Do diploma à inadimplência: um estudo sobre o endividamento dos beneficiários do financiamento estudantil

 

From diploma to default: a study on the indebtedness of student financing beneficiaries

 

Del diploma al default: un estudio sobre la deuda de los beneficiarios de préstamos estudiantiles

 

Erica Almeida Leal

Universidade Estadual de Santa Cruz, Bahia, Brasil

erica.eal@gmail.com

Lessi Inês Farias Pinheiro

Universidade Estadual de Santa Cruz, Bahia, Brasil

lifpinheiro@uesc.br

Marcelo Inácio Ferreira Ferraz

Universidade Estadual de Santa Cruz, Bahia, Brasil

mfferraz@uesc.br

 

Recebido em 10 de junho de 2021

Aprovado em 17 de dezembro de 2021

Publicado em 27 de setembro de 2023

 

 

RESUMO

A financeirização das políticas sociais corresponde ao entrelaçamento entre os interesses do capitalismo financeiro mundializado e atuação do poder público no provimento de bens e serviços. No Brasil, a financeirização das políticas educacionais levou o governo federal a criar programas de oferta massiva de vagas no ensino superior privado, que se materializam através do repasse de recursos públicos para IES-privadas. O presente artigo tem por objetivo analisar a relação existente entre o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o endividamento dos estudantes que ingressaram no ensino superior a partir deste programa. Para tanto, realizou-se uma pesquisa exploratória, desenvolvida a partir da análise de dados secundários (INEP, FNDE, IBGE, PNAD-Contínua, CNC, e outros), que tratam sobre o Fies e sobre as condições de endividamento e participação no mercado de trabalho dos beneficiários do Fies. Com a pesquisa, tornou-se possível identificar que o Fies, enquanto política pública financeirizada, prioriza os interesses do capitalismo mundializado, sobretudo no que tange ao máximo valor ao acionista e a diversificação das parcerias público-privadas. O Estado contribui para a ampliação do acesso ao crédito para a população de baixa renda e do repasse de recursos públicos para IES-privadas. O estudante, por sua vez, embora tenha conquistado o sonho de concluir a graduação com a esperança de adquirir melhores condições de vida, arca com o ônus decorrente das políticas públicas financeirizadas, consubstanciado em índices crescentes de endividamento.

Palavras-chave: educação superior; Fies; políticas públicas.

 

ABSTRACT

The financialization of social policies corresponds to the intertwining between the interests of globalized financial capitalism and the role of public authorities in the provision of goods and services. In Brazil, the financialization of educational policies led the federal government to create programs to massively offer places in private higher education, which are materialized through the transfer of public resources to private educational institutions. This article aims to analyze the relationship between the Student Financing Fund (Fies) and the indebtedness of students who entered higher education from this program. To this end, an exploratory research was carried out based on the analysis of secondary data (INEP, FNDE, IBGE, PNAD-Continua, CNC, and others), which deal with Fies and the conditions of indebtedness and market participation of Fies beneficiaries. With the research, it became possible to identify that Fies, as a financialized public policy, prioritizes the interests of globalized capitalism, especially with regard to maximum shareholder value and the diversification of public-private partnerships. The State contributes to the expansion of access to credit for the low-income population and the transfer of public resources to private HEIs. The student, in turn, despite having conquered the dream of completing graduation with the hope of acquiring better living conditions, bears the burden of financialized public policies, substantiated by growing indebtedness rates.

Keywords: college education; Fies; public policy.


RESUMEN

La financiarización de las políticas sociales corresponde al entrelazamiento entre los intereses del capitalismo financiero globalizado y las acciones de las autoridades públicas en la provisión de bienes y servicios. En Brasil, la financiarización de las políticas educativas llevó al gobierno federal a crear programas que ofrecen vacantes masivas en la educación superior privada, que se materializan a través de la transferencia de recursos públicos a IES privadas. Este artículo tiene como objetivo analizar la relación entre el Fondo de Financiamiento de Estudiantes (Fies) y la deuda de los estudiantes que ingresaron a la educación superior a través de este programa. Para ello, se realizó una investigación exploratoria, desarrollada a partir del análisis de datos secundarios (INEP, FNDE, IBGE, PNAD-Continua, CNC, y otros), que versan sobre las Fies y las condiciones de endeudamiento y participación en el mercado de trabajo de los beneficiarios del Fies. Con la investigación, fue posible identificar que el Fies, como política pública financiarizada, prioriza los intereses del capitalismo globalizado, especialmente en lo que respecta al máximo valor para los accionistas y la diversificación de las asociaciones público-privadas. El Estado contribuye a ampliar el acceso al crédito de la población de bajos ingresos y la transferencia de recursos públicos a las IES privadas. El estudiante, a su vez, aunque haya cumplido el sueño de completar su carrera con la esperanza de adquirir mejores condiciones de vida, soporta la carga resultante de las políticas públicas financiarizadas, materializadas en tasas de endeudamiento crecientes.

Palabras clave: educación superior; Fies; políticas públicas.

 

 

Introdução

 

No âmbito da educação superior, o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) constitui a principal estratégia de expansão do ensino superior no Brasil, cuja base consiste na oferta de vagas em instituições de ensino superior privadas, mediante concessão de financiamentos para os estudantes que aderirem ao programa.  Desde a sua criação, o Fies passou por significativas alterações em sua estrutura e regulamentação, com modificações na definição da receita, agente operador e financeiro, condições de pagamento, garantia e elegibilidade.

Criado em 1999, a partir da publicação da Medida Provisória nº 1.827/1999, posteriormente convertida na Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, o  Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) consiste em um fundo de natureza contábil, vinculado ao Ministério da Educação, cuja operacionalização consiste em financiar a graduação na educação superior de estudantes matriculados em instituições de ensino superior privadas. No Fies a operação é efetuada por meio de títulos da dívida pública especificamente emitidos para esse único fim (os CFT-Es, Certificados Financeiros do Tesouro – Série E).

De acordo com a exposição de motivos da Medida Provisória nº 1.827/1999, o Fies tem por objetivo minimizar problemas sociais, como o baixo percentual de adultos com ensino superior completo e a baixa taxa bruta de matrícula das classes mais pobres nesta etapa de ensino.

Entre os anos de 2010 a 2014 intensificaram-se as ações que contribuíram para a expansão do Fies, tais como a redução da taxa de juros, ampliação do prazo de amortização para 3 (três) vezes a duração do curso e ampliação do período de carência para 18 meses. A oferta massiva de vagas no ensino superior privado esteve marcada pelo repasse elevado de recursos para as instituições privado-mercantis, o que contribuiu para a formação de grandes oligopólios na área de educação superior. Por se tratar de uma política pública financeirizada, o Fies contribui para o aumento da demanda, não apenas por ensino superior, mais precipuamente por crédito estudantil, muito embora o público-alvo desta modalidade de crédito não tenha plena clareza sobre como irá honrar as obrigações decorrentes deste financiamento.

Por outro lado, as IES-privadas beneficiaram-se com a expansão do Fies, suas fragilidades e contradições, sobretudo no que diz respeito à frágil fiscalização do valor cobrado pelas mensalidades e a ausência de controle de qualidade dos cursos ofertados até 2009. Como consequência, tem-se a formação de grandes oligopólios na área de educação com capital aberto na bolsa de valores, com destaque para a Kroton, Anima, Estácio e a Ser Educacional; enquanto a educação é tratada como mera mercadoria, em perfeita consonância com as orientações do Banco Mundial para o ensino superior em países em desenvolvimento.

 O presente artigo visa analisar a relação existente entre o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o endividamento dos estudantes que ingressaram no ensino superior a partir deste programa. Para tanto, realizou-se uma pesquisa explorativa, a partir da análise de dados secundários disponibilizados por órgãos oficiais (INEP, FNDE, IBGE, PNAD-Contínua, CNC e outros) e artigos científicos sobre o tema.

A discussão encontra-se organizada em dois capítulos, além desta introdução. O primeiro versa sobre a financeirização das políticas sociais brasileiras e traz uma apresentação teórica sobre os efeitos deste processo no cotidiano das famílias. O segundo apresenta o resultado do levantamento de dados e informações a respeito das condições de inadimplência e empregabilidade dos beneficiários do Fies, desdobramentos significativos do financiamento estudantil, que indicam a repercussão desta política pública na vida econômica dos estudantes, ultrapassando a análise que se atem apenas à dados relacionados com a conclusão do ensino superior.

 

A financeirização das políticas sociais brasileiras

A política econômica e social adotada no Brasil, nas últimas décadas, encontra-se cada vez mais atrelada à ideologia neoliberal, que favorece a ascensão do capital financeiro, conforme já ocorre nos países desenvolvidos desde a década de 70. Estudos sobre a financeirização no Brasil e nos demais países emergentes da América Latina (FEIJÓ, et. al., 2019; SCHORR; WAINER, 2018) demonstram que, diferentemente do que ocorreu em países desenvolvidos, a dominância do regime de acumulação financeirizada no Brasil ocorreu de forma precoce, o que contribuiu para a intensificação da desindustrialização no âmbito nacional, em prejuízo para a base produtiva e para a oferta de empregos.

Este fenômeno ocorre em razão do potencial que a financeirização possui para alterar a base produtiva, em prol da geração da riqueza financeirizada. De acordo com Feijó et al. (2019), a liberalização financeira em países em desenvolvimento induz a perda de importância do setor industrial na estrutura produtiva, levando a um processo de desindustrialização precoce, além de aumentar a fragilidade externa e reduzir o espaço para o desenvolvimento das políticas econômicas de longo prazo. 

No mesmo sentido, Schorr e Wainer (2018) explicam que, a partir da década de 1990, a economia brasileira, com apoio dos Estados e das grandes empresas, passou a permitir a subordinação do setor produtivo ao setor financeiro, através do desempenho de estratégias de acumulação, que culminaram na desindustrialização precoce.

La economía de Brasil viró su rumbo en los años noventa hacia un tipo de economía en el cual el sector financiero subordinó al productivo. Esto creó una elite ligada a la captura de rentas financieras. Tanto el Estado como las empresas ingresaron en nuevas formas de organización con el fin de garantizar esas capturas. Particularmente, la cúpula empresaria sufrió una profunda desindustrialización, mientras las estrategias de acumulación incluyeron fuga de capitales, centralización, adquisición de activos líquidos y toma de deuda (SCHORR; WAINER, 2018, p. 80).

 

Os efeitos da financeirização do Brasil espraiaram-se não apenas no âmbito dos setores produtivos da economia, mas também, no âmbito das políticas sociais, cujo pilar se encontra na reconfiguração da ação intervencionista estatal, na qual o Estado passa a assumir o papel ativo no processo de ampliação dos espaços possíveis de acumulação financeira, enquanto os agentes financeiros passam a assumir a função de gestores dos gastos públicos e da política social. Nesse sentido, Fine (2009) destaca que a financeirização não corresponde apenas a uma política macroeconômica, mas a uma forte subordinação da política social aos interesses econômicos, que compreendem os ditames da promoção dos mercados em geral e especialmente do mercado de finança.

A consequência desta interferência da financeirização na política social, observada por Fine (2009), consiste numa verdadeira desordem no âmbito das políticas sociais dos países em desenvolvimento, nos quais o neoliberalismo tem sido responsável por promover e defender a financeirização, com implicações diretas e indiretas para a sociedade.

No Brasil, o Estado, mesmo quando submetido ao discurso liberal, sempre possuiu um papel preponderante para a garantia das condições gerais de acumulação capitalista (BRETTAS, 2017). No entanto, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988 iniciou-se um período definido por Brettas (2017) como contraditório, visto que, enquanto de um lado a norma constitucional passa a positivar garantias e direitos a serem providos pelo Estado, tais como, a saúde, a educação, a assistência social e a previdência; do outro, a efetivação das políticas sociais, em sua fase neoliberal, acentua sua capacidade de tornar lucrativas as ações privadas na prestação de serviços públicos, apontando caminhos para enfrentar as crises de acumulação e de hegemonia.

Da mesma forma, Lavinas et al. (2018, p. 195) assevera que a política social adotada no Brasil nos anos 2000 encontra-se repleta de “contradições e desafios que surgem com o avanço do capitalismo financeirizado e a prevalência do capital de juros na reprodução da vida e na exploração da natureza de forma insustentável e predatória”, em meio a um alargamento no campo de direitos individuais e sociais, tais como, a saúde, a previdência e a educação, devidamente positivados na Constituição Federal de 1988, que dão base ao atual Estado Democrático de Direito.

O discurso utilizado para justificar o entrelaçamento entre os setores público e privado assenta-se na ideia de que os recursos públicos não seriam suficientes para suprir a demanda social, nos termos definidos pela Constituição Federal de 1988 (BRETTAS, 2017), o que se assemelha com o argumento utilizado para justificar a suposta crise do Estado de Bem Estar Social, sustentada nos países desenvolvidos a partir da década de 70.

Diante desta realidade imposta pelos interesses privados e financeiros, foram efetuadas propostas para o direcionamento dos gastos públicos e da efetivação da política social, sintetizados por Brettas (2017), nos seguintes eixos: deveriam os recursos públicos terem como prioridade o pagamento da dívida pública e a sinalização; a necessidade de buscar apoio fora do aparato estatal (terceiro setor, voluntariado e parcerias público-privadas) para garantir a prestação dos serviços públicos; e a financeirização das políticas sociais como um caminho para a implementação não apenas das políticas que compõem a Seguridade Social, mas também das demais políticas.

Nas últimas décadas, foram criados programas governamentais que contribuíram com o entrelaçamento entre o setor público e o setor privado e financeiro, tais como, o Programa Minha Casa Minha Vida e o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES), cujo pressuposto consiste na inclusão bancária, ou seja, o indivíduo para ser beneficiado com determinado programa governamental necessita ter uma conta bancária e, em muitos casos, realizar um contrato de financiamento, com obrigação de assumir prestações pecuniárias mensais acrescidas de juros como contrapartida ao benefício social adquirido (saúde, educação, habitação, etc.). Assim, a inclusão bancária é apresentada como um pressuposto para o exercício da cidadania e garantia de melhores condições de vida.

A situação mostra-se problemática ao considerar que se trata de um país que apresentou taxa de analfabetismo das pessoas de 15 anos de idade ou mais estimada em 6,6% (11 milhões) em 2019, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). Este dado revela que a população que mais necessita de acesso aos programas sociais não possui as habilidades necessárias para a prática da leitura e da escrita, o que coloca em questão os desdobramentos decorrentes da obrigatoriedade de possuir uma conta bancária para tornar-se beneficiário de programas sociais.  Por outro lado, os brasileiros alfabetizados não possuem educação financeira ou bancária, visto que este conteúdo não é obrigatório na educação básica.

Em 2020, os brasileiros sofreram os efeitos decorrentes da crise econômica e sanitária causada pela pandemia do Coronavírus. Dentre as medidas excepcionais de proteção social adotadas pelo Governo Federal, destaca-se a concessão do auxílio emergencial no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais ao trabalhador desempregado e ao microempreendedor individual, que cumpriram os requisitos estabelecidos pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020. Para ter acesso ao auxílio emergencial, o beneficiário teria que realizar um cadastro no aplicativo ou site do Auxílio Emergencial e os valores seriam disponibilizados nas contas digitais. No entanto, as dificuldades enfrentadas pelos beneficiários para ter acesso ao aplicativo e a conta digital induziram a formação de filas gigantescas nas agências da Caixa Economia Federal, amplamente noticiada pelos meios de comunicação, o que evidencia as limitações enfrentadas pela população brasileira de baixa renda para ter acesso aos serviços bancários e como a política social brasileira encontra-se dependente e subordinada a sistemática estabelecida pelas instituições bancárias.

No âmbito da saúde, o Governo Federal publicou o Decreto nº 10.530, de 26 de outubro de 2020, para incluir o setor de atenção primária à saúde no âmbito do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República - PPI, para fins de elaboração de estudos de alternativas de parcerias com a iniciativa privada para a construção, a modernização e a operação de Unidades Básicas de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. A crise de saúde e sanitária intensificada no país em razão da pandemia ocasionada pelo Coronavírus não são suficientes para desestimular os processos de privatização e financeirização das políticas sociais, que busca ampliar os espaços possíveis de ocupação do capital financeiro, em prejuízo para o provimento público e gratuito de serviços essenciais.

A repercussão negativa causada pela intenção do Governo Federal de privatizar as Unidades Básicas de Saúde ensejou a revogação do Decreto nº 10.530/2020, 02 (dois) dias após a sua publicação. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, 71,5% da população brasileira depende do Serviço Único de Saúde (SUS), ou seja, trata-se de uma população extremamente sensível e vulnerável às modificações no serviço público de saúde, especialmente aquelas inclinadas para a privatização e a cobrança de contraprestações pecuniárias.

Os exemplos acima mencionados ilustram o modo como o poder público encontra-se condicionado aos mecanismos de financeirização para a efetivação de políticas públicas, inclusive aquelas destinadas à população de baixa renda, que apesar da pouca instrução e do acesso escasso às condições básicas de vida (como habitação, saneamento, serviços de saúde, alimentação, etc.), tornaram-se público-alvo para o direcionamento de políticas de expansão do espaço de ocupação do capital financeiro. Multiplicam-se, assim, a existência de famílias cada vez mais dependentes do acesso ao crédito (capital portador de juros) para usufruir de direitos básicos, em favor dos interesses dominantes do capitalismo financeiro.

No âmbito da educação superior, a expansão do setor privado conta com o apoio do Governo Federal que se materializa através de programas de oferta de vagas para estudantes em instituições de ensino superior privadas, com aporte financeiro do setor público. Dentre estes programas, destacam-se o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Programa Universidade para Todos (Prouni), com oferta massiva de vagas, e, consequentemente, grandes repasses de recursos públicas para instituições que possuem capital aberto na bolsa de valores, consoante permissão contida na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996).

O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), instituído por meio da Medida Provisória (MP) nº 1827, de 27 de maio de 1999, reeditada por meio de outras três medidas provisórias, com conversão na Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2000, é um fundo de natureza contábil, destinada a concessão de financiamentos a estudantes regularmente matriculados em cursos superiores não gratuitos e com avaliação positiva nos processos conduzidos pelo Ministério da Educação (MEC).

O Programa Universidade para Todos (Prouni) do Ministério da Educação, por sua vez, criado em 2005 e atualmente regulamentado pela Instrução Normativa RFB Nº 1394, de 12 de setembro de 2013, é um programa que converte tributos não pagos por instituições privadas de ensino superior em vagas e bolsas de estudo integrais e parciais (50%) para alunos de baixa renda. Ao todo, a instituição privada de ensino superior, com fins lucrativos ou sem fins lucrativos não beneficente, que aderir ao Prouni fica isenta do pagamento da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), Contribuição para o PIS/Pasep, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), e do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ). O benefício fiscal concedido pelo Prouni é computado como despesa pela Receita Federal.

Segundo Lavinas et al. (2017), há um contrassenso nas políticas públicas de oferta de vagas em instituições de ensino superior privadas, especialmente no Fies, tendo em vista que o percentual de estudantes universitários em instituições privadas já alto, passou de 70% em 2003 para 75% em 2015 (INEP, 2016), enquanto o gasto com Fies, nesse mesmo ano, alcança pouco mais de R$ 15 bilhões, contra R$ 1,3 bilhão em 2003 e passa a representar 46% de toda a despesa do governo federal com universidades públicas federais em 2015 (TESOURO NACIONAL, 2016). Essa progressão geométrica do crédito estudantil em curto espaço de tempo estimulou a formação de grandes conglomerados na área da educação, a exemplo do Grupo Kroton que se estabeleceu como a maior empresa de educação (básica e superior) da América Latina, detentor de mais de 80% das matrículas no Ensino Superior, entendida como expressão do processo de financeirização da educação superior brasileira (SOARES, 2018).

Em contrapartida, foram identificadas fragilidades na fiscalização do Fies, especialmente no que tange ao limite de preço por mensalidade, o que permitia que a instituição de ensino superior cobrasse preços acima dos praticados pelo mercado (SILVA e SOARES, 2019).

Ao analisar a financeirização a partir da repercussão na vida dos indivíduos e das famílias, observa-se a articulação de projetos e esquemas que visam incorporar as famílias de baixa renda e de classe média nos mercados financeiros através da participação em planos de pensão, hipotecas residenciais, seguros e outros produtos financeiros comercializados em massa. Ao participar dos mercados financeiros, os indivíduos são incentivados a internacionalizar novas normas de tomada de risco e desenvolver novas subjetividades como investidores ou proprietários de ativos financeiros (ZWAN, 2014). 

É o que Zwan (2014) define como financeirização do cotidiano, caracterizada pela forte tendência do mercado financeiro de buscar atender as necessidades básicas das pessoas, através de serviços que, em tese, deveriam ser providos pelo poder público, em consonância com os ditames do Estado de Bem-estar Social. Agora, o indivíduo é frequentemente incentivado a comprar produtos para se proteger contra as incertezas da vida. Assim, tem-se uma ampliação da democratização das finanças como resultado da convergência das finanças e do ciclo de vida.

Os estudos de Fine (2009) sobre a relação existente entre a financeirização e a política social, demonstram que a financeirização permite ao setor privado alterar a atuação do setor público, que passa a incorporar os mercados financeiros ao processo de provisão, como mais notável habitação e pensões. Com isso, tem-se que a financeirização exerce maior influência, direta e indiretamente, sobre aspectos econômicos, sociais e políticos, tornando-se capaz de colocar aspectos da vida econômica e social em risco de volatilidade por parte de instabilidade e, inversamente, coloca a economia em risco de crises próprias dos mercados particulares.

Stockhammer (2010) salienta que os efeitos da financeirização nas famílias foram tão profundos quanto os das empresas, visto que, indivíduos e famílias se acostumaram a confiar no crédito. Como consequência, observou-se mudanças de atitudes, tanto no âmbito familiar, quanto no âmbito das instituições e dos instrumentos financeiros, com destaque para o uso generalizado de cartões de crédito. Os níveis de endividamento das famílias aumentaram acentuadamente desde meados da década de 1970. Em termos de volumes, o crédito hipotecário é a forma mais importante de crédito às famílias em todos os países.

Sobre o endividamento das famílias, Stockhammer (2010) questiona se este fenômeno decorre de um processo racional de decisão ou de um processo social e cultural mais amplo, visto que, para grande parte da literatura mainstream, as famílias aumentaram racionalmente suas dívidas à medida que sua riqueza aumentava, enquanto, do ponto de vista da economia política, o aumento da dívida das famílias é o resultado do aumento das normas de consumo em face da massa estagnada. Tendo em vista que uma parte substancial da dívida acumulada se deve às famílias que mantêm níveis de consumo insustentáveis, considera-se que se trata de um fenômeno irracional, cujas causas e explicações se encontram relacionadas com processos sociais e culturais atrelados a uma perspectiva macroeconômica.

Ao agir de acordo com os interesses do capitalismo financeiro, o poder público permite a existência de constantes falhas e o sucateamento dos serviços públicos, como ocorre com a previdência, a saúde e a educação, tornando estes serviços como espaços possíveis para a ocupação e a ampliação dos oligopólios movidos por interesses rentistas e pela maximização do valor ao acionista. Assim, serviços básicos que a priori deveriam ser providos pelo poder público, transformam-se em verdadeiras necessidades do indivíduo, providos pelos setores privados e financeiros, por meio de contraprestação pecuniária do usuário.

 A situação mostra-se ainda mais complexa quando o poder público contribui diretamente com a expansão do capitalismo financeiro, em detrimento da oferta de serviços públicos, através da privatização de estatais e parcerias público-privadas, que compreendem o repasse de recursos públicos para instituições privadas e financeiras.

Ao cidadão, resta adquirir produtos e serviços ofertados pelo capitalismo financeiro, de modo insustentável e irracional (STOCKHAMMER, 2010), e assumir os níveis crescentes de comprometimento da renda e o endividamento. Em outras palavras, é o indivíduo que arca com o ônus (que se materializa por meio do dispêndio de recursos financeiros e da perda de direitos e garantias asseguradas constitucionalmente) e sustenta toda a sistemática financeira que se impõe no cotidiano das famílias dos países em desenvolvimento, a exemplo do Brasil.

Ao considerar o caráter regressivo da carga tributária brasileira, que afeta principalmente os trabalhadores formais e servidores públicos, enquanto as grandes fortunas não são tributadas no Brasil (SALVADOR, 2012; 2016) e relacionar este aspecto com a financeirização das políticas sociais, pontua-se que a população brasileira, para ter acesso a determinados serviços considerados essenciais, como a saúde e a educação, arca com todo o ônus, custeando-o em dobro: ao pagar os tributos e ao realizar contraprestações pecuniárias para instituições privadas (que já possuem aporte financeiro de recursos públicos).

Lavinas et al. (2018) pontua as principais consequências do processo de financeirização em curso no Brasil, que são: a retração da massa salarial, com agravamento da desigualdade de renda; prevalência de especulação; aumento do consumo em decorrência da forma de expansão do crédito, que resulta no aumento significativo do grau de endividamento das famílias; e a tendência de que a participação dos juros venha a superar a parcela do lucro no Produto Interno Bruto (PIB). A autora destaca que as novas formas de endividamento decorrem de uma estratégia viciosa, marcadamente neoliberal, segundo a qual, a função política social destina-se primordialmente ao acesso ao setor financeiro ou à aquisição de serviços, em detrimento do dever estatal de assegurar níveis crescentes de bem-estar social.

Em síntese, a financeirização consiste num processo de dominância do capital financeiro e transnacional, que se sobrepõe ao capital produtivo e se entrelaça com os aspectos econômicos e sociais, tanto das empresas, quanto das famílias. O acesso ao crédito e a oferta de serviços financeiros têm tornado as famílias cada vez mais reféns dos efeitos indesejados decorrentes da financeirização, tais como, a precarização dos serviços públicos e o endividamento dos indivíduos.

Com o intuito de visualizar e discutir a repercussão da financeirização das políticas públicas no cotidiano das famílias, o tópico a seguir apresentará o resultado de um levantamento acerca das condições de endividamento e empregabilidade dos estudantes beneficiários do Fundo do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), tido como a maior estratégia de expansão do ensino superior no Brasil nos últimos anos.

 

Análise dos desdobramentos do financiamento estudantil para os estudantes

A financeirização das políticas sociais compreende um processo de estreitamento das relações entre o poder público e o capital financeiro mundializado, no qual a diversificação das parcerias público-privadas e das fontes de financiamento corroboram para a ambiguidade entre os papeis assumidos pelo Estado e pelas instituições financeiras: ora atuam como gestores das políticas e gastos públicos, ora atuam em favor da ascensão do capital financeiro e propiciam o máximo valor ao acionista.

 Para além da relação entre Estado e instituições financeiras, as famílias surgem como atores dependentes da dinâmica estabelecida pela financeirização das políticas públicas. Os indivíduos e suas respectivas famílias estão inseridos num contexto de acesso e dependência ao crédito para ter acesso a serviços essenciais, como saúde, previdência, educação e habitação. Dentre as consequências, destaca-se a existência de níveis crescentes e insustentáveis de consumo e endividamento.

Quanto ao Fies, a análise dos níveis de endividamento suportado pelos estudantes e suas famílias ao longo dos anos nos permite compreender os efeitos e a extensão desta política pública, cuja base consiste no repasse de recursos públicos para instituições privadas e financeiras, em perfeita simetria com o processo de financeirização das políticas sociais, em prol da ampliação dos espaços possíveis de ocupação do capitalismo financeiro.

Para tanto, é importante compreender que a carteira de financiamentos concedidos no âmbito do Fies até 2017 está distribuída em três fases, que são a fase de utilização, fase de carência e fase de amortização, que se diferenciam conforme definição a seguir transcrita:

a) Fase de utilização: período no qual o estudante está cursando o ensino superior e está limitado ao prazo de duração regular do curso. Nessa fase o estudante realiza o pagamento, a cada três meses, do valor referente aos juros incidentes sobre o financiamento; b) Fase de carência: período que se inicia logo após a conclusão do curso; (...) e c) Fase de amortização: período que se inicia no mês imediatamente seguinte ao final da fase de carência, quando é estabelecido o valor das prestações que o estudante irá pagar mensalmente até a liquidação do financiamento, cujo prazo poderá alcançar cerca de três vezes o período financiado do curso (grifo nosso) (FNDE, NOTA TÉCNICA Nº 3/2019/COFIN/CGSUP/DIGEF, 2019, p. 7).

 

Ademais, é importante mencionar que o Comitê Gestor do Fies (CG-Fies), por meio da Resolução nº 27, de 10 de setembro de 2018, estabeleceu que os contratos em atraso são aqueles com prestações não pagas a partir do primeiro dia após o vencimento e que os inadimplentes são aqueles com prestações não pagas a partir do nonagésimo dia após o vencimento da prestação, observados na fase de amortização do financiamento. Para acionar a garantia estabelecida pelo FG-Fies ou FGEDUC, é necessário um atraso igual ou superior a 360 dias.

A Figura 1 apresenta dados sobre as taxas de inadimplência do Fies, entre os anos de 2014 a 2019, com base nos contratos formalizados até dezembro de 2017, e refletem o resultado das alterações realizadas até a segunda fase do Fies, período em que houve maior flexibilização nas regras do financiamento, tanto para acesso dos estudantes, quando para adesão das IES-privadas ao fundo. Em 2014, a taxa de inadimplência alcançou o percentual de 29,21%, o que ensejou as reformulações realizadas a partir de 2015 (terceira fase do Fies). Não obstante, as taxas mantiveram-se crescentes, alcançando o percentual de 50,48% em 2019.

 

Figura 1 - Taxa de Inadimplência do FIES dos contratos formalizados até dezembro/2017 (2014 a 2019)

Fonte: Elaboração própria, com dados do FNDE (2020).

 

Sobre a inadimplência dos estudantes, levantamento realizado pelo Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMAP, 2019) indica que a flexibilização das regras ocorrida na segunda fase contribuiu para a expansão do programa e para a elevação substancial do risco fiscal do Fies. A Tabela 1 apresenta a distribuição da inadimplência conforme dias de atraso do pagamento e fases do Fies, com base nos contratos existentes em janeiro de 2019. A partir da análise destes dados, é possível observar que o maior índice de inadimplência se encontra concentrado entre os anos de 2010 e 2014, atingindo o percentual total de 87,1%, com 41,9% de contratos em atraso acima de 360 dias.

 

Tabela 1 - Distribuição da inadimplência segundo dias de atraso do pagamento e fases do Fies – posição de jan/2019

Fase do Fies

 

 

 

Pagamento em atraso

Primeira Fase

Segunda Fase

Terceira fase

Total

30 a 90 dias

0,1%

18,4%

5,7%

24,1%

90 a 360 dias

0,0%

26,8%

5,3%

32,2%

Acima de 360 dias

0,1%

41,9%

1,7%

43,7%

Total

0,2%

87,1%

12,7%

100%

Fonte: CMAP (2019).

 

A Tabela 2, por sua vez, apresenta dados sobre o saldo devedor total e o saldo devedor inadimplente desagregados por tamanho do saldo devedor para contratos em fase de amortização (A) e em todas as fases (B) (CMAP, 2019). Os dados evidenciam que a taxa de inadimplência é inversamente relacionada ao valor da dívida. Ao considerar a taxa de inadimplência de até 90 dias, nos contratos em fase de amortização, observa-se que as dívidas com valores de até R$20.000,00 possuem taxa de inadimplência de aproximadamente 50%, reduzindo para aproximadamente 45% nos contratos com dívidas entre R$20.000,00 a R$100.000,00; e para apenas 16% nos contratos com dívidas acima de R$100.000,00. Verifica-se ainda que ocorre uma diminuição nas taxas de inadimplência acima de 360 dias, quando comparadas às taxas de inadimplência de até 90 dias.

Ao considerar os contratos em todas as fases, é possível notar que o maior índice de inadimplência se concentra nas dívidas de até 20.000,00 reais, com atraso de até 90 dias, com variação de inadimplência entre 50% e 40%. Por sua vez, a maior taxa de inadimplência identificada encontra-se nos contratos de até R$5.000,00 reais, com atraso de até 90 dias, no percentual de 54%. Ao analisar o número de contratos com saldo devedor, observa-se maior concentração entre os contratos com dívidas de até R$20.000,00. Esses dados corroboram para ilustrar a fragilidade de uma política pública desenvolvida com base no acesso ao crédito para a parcela da população mais desfavorecida economicamente, que de modo geral possuem dificuldades financeiras para suprir necessidades básicas, como a própria alimentação, o que persiste quando se trata da necessidade de honrar com as dívidas decorrentes do financiamento estudantil.

 

Tabela 2 - Saldo devedor total e inadimplente por faixa de saldo devedor – posição de jan/2019

(A)     Contratos em fase de amortização

Faixas de saldo devedor (R$ mil)

Saldo devedor (R$ milhões)

Saldo inadimplente

(R$ milhões)

90 dias

Saldo inadimplente

(R$ milhões)

360 dias

Taxa de inadimplência

90 dias

Taxa de inadimplência

360 dias

Nº de contratos

 

Até R$ 5 mil

467

225

190

48%

41%

170.760

 

5 a 10

1293

667

575

52%

44%

174.310

 

10 a 15

1811

931

776

51%

43%

145.659

 

15 a 20

2020

1001

800

50%

40%

116.049

 

20 a 25

2064

983

764

48%

37%

92.216

 

20 a 25

1983

916

690

46%

35%

72.385

 

30 a 40

3514

1558

1107

44%

32%

101.490

 

40 a 50

3011

1316

889

44%

30%

67.447

 

50 a 100

6334

2722

1582

43%

25%

98.977

 

Acima de 100

3567

556

264

16%

7%

19.794

 

Total

26063

10875

7637

42%

29%

1059.087

 

 

(B) Contratos em todas as fases

 

 

 

Faixas de saldo devedor (R$ mil)

Saldo devedor (R$ milhões)

Saldo inadimplente

(R$ milhões) 90 dias

Saldo inadimplente

(R$ milhões) 360 dias

Taxa de inadimplência 90 dias

Taxa de inadimplência 360 dias

Número de contratos

 

Até R$ 5 mil

778

418

340

54%

44%

264674

 

5 a 10

2374

1236

1019

52%

43%

319782

 

10 a 15

3619

1679

1321

46%

37%

290270

 

15 a 20

4513

1868

1394

41%

31%

258804

 

20 a 25

5027

1880

1332

37%

26%

224183

 

20 a 25

5236

1813

1203

35%

23%

190869

 

30 a 40

10591

3261

1937

31%

18%

304603

 

40 a 50

10940

2856

1498

26%

14%

243917

 

50 a 100

35709

7075

2828

20%

8%

532598

 

Acima de 100

20340

1429

469

7%

2%

107183

 

Total

99127

23515

13341

24%

13%

2736883

 

Fonte: CMAP (2019).

 

De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), em janeiro de 2019, 60% das famílias brasileiras estão endividadas, sendo que 38% destas famílias possuem dívidas em atraso. Do modo geral, 22,9% das famílias brasileiras possuem dívidas em atraso (Tabela 3).

 

Tabela 3 - Pesquisa de inadimplência e endividamento do consumidor (PEIC) - janeiro/2019

PEIC (% do total de famílias)

Total - %

Número Absoluto

Famílias endividadas

60,1%

9.696.781

Famílias com conta em Atraso (% dos endividados)

38,0%

-

Famílias com conta em Atraso

22,9%

3.635.636

Famílias que não terão condições de pagar as dívidas em atraso

9,1%

1.501.033

Fonte: CNC (2021); elaboração própria.

 

Ao correlacionar estes dados com o percentual do saldo devedor dos contratos do Fies em fase de amortização, verifica-se que a inadimplência do Fies nesta fase encontra-se superior à média de inadimplência da população brasileira, visto que 42% dos contratos em atraso estão inadimplentes a mais de 90 dias, com maior concentração nas dívidas com valores de até 20 salários-mínimos.

Para análise das condições de emprego e renda dos beneficiários do Fies, a Tabela 4 apresenta dados relacionadas ao desempenho no mercado de trabalho, referentes aos contratos em todas as fases, em amortização, em utilização e inadimplentes (atraso superior a 360 dias) em amortização, calculadas a partir do cruzamento, por indivíduo, de dados do Fies com os dados da RAIS 2018 (CMAP, 2019). Grosso modo, a análise realizada pelo CMAP (2019) indica que em todas as fases do programa, mais da metade dos alunos trabalharam formalmente em 2018, e que nos contratos em fase de amortização, 83% dos alunos Fies possuíram emprego formal em algum momento entre 2010 e 2018, o que seria suficiente para indicar que os estudantes, em sua maioria, possuem experiência de trabalho no mercado formal, com condições de honrar com as dívidas decorrentes do Fies, inclusive por se tratarem de dívidas com valores considerados baixos, a maioria com saldo devedor de até 20.000 reais, conforme demonstra a Tabela 2.

Observou-se que uma parcela substancial dos contratos inadimplentes aparentemente teria condições de arcar com as prestações do programa, principalmente tendo em vista que grande parte dos mesmos possui dívidas de valor relativamente baixo. A título de exemplo, cerca de 30% do saldo inadimplente a mais de 360 dias se refere a dívidas de até R$ 20 mil. Outra evidência nesse sentido é o fato de que, em janeiro/2019, 36,3% dos contratos que possuíram vínculo formal com entidades empresariais estavam inadimplentes a mais de 360 dias, enquanto o mesmo indicador era de 41,2% para os indivíduos que não possuíam vínculo formal em 2018 (CMAP, 2019, p. 46).

Em que pese a contribuição do CMAP (2019) para a compreensão do modo de funcionamento e aperfeiçoamentos necessários no Fies, verifica-se que o dado “presença em alguma RAIS 2010-2018” não é suficiente para indicar que 83% dos beneficiários do Fies, no caso dos contratos em fase de amortização, possuem um vínculo de emprego duradouro para realizar o pagamento do financiamento estudantil. Isto porque este dado não indica a duração destes vínculos de empregos, apresentando-se de forma muito genérica.

 

Tabela 4 - Participação no mercado de trabalho formal – beneficiários do Fies por fase do contrato em jan/2019

 

Todas as fases

Utilização

Amortização

 

Contratos inadimplentes (>360 dias) em amortização

Presença na RAIS 2018

53,3%

49,0%

61,5%

56,9%

Remuneração média

R$ 2.513,09

R$ 2.049,88

R$ 2.909,76

R$ 2.356,56

Presença em alguma RAIS 2010-2018

73,9%

69,8%

83,0%

83,8%

% de comprometimento da renda

-

-

12,1%

13,7%

Fonte: CMAP (2019); elaboração própria.

 

No que se refere ao dado “Presença na RAIS 2018”, observa-se que apenas 61,5% dos beneficiários dos contratos em fase de amortização possuíam algum vínculo de emprego em 2018 (Tabela 8), o que indica que 39,5 dos beneficiários do programa após a conclusão do curso superior e o período de carência não possuíam nenhum vínculo empregatício no mesmo ano. Ao realizar a comparação entre a fase de utilização (durante a realização do curso), e a fase de amortização (após a formatura), observa-se que houve um aumento de apenas 12,5% dos beneficiários com algum tipo de emprego formal.

De acordo com dados da PNAD Contínua (2018 e 2019), a taxa de desocupação da população brasileira atingiu o percentual de 13,1% no primeiro trimestre de 2018 e de 12,7% no primeiro trimestre de 2019, muito abaixo do nível de desocupação indicado pela RAIS 2018 para os estudantes beneficiários do Fies.

No que tange à renda, a Tabela 4 indica os beneficiários do Fies possuem remuneração média no valor R$ 2.513,09, enquanto os inadimplentes encontram-se em situação mais desfavorecida, com remuneração média no valor de R$ 2.356,56.

Nesse ponto, o CMAP (2019) afirma que o Fies impacta positivamente na renda dos beneficiários, por proporcionar um “prêmio salarial”, ao considerar o aumento de aproximadamente 40% entre a remuneração mensal dos beneficiários que se encontram na fase de utilização e amortização. No entanto, uma análise mais apurada permite inferir que, na verdade, a rendimento médio dos beneficiários do Fies se encontra abaixo do rendimento médio da população brasileira com ensino superior completo, estimado no valor de R$ 5,494,00 no ano de 2018, conforme dados da PNAD Contínua (2020).

Corroborando com a discussão supramencionada, a Tabela 5 apresenta dados sobre o percentual de inadimplentes por natureza jurídica do empregador para todos os contratos (A) e para os contratos em fase de amortização (B), em janeiro de 2019 (CMAP, 2019). Observa-se que, na fase de amortização, 38,5% dos beneficiários do Fies encontram-se fora do setor formal de empregos, e neste grupo concentra-se a maior taxa de inadimplência do Fies, representando 51,9% dos inadimplentes acima 90 dias e 41,2% dos inadimplentes de acima de 360 dias.

 

Tabela 5 - Percentual de contratos e percentual de inadimplentes por natureza jurídica do empregador e fase do contrato em jan/2019

(A) Todas as fases

 

 

 

 

 

Variável

Inadimplência 90 dias

Inadimplência ≥ 360 dias

% dos contratos

% dos empregos

Administração Pública - Estatutário

28,8%

20,0%

4,4%

8,3%

Administração Pública - Outros

32,7%

22,6%

5,3%

9,9%

Entidades empresariais

37,6%

26,5%

38,6%

72,4%

Entidades sem Fins Lucrativos

33,8%

23,4%

4,6%

8,7%

Outros

30,6%

21,1%

0,3%

0,7%

Fora do setor formal

38,9%

28,9%

46,7%

n.a.

Total

37,3%

27,0%

100,0%

100,0%

 

 

 

 

 

 

(B) Amortização

 

 

 

 

 

 

Variável

Inadimplência 90 dias

Inadimplência ≥ 360 dias

% dos contratos

% dos empregos

Administração Pública - Estatutário

35,2%

26,8%

6,1%

9,9%

Administração Pública - Outros

39,6%

29,8%

7,4%

12,1%

Entidades empresariais

46,8%

36,3%

41,7%

67,8%

Entidades sem Fins Lucrativos

41,2%

31,2%

5,9%

9,6%

Outros

39,6%

30,5%

0,4%

0,6%

Fora do setor formal

51,9%

41,2%

38,5%

n.a.

Total

47,1%

36,8%

100,0%

100,0%

Fonte: CMAP (2019)

 

A análise dos dados acerca da inadimplência, renda e empregabilidade contribuem para um melhor entendimento sobre os efeitos sentidos pelos beneficiários do financiamento estudantil. Cabe destacar que o Fies, por se tratar de uma política pública educacional, não se exaure em si mesma, ou seja, os efeitos do Fies não podem ser mensurados apenas com base na quantidade de vagas no ensino superior, mas é imprescindível a existência de um olhar apurado para a repercussão deste financiamento na vida financeira dos estudantes, durante e após a conclusão do curso superior.

De modo geral, verificou-se que as taxas de inadimplência do Fies encontram-se superior às taxas de inadimplência da população brasileira, com maior concentração nas dívidas com valor de até R$20.000,00; acompanhada do alto índice de beneficiários do Fies fora do setor formal.

Ao contrapor estes dados com o aumento expressivo de vagas disponibilizadas em IES-privadas para estudantes do Fies (principalmente entre os anos de 2010 e 2014), acompanhado do repasse significativo de recursos público para estas instituições infere-se que o Fies constitui uma política de desenvolvimento educacional desacompanhada de qualquer noção de desenvolvimento, na forma explicitada por Fine (2014), quando descreve as políticas públicas com discurso desenvolvimentista, embora dissociadas de uma ideia consistente e duradoura de desenvolvimento. Na verdade, estas políticas corroboram para a hegemonia do capitalismo financeiro, em desfavor de uma população carente e cada vez mais submissa à sistemática financeira para ter acesso à serviços básicos e essenciais.

A inadimplência dos beneficiários do Fies não pode ser considerada apenas como um risco que prejudica a sustentabilidade fiscal do Fies, a ser tratada a partir de aperfeiçoamentos nos métodos de cobrança e renegociação da dívida, como sugere o CMAP (2019). Muito mais que isso, esta inadimplência representa a quebra de expectativa dos estudantes e suas famílias que assumem uma dívida a longo prazo, mas não encontram no mercado de trabalho condições de emprego e renda favoráveis o suficiente para honrar o compromisso assumido e proporcionar melhor qualidade de vida.

Os desdobramentos do financiamento estudantil na vida econômica dos beneficiários refletem a financeirização do cotidiano (ZWAN, 2014), que encontra nos serviços públicos espaço para a criação de novos serviços financeiros e incorpora as famílias de baixa renda e de classe média nos mercados financeiros, sendo o acesso ao crédito o meio mais rápido (não o mais eficaz) para a obtenção de direitos e garantias ainda considerados como fundamentais pela Constituição vigente.

 

 

 

Considerações Finais

 

A partir das análises realizadas no presente artigo tornou-se possível identificar os desdobramentos da financeirização da política pública para o ensino superior.  O Fies, principal programa governamental de expansão do ensino superior no país, exemplifica o modo como os ditames do capitalismo financeiro mundializado se consolida e se expande em todos os aspectos sociais, com consequências significativas para as condições de renda, empregabilidade e endividamento das famílias brasileiras.

Em troca da oferta massiva de vagas no ensino superior, o Fies proporcionou o repasse crescente de recursos públicos para instituições de ensino privadas, o que contribuiu para a valoração das ações destas instituições na bolsa de valores, em que pese a ausência de controle acerca da qualidade dos cursos ofertados até 2010, o que foi revisto apenas em decorrência da necessidade de revisar as condições de sustentabilidade econômica do programa.

Apesar da oportunidade encontrada pelos estudantes para ingressar e concluir o ensino superior, as condições de empregabilidade e renda apresentam-se muito distantes das condições almejada por esta parcela da população, visto que os dados analisados demonstram que os beneficiários do Fies possuem salários e participação no mercado formal de trabalho muito abaixo da média constatada para a população brasileira com ensino superior completo para esses mesmos índices.

Como se não bastasse, os beneficiários do Fies acumulam altos índices de endividamento, sendo estas as principais consequências de uma política pública desatrelada de uma estratégia de desenvolvimento duradoura, capaz de conciliar programas de oferta de cursos de qualidade com oferta de empregos e salários compatíveis com as funções desempenhadas pelos trabalhadores graduados. Nos contratos formalizados até dezembro de 2017, a taxa de inadimplência já alta em 2014 saltou de 20,21% para 50,48% em 2019, conforme dados do FNDE (2020). Em janeiro de 2019, observou-se que o maior índice de inadimplência concentra-se nos contratos com dívida de até R$20.000,00 (CMAP,2019), o que permite concluir que a inadimplência está intimamente direcionada para os beneficiários de baixa renda e que após a conclusão do curso superior não encontraram condições favoráveis de empregabilidade e renda.

Assim como no caso do Fies, a financeirização das políticas públicas proporciona a obtenção de altas taxas de lucro e o crescimento do setor privado e financeiro, enquanto as famílias sofrem os efeitos decorrentes da chamada financeirização do cotidiano (ZWAN, 2014): serviços públicos precários, níveis insustentáveis de inadimplência, baixa oferta de empregos e submissão à sistemática estabelecida pelas instituições financeiras.

O Estado, por sua vez, atua ativamente em prol dos interesses do capitalismo financeiro que amplia as formas de acesso ao fundo público, enquanto às instituições privadas e financeiras exercem o papel de verdadeiras gestoras das políticas públicas, impondo os seus interesses sobre o dever estatal de garantir direitos sociais básicos para a população brasileira, como a saúde, educação e a assistência social.

 

Referências

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