Tecnopol�tica e educa��o: roubo, vigil�ncia e modula��o

Technopolitcs and education: theft, surveillance and modulation

 

Renata Lima Aspis

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil

renatalimaaspis@gmail.com - https://orcid.org/0000-0001-6330-8027

 

Recebido em 11 de setembro de 2022

Aprovado em 13 de setembro de 2022

Publicado em 03 de novembro de 2022

 

RESUMO

Este artigo tem como objetivo geral trazer algumas quest�es e conceitos, que n�o s�o especificamente do campo da educa��o, para problematizar a presente ades�o das universidades p�blicas brasileiras �s plataformas digitais pertencentes �s grandes corpora��es norte americanas. O artigo percorre o caminho da an�lise e da cr�tica ao funcionamento dos mecanismos de roubo de dados, vigil�ncia e manipula��o das subjetividades dos usu�rios das tecnologias digitais de comunica��o e informa��o em redes cibern�ticas, explicitando-os e assim conduzindo �s urgentes quest�es referentes � possibilidade de pensamento aut�nomo hoje. O pensamento � entendido n�o apenas como a��es de an�lise e cr�tica, mas tamb�m, seguindo Deleuze, concebendo-o como cria��o. A conclus�o � a da premente necessidade de que primeiramente se reconhe�a o problema de captura da vida, operada pelas grandes corpora��es de tecnologia digital do norte global. E em consequ�ncia disso, que se sinta a exig�ncia de movimento de cria��o de formas de resist�ncia � investida de destitui��o da soberania das universidades p�blicas brasileiras sobre a cria��o de conhecimento ali realizada, por meio do roubo e controle dos seus dados.

 

Palavras-chave: Tecnopol�tica; Colonialismo de dados; Governamentalidade algor�tmica.

 

ABSTRACT

The main goal of this article is to comment on a number of questions and concepts that are not specifically from the education field to problematize the current adherence of Brazilian public universities to digital platforms developed and owned by north-american corporations. The article analyzes and criticizes the inner workings of the mechanisms of data theft, surveillance and manipulation of user�s subjectivities, explaining them to then discuss the urgent matters of critical thinking in today�s world. Thought is understood not only as actions of analysis and criticism but also, according to Deleuze, as creation. The conclusion is that there is a pressing need to acknowledge the problem of the capture of life operated by big tech corporations of the global north and because of that understand the necessity of the creation of a movement of resistance to the attempt of destitution of the sovereignty of brazilian public universities over their knowledge and knowledge creation process through data theft and control.

 

Keywords: Technopolitics; Data colonialism; Algorithmic governance.

 

Como voc� desperta da Matrix

se voc� nem sabe que est� nela? (Tristan Harris)

 

O termo tecnopol�tica pode ser entendido de forma bastante ampla, como os efeitos pol�ticos das tecnologias que permeiam as rela��es sociais, ou seja, refere-se aos arranjos tecnol�gicos e sociot�cnicos que organizam cada vez mais a nossa vida e influenciam o modo como vivemos. Esses dizem respeito n�o s� �s tecnologias de comunica��o, mas a outras, de organiza��o das cidades, como distribui��o de �gua, por exemplo, entre tantas outras da arquitetura da sociedade (PARRA, 2020). Neste artigo, por�m, vamos nos ater aos mecanismos das tecnologias digitais de informa��o e comunica��o em redes cibern�ticas e tentar entender como funcionam no condicionamento de comportamento social e mais especificamente suas consequ�ncias no campo da educa��o.

Essas tecnologias est�o intensamente presentes no funcionamento do cotidiano de todos, mesmo daqueles que n�o as usam diretamente. A partir da Revolu��o Microeletr�nica, do s�culo passado, o que percebemos � um movimento constante dessas tecnologias se tornarem cada vez menores, cada vez mais r�pidas e cada vez mais baratas.� Isto faz com que cada vez mais as rela��es sociais sejam mediadas por tecnologias digitais de informa��o e comunica��o em redes cibern�ticas, cada vez de forma mais intensa, e usadas por um n�mero maior de pessoas. Isso, em si, � um problema? N�o. As tecnologias, elas mesmas, n�o s�o boas nem m�s. Tudo depende do modo como s�o usadas, por quem s�o usadas, para qu� e em detrimento do qu�. Nossa civiliza��o j� passou por revolu��es industriais, nossas vidas j� foram condicionadas por milhares de inven��es. No entanto, em rela��o a essas tecnologias, podemos pensar que talvez n�o se trate apenas de mais uma inven��o.� Isto porque tais tecnologias t�m efeitos que se expandem desde o espa�o sideral, passando pela pr�pria estrutura da sociedade, at� as c�lulas dos corpos humanos e suas psiques e os seus desejos e suas formas de pensar e agir no mundo e, mais, sem que isso seja exatamente conhecido.

 

As a��es de comunica��o digitalmente mediadas s�o capazes de estender nossa capacidade de se comunicar com qualquer pessoa conectada no planeta, em tempo real, de perceber a realidade e de reagir a ela. Para muito mais al�m de nossos sentidos naturais, essa infraestrutura invis�vel nos permite saber onde as pessoas est�o; o que fazem e, com o apoio de sensores e redes, perceber de outra maneira nosso ambiente proximal ou distante. S�o informa��es que nos permitem tomar decis�es diferentes daquelas que tomar�amos se n�o tiv�ssemos o acesso a todos esses dispositivos e redes. Isso afeta continuamente nossa realidade e, ampliada a uma escala de milh�es de pessoas, transforma toda sociedade (PARRA; CRUZ; AMIEL; MACHADO, 2018, p.65).

 

 

Perguntamos: quem controla as redes pelas quais estamos envolvidos? Quais s�o os interesses que est�o por tr�s da disponibiliza��o gratuita dos aplicativos e plataformas que usamos cotidianamente? N�o sabemos. E vivemos isso quase sem perceber, de forma acr�tica, nos entregamos. Isto � um problema? Sim. Estamos sendo controlados remotamente, estamos hipnotizados, agindo segundo a vontade de outrem. E, sim, isto � um problema, pois, ao deixar de ser livre, ao abdicar de criar sentido para a pr�pria vida, o que podemos dizer que resta de um ser humano?

Isto dito assim dessa maneira parece bastante alarmante e talvez dif�cil de ser levado a s�rio. Pode nos vir � mente o cl�ssico temor que aparecem em algumas fic��es cient�ficas, quando os rob�s de Intelig�ncia Artificial dominam a Terra e passam a escravizar os seres humanos, ent�o olhamos ao redor e achamos tudo normal e pensamos �sou eu que uso meu celular, n�o ele a mim, que bobagem�. Algu�m nos fala que os algoritmos est�o nos governando (mas o que s�o mesmo, os algoritmos?), uma vaga sensa��o de estarmos perdendo uma parte da hist�ria nos invade, mas logo adotamos nossa habitual postura de ficarmos c�modos e pensamos �n�o pode ser que seja t�o grave assim, caso contr�rio �algu�m� j� teria feito alguma coisa, quanto alarmismo!�. Ou pode ser que intu�mos que haja algo realmente de muito errado acontecendo, mas nossas milenares pregui�a e covardia rapidamente nos reposicionam no h�bito derrotista de pensar que n�o podemos fazer nada a respeito disso.

O objetivo deste artigo � trazer algumas quest�es e conceitos, que n�o s�o especificamente do campo da educa��o, para problematizar a presente ades�o das universidades p�blicas brasileiras �s plataformas digitais pertencentes �s grandes corpora��es norte americanas. A partir da explicita��o do funcionamento dos mecanismos de roubo de dados, vigil�ncia e manipula��o das subjetividades dos usu�rios das tecnologias digitais de comunica��o e informa��o em redes cibern�ticas, pretendemos conduzir �s urgentes quest�es referentes � possibilidade de pensamento aut�nomo hoje, entendendo este n�o apenas como a��es de an�lise e cr�tica, mas tamb�m, seguindo Deleuze (2006), concebendo-o como cria��o.

Tecnopol�tica: como tudo isso funciona

Nos �ltimos dez anos, as maiores empresas do Vale do Sil�cio

operam vendendo seus usu�rios (Roger Namee)

 

Vivemos hoje o que se tem chamado de plataformiza��o (POELL; NIEBORG; VAN DIJCK, 2020) da sociedade, que � a j� indissoci�vel rela��o entre as estruturas da sociedade e as plataformas digitais. Os diversos setores sociais como sa�de, educa��o, transporte, etc., est�o mais e mais a cada dia, dependentes das infraestruturas dessas plataformas, que, note-se, e isto � muito importante, s�o plataformas que s�o de propriedade privada das cinco maiores corpora��es de tecnologia, norte americanas: Google/Alphabet, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft (GAFAM). As cinco corpora��es mais ricas do mundo hoje s�o de tecnologias da informa��o. A capa de um dos n�meros da revista The Economist, em 2017[i], traz uma ilustra��o onde se v� uma paisagem do mar com diversas plataformas de petr�leo, cada uma com o logotipo de uma dessas empresas que negociam dados. A manchete �: O recurso mais valioso do mundo n�o � mais o petr�leo, mas dados. Dados. Tudo come�a por aqui.

 

Muitos de n�s, sen�o todos, j� tivemos a sensa��o de que nossos telefones celulares ouvem nossas conversas, j� que aparecem sugest�es em suas telas sobre coisas h� pouco comentadas. Por que isso acontece e como?

Isso acontece porque tudo, absolutamente tudo que qualquer um de n�s faz na internet est� sendo assistido, rastreado, medido, qualquer a��o, como compras com cart�o de cr�dito, buscas na web, localiza��o, intera��es como dar likes e fazer coment�rios, tudo � minuciosamente monitorado e registrado constantemente. � poss�vel que, por meio dos sensores da c�mera dos computadores, se saiba exatamente o que os olhos est�o focando na imagem apresentada, � poss�vel saber quanto tempo ficamos olhando uma determinada imagem. Trata-se de um complexo e eficaz sistema de vigil�ncia. Cada �nfimo gesto de cada um de n�s, on line, � transformado em dado. A isso se d� o nome de datafica��o, ou seja, o processo de transforma��o das rela��es sociais em dados que, a despeito de sua dimens�o qualitativa, s�o necessariamente quantitativos. Ou seja, a datafica��o � o processo pelo qual as a��es sociais passam a ser quantific�veis, o que leva � possibilidade de que sejam rastreadas em tempo real e que se desenvolva toda uma ci�ncia de an�lise preditiva.� Por meio de uma coleta generalizada de dados criam-se padr�es de comportamento, que ser�o usados depois, mas n�o pelas pr�prias pessoas. �Indo al�m da digitaliza��o, a datafica��o � a tradu��o de inten��es, a��es, reflexos, sentimentos em dados operacionaliz�veis, para gerar novas a��es preditivas (coletivas ou individuais) a partir de coleta extensiva de informa��es� (LEMOS, 2021, p.195). As grandes corpora��es, empresas privadas, que visam lucro e apenas lucro, oferecem servi�os que parecem ser gratuitos para uso, j� que n�o cobram em dinheiro. Por�m, nada � gratuito no capitalismo, n�o tenhamos ilus�es quanto a isto. Essas empresas cobram o uso de seus aplicativos em dados. Assim, a coleta massiva de dados, por enormes empresas capitalistas, criou um grande mercado de dados, o petr�leo do s�culo XXI. E podemos dizer que a vida social cotidiana passou a ser fator de produ��o capitalista. De certa forma, os dados s� existem para o capital, pois, quando estamos fazendo qualquer coisa on line, n�o pensamos neles, muitas vezes nem sabemos que eles existem. � importante salientar que os problemas em rela��o �s tecnologias digitais de informa��o e comunica��o dizem respeito ao uso neoliberal que � feito delas. O uso dessas tecnologias, com efeitos delet�rios, est� se dando no contexto do neoliberalismo, essa m�quina de transformar tudo em empresa, at� mesmo os sujeitos, os novos �empreendedores�, cujas rela��es se resumem � concorr�ncia, esse sistema de capturar tudo em prol do capital, a despeito da vida, vida foi tornada fonte de dados.

 

Por dados n�s queremos dizer fluxos de informa��o que passam da vida humana em todas as suas formas para infraestrutura de coleta e processamento. Esse � o ponto de partida para gerar lucro a partir de dados. Nesse sentido, dados abstraem a vida, convertendo-a em informa��o que pode ser armazenada e processada por computadores e apropriam-se da vida convertendo-a em valor para terceiros (COULDRY; MEJIAS, 2019, p. xiii)[ii].

 

Vamos mais devagar, desdobremos isso. Como � poss�vel que sejam t�o imensamente ricos, se disp�em o uso dos seus aplicativos e plataformas gratuitamente? Como diz Tristan Harris no document�rio �O dilema das redes� (The social dilemma), �se voc� n�o est� pagando pelo produto, ent�o voc� � o produto�. Como isso se d�? O que a Gloogle - que n�o � somente uma simples ferramenta de busca -, quer, e o que o Facebook - que n�o � apenas um lugar acompanharmos nossos amigos e ver suas fotos -, quer, � a nossa aten��o. Todos esses que nos parecem t�o singelos servi�os gratuitos na internet, n�o s�o de fato gratuitos, os anunciantes pagam por eles. Eles pagam �s empresas de tecnologia digital para poderem nos mostrar seus an�ncios. Assim, � a nossa aten��o que � vendida ao anunciante, n�s somos o produto. Ora, mas isso j� n�o era assim na televis�o aberta h� tantas d�cadas? N�o exatamente.� O que se passa agora � que se trata de um modelo de neg�cio que garante que os anunciantes ter�o o m�ximo de sucesso. Essa garantia � conseguida por meio de um ac�mulo de bilh�es de dados, � necess�rio coletar tudo e cada vez mais todos os aspectos de tudo o que cada um de n�s faz quando estamos on line. Essa ind�stria tem mais informa��es sobre n�s do que jamais foi imaginado que seria poss�vel. O monitoramento minucioso e incessante de cada gesto nosso on line permite n�o apenas que se saiba se temos gatos ou n�o, por exemplo, mas se estamos deprimidos ou animados naquele dia, se estamos sem dinheiro, o que estamos planejando para nossas vidas, se vamos menstruar em breve, que tipo de coisa nos emociona e qual a emo��o, que tipo de causas nos levam ao engajamento, ou seja, � poss�vel conhecer nossas personalidades e estados de humor pela an�lise da nossa navega��o na internet. N�s, cada vez mais, alimentamos indiscriminadamente essa ind�stria com nossos dados, e quanto maior � o n�mero de dados que geramos, mais previs�veis ficamos. Criam-se padr�es de comportamento, modelos que podem prever nossas a��es e isso vale mais do que ouro. Esse processo � o que se chama de monetiza��o de dados, dados se transformam em dinheiro, por isso � poss�vel falar em economia de dados, em mercado de dados.

Foquemos nesse aspecto da possibilidade de previs�o de comportamentos e nos aproximemos do conceito de capitalismo de vigil�ncia, de Shoshana Zuboff,

 

O capitalismo de vigil�ncia reivindica de maneira unilateral a experi�ncia humana como mat�ria-prima gratuita para a tradu��o em dados comportamentais [...] [que ser�o] manufaturado[s] em produtos de predi��o que antecipam o que um determinado indiv�duo faria agora, daqui a pouco e mais tarde. [...] esses produtos de predi��es s�o comercializados num novo tipo de mercado para predi��es comportamentais [...] Os capitalistas de vigil�ncia t�m acumulado uma riqueza enorme a partir dessas opera��es comerciais, uma vez que muitas companhias est�o �vidas para apostar no nosso comportamento futuro (ZUBOFF, 2020, p.18-19).

 

�, portanto, a partir da cria��o de padr�es de comportamento que se alcan�a uma maior garantia de sucesso do an�ncio, que, salientamos, pode ser um an�ncio para a compra de um determinado produto, mas pode tamb�m ser o an�ncio de uma ideia, uma incita��o para uma determinada a��o. Vamos desenvolver isso adiante. Quanto mais se sabe sobre a personalidade de uma pessoa e a fase de vida pela qual ela est� passando, mais � poss�vel direcionar o an�ncio e mais o an�ncio vai ser eficaz. Ent�o n�o � a mesma coisa que os velhos an�ncios da televis�o aberta, que eram sementes jogadas ao vento, igualmente para todos. Agora � poss�vel detectar e separar grupos de pessoas que t�m mais ou menos o mesmo perfil, o mesmo padr�o de comportamento, e isso torna poss�vel o controle sobre parcelas da popula��o para bombarde�-las com determinados produtos. Como j� dissemos, conforme s�o criados esses padr�es e s�o criados produtos para as pessoas desse determinado padr�o, que s�o direcionados de forma espec�fica, maior � a probabilidade de consumo dessas mercadorias. Assim, cria-se a possibilidade n�o apenas de se enviar an�ncios de produtos consum�veis, mas tamb�m de se bombardear a tela das pessoas com sugest�es de v�deos e outras coisas que trazem determinadas ideias muito espec�ficas, ideias pol�ticas sobre a realidade, que tendam muito fortemente para um determinado lado. E, por meio da reiterada apari��o de um tipo de conte�do, cria-se, para o usu�rio, a sensa��o de que aquilo � verdade, pois est� em tudo o que aparece nesse mundo individual daquela pessoa e, al�m disso, as mesmas coisas aparecem tamb�m para cada um dos que concordam com ela, os que compartilham o seu perfil, que t�m o mesmo padr�o comportamental. Hoje � cada vez maior o n�mero de pessoas que possui um aparelho de telefone celular do tipo smartphone que � s� seu, que fica no seu bolso, na sua m�o, e isso facilita que se crie uma realidade tamb�m s� sua, o que n�o acontecia com os meios de comunica��o de massa. Por meio da an�lise dos dados que vamos desavisadamente derrubando pelos caminhos das nossas navega��es, os rastros eletr�nicos que deixamos, � constitu�do um padr�o e a partir da� o que aparece na tela para uma determinada pessoa, que corresponde a um determinado padr�o, n�o � a mesma coisa que aparece para outra pessoa, que corresponda a outro padr�o. Quando duas pessoas de perfis diferentes abrem exatamente o mesmo aplicativo ou digitam exatamente a mesma palavra na ferramenta de busca, n�o aparece a mesma coisa para elas, s�o criadas realidades espec�ficas para cada uma. �Dividir para dominar�, � uma velha t�tica de guerra que ainda funciona, assim, a realidade � personalizada, o que torna a manipula��o mais eficaz. Imagine se o dicion�rio desse uma defini��o diferente de cada voc�bulo dependendo da pessoa que o consultasse. Estamos falando de fake news? Sim, estamos falando de fake news tamb�m. E eis que a era da informa��o se tornou a era da desinforma��o. As grandes corpora��es de tecnologia digital n�o est�o interessadas na �tica e na justi�a, mas sim no lucro. N�o se importam em permitir que informa��es n�o verificadas ou at� mesmo comprovadamente falsas se espalhem e alcancem um n�mero imenso de pessoas, se isso lhes trouxer dinheiro. � importante observar aqui que os bilh�es e bilh�es de dados necess�rios para a cria��o dos padr�es de comportamento n�o s�o gerados apenas por nossas navega��es espont�neas, mas por a��es de compartilhamento de nossos dados que somos obrigados a fazer para usar os aplicativos. Por que, por exemplo, um aplicativo para monitorar batimentos card�acos na pr�tica de exerc�cios f�sicos, nos pede acesso a nossos contatos e �s nossas fotos, por exemplo, e se n�o permitirmos n�o podemos us�-lo? Justamente para essa gera��o desenfreada de dados. Nas condi��es do aplicativo eles prometem que v�o compartilhar nossos dados apenas com seus parceiros. Mas quem s�o seus parceiros? N�o sabemos. O que v�o fazer com esses dados? Sabemos: usar contra n�s mesmos.

Esse enorme interesse por nossos comportamentos futuros n�o diz respeito apenas � venda direta de mercadorias. Al�m de prever os comportamentos, existe toda uma ci�ncia de cria��o de meios de �modifica��o comportamental�, segundo Shoshana Zuboff, que gera um novo tipo de poder, que ela chama de poder instrument�rio, que, �conhece e molda o comportamento humano em prol das finalidades de terceiros� (ZUBOFF, 2020, p.19). Esses �terceiros� que s�o aqueles que compram os dados que geramos, podem estar interessados em moldar comportamentos de milh�es de pessoas seja para que comprem coisas, seja para que votem em determinado candidato nas elei��es, por exemplo. Essas ind�strias fazem o que � chamado por alguns autores de �minera��o de dados�, para a cria��o de perfis que possibilitam a modifica��o comportamental para uso ideol�gico, pol�tico ou comercial. �Sensores s�o utilizados para modificar o comportamento das pessoas com a mesma facilidade com que modificam o comportamento de um aparelho� (ZUBOFF, 2020, p. 337). H� toda uma engenharia que tem �o poder de praticar a��es que podem passar por cima do que voc� est� fazendo ou at� mesmo colocar voc� num caminho que n�o escolheu� (ZUBOFF, 2020, p. 337). O exemplo ic�nico de modifica��o de comportamento pol�tico � o chamado esc�ndalo da Cambridge Analytica-Facebook[iii]. Vivemos hoje a situa��o de gerarmos dados e de eles serem usados sem nossa permiss�o, na cria��o de realidades que interessam a outrem e de serem usados contra n�s por aquele que pagar mais, sem outro crit�rio, e tudo isso sem que a gente perceba.

Podemos perguntar: por que as pessoas que eventualmente v�m a saber da manipula��o � qual est�o submetidas n�o deixam de usar as redes cibern�ticas? Para al�m do processo crescente de plataformiza��o da sociedade que nos obriga a estarmos conectados, n�o deixamos de usar as redes sociais por um motivo muito simples: elas viciam. Por exemplo, uma inven��o muito mal�fica que causa v�cio e perda de si mesmo, � o chamado feed infinito, esse fluxo de conte�do que permite rolagem, a tela que nunca tem fim, o ded�o repete um gesto autom�tico para rolar a tela que nunca acaba, nos hipnotizando. Outro exemplo de t�tica para viciar, � a sofisticada engenharia das recomenda��es. Correntemente aparecem sorrateira ou explicitamente sugest�es para nossos pr�ximos cliques, sendo comum aparecer �recomendado para voc�, nos diversos aplicativos e sites que frequentamos. O design de recomenda��es nos leva a ficar clicando reiteradamente, ficamos muito mais tempo conectados do que planej�vamos e do que podemos perceber. Al�m do fato de ser viciante, h� outros problemas quando clicamos nas recomenda��es, pois agindo assim, estamos �ensinando� o algoritmo que coleciona informa��es sobre n�s, fazendo com que o padr�o ao qual estamos sendo inseridos fique cada vez mais fidedigno, aumentando as possibilidades de previs�o de nossas a��es e sua consequente manipula��o. Al�m disso, ao aceitar uma recomenda��o, estamos invariavelmente trilhando vias que j� foram previamente tra�adas para n�s, sem que nos atentemos para isso, na ilus�o de liberdade de escolha e decis�o, aut�matos controlados remotamente ou seres humanos, afinal?

A discuss�o sobre os atuais mecanismos de modula��o comportamental est� ainda dando seus primeiros passos na �rea da educa��o, em compara��o com as produ��es da tecnoci�ncia, cada vez mais �vida em desenvolver f�rmulas de captura da aten��o humana em prol do lucro das empresas. Anna Bentes (2022) destrincha o funcionamento de um guia pr�tico de design comportamental que combina mecanismos psicol�gicos e tecnol�gicos voltados para formar h�bitos, dentro dessa perspectiva que est� sendo chamada de tecnobehaviorismo, um behaviorismo atualizado �a vigil�ncia algor�tmica serve para oferecer recompensas psicol�gicas, visando estimular os usu�rios a repetir comportamentos autom�ticos� (BENTES, 2022, p.16).

O que est� em jogo aqui � que ignoramos que nossas exist�ncias est�o sendo moduladas, uma pr�tica t�o comum nas chamadas sociedades de controle, como as nomeou Deleuze, �os controles s�o uma modula��o, como uma moldagem auto-deformante, que mudasse continuamente, a cada instante, ou como uma peneira cujas malhas mudassem de um ponto a outro [...] nas sociedades de controle nunca se termina nada (DELEUZE, 1992, p.221)�. Ignoramos esse novo tipo de governamentalidade, complexo sistema de t�cnicas de governo, que sabemos com Foucault, que diz respeito a conduzir condutas, ou seja, �modos de a��o mais ou menos refletidos e calculados, por�m todos destinados a agir sobre as possibilidades de a��o dos outros indiv�duos. Governar, neste sentido, � estruturar o eventual campo de a��o dos outros� (FOUCAULT, 1995, p. 244). Limitar as possibilidades ao previs�vel, ao previsto, controlar, regular e intervir. �Ele incita, induz, desvia, facilita ou torna mais dif�cil, amplia ou limita, torna mais ou menos prov�vel� (FOUCAULT, 1995, p. 243), ou seja, controla as possibilidades, determina os modos poss�veis, modula os fluxos, nem percebemos que estamos sendo conduzidos. O modo como o governo opera hoje, nas plataformas digitais, um tecnogoverno, � muito sutil e conta com a a��o daquele que est� sendo governado ao deixar-se seduzir, respondendo a est�mulos, em busca de recompensas. Os caminhos que s�o tra�ados pelo design comportamental e trilhados por n�s s�o t�o persuasivos porque nos d�o a ilus�o de liberdade de escolha. Governo, ent�o, � esse tipo de poder que sujeita os humanos, na medida em que determina de antem�o os modos de subjetiva��o. A possibilidade de livre cria��o de si mesmo, de cria��o aut�noma das subjetividades � capturada e transformada em reprodu��o de modelos preestabelecidos. A governamentalidade que nos sujeita hoje � a algor�tmica. N�o entendemos nada de algoritmos, e mesmo se entend�ssemos de nada adiantaria, pois, o funcionamento algor�tmico das redes que frequentamos de maneira t�o despreocupada n�o est� aberto para avalia��o popular, para avalia��o daqueles que s�o os que est�o sendo conduzidos por ele, pois pertencem a empres�rios capitalistas. A modula��o algor�tmica � de propriedade privada.

Mas, afinal, o que s�o algoritmos? Algoritmos s�o conjuntos de instru��es que explicam detalhadamente como realizar uma tarefa. Uma receita de bolo, por exemplo, pode ser considerada um algoritmo. Em rela��o ao universo digital, um algoritmo � uma s�rie de regras / instru��es rigorosas para resolver um problema ou calcular algo, que � criada por um programador de computadores. Algoritmos ordenam e processam quantidades enormes de dados, para resolver um determinado problema. Por exemplo, as regras para resolver cubo m�gico, suas sequ�ncias de movimentos para acertar as faces, s�o algoritmos. No contexto de machine learning ou aprendizagem autom�tica, ou ainda aprendizado de m�quina, o algoritmo � o m�todo pelo qual o sistema de intelig�ncia artificial vai realizar uma determinada tarefa: a partir de dados de amostra, vai conseguir entender o sistema e criar modelos, e ent�o fazer previs�es sobre ele. O algoritmo gera um modelo a partir de dados, e o modelo gera previs�es. O aprendizado de m�quina � uma �rea cient�fica focada em entender e construir m�todos e modelos capazes de "aprender", ou seja, m�todos que se utilizam de dados para resolver problemas e realizar determinadas tarefas, de uma forma independente do comando humano a cada passo. Isto �, algoritmos de aprendizado de m�quina geralmente consistem em um modelo que "aprende" usando dados de amostra, chamados dados de treinamento, para, a partir disso, generalizar. Ent�o, dada uma quantidade muito grande e/ou complexa de dados, o algoritmo de aprendizado de m�quina usa v�rias t�cnicas para conseguir ver padr�es que n�s n�o conseguimos, em uma velocidade absurdamente r�pida - imposs�vel para um c�rebro humano-, e a partir disso gera previs�es ou decis�es sem ser programado explicitamente para resolver cada caso espec�fico, cada passo do processo. O fato de os algoritmos poderem dar ao computador a habilidade de �aprender� com os dados disponibilizados, por meio da cria��o de modelos, podendo tomar decis�es sozinho e fazer previs�es sem que seja necess�ria a interfer�ncia humana passo a passo, leva a certa independ�ncia desse:

[C]onforme o banco de dados se atualiza, eles [os algoritmos] v�o se atualizando, isso que � o aprendizado [...] mudam em tempo real, a equa��o n�o � a mesma agora e daqui a vinte segundos [...] dependendo do tipo de algoritmo nem quem programou consegue saber como ele est�, porque ele vai atualizando em camadas mais complexas e a divis�o disso � feita de forma computacional e voc� n�o consegue saber quantas camadas s�o, ele vai criando as camadas conforme a necessidade (TECNOPOL�TICA#1, 2018).

 

� importante sempre lembrar que algoritmos n�o se criam por si s�.� Como diz a matem�tica e cientista da computa��o Cathy O�Neil[iv], algoritmos n�o s�o neutros e os modelos podem ser considerados opini�es matematicamente expressas. Anterior a qualquer algoritmo h� pessoas (empresas com seus objetivos financeiros e pol�ticos) determinando os problemas a serem resolvidos, a sequ�ncia usada nessa resolu��o e com quais dados isso ser� feito. Sendo assim, os algoritmos podem ser enviesados pela ideologia, cultura ou preconceitos[v] de quem os cria.� �, portanto, neste sentido que podemos falar de governamentalidade algor�tmica. Os algoritmos est�o em todos os lugares e n�s vimos sendo pontuados e classificados por f�rmulas que n�s n�o entendemos e que mesmo se entend�ssemos seria in�til, j� que elas s�o fechadas, s�o secretas, s�o propriedades privadas, e em geral, ainda, n�o contamos com um sistema para o qual se possa apelar em caso de discord�ncia ou d�vida.

 

[o] problema � que os processos sociais e econ�micos est�o ocultos nos algoritmos, nos modelos de neg�cios e nos fluxos de dados que n�o est�o abertos ao controle democr�tico. Assim, a ideologia do neoliberalismo define a arquitetura da nossa sociedade conectiva. Uma arquitetura que n�o deixa espa�o para setores p�blicos, valores p�blicos e espa�o p�blico (VAN DIJCK, 2019, s/p).

 

A governamentalidade algor�tmica n�o �, portanto, aquela assombra��o cibern�tica de fic��o cient�fica, que controla os humanos, mas � produzida e operada por grandes empresas capitalistas.

 

Colonialismo de dados, a universidade e o pensamento

A explora��o da vida humana para gerar lucro por meio dos dados � o cl�max de cinco s�culos de tentativas de conhecer, explorar e dominar o mundo,

a partir de centros espec�ficos de poder (Nick Couldry e Ulises A. Mejias)

 

Nos �ltimos anos vimos um crescente movimento de oferta de uso �gratuito� de plataformas educacionais, de grandes empresas estadunidenses de comunica��o, �s institui��es de ensino p�blico no Brasil. A rela��o entre essas duas partes, no entanto, � bastante desequilibrada, pois, de um lado as empresas extraem livremente enorme quantidade de dados e do nosso lado mal sabemos para onde esses dados v�o e para o que ser�o usados.

 

Por um lado, as empresas t�m, potencialmente, acesso a uma grande quantidade de dados das institui��es p�blicas - desde dados pessoais de alunos, professores e funcion�rios, dados comportamentais dos usu�rios dos aplicativos educacionais e dos dispositivos (tablet, celular, computador), dados de rendimento escolar dos alunos e professores e at� dados de comunica��o institucional e de pesquisa. Por outro lado, como usu�rios e pesquisadores com interesse em dimensionar o mercado de dados, temos dificuldade tanto em saber se nossas informa��es est�o protegidas quanto em obter informa��es oficiais sobre os termos, os acordos e os reais par�metros dos dados coletados (CRUZ; SARAIVA; AMIEL, 2019, p.2).

 

A importante iniciativa brasileira de divulga��o cient�fica, constitu�da por pesquisadores acad�micos e organiza��es sociais, chamada Observat�rio Educa��o Vigiada[vi], coleta e divulga informa��es sobre a plataformiza��o da educa��o p�blica no Brasil e na Am�rica do Sul. No mapeamento[vii] que fizeram, v�-se que 79,17% das institui��es p�blicas brasileiras de ensino superior analisadas usam servi�os das GAFAM e apenas 20,83% usam outros. Aderimos tranquilamente, sem nem mesmo conhecer os termos de uso das plataformas que atuam na educa��o[viii], assim como aceitamos todos os termos de uso dos aplicativos que usamos quase totalmente sem ler, incentivados, inclusive, pelo modo dif�cil � avalia��o como eles se apresentam.� �N�s estamos entrando na era n�o de um novo capitalismo, mas sim de um novo entrela�amento entre as hist�rias paralelas do capitalismo e do colonialismo, e a for�a entrela�adora s�o os dados� (COULDRY; MEJIAS, 2019, p. xii)[ix].� Vemos se instaurar um novo colonialismo, o colonialismo de dados, que tem funcionamento an�logo ao colonialismo cl�ssico com pr�ticas de extrativismo predat�rio, para mercantiliza��o, s� que desta vez a colabora��o dos explorados tornou-se seu modo de vida. Veja, por exemplo, que sob a alega��o de melhor desempenho no processamento, todos os dados do Sistema de Sele��o Unificada (SiSU), para a entrada nas universidades p�blicas no Brasil, foram entregues pelo Minist�rio da Educa��o do Brasil para a Microsoft. Foram milh�es de dados, tais como �a renda familiar bruta mensal de cada um, os valores recebidos em diversos programas sociais, a nota no Enem, as m�dias populacionais relacionadas � cor declarada e a defici�ncias� (SILVEIRA, 2021, p. 39). E a Microsoft n�o cobrou nada...

 

[A]s universidades federais, que figuram as institui��es p�blicas mais estrat�gicas da sociedade brasileira, hoje j� s�o laborat�rios de aprimoramento dos sistemas de aprendizado de m�quinas e retroalimentam a l�gica de acumula��o de lucro no Norte Global e do aumento das desigualdades e da depend�ncia nos pa�ses do Sul (MIAN, 2021, p.137).

 

E sarcasticamente chama-se o lugar onde se deposita esses dados de �nuvem�... N�o podemos deixar de fazer um pequeno desvio aqui no nosso foco, para mencionar que, embora �nuvem� sugira algo leve, fora da terra, et�reo, algo como as ondas eletromagn�ticas, ela n�o � isso. O que � chamado de �nuvem� s�o imensas centrais de dados, data centers, que s�o edif�cios muito concretos, que ocupam espa�o territorial, que abrigam milhares de computadores que necessitam de refrigera��o, e que, portanto, gastam muita energia el�trica e causam grande

impacto na natureza, j� que raramente se utilizam de energia limpa e renov�vel. Al�m desses problemas ambientais � relativos � extra��o de energia da natureza- na crescente e desregulada extra��o e ac�mulo de dados, temos ainda que considerar a extra��o de min�rio que � necess�ria para alimentar a produ��o de equipamentos ele�tr�nicos (LEMOS, 2021), sem falar nos impactos ambientais da instala��o de cabos submarinos de fibra �tica, intercontinentais, para a transmiss�o dos dados (PARRA, 2020a).

Atra�dos pelo baixo custo ou �gratuidade� dos servi�os oferecidos pelas plataformas educacionais norte-americanas, tomando como crit�rio a facilita��o dos processos, as institui��es brasileiras n�o est�o percebendo se tratar de um problema de abdica��o da soberania sobre nossos dados. Esta quest�o n�o � discutida por quem est� na gest�o do governo, nem por quem pretende estar nesse lugar, assim como n�o � uma quest�o p�blica e tampouco educacional. Parece invis�vel o interesse econ�mico dessas grandes corpora��es, principalmente Microsoft e Google na �rea educacional brasileira (SILVEIRA, 2021).

A colonialidade, que para muitos pensadores (QUIJANO, 1992) atuais � o que persiste do colonialismo cl�ssico como um padr�o de poder, � tamb�m um padr�o de subjetiva��o e � assim�trico. Em rela��o aos t�o perniciosos efeitos econ�micos e pol�ticos, da coleta (roubo) dos dados para a plataformiza��o e modula��o da vida social, podemos dizer que n�o s�o os mesmos nos pa�ses que est�o no centro desse sistema, controlando os processos, do que nos pa�ses perif�ricos a ele, � merc� de suas a��es. A colonialidade se configura como uma imposi��o de modos de vida e modos de pensar, ela age na desvaloriza��o ou total nega��o dos modos de pensar e de criar a realidade das culturas nos pa�ses n�o ricos, esfor�ando-se por convenc�-los de sua inferioridade, de sua incapacidade em criar solu��es originais para seus problemas.

As grandes empresas de tecnologia est�o sempre �vidas para oferecer seus produtos, para rapidamente se imiscuir na vida social trazendo suas solu��es, de forma que desqualifica a capacidade local de criar solu��es pr�prias, fortalecendo a ideia de incompet�ncia dos outros povos que n�o eles. �No contexto da colonialidade, o colonizado, a intelig�ncia coletiva local, nunca est� pronto, apto, capacitado para enfrentar um problema sem recorrer a uma corpora��o matriz� (SILVEIRA, 2021, p.41).

� sempre e cada vez mais importante percebermos a dimens�o pol�tica dos nossos �brinquedos� eletr�nicos, talvez principalmente os profissionais da educa��o, que t�m meios de estudar e propagar a ideia de que essas novas tecnologias n�o s�o apenas mais uma inven��o. As mudan�as que vivemos agora, por meio das tecnologias digitais de informa��o e comunica��o em redes cibern�ticas, s�o mudan�as radicais naquilo que podemos chamar de humanidade, sua consci�ncia, sua capacidade de pensar sobre seu pr�prio pensamento e analisar e criticar e assim poder tomar decis�es livremente. Al�m disso, � importante que nos preocupemos com o modo como esses corpos humanos se comp�em, no encontro com outros corpos, no contexto da governamentalidade algor�tmica, perguntamos, como � que est�o se dando as rela��es humanas? Para qual tipo de sociabilidade estamos sendo conduzidos?

Se a vida foi transformada em dados, � urgente que saibamos disso e partamos em sua defesa. Para o soci�logo e professor-pesquisador Henrique Parra (2020a), os problemas envolvidos nesse novo modo de funcionamento social, pol�tico-econ�mico, existencial, se assemelha aos problemas clim�ticos do antropoceno (esse limite da vida do planeta e no planeta em que a interfer�ncia humana nos colocou), que foram negados ou minimizados por d�cadas, at� que estourassem em nossa cara at� j� n�o podermos mais ignor�-los. A pergunta �: quando esses problemas todos que vimos tratando at� aqui, relativos � tecnopol�tica, quando estourarem em nossas caras, seremos n�s, ainda, n�s mesmos?

Chamamos de tecnopol�tica esse novo modo de funcionamento da pol�tica, totalmente mediada por tecnologias controladas por grandes corpora��es capitalistas neoliberais. Mas este � um modo tal que, talvez, j� n�o possa ser chamado de pol�tica, se entendermos esta como um complexo sistema de rela��es entre os animais humanos, que constitui a sociedade e os pr�prios humanos, tendo como princ�pio a capacidade de pensamento auto-reflexivo, cr�tico e criativo.

 

Se o colonialismo hist�rico se apossava de territ�rios, seus recursos e os corpos que os extra�am, a tomada de poder do colonialismo de dados � mais simples e mais profunda: a captura e controle da vida humana em si, apropriando-se dos dados que podem ser extra�dos dela, para gerar lucro. A vida humana est� literalmente sendo anexada ao capital (Couldry; Mejias, 2019, p. xi)[x].

 

Henrique Parra (2020), afirma a necessidade urgente de pensarmos as tecnologias de informa��o e comunica��o n�o mais como ferramentas, mas como algo que constr�i mundos e determina formas de viver e a partir disso, pergunta quais s�o os processos de subjetiva��o que est�o implicados no uso dessas tecnologias. Quais formas de vida est�o sendo produzidas? Que tipo de mundo est� sendo constru�do? Especificamente no campo da educa��o, perguntamos, quais s�o os modos de pensar (ou n�o pensar?) que est�o sendo modulados pelas tecnologias cognitivas e qual nossa responsabilidade sobre isso?

 

O colonialismo de dados se apropria n�o s� dos recursos f�sicos, mas tamb�m dos nossos recursos de conhecer o mundo. Isso significa que o poder econ�mico (o poder de criar valor) e o poder cognitivo (poder sobre o conhecimento), convergem como nunca antes. Portanto, o que est� acontecendo com dados s� pode ser totalmente compreendido se comparado n�o s� com o capitalismo, mas com as mais longas inter-rela��es entre o capitalismo e o colonialismo (COULDRY; MEJIAS, 2019, xi).

 

N�o � algo que a Google tente ocultar, em rela��o ao Googleclassroom, que interessa para a empresa o que chama de �fideliza��o dos usu�rios�. O que significa: oferecer o �modo Google de estudar� desde cedo, para que o �usu�rio� tenha esse espec�fico modo de acesso ao conhecimento disciplinando seu modo de pensar e que fique fiel a ele por d�cadas, se n�o para sempre. Com mecanismos de controle de busca sobre a pesquisa, controle sobre o acervo, a mem�ria, dentro de ambientes indexados, classificados, hierarquizados, como promover a liberdade do pensamento, tornando-o aut�nomo, criativo? Quais s�o as formas de pensamento que est�o sendo constitu�das nesses ambientes educacionais, que modulam modos de ensinar e aprender? A vida e a realidade est�o mediadas por esse design tecnol�gico que se naturalizou, os modos de pensar e desejar j� est�o dados, basta percorrer os caminhos j� tra�ados, e mesmo assim podemos ainda insistir em perguntar: e a liberdade? A autonomia, que caracteriza um pensamento humano? E o futuro? Como as crian�as v�o imaginar outros mundos se est�o estritamente moduladas?

Deleuze e Guattari (1997) em �Tratado de Nomadologia� afirmam ser comum nos atentarmos para os conte�dos dos pensamentos quando queremos critic�-los, mas que a quest�o � primeiramente a da pr�pria forma do pensamento. Quais s�o as formas de pensar que est�o sendo moldadas e moduladas na contemporaneidade, de maneira sorrateira e naturalizada, nos acomodando confortavelmente em nossas cadeiras, diante de telas sedutoras que nos capturam? � imprescind�vel que nos atenhamos �s formas/f�rmas de pensar que se apossam de n�s, esse � um tema de extrema relev�ncia para a educa��o hoje. �Quanto menos as pessoas levarem a s�rio o pensamento, tanto mais pensar�o conforme o que quer um Estado� (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 46), entendendo Estado aqui, hoje, como empresa, Estado-empresa. Levemos a s�rio, pois, o pensamento, as formas de pensar.

Como resistir? Como resistir de dentro das universidades? Pensamos ter algumas sugest�es. Em primeiro lugar, com certeza, � necess�rio ter conhecimento do problema, para ter nitidez sobre as rela��es tecnopol�ticas que est�o a condicionar nossas vidas e disposi��o para enfrent�-las. Em segundo lugar pensamos ser bastante �til que ensinemos sobre esse problema em nossos cursos, o tanto quanto for poss�vel. Em terceiro lugar nos parece muito eficaz substituirmos o uso de plataformas e aplicativos das GAFAM, por outros, livres, de c�digo aberto. �Universidade e escolas de todos os n�veis deveriam ensinar e oferecer apenas software livre aos estudantes. Softwares propriet�rios deveriam ser autorizados nos campi apenas para engenharia reversa� (STALLMAN, 2017, s/p). Os chamados softwares livres s�o os que t�m c�digo aberto, possibilitando que os usu�rios acessem o c�digo fonte. Segundo a Free Software Foundation juntamente com o projeto GNU, qualquer usu�rio tem o direito de executar, copiar, distribuir, estudar, mudar e melhorar o software. Richard Stallman, programador do MIT (Massachusetts Institute of Technology) foi quem criou, na d�cada dos anos 1980, o GNU, um sistema operacional alternativo aos sistemas propriet�rios, seguindo, pensamos, a �tica hacker (HIMANEN, 2001), anticapitalista, de compartilhamento, que tem como valores a paix�o pelo trabalho, a liberdade de tempo livre, o trabalho colaborativo, a necessidade de cuidar dos outros, a busca da felicidade como a��o e a criatividade. Ou seja, trata-se de conceber e usar tecnologias que sejam compat�veis com as formas de vida e os mundos que desejamos. Desnaturalizar esse atual jeito de viver por meio das tecnologias e criar outros regimes de sensibilidade (TECNOPOL�TICA #38, 2020). Em quarto lugar, nos parece muito importante nos engajarmos na luta pela instaura��o de uma autoridade nacional de prote��o de dados, amparada por fortes mecanismos legais de prote��o geral de dados, que n�o temos no Brasil, para que, inclusive, os gigantes tecnol�gicos n�o saiam ilesos de seus crimes, que, a depender do ponto de vista, podem ser considerados crimes contra a humanidade.

�N�o cabe temer ou esperar, mas buscar novas armas� (DELEUZE, 1992, p.220). Se n�o conseguimos fazer como Richard Stallman, que se nega a carregar um telefone celular, ao menos que n�o nos neguemos a enfrentar com coragem e disposi��o o sistema de roubo, vigil�ncia e modula��o que captura nossas vidas.

 

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Notas



1 Cf. https://www.economist.com/leaders/2017/05/06/the-worlds-most-valuable-resource-is-no-longer-oil-�but-data The world�s most valuable resource is no longer oil, but data (livre tradu��o nossa).

 

2 Todas as cita��es de Couldry e Mejias s�o de livre tradu��o nossa. �[...] by data we mean information flows that pass from human life in all its forms to infrastructures for collection and processing. This is the starting point for generating profit from data. In this sense, data abstracts life by converting it into information that can be stored and processed by computers and appropriates life by converting it into value for a third party�.

 

3 O caso foi que, a partir de um question�rio sobre personalidade que o Facebook disponibilizou e que milh�es de pessoas responderam espontaneamente, gerou-se uma quantidade de dados psicogr�ficos suficientes para mapear padr�es de comportamento de uma popula��o enorme. Esses dados foram disponibilizados pelo Facebook, para a Cambridge Analytica, empresa de assessoria pol�tica, que vendeu seus servi�os de modifica��o de comportamento para influenciar a opini�o de eleitores em v�rios pa�ses. Testaram a efic�cia desses experimentos absolutamente anti�ticos em dezenas de pa�ses da �sia e da �frica e posteriormente aplicaram na popula��o norte americana, na elei��o de Thrump e na elei��o presidencial no Brasil em 2018.� A enorme polariza��o na pol�tica que se vive nesses pa�ses, foi criada dentro da l�gica de dividir para conquistar, por meio dessas t�ticas de modula��o de comportamentos. A partir do esc�ndalo da Cambridge Analytica-Facebook, houve a cria��o da campanha #OwnYourData (#PossuaSeusDados), que se baseia na ideia de que ter direitos sobre os pr�prios dados � um direito humano (Data rights are human rights). Cf. Document�rio �Privacidade hackeada.�

 

4 Cf. �A era da f� cega no �big data� tem que acabar�, de Cathy O�Neil, autora do livro �Armas de destrui��o matem�tica� (Weapons of math destruction).

https://www.ted.com/talks/cathy_o_neil_the_era_of_blind_faith_in_big_data_must_end?language=pt

 

5 Cf. Joy Buolamwini em Liga da Justi�a Algor�tmica. https://www.ajl.org/ Algorithmic Justice League

 

6 O Observat�rio Educa��o Vigiada foi originalmente criado pela Iniciativa Educa��o Aberta (uma parceria entre a C�tedra UNESCO de Educa��o EaD da UnB e o Instituto EducaDigital), pelo Laborat�rio Amaz�nico de Estudos Sociot�cnicos - UFPA e pelo Centro de Compet�ncia em Software Livre - UFPA e trabalha atualmente em parceria com a LAVITS � Rede Latino-Americana de Estudos sobre Vigil�ncia, Tecnologia e Sociedade.

 

7 O Brasil � o pa�s com o maior n�mero de institui��es p�blicas de ensino superior da Am�rica do Sul, com 144 institui��es. Em n�meros absolutos, das 281 institui��es que utilizam solu��es da empresa Google na Am�rica do Sul, 103 (37%) est�o no pa�s. Somente 21% das institui��es p�blicas de ensino superior utilizam solu��es alternativas de armazenamento de e-mails � o que est� em conson�ncia com a m�dia do continente�.

 

8 Interessante conferir o Relat�rio Educa��o, dados e plataformas: an�lise descritiva dos termos de uso dos servi�os educacionais Google e Microsoft, que traz uma an�lise descritiva dos Termos de Uso e Pol�tica de Privacidade do G Suite for Education e Microsoft 365, dois dos pacotes educacionais mais utilizados por institui��es p�blicas de educa��o.

 

9 Livre tradu��o nossa de: �We are entering the age not so much of a new capitalism as of a new interlocking of capitalism�s and colonialism�s twinned histories, and the interlocking force is data�.

 

10 Livre tradu��o nossa de: �If historical colonialism annexed territories, their resources, and the bodies that worked on them, data colonialism�s power grab is both simpler and deeper: the capture and control of human life itself through appropriating the data that can be extracted from it for profit. Human life is quite literally being annexed to capital�.