025
RESUMO
O objetivo deste artigo foi identificar o que tem sido produzido nacionalmente em programas de pós-graduação stricto sensu no Brasil em termos do emprego da emoção nas mais diversas áreas do conhecimento e, conhecer os assuntos tratados nas pesquisas da área da neurociência e educação acerca desse tema, no período de 2018 a 2022. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica do estado do conhecimento, com abordagem qualitativa e do tipo exploratória, no banco de dados da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Com o descritor emoção, foram selecionados 349 produções, sendo 126 teses e 223 dissertações, que atenderam aos critérios propostos e que fizeram parte das discussões. A área que mais produziu foi as Ciências Humanas na região sudeste, no ano de 2019. As categorias mais presentes foram a regulação emocional e processo de ensino e aprendizagem. A partir dos descritores emoção and educação foram selecionadas 76 produções, sendo sete teses e 69 dissertações. Os assuntos mais abordados foram processo de ensino e aprendizagem e regulação emocional. Com os descritores emoção and neurociência and educação foram localizadas sete produções acadêmicas que tratavam dessa relação. As produções acadêmicas foram realizadas preferencialmente em universidades públicas, da região sul, sudeste e norte e em cursos voltados à formação acadêmica. O assunto mais tratado foi acerca das funções cognitivas. Face aos resultados, pode-se dizer que há pouca produção das contribuições da neurociência acerca dos estudos da emoção para a educação, contrariamente à importância dessa área de conhecimento.
Palavras-chave: Educação; Emoção; Neurociência.
ABSTRACT
The objective of this article was to identify what has been produced nationally in stricto sensu postgraduate programs in Brazil in terms of the use of emotion in the most diverse areas of knowledge and, to know the subjects addressed in research in the area of neuroscience and education on this topic, from 2018 to 2022. A bibliographical research of the state of knowledge was carried out, with a qualitative approach and exploratory type, in the database of the Brazilian Digital Library of Theses and Dissertations (BDTD). With the emotion descriptor, 349 productions were selected, 126 theses and 223 dissertations, which met the proposed criteria and which were part of the discussions. The area that produced the most was the Human Sciences in the southeast region in 2019. It is noteworthy that the most present categories were emotional regulation and the teaching and learning process. From the descriptors emotion and education, 76 productions were selected, seven theses and 69 dissertations. The most discussed subjects were the teaching and learning process and emotional regulation. With the descriptors emotion and neuroscience and education, seven academic productions were located that dealt with this relationship. The academic productions were carried out preferably in public universities, in the south, southeast and north regions and in courses aimed at academic training. The most discussed subject was about cognitive functions. Given the results found, it can be said that there is little production of contributions from neuroscience about the studies of emotion for education, contrary to the importance of this area of knowledge.
Keywords: Education; Emotion; Neuroscience.
RESUMEN
El objetivo de este artículo fue identificar lo que se ha producido a nivel nacional en los programas de posgrado stricto sensu de Brasil en cuanto al uso de la emoción en las más diversas áreas del conocimiento y, conocer los temas abordados en las investigaciones en el área de neurociencia y educación sobre este tema, de 2018 a 2022. Se realizó una investigación bibliográfica del estado del conocimiento, con enfoque cualitativo y tipo exploratorio, en la base de datos de la Biblioteca Digital Brasileña de Tesis y disertaciones (BDTD). Con el descriptor emoción, fueron seleccionadas 349 producciones, 126 tesis y 223 disertaciones, que cumplieron con los criterios propuestos y que formaron parte de las discusiones. El área que más produjo fue Ciencias Humanas y en la región sureste en 2019. Se destaca que las categorías más presentes fueron la regulación emocional y el proceso de enseñanza y aprendizaje. A partir de los descriptores emoción y educación, fueron seleccionadas 76 producciones, siete tesis y 69 disertaciones. Los temas más discutidos fueron el proceso de enseñanza y aprendizaje y la regulación emocional. Con los descriptores emoción y neurociencia y educación, se localizaron siete producciones académicas que abordaron esta relación. Las producciones académicas se realizaron preferentemente en universidades públicas, de las regiones sur, sureste y norte y en cursos destinados a la formación académica. El tema más discutido fue sobre las funciones cognitivas. Dados los resultados encontrados, se puede decir que existe poca producción de aportes desde la neurociencia sobre los estudios de la emoción para la educación, contrario a la importancia de esta área del conocimiento.
Palabras Clave: Educación; Emoción; Neurociencia.
Introdução
As emoções veem sendo investigadas no decurso da história, por diferentes campos de conhecimento como saúde, educação, linguística, entre outros. Dentre esses, encontra-se a neurociência, que por ser uma área interdisciplinar que aborda esses diversos âmbitos, tem uma grande contribuição para o entendimento do tema. De acordo com Amaral e Guerra (2020), na perspectiva da neurociência, a emoção é um sinalizador interno que provoca mudanças corporais, que alteram o comportamento humano.
Dentro desse contexto, destacam-se os estudos da neurociência sobre emoção para a educação, uma vez que esta tem grande impacto na vida das pessoas. Machado (2023) realizou uma revisão bibliográfica do estado da arte quanto às publicações acerca da emoção na consolidação da aprendizagem. Esta pesquisa resultou na metanálise de 26 publicações, as quais apontam que as descobertas neurocientíficas e sua aplicação no campo da educação necessitam de maior divulgação para auxiliar nos processos de ensino e aprendizagem.
Destacam-se outras pesquisas bibliográficas voltadas à neurociência e educação. Staudt (2020) realizou uma pesquisa sobre teses e dissertações acerca da neurociência e educação, sem recorte temporal, a partir do banco da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e identificou 10 teses e 28 dissertações. Indicou que, apesar de haver um crescimento das pesquisas acerca desse tema até 2020, ainda há a necessidade de articular melhor as áreas e de “ampliar as discussões envolvendo especialmente as práticas pedagógicas que estejam apoiadas nos resultados apontados pela Neurociência” (Staudt, 2020, p. 6).
Nessa mesma linha, Souza (2020) realizou uma pesquisa com as produções acadêmicas brasileiras na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD) no período de 2015 a 2019, a fim de apresentar as contribuições da neurociência para o processo de ensino e aprendizagem do ensino fundamental e identificou que somente 36,9% das teses e dissertações efetivamente contabilizadas tratavam do tema.
Em outro estudo, Thesing e Costas (2018) verificaram que inexistem produções acadêmicas no período 2010-2016, acerca da relação educação e neurociência nos trabalhos completos dos anais dos Grupos de trabalhos das Reuniões anuais da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd) e na BDTD, somente 13 produções tratavam dos estudos neurocientíficos direcionados à educação.
Costa, Nóbile e Crespi (2021) realizaram uma revisão de artigos publicados entre 2009-2019 na SciELO acerca das contribuições da neuroeducação sobre o processo de aprendizagem. Os autores destacam que “a neuroeducação pode acrescentar o conhecimento sobre a funcionalidade do cérebro a favor de criar várias estratégias educativas que facilitem a aprendizagem do aluno” (Costa; Nóbile; Crespi, 2021, p. 20).
Nesta mesma linha, Amaral e Guerra (2022) realizaram uma revisão em 840 estudos e pesquisas nacionais e internacionais visando identificar as pesquisas de neurociência educacional. As autoras destacaram que a contribuição da neurociência na educação se dá quando o “professor pode colocar essas evidências científicas em ação na sala de aula” (Amaral; Guerra, 2022, p. 11).
Diante do exposto, faz-se relevante investigar sobre como esse tema tem sido pesquisado nos programas de pós-graduação nacionais, posto que são o locus onde quase a maioria das pesquisas são realizadas (Schwartzman, 2022). De acordo com esse autor, o Brasil é o país com maior sistema de pós-graduação e pesquisa na América Latina. Para chegar a este ranking a pesquisa nacional percorreu uma longa história. As primeiras instituições de pesquisa foram no governo imperial, no século XIX. Com a proclamação da República, houve uma maior necessidade por pesquisas, que foram fomentadas com a criação da Universidade de São Paulo, em 1934. Em 1951, foi criado o Conselho de Pesquisa (CNPq), que sofreu alterações em 1971, após a reforma universitária.
A reforma universitária, Lei nº 5540, de 28 de novembro de 1968 (Brasil, 1968) implementou o sistema de cursos de pós-graduação no Brasil, estabelecendo os em stricto e lato sensu. Os cursos stricto sensu oferecidos em mestrados e doutorados podem ser profissionais e acadêmicos. Os mestrados e doutorados acadêmicos são direcionados à pesquisa e ensino e, os profissionais voltados ao mundo do trabalho. Enquanto os cursos latu sensu são as especializações que são direcionadas ao mundo do trabalho e profissional (Schwartzman, 2022). De acordo com CAPES (2023), os cursos de pós-graduação estão distribuídos no país conforme Tabela 1.
Tabela 1 - Distribuição dos cursos de pós-graduação no Brasil
Fonte: Brasil (2023).
Considerando-se a natureza acadêmica e de pesquisa dos cursos de stricto senso, é fundamental conhecer as pesquisas realizadas por esses centros de pesquisa. Diante disso, levanta-se a seguinte questão: o que tem sido investigado nas produções acadêmicas nacionais sobre a emoção, educação e neurociência nos programas de pós-graduação stricto sensu brasileiros no período de 2018 a 2022?
Para responder essa questão, foi realizada uma pesquisa com o objetivo de identificar o que tem sido produzido nacionalmente em programas de pós-graduação stricto sensu brasileiras em termos do emprego da emoção nas mais diversas áreas do conhecimento e, conhecer os assuntos tratados nas pesquisas da área da neurociência e educação acerca desse tema, no período de 2018 a 2022.
Emoção, neurociência e educação: relação intrínseca Cérebro e aprendizagem
A neurociência, área de conhecimento que tem como objeto de estudo, o cérebro, se constituiu na década de 1960. Entretanto, ganhou maior destaque a partir da Década de 1990, denominada como a Década do Cérebro (Amaral; Guerra, 2020).
Essa área envolve diferentes campos disciplinares como medicina, psicologia, computação, linguística entre outras e diversas vertentes: molecular, celular, sistêmica, comportamental e cognitiva (Grossi; Lopes; Couto, 2014). Nesta presente pesquisa o foco é na neurociência cognitiva que passou a ser mais investigada a partir dos anos 2000 e estuda “as capacidades mentais mais complexas como aprendizagem, linguagem, memória, planejamento” (Grossi; Lopes; Couto, 2014, p. 29).
Apesar de a neurociência não focar seus estudos na aplicação para a educação, ela traz subsídios ao traduzir como o cérebro funciona e as relações entre “a atividade cerebral, comportamento e aprendizagem” (Carvalho et al., 2019, p. 6). Amaral e Guerra (2020, p. 35) trazem algumas questões que aproximam a neurociência da educação, tais como: “o que é aprender na perspectiva cerebral? o que acontece no cérebro quando aprendemos?”. As autoras explicam a forte interface entre essas duas áreas do conhecimento devido ao fato de que a aprendizagem envolve várias funções mentais:
ocorre a partir da reorganização de sinapses, de circuitos e de redes de neurônios, interconectados e distribuídos por todo o cérebro, o que envolve e também promove o desenvolvimento de funções mentais, tais como atenção, emoção, motivação, memória, linguagem e raciocínio lógico-matemático (Amaral; Guerra, 2020, p. 36, grifos das autoras).
Assim sendo, o cérebro não está pronto ao nascer, uma vez que “o bebê humano nasce bastante imaturo, pois a maior parte das conexões em seu cérebro será feita com a ajuda das interações com o meio ambiente” (Cosenza; Guerra, 2011, p. 39). Portanto, à medida que os neurônios são ativados, principalmente pela aprendizagem, as sinapses fortalecidas nas redes neurais e, consequentemente, do cérebro, vão se formando. Essa capacidade de se adaptar ou remodelar ao longo da vida, denomina-se neuroplasticidade, a qual pode ser de dois tipos.
O primeiro tipo é a neuroplasticidade estrutural, que é a capacidade do cérebro de criar novas conexões entre os neurônios e, assim, mudar sua estrutura física. O segundo tipo é a neuroplasticidade funcional, que é a capacidade que o cérebro tem de se modificar para transferir a função de uma determinada área para outra, devido a um dano cerebral (Garlit, 2022). Isso mostra que neuroplasticidade é a base da aprendizagem, sendo o processo de aprendizagem dialético, ou seja, ao mesmo tempo que altera o cérebro, este processo é alterado pelas mudanças cerebrais (Costa, 2023). Assim, pode-se dizer que o ato de aprender resulta de conexões neurais (Silva, 2022). Aliando a esta visão, Grossi, Lopes e Couto (2014, p. 30) afirmam que “aprender tem relação com bases químicas e físicas na função neural, através das sinapses”.
Entretanto, esse processo precisa ser criado por um ensino deliberado por meio de estratégias pedagógicas que “são estímulos que levam à reorganização de conexões cerebrais, produção de conhecimento, habilidades e atitudes” (Amaral; Guerra; 2020, p. 98). Logo, quanto mais variadas as estratégias pedagógicas, mais conexões neurais são engendradas, tornando o cérebro mais complexo.
Uma das abordagens para se estudar o cérebro é a neurociência cognitiva, a qual investiga os mecanismos cerebrais envolvidos na aprendizagem e apresenta evidências científicas para o campo da educação, auxiliando na elaboração de estratégias pedagógica, ou seja, se os professores adotarem procedimentos pedagógicos inovadores e efetives, baseados nos estudos da neurociência, podem mobilizar o processo de aprendizagem (Amaral; Guerra, 2022). Costa (2023, p. 8) reforça essa afirmativa quando propõe que “as ações pedagógicas em sala podem ficar mais eficazes quando este professor conhece o funcionamento cerebral”.
Em síntese, os estudos sobre a aprendizagem é um dos pontos que une os conhecimentos da neurociência e educação. A neurociência indica algumas direções para que o professor possa fundamentar suas estratégias pedagógicas levando em conta o funcionamento cerebral. Deste modo, a parceria da neurociência e educação é relevante. Um professor que conhece como o cérebro aprende, poderá fazer melhores escolhas de estratégias pedagógicas.
Emoção na aprendizagem sob a perspectiva da neurociência
As emoções têm um papel importante na vida das pessoas. Como apresentam componente biológico mais perceptível, pois são acompanhadas de reações orgânicas agudas, passou a ser objeto de estudo da neurociência (Carvalho et al., 2019). Damásio (2012, p. 273) enfatiza que a emoção se caracteriza por [...] “um conjunto de mudanças que ocorrem, quer no corpo, quer no cérebro e, que normalmente é originado por um determinado conteúdo mental”. Para o autor, as emoções podem ser primárias, secundárias e de fundo.
As emoções primárias são universais, tais como raiva, nojo, tristeza, surpresa, felicidade/alegria; as secundárias são as aprendidas socialmente e influenciadas pela cultura na qual estamos inseridos, tais como vergonha, ciúme, compaixão, entre outras; e, por fim, as emoções de fundo, que serão os sentimentos do próprio existir, a como nos sentimos e que são mais persistentes ao longo da vida (Damásio, 2012).
Essas emoções primárias, secundárias e de fundo podem ser vivenciadas em valências, tanto positivas, quanto negativas. As positivas são aquelas que despertam sensações prazerosas nas pessoas; enquanto emoções vivenciadas como negativas são aquelas que causam angústia, paralisia nas ações das pessoas (Carvalho et al., 2019).
Todos esses tipos e valências estão presentes em todas às dimensões da vida. Em relação à aprendizagem, os estudos da neurociência mostram que o cérebro precisa se emocionar para aprender. Segundo Carvalho et al. (2019, p. 1) “descobertas da neurociência em relação às emoções humanas podem colaborar com o processo de aprendizagem”. A emoção é responsável por orientar o processo de aprendizagem, sendo o “carro-chefe da aprendizagem” (Amaral; Guerra; 2020, p. 73), isso porque a “emoção e cognição partilham o mesmo plano, de base afetiva, ou seja, são imanentes” (Rocha; Kastrup, 2009, p. 386).
Neste sentido, Espiridião-Antônio et al. (2005) complementam que “o sistema de emoções está organizado em redes e, quanto mais evoluída, mais as funções cognitivas são afetadas”. Isso é reforçado por Fonseca (2016) que chama a atenção para o fato de que a emoção “abre caminho para a cognição”. Ainda nessa linha, Fonseca (2016) sinaliza que “a emoção dirige, conduz e guia a cognição” (Fonseca, 2016, p. 370). Dessa forma, emoção e cognição são duas dimensões dialeticamente conectadas.
Nesse cenário, os estudos da neurociência têm grande contribuição, pois o conhecimento do cérebro, especialmente quanto à emoção, quando aliados aos conhecimentos da Educação, podem auxiliar no processo de aprendizagem. Logo, pode-se dizer que compreender o papel das emoções no funcionamento cerebral é necessário para que o professor possa possibilitar um ensino que promova alterações sinápticas que levem à aprendizagem (Carvalho et al., 2019).
Percurso metodológico
Neste artigo foi realizada uma pesquisa bibliográfica do estado do conhecimento, com abordagem qualitativa, do tipo exploratória no BDTD, a fim de mapear quais as teses e dissertações produzidas sobre emoção, neurociência e educação. A pesquisa foi realizada nos meses de maio e junho de 2023. Justifica-se a escolha por esse tipo de pesquisa porque no estado de conhecimento, os “trabalhos não se restringem a identificar a produção, mas analisá-la, categorizá-la e revelar os múltiplos enfoques e perspectivas” (Romanowski; Ens, 2006, p. 39). A pesquisa foi realizada em três etapas:
1ª etapa: seleção de teses e dissertações publicados sobre a temática guiou-se pelos seguintes passos:
1º) Busca das publicações no banco de dados da BDTD, entre 2018 a 2022, utilizando os seguintes descritores: emoção; emoção and neurociência; emoção and educação e, emoção and neurociência and emoção.
2º) Exclusão das teses e dissertações que apareceram repetidos na busca, que não estavam na língua portuguesa e que não se relacionavam com a temática da presente pesquisa.
2ª etapa: leitura preliminar dos resumos das produções acadêmicas selecionadas na 1ª etapa para identificar as áreas de conhecimento e assuntos nos quais o tema emoção fosse tratado.
3ª etapa: separação dentre as produções acadêmicas selecionadas nas etapas anteriores, as que relacionavam emoção, neurociência e educação.
Apresentação dos dados e análises
As produções acadêmicas selecionadas sobre emoção: o que elas revelaram
A busca por teses e dissertações publicados sobre a temática emoção resultou em 489 pesquisas. Assim, foram lidos todos os títulos, palavras-chave e resumos de todas. Esta leitura permitiu identificar quais pesquisas tinham a emoção como foco, o que resultou em 349 produções acadêmicas (Tabela 2).
Tabela 2 - Quantitativos de produções acadêmicas acerca da emoção entre os anos 2018-2022
Tipo/Ano |
2018 |
2019 |
2020 |
2021 |
2022 |
Total |
Excluídos |
Total |
Teses |
21 |
31 |
25 |
21 |
28 |
159 |
33 |
126 |
Dissertações |
52 |
62 |
40 |
38 |
31 |
330 |
107 |
223 |
Total |
73 |
93 |
65 |
59 |
59 |
489 |
140 |
349 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Pode-se observar pelos dados apresentados na Tabela 2 que houve produção significativa do tema pelos programas de pós-graduação brasileiros. Quanto às teses, houve uma frequência nas produções acadêmicas ao longo dos anos, sobressaindo os anos de 2019 e 2022 como o que mais tiveram estudos sobre a temática. Quanto às dissertações, verifica-se que houve um decréscimo nas pesquisas a partir de 2020. O ano de 2019 foi o que mais teve produção, tanto de teses, quanto de dissertações. Esses dados corroboram os da própria plataforma BDTD (2023), que indicam que no ano 2019 teve uma produção significativa, com queda a partir de 2020.
Aventa-se a hipótese dessa menor produção ser decorrente do período pandêmico da covid-19, conforme indicado em uma pesquisa que sinaliza um recuo no número de mestres e doutores no período de 2020 (Marques, 2023). Outro dado corroborado pela Plataforma BDTD (2023) é o maior número de dissertações em relação às teses, o que se confirma pelo maior número de cursos de mestrado stricto sensu nacionais (CAPES, 2023).
A Tabela 3 apresenta o tipo de produção por áreas de conhecimento, que tenham produção acerca da emoção. As áreas de conhecimento são as definidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Tabela 3 - Distribuição das produções acadêmicas por áreas do conhecimento do CNPq (2018 a 2022)
Áreas do conhecimento |
Teses |
Dissertações |
Total |
Linguística, Letras e Artes |
16 |
34 |
50 |
Ciências Sociais Aplicadas |
26 |
36 |
62 |
Ciências Humanas |
45 |
92 |
137 |
Ciências da Saúde |
12 |
32 |
44 |
Ciências Exatas e da Terra |
6 |
5 |
11 |
Ciências Biológicas |
6 |
11 |
17 |
Ciências Agrárias |
1 |
0 |
1 |
Engenharias |
5 |
1 |
6 |
Multidisciplinar |
9 |
12 |
21 |
Total |
127 |
223 |
349 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Analisando os dados apresentados na Tabela 3, percebe-se que houve produção em todos os anos e em todas as áreas de conhecimento, sendo que a que mais se sobressai é a área de Ciências Humanas com maior número de teses e dissertações; enquanto a área de Ciências Agrárias foi a que teve produção inexpressiva, o que em parte é esperado, considerando que esta área foca em estudos mais direcionados à natureza.
Quanto às regiões onde estão os programas que produziram as teses e dissertações, identifica-se que a região Sudeste é a que mais sobressaiu. Chama-se a atenção para região norte com baixa produção, sendo que somente uma tese e nenhuma dissertação sobre emoção foi produzida no período investigado (Tabela 4).
Tabela 4 - Distribuição de produções acadêmicas por região
Região/Tipo de produção |
Teses |
Dissertações |
Total |
Sul |
24 |
50 |
74 |
Sudeste |
64 |
116 |
180 |
Nordeste |
23 |
43 |
66 |
Norte |
4 |
0 |
4 |
Centro-Oeste |
11 |
14 |
25 |
Total |
126 |
223 |
349 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Ao observar os dados apresentados na Tabela 4, nota-se a diferença entre as produções acadêmicas de dissertações de mestrado e teses de doutorado, em termos de quantidades, entre as regiões brasileiras. Esses dados corroboram com os índices apresentados pela CAPES (2023), a qual apontou que, no ano de 2021, a maioria dos cursos de pós-graduação estava concentrado na região sudeste e sul, ou seja, há uma contração regional.
A região norte apresenta o menor percentual de cursos de pós-graduação, o que é confirmado com a parca publicação. Esse resultado pode estar relacionado ao fato de que talvez o tema da presente pesquisa não seja de interesse dos pesquisadores desta região. Esses dados ratificam as pesquisas de Thesing e Costas (2018) e Staudt (2020), as quais apontam a concentração de cursos de pós-graduação em IES públicas e da região sul e sudeste, conforme também identificado nesta investigação.
Assuntos tratados nas produções acadêmicas selecionadas: o que os dados evidenciaram
Após uma leitura de todos os resumos e palavras-chave das teses e dissertações foi possível mapear como a emoção foi tratada nas 349 pesquisas, ou seja, foi possível identificar os assuntos tratados nessas pesquisas. Esses assuntos, extraídos dos textos durante as leituras, foram organizados em categorias (Tabela 5), com um total de 29 categorias agrupadas em assuntos correlatos. Vale ressaltar que não houve uma separação por áreas do conhecimento.
Tabela 5 - Categorias elencadas a partir das produções acadêmicas sobre emoção
Categorias |
Quantidades |
|
C1 |
Afetividade |
12 |
C2 |
Ansiedade |
7 |
C3 |
Arte |
5 |
C4 |
Competência socioemocional |
4 |
C5 |
Consumo |
7 |
C6 |
Deficiência |
10 |
C7 |
Design |
17 |
C8 |
Direito |
6 |
C9 |
Empreendedorismo |
10 |
C10 |
Esporte |
9 |
C11 |
Ética |
8 |
C12 |
Experiência religiosa |
4 |
C13 |
Expressões faciais |
22 |
C14 |
Formação docente |
14 |
C15 |
Funções cognitivas |
15 |
C16 |
Gênero |
4 |
C17 |
Literatura |
17 |
C18 |
Marketing |
8 |
C19 |
Mídia |
17 |
C20 |
Música |
11 |
C21 |
Política |
8 |
C22 |
Processo de ensino e aprendizagem |
32 |
C23 |
Profissional de saúde |
10 |
C24 |
Regulação emocional |
44 |
C25 |
Urbanismo |
5 |
C26 |
Violência |
6 |
C27 |
Transtorno do Espectro Autista |
5 |
C28 |
Tecnologias digitais |
20 |
C29 |
Transtorno mental |
12 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
A partir dos dados apresentados na Tabela 5 pode-se observar uma variedade de assuntos tratados nas produções acadêmicas selecionadas. Os assuntos mais abordados nas produções acadêmicas são a Regulação emocional (categoria - C24) e Processo de ensino e aprendizagem (categoria - C22). As produções acadêmicas sobre Regulação emocional apontam para estratégias de enfrentamento (coping), reconhecimento emocional, apoio/afeto social, bem-estar subjetivo, autorregulação, autocontrole e empatia. Cosenza e Guerra (2011) indicam que o mecanismo regulação cognitiva e socioemocional é uma função executiva e implica o “estabelecimento de metas, elaboração de uma estratégia comportamental, o monitoramento das estratégias adequadas e o respeito às normas sociais” (Cosenza; Guerra, 2011, p. 95). Os autores complementam que esses mecanismos sofrem um processo de maturação progressiva da infância à adolescência, sendo necessário que sejam ensinados. Segundo Fonseca (2016):
sem dispor de funções de autorregulação emocional, a história da Humanidade seria um caos, e a aprendizagem um drama indescritível, as emoções tomariam conta das funções cognitivas e os seres humanos só saberiam agir de forma impulsiva, excitável, eufórica, episódica e desplanificada. Eis a razão porque o cérebro humano integra inúmeros e complexos processos neuronais de produção e de regulação das respostas emocionais (Fonseca, 2016, p. 35).
Fonseca (2016) ainda sinaliza que a aprendizagem com sucesso implica três componentes em interação sistêmica: a regulação emocional, o conhecimento consciente e as estratégias cognitivas. Quanto à regulação emocional, o aluno necessita gerenciar suas emoções tanto positivas, quanto negativas, pois essas influenciam as funções motivacionais, cognitivas e executivas. Concomitantemente, é preciso identificar o conhecimento que está aprendendo, considerando-o como algo que faça sentido para si, bem como, desenvolver estratégias cognitivas de regulação da sua aprendizagem, como analisar em que medida está aprendendo ou não, utilizando-se da metacognição, que é a capacidade de pensar sobre sua cognição e, com isso, aprender a aprender.
A categoria C22 foi a que mais se destacou em termos de ocorrência. A partir desse resultado, infere-se que os estudos da neurociência indicam a importância do ensino deliberado por meio de estratégias pedagógicas, pois levam “à reorganização de conexões cerebrais, produção do conhecimento, habilidades e atitudes” (Amaral; Guerra, 2020, p. 98). Ainda nessa lógica, os autores sinalizam que cabe aos professores direcionar o processo de aprendizagem, ou seja, se os professores adotarem estratégias pedagógicas inovadoras e efetivas, baseadas nos estudos da neurociência, podem mobilizar o processo de aprendizagem. Costa et al. (2023, p. 8) reforçam essa afirmativa quando propõem que “as ações pedagógicas em sala podem ficar mais eficazes quando este [professor] conhece o funcionamento cerebral”.
Os temas menos abordados são competência socioemocional (categoria - C4), Experiência religiosa (categoria - C12) e Gênero (categoria - C16) com quatro produções acadêmicas cada. Chama a atenção os parcos estudos sobre competência socioemocional, entendendo que essa é uma das competências mais abordadas atualmente, especialmente, na educação, sendo prevista para todos os currículos no Brasil conforme a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017).
De acordo com Marin et al. (2017, p. 99) a “competência socioemocional é um construto complexo, que compreende outros conceitos, como o de habilidades, estando relacionado aos conceitos de inteligência emocional e desenvolvimento socioemocional”. Por isso, esperava-se mais produções acadêmicas relativas a esse tema.
As produções acadêmicas selecionadas sobre emoção e educação: o que se descobriu
Com os termos: emoção and educação foram selecionadas 76 produções acadêmicas, sendo sete teses e 69 dissertações. Na Tabela 6, pode-se observar que houve mais produções acadêmicas acerca da relação entre emoção e educação no ano de 2019 e em cursos pós-graduação em nível de mestrado, quando comparadas às teses. Constata-se essa disparidade de produções acadêmicas entre as dissertações e teses desenvolvidas nos programas strictu sensu nacionais acerca do tema, foi anteriormente identificada na Tabela 1.
Tabela 6 - Distribuição de Teses e dissertações acerca Emoção e Educação selecionadas no período 2018-2022
Ano/Tipo |
Teses |
Dissertações |
2018 |
0 |
14 |
2019 |
1 |
17 |
2020 |
3 |
14 |
2021 |
1 |
14 |
2022 |
2 |
10 |
Total |
7 |
69 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Problematiza-se os dados da Tabela 6, pois parece não haver continuidade e aprofundamento das pesquisas acerca do tema emoção no âmbito educacional, uma vez que que esses seriam realizados em cursos de doutorado e os dados indicam que não está havendo essa transição. Os doutorados, especialmente, os acadêmicos são orientados para a pesquisa (Schwartzman, 2022), portanto, seriam o locus para aprofundamento do tema.
Durante a leitura das 76 pesquisas foi possível extrair dos textos os principais assuntos tratados por elas. Esses assuntos foram organizados nas mesmas 29 categorias da Tabela 5, embora algumas delas não tiveram nenhuma ocorrência. Vale ressaltar que não houve uma separação por áreas do conhecimento.
Tabela 7 - Categorias elencadas a partir das produções acadêmicas sobre emoção and educação
Categorias |
Quantidades |
|
C1 |
Afetividade |
7 |
C2 |
Ansiedade |
0 |
C3 |
Arte |
2 |
C4 |
Competência socioemocional |
1 |
C5 |
Consumo |
2 |
C6 |
Deficiência |
2 |
C7 |
Design |
0 |
C8 |
Direito |
0 |
C9 |
Empreendedorismo |
0 |
C10 |
Esporte |
5 |
C11 |
Ética |
1 |
C12 |
Experiência religiosa |
0 |
C13 |
Expressões faciais |
0 |
C14 |
Formação docente |
2 |
C15 |
Funções cognitivas |
7 |
C16 |
Gênero |
1 |
C17 |
Literatura |
2 |
C18 |
Marketing |
4 |
C19 |
Mídia |
5 |
C20 |
Música |
3 |
C21 |
Política |
2 |
C22 |
Processo de ensino e aprendizagem |
13 |
C23 |
Profissional de saúde |
2 |
C24 |
Regulação emocional |
8 |
C25 |
Urbanismo |
0 |
C26 |
Violência |
1 |
C27 |
Transtorno do Espectro Autista |
1 |
C28 |
Tecnologias digitais |
5 |
C29 |
Transtorno mental |
0 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Os dados apresentados na Tabela 7 apontam que os assuntos mais abordados nas teses e dissertações foram Processo de ensino e aprendizagem (categoria - C22) com 13 respostas, seguido por Regulação emocional (categoria - C24) com oito produções acadêmicas. Essas categorias foram as mesmas elencadas com descritor emoção, entretanto, inverte a ordem na quantidade de teses e dissertações que tratam do assunto.
As produções acadêmicas selecionadas sobre emoção, neurociência e educação: o que se descobriu
Com os termos emoção and neurociência and educação foram selecionadas sete produções acadêmicas sendo três teses e quatro dissertações. A fim de caracterizar quais são essas produções acadêmicas, foram inventariados ano, tipo, programa e Instituição de Ensino Superior (IES) que ofertaram (Quadro 1).
Quadro 1 - Tipo de produção e programa de pós-graduação e Instituição de Ensino Superior
Ano |
Tipo |
Programa |
IES |
2018 |
Dissertação |
Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática |
Universidade Federal de Sergipe |
2019 |
Dissertação |
Programa de Pós-graduação em Psicobiologia |
Universidade Estadual de São Paulo |
Pós-graduação em Neurociências |
Universidade Federal de Minas Gerais |
||
2020 |
Dissertação |
Programa de Mestrado e Doutorado Profissional em Educação e Novas Tecnologias |
Centro Universitário Internacional UNINTER |
Tese |
Programa de Pós-Graduação em Educação |
Universidade Federal de Santa Maria |
|
2021 |
Tese |
Programa de Pós-graduação em Educação Brasileira |
Universidade Federal do Ceará |
2022 |
Tese |
Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e na Adolescência |
Universidade Federal de São Paulo |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Pode-se observar no Quadro 1 que são variados Programas de pós-graduação que investigam acerca da relação entre emoção, neurociência e educação e que se concentram em universidades públicas, da região sul, sudeste e nordeste e são voltados à formação acadêmica, sendo somente um direcionado ao programa de formação profissional. Dados que ratificam estudos (Thesing; Costa, 2018; Staudt, 2020).
Quanto aos programas focarem na formação acadêmica e serem públicas, é corroborado por Scwartzman (2022) ao afirmar que a maioria dos programas acadêmicos são públicos. Evidencia que essas publicações acerca da relação entre emoção, neurociência e educação apresenta mais homogeneidade entre as regiões sul, sudeste e nordeste. Sobre isso, Sidone, Haddad e Mena-Chalco (2016, p. 15), indicam que houve uma “expansão das redes de colaboração e ao aumento da participação de autores das regiões cientificamente menos tradicionais, tais como, Sul e Nordeste”.
Porém, há o completo silenciamento nas produções acadêmicas da região centro-oeste e norte, o que parece confirmar que a pouca oferta de cursos stricto sensu nessas regiões: 397 e 283, respectivamente (CAPES, 2023). Corrobora Thesing e Costas (2018) que identificou que as teses e dissertações acerca da neurociência na educação produzidas estão localizadas em cursos de pós-graduação no sul e sudeste brasileiro.
A Tabela 8 apresenta os assuntos mais abordados na relação entre emoção, neurociência e educação.
Tabela 8 - Categorias elencadas a partir das produções acadêmicas sobre emoção and neurociência and educação
Categorias |
Quantidades |
|
C4 |
Competência socioemocional |
1 |
C15 |
Funções cognitivas |
3 |
C20 |
Música |
1 |
C22 |
Processo de ensino e aprendizagem |
1 |
C24 |
Regulação emocional |
1 |
C28 |
Tecnologias digitais |
1 |
Fonte: Dados da pesquisa (2023).
Analisando a Tabela 8, observa-se que as investigações acerca das Funções cognitivas (categoria - C22) com três produções acadêmicas. Esses dados corroboram o que Staudt (2006) identificou, que as pesquisas acerca das funções cognitivas, “memória, motivação, atenção, emoção, plasticidade cerebral e funções executivas vinculada à neurociência e educação têm crescido nos últimos três anos, embora ainda se perceba a necessidade de melhorar a articulação entre ambas as áreas” (Staudt, 2020, p. 6).
As outras pesquisas investigaram a Competência socioemocional (categoria - C4), Música (categoria - C22), Processo ensino e aprendizagem (categoria - C24), Regulação emocional (categoria - C26) e tecnologias digitais (categoria - C29) com um estudo cada. É importante ressaltar que se esperava mais publicações de neurociência em virtude de que essa é um campo interdisciplinar e tem uma extensa rede e que aborda diferentes áreas: saúde, educação, linguística, marketing, ciência da computação (Amaral; Guerra, 2020).
Análise final: lacunas observadas
Ao final desta pesquisa foram identificadas três lacunas no que se trata de pesquisas sobre emoções. São elas:
A primeira é a concentração de produções na região sudeste e parca produção na região norte acerca do tema emoção. Fato que se repete nas pesquisas entre emoção, educação e neurociência. Isso corrobora os dados da concentração de cursos de pós-graduação stricto sensu na região sudeste (CAPES, 2023). Nessa mesma linha, Marques (2023) apresenta dados que a região norte foi a que teve maior retração entre doutores entre 2019-2020, com queda de 23%. Diante deste contexto, considera-se que uma maior homogeneidade de oferta e conectividade dos cursos de pós-graduação stricto sensu entre as regiões auxiliaria a produção e divulgação científica da temática em todo o território nacional. Bem como, a necessidade de políticas voltadas ao incentivo de novos cursos e ampliar o número de pesquisadores na região norte.
A segunda lacuna é a queda de produções acadêmica, em geral, a partir de 2020 e sem recuperação expressiva até 2022. Entende-se que esse fato possa ter sido agravado pela pandemia da covid-19, que “interrompeu o círculo virtuoso de crescimento” (Marques, 2023, p. 29) da ciência nacional. Entretanto, pondera-se que um maior investimento financeiro, tanto do setor público, quanto privado, poderiam fomentar mais pesquisas, levando em conta a importância desse tema.
A terceira lacuna refere-se às poucas pesquisas que tratam da competência socioemocional, considerando sua importância nos contextos: escolar, profissional, social e familiar. Destaca-se nesta investigação a competência socioemocional no campo da educação. Sabe-se que esta está prevista para ser desenvolvida nos currículos escolares (Brasil, 2017) e que mais estudos poderiam contribuir para sua implementação em contextos educacionais.
Quanto às pesquisas sobre emoção e educação, identifica-se uma lacuna que é a discrepância observada entre as produções de mestrado e doutorado. Parece não haver continuidade de pesquisas que se iniciam nos programas de mestrado com seu aprofundamento no doutorado. Pois, de acordo com Schwartzman (2022), são nos programas de doutorado em que há uma investigação mais detalhada das pesquisas. Bem como, reafirma os dados que há maior oferta de programas de mestrado em relação aos de doutorado (CAPES, 2023).
Thesing e Costas (2018, p. 30) problematizam essa situação: “por que não há crescimento no âmbito das pós-graduações em educação, de pesquisas sobre neurociências e suas contribuições para a educação?” As autoras levantam a hipótese de que isso seja decorrente da falta de diálogo entre pesquisadores e professores e a pouca troca entre os grupos de pesquisa nacional e internacional, o que poderia alavancar esses estudos na pós-graduação.
Neste cenário, argumenta-se que se incentive a produção acadêmica nos programas de mestrado, a fim de possibilitar que esses se qualifiquem para serem ofertados em nível de doutorado, garantindo assim, uma continuidade e aprofundamento das investigações iniciadas em programas de mestrado. Com isso, incentivar o círculo virtuoso de retroalimentação das pesquisas desenvolvidas entre os cursos de mestrado e doutorado.
Quanto às pesquisas sobre emoção, neurociência e educação identificam-se duas lacunas. A primeira lacuna refere-se à ausência de pesquisas sobre a temática em cursos de pós-graduação stricto sensu acadêmicos privados. Esse dado corrobora o que Scwartzman (2022) sinaliza ao afirmar que a maioria dos programas acadêmicos são públicos. Infere-se que no setor privado essas pesquisas não estejam sendo foco dos pesquisadores, que orientam os trabalhos. Fato que pode fragilizar as investigações que relacionem esses três eixos intercambiantes.
A segunda lacuna é a pouca produção de pesquisas, somente sete, relacionando emoção, neurociência e educação, dado que instiga ser melhor aprofundado considerando que os estudos da neurociência acerca da emoção têm grande contribuição para educação (Amaral; Guerra, 2020). Sabe-se que a neurociência pode contribuir com evidências científicas para o campo da educação, auxiliando aos professores na elaboração de estratégias pedagógicas a fim de promover a aprendizagem (Costa et al., 2023). Thesing e Costas (2018, p.31) ratificam essa perspectiva ao apontar “que as contribuições das Neurociências para a área educacional são de grande valia para pensar novas e signficativas estratégias de ensino, que sejam promotoras efetivas de aprendizagem”. Entretanto, há a necessidade de um esforço dos neurocientistas em traduzir seus achados para o campo educacional, a fim de que haja um diálogo entre pesquisadores e educadores.
Enfim, o que se verificou nessa investigação, é que, apesar de as pesquisas sobre emoção nas áreas da neurociência e educação ser um tema relevante, ainda necessita ser melhor investigada e propagada nas pesquisas dos programas de pós-graduação stricto sensu nacional. Da mesma forma, há a necessidade de promover continuidade de oferta de mestrado e doutorado nos programas, melhorar a conectividade entre os programas nacionais e mitigar a concentração de sua oferta nas regiões brasileiras.
Considerações finais
O presente artigo visou responder a seguinte questão: o que tem sido investigado nas produções acadêmicas nacionais sobre a emoção, educação e neurociência nos programas de pós-graduação stricto sensu brasileiros no período de 2018 a 2022?
Para tanto, foram selecionadas 349 produções acadêmicas - teses e dissertações - com descritor emoção. A análise dessas teses e dissertações a partir dos recortes e limitando-se às produções acadêmicas selecionadas, permitiu identificar que a área que mais produziu foi as ciências humanas, o que é esperado, uma vez que é o tema afim dessa área. Entretanto, concorda-se com Thesing e Costas (2018, p.10) que sugerem que “programas de pós-graduação, de diferentes áreas, poderiam assumir interesse investigativo nas pesquisas sobre neurociências e educação”
A maioria em cursos stricto sensu que apresentaram produções acadêmicas sobre emoção estão na região sudeste, o que corrobora com dados da CAPES (2023) de concentração desses cursos nesta região. Thesing e Costas (2018) e Staudt (2020) constataram essa concentração nas produções acerca da neurociência e educação.
As categorias mais presentes foram referentes à regulação emocional, seguida de processo de ensino e aprendizagem. Salienta-se que ambas categorias tratam de assuntos pertinentes à neurociência que expõe evidências científicas para a importância da regulação emocional, bem como, para o processo de ensino e aprendizagem ser mais eficaz. Concorda-se com Machado (2023) a qual apontou acerca da importância dessa temática na educação.
Quanto aos descritores emoção and educação foram selecionadas 76 produções acadêmicas, sendo sete teses e 69 dissertações, o que representa uma disparidade de produções entre mestrado e doutorado acerca do tema. Os assuntos mais abordados nessas produções selecionadas foram processo de ensino-aprendizagem e regulação emocional.
Com os descritores emoção and neurociência and educação identificou-se somente sete produções acadêmicas. Observa-se que há pouca produção acadêmica acerca das contribuições da neurociência para a educação, especialmente, sobre o papel da emoção no funcionamento do cérebro.
Vale sublinhar que as produções acadêmicas foram realizadas, preferencialmente, em universidades públicas, da região sul, sudeste e norte e em cursos voltados à formação acadêmica. Esses achados corroboram com os dados da CAPES (Brasil,2023) de concentração desses cursos nestas regiões, bem como na modalidade formação acadêmica (Schwartzman, 2022). Thesing e Costas (2018) e Staudt (2020) constaram o mesmo em suas pesquisas.
Salienta - se que esta pesquisa não almeja esgotar a investigação do tema, mas visa incentivar novas pesquisas do tipo do estado do conhecimento sobre o tema. Deseja-se que essa investigação traga à cena quais as produções acadêmicas sobre o tema estão sendo realizadas em cursos stricto sensu no Brasil. E, sugere-se novas investigações sobre quais programas e quem são os pesquisadores que estão investigando a relação entre emoção, neurociência e educação. Considera-se que isso ampliaria o conhecimento sobre o tema, já que se entende pesquisas do estado do conhecimento, como um campo em constante construção.
Espera-se que mais estudos sejam feitos, para trazer maiores contribuições sobre as lacunas da temática investigada, conforme proposto por Romanowski e Ens (2006) acerca das pesquisas do estado do conhecimento: “apontar as restrições sobre o campo em que se move a pesquisa, as suas lacunas de disseminação, identificar experiências inovadoras investigadas que apontem alternativas de solução para os problemas da prática” (Romanowski; Ens, 2006, p. 39).
Por fim, pondera-se que esse estudo contribua para que os professores dos cursos de formação inicial e continuada possam utilizá-lo como referência bibliográfica nos seus componentes curriculares, auxiliando na divulgação desses conhecimentos para os professores. Com isso, os estudos acerca da emoção, desenvolvidos pelas universidades se aproximem da prática docente.
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