Mobilização cognitivo-pedagógica: confluência teórica no ensino de língua inglesa na EPT
Mobilizing cognitive skills: theoretical confluence in ELT in Vocational Teaching
Movilización cognitivo-pedagógica: la enseñanza del Inglés en la formación profesional integrada
Roberto Lima de Moraes Ramos
Instituto Federal de Brasília, Brasília, Brasil
roberto.ramos@ifb.edu.br - https://orcid.org/0000-0001-8826-6257
Veruska Ribeiro Machado
Instituto Federal de Brasília, Brasília, Brasil
veruska.machado@ifb.edu.br - https://orcid.org/0000-0002-7754-6947
Recebido em 08 de setembro de 2020
Aprovado em 10 de janeiro de 2023
Publicado em 20 de abril de 2023
RESUMO
Em resposta à lacuna didático-metodológica da teoria de educação integrada e, mais especificamente, em relação ao ensino de língua inglesa (LI) no Ensino Médio Integrado (EMI) no contexto da Educação Profissional e Tecnológica (EPT), este trabalho apresenta um alinhamento teórico de concepção didático-metodológica entre um modelo prático para desenvolver o pensamento crítico no ensino de LI (DUMMETT; HUGHES, 2019), a Pedagogia dos Multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2015) e proposta pedagógica para a formação integrada (RAMOS, 2016), com o intuito de propor uma sólida premissa a partir da qual se poderia pensar uma abordagem metodológica, para o ensino de LI no EMI em EPT, que consubstancie os preceitos filosóficos-conceituais da visão educacional subjacente a essa modalidade de ensino. A apresentação e o cotejamento das teorizações permitem identificar a Taxonomia de Bloom (1956), revisada por Anderson e Krathwohl (2001), como ponto de contato e parâmetro de comparação entre as teorizações. Nesse processo, vislumbrou-se o expediente pedagógico da mobilização cognitivo-pedagógica dos processos mentais e recursos didáticos na sala de aula. A identificação desse constructo, transversal ao conjunto das abordagens educativas analisadas, somado ao fato de que ele se coaduna com uma perspectiva originária da concepção integrada de formação integrada de sujeito e de sociedade (RAMOS, 2016), o habilita a ser considerado um ponto de partida para avançar os estudos de ensino de LI no EMI em EPT.
Palavras-chave: Ensino de Língua Inglesa; Formação integrada; Teorias didático-metodológicas.
ABSTRACT
In response to a teaching-methodology gap in the literature on Integrated Education, and more specifically, in relation to English Language Teaching (ELT) in a Technical High School (THS) setting, within the realm of Brazilian vocational education, this work presents a theoretical lining-up of concepts pertaining to three models for teaching: a working model for Critical Thinking in ELT (DUMMETT; HUGHES, 2019), a Pedagogy of Multiliteracies (COPE; KALANTZIS, 2015) and a teaching method for integrated human development (RAMOS, 2016). In doing so we strive to propose a sound teaching construct that can serve as a premise for advancing further research into a wider and more elaborate methodological approach in ELT, within the vocational setting of THS. This means aligning teaching practices with the educational and philosophical underpinnings of Integrated Education and its concept of all-round learning. By expounding and comparing the aforementioned theories, we identified Bloom’s taxonomy (1956), as revised by Anderson and Krathwohl (2001), as a baseline from which to align concepts among such theories. From this process a common underlying construct for teaching cognitive skills in the classroom emerged. The fact that such a construct has a cross-sectional presence among the analyzed theories, including one which stemmed from a kindred field to Integrated Education (RAMOS, 2016), accredits it as a worthy starting point from which to devise and craft a methodological approach to ELT in THS.
Keywords: English Language Teaching; All-round learning; Teaching Methodology.
RESUMEN
En respuesta a la brecha didáctico-metodológica en la teoría de la educación integrada y, más específicamente, en relación con la enseñanza del idioma inglés (ELT – English Language Teaching) en la Formación Profesional Integrada en Grado Medio (FPIGM), en el contexto de la Educación Profesional y Tecnológica (EPT) brasileña, en esta obra se presenta una alineación teórica del diseño didáctico-metodológico entre un modelo práctico para desarrollar el pensamiento crítico en la enseñanza del ELT (DUMMETT; HUGHES, 2019), la Pedagogía del Multialfabetización (COPE; KALANTZIS, 2015) y propuesta pedagógica para la formación integrada (RAMOS, 2016), con el fin de proponer una premisa sólida a partir de la cual se pueda pensar un enfoque metodológico, para la enseñanza del ELT en la FPIGM en EPT, que encarne los preceptos filosófico-conceptuales de la visión educativa que subyace a este modo de enseñanza. La presentación y el cotejo de las teorizaciones permiten identificar la taxonomía de Bloom (1956), revisada por Anderson y Krathwohl (2001), como punto de contacto y parámetro de comparación entre las teorizaciones. En este proceso se observó la estrategia de movilización cognitivo-pedagógica de procesos mentales y recursos didácticos en la clase. La identificación de este constructo, transversal a todos los enfoques educativos analizados, sumado al hecho de que es coherente con una perspectiva proveniente de la concepción integrada de la formación de sujetos y de la sociedad (RAMOS,2016), permite considerarlo como un punto de partida para avanzar en los estudios de la enseñanza de la LI en la FPIMG en la EPT.
Palavras-chave: Enseñanza del inglés; Formación integrada; Teorías didáctico-metodológicas.
Introdução: uma lacuna didático-metodológica
O ensino de língua inglesa (LI), no âmbito do Ensino Médio Integrado (EMI), tem carecido de referências metodológicas sólidas, que procurem alinhar a prática educativa com sua concepção filosófica (BEZERRA, 2012; e FERRARINI-BIGARELI, 2016). Tal concepção refere-se à educação integrada, que, há aproximadamente duas décadas, tem fortemente impactado o campo da Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no Brasil.
Apesar de associada ao campo da EPT de uma maneira geral, a educação integrada conceptualizou-se, mais substancialmente, a partir de reflexões acadêmicas sobre o ensino médio no contexto da EPT, iniciadas em 2003 (DIAS, 2015, p. 104-106), que resultaram em uma significativa produção acadêmica sobre ensino técnico profissionalizante (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005; MOURA, 2007; SAVIANI, 2007; RAMOS, 2008). Essa proveria suporte ao avanço do conceito de educação integrada nas políticas públicas, cuja maior representação seria a criação e a expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT), desde 2008, consubstanciado, com maior proeminência, pelos Institutos Federais. Essa nova modalidade educacional no país motivou, por sua vez, outra leva de estudos acadêmicos sobre uma realidade agora não mais somente idealizada, mas materializada em uma rede e suas instituições, em processo de consolidação e evolução.
Revisão de literatura acadêmica que versa sobre a integração em EPT, por uma perspectiva genérica (VIEIRA, J.; VIEIRA, M., 2016), bem como uma que foca especificamente no campo de ensino de LI no EMI (FERRARINI-BIGARELI, 2016) permitem identificar uma significativa ausência de trabalhos de enfoque didático-metodológico que busquem alinhar práticas educativas e preceitos conceituais, dentro de uma perspectiva de educação integrada. Enquanto aquele primeiro corpus tem posto o conceito de currículo integrado no centro das discussões, este segundo tem buscado aplicar teorias convencionalmente associadas ao campo de ensino de LI – com destaque para o Ensino de Inglês para Fins Específicos (ESP – English for Specific Purposes (CHIULLI, 2013; SOUZA, 2013; SILVA, 2016) e (multi)letramentos (FERRAZ, 2012; SOUZA, 2013; PREDEBON, 2015, ARNT, 2018) – a contextos de EPT, norteados pelos objetivos educacionais da teoria de integração.
Assim, diante da quase ausência completa da questão didática na literatura sobre integração e a falta de uma abordagem metodológica clara para o ensino de LI em EMI em EPT a partir da teoria de integração, não surpreendem as inconsistências entre discurso – de professores e em documentos pedagógicos (diretrizes, regulamentos, orientações, planos de curso e planos de aula) – e práticas educativas observadas em sala de aula, tanto pela perspectiva de integração de forma geral (COSTA, 2012; BORGES, 2018; SALES; REIS, 2019), quanto especificamente no campo do ensino de LI (BEZERRA, 2012; e FERRARINI-BIGARELI, 2016).
A integração certamente é uma proposta ambiciosa, pois supõe uma nova e complexa concepção pedagógica que abrange nível macro e mircoeducacional. O nível macro envolve a coordenação de todo um curso e a articulação de seus vários componentes curriculares, por meio do currículo integrado; o nível micro, por sua vez, implica práticas educativas, na condução dos componentes curriculares, comprometidas com a visão educacional subjacente.
Araújo e Doriedson (2014) nos alerta que reestruturação de programas e projetos de ensino para configurar o currículo integrado, embora etapa necessária, não é condição suficiente para promover um ensino integrado. Com base em dados de pesquisa, concluíram que é na práxis docente da sala de aula que a integração tende a se efetivar. Nesse sentido, o ensino verdadeiramente integrado decorre de uma atitude e de uma intencionalidade crítico-consciente do educador para com ações pedagógicas renovadoras que expressem o ímpeto para a transformação social implícito à sua conceituação. É nesse âmbito da conscientização e da formação docente para práticas educativas integradoras que reside a pertinência da questão de uma abordagem didático-metodológica consistente e adequada.
A confluência dos dois campos acadêmicos – o de ensino de LI e o de educação integrada – sugere uma tentativa de convergência de suas teorias pedagógicas. Assim, uma abordagem metodológica para o ensino de LI no EMI em EPT deve considerar as especificidades do inglês como componente curricular e sua tradição metodológica, mas sem abrir mão de dialogar com referências didático-pedagógicas do campo originário do conceito de educação integrada. Pontos de contato entre os dois campos podem configurar uma premissa para se responder à lacuna da literatura destacada, rumo a uma abordagem metodológica própria para um ensino de língua inglesa que se poderia denominar de integrado.
Isto posto, esse artigo busca sinalizar um ponto de consonância entre duas teorias de ensino de língua e linguagem – a Pedagogia dos Multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2015) e o pensamento crítico no ensino de LI (DUMMETT; HUGHES, 2019) – e a teorização pedagógica histórico-crítica (RAMOS, 2016), associável à teoria de integração, sobre o qual se poderia fundamentar uma proposta de ensino integrado para o ensino de inglês no EMI em EPT. A partir de aproximações teóricas entre a educação integrada e a Pedagogia dos Multiletramentos (ARNT, 2018) e da identificação de conceptualizações comparáveis, por parâmetros de análise dos processos cognitivos na aprendizagem pertencente à Taxonomia de Bloom (DUMMETT; HUGHES, 2019), vislumbramos um movimento de mobilização cognitivo-pedagógico, que perpassa o conjunto dessas teorizações, e que, portanto, pode servir de ponto de partida para uma abordagem didático-metodológica de ensino de LI que se coadunaria aos objetivos educacionais implícitos à concepção de formação integrada subjacente ao EMI em EPT.
Nessa tarefa, trataremos, primeiro, de uma breve conceituação da perspectiva de educação à qual circunscreve nossa problematização, a partir da qual se contemplam os demais referenciais teóricos: a educação integrada e o Ensino Médio Integrado. Em seguida, apresentaremos uma proposta pedagógica substancialmente histórico-crítica e justificaremos sua caracterização como aquilo que mais se aproxima de uma proposta didática provinda da teoria de integração. Então, procederemos a expor uma teorização didático-metodológica pensada para o âmbito geral do Ensino de Língua Inglesa (ELT – English Language Teaching) – para falantes de outras línguas –, e sua fundamentação teórica, sobre processos cognitivos, que servirá de parâmetro para o cotejamento das teorizações analisadas. Com os parâmetros conceituais estabelecidos, passaremos a descrever a teorização da Pedagogia dos Multiletramentos e a traçar paralelos com as demais teorias.
Dessa forma, uma vez explanadas as teorizações didático-pedagógicas, estaremos em condição de elaborar análises e quadros comparativos, que possam ilustrar o constructo de mobilização cognitivo-pedagógico, aplicá-lo à primeira proposta histórico-critica para a formação integrada e, assim, legitimá-lo como uma possível premissa para se pensar em um ensino integrado de LI no EMI em EPT.
Educação integrada e Ensino Médio Integrado
A educação integrada representa uma concepção peculiar de formação de ser humano e, consequentemente, de sociedade, que se circunscreve à tradição de ideal socialista de educação omnilateral e politécnica (LOTTERMANN; SILVA, 2016). A educação politécnica é uma proposta marxiana de formação humana holística, que pretende capacitar o sujeito para exercer ou adaptar-se a qualquer trabalho e, assim, poder transformar seu meio e produzir sua própria existência. A omnilateralidade, por sua vez, representa a ideia de se formar “todo ser humano em sua integralidade física, mental, cultural, política e científico-tecnológica” (CIAVATTA, 2005 p. 86).
Assim, a proposta de educação integrada procura opor-se às forças e tendências alienantes da organização de produção capitalista, que, historicamente, tem favorecido a oferta social de dois tipos de educação e de escola: uma para a elite dirigente e outra para a classe trabalhadora – que visivelmente tem caracterizado a sociedade brasileira (MOURA, 2007). Contraposto a esse dado estruturante de desigualdade social, está a proposta gramsciana de Escola Unitária, da mesma corrente socialista, que visa a universalizar o acesso a uma educação humanística que contemple tanto a cultura do trabalho manual, quanto a do pensar (SAVIANI, 2007). Dessa forma, pretende-se formar cidadãos plenos para atuarem no mundo e regularem as próprias vidas, bem como para questionarem o paradigma capitalista vigente e promoverem a construção de uma sociedade mais solidária e igualitária.
No bojo dessa teorização, a concepção histórico-ontológica do trabalho como princípio educativo e formativo (SAVIANI, 2007) faz do Ensino Médio a instância, por excelência, para se implementar a educação integrada. Primeiramente porque o Ensino Médio representa “a etapa biopsicológica e social de seus estudantes em que ocorre o planejamento e a necessidade de inserção no mundo do trabalho, no mundo adulto” (RAMOS, 2008, p. 12); e, em segundo lugar, porque, conforme análise de dados de Moura (2013), no contexto socioeconômico brasileiro, muitos jovens da classe trabalhadora não podem se dar ao luxo de esperarem terminar uma graduação para procurarem emprego – como o fazem muitos dos jovens de extratos médios e altos da população – e precisam se capacitar para ingressar no mundo do trabalho já em idade escolar do Ensino Médio.
É nesse sentido que Ramos (2008) se refere ao EMI como um projeto político-pedagógico para a educação e a sociedade brasileira. Um projeto que suscita uma postura ética, uma vez que implica conhecimento de um problema bem como os meios para superá-lo (NOSELLA, 2003 apud RAMOS, 2008, p. 13). Assim configuram-se os pressupostos da Educação Profissional Técnica de Nível Médio, por uma perspectiva de educação integrada – uma modalidade de ensino que combina a formação do Ensino Médio com uma das várias profissões técnicas, comumente conhecido como Ensino Médio Integrado, ou, pela sua sigla, EMI.
Uma pedagogia histórico-crítica para a educação integrada
Como se percebe, a integração constitui uma teoria pedagógica elaborada e consistente. No entanto, essa teorização não tem enfatizado a dimensão didático-metodológica. A falta de foco nessa dimensão na literatura de integração encontra simbolismo máximo no texto de Araújo e Frigotto (2015). Apesar de seu título, Práticas pedagógicas e ensino integrado, o texto se limita a reiterar a relevância da práxis para a efetivação de um ensino integrado e a referenciar, de forma genérica, estratégias didáticas – problematização, trabalho coletivo e cooperativo, e autogestão para promover a autonomia – sem tratá-las em profundidade e sem sistematizá-las de uma forma metodológica. Ao afirmarem que não se pode conceber o ensino integral por meio de uma metodologia única, não apresentam metodologia alguma. Assim, a discrepância entre o título desse artigo e sua substância é frustrante e sintomático de uma teorização pedagógica que tem se abdicado de tratar de mecanismos didáticos para garantir que a metodologia adotada em sala de aula reflita, de fato, os objetivos pretendidos.
Assim, apesar de não se encontrar uma proposta metodológica explícita na literatura específica de educação integrada, podemos recorrer a uma concepção pedagógica de um campo correlato, no qual teóricos da integração também desenvolvem suas concepções educacionais, a partir dos mesmos fundamentos para uma formação integrada de sujeitos: a pedagogia histórico-crítica. A afinidade entre os dois campos teóricos pode também ser corroborada pela ênfase que ambos conferem à natureza social da educação, com foco nos conflitos sociais e culturais constitutivos da sociedade e no desvelamento de ideologias, que as situa no campo das teorias críticas da pedagogia.
É nesse sentido que, para se pensar na dimensão didático-metodológica, a partir de concepção originária do campo da integração, nos respaldamos em uma proposta pedagógica apresentada no âmbito da pedagogia histórico-crítica, por uma das expoentes da teoria de integração. Em texto que contrapõe a pedagógica histórico-crítica à pedagogia das competências, com vistas a uma formação integrada do ser humano, Ramos (2016) concebe um processo da organização de elementos para a elaboração coletiva de uma proposta curricular integrada, cujo última etapa abrange a “Organização dos componentes, sequências, tempos e espaços disciplinares e interdisciplinares” (RAMOS, 2016, p. 70). Ao contemplar essa etapa, de natureza didático-metodológica, a autora então revisa “o método histórico-crítico de educação, baseado na contínua vinculação entre educação e sociedade” de Saviani (2005 apud RAMOS, 2016. p. 68), seus conceitos e categorias, para propor uma orientação à prática pedagógica, que reproduzimos a seguir:
Quadro 1 – Passos pedagógicos para uma formação integrada
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Tempos / espaços e práticas / passos pedagógicos |
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TEMPOS / ESPAÇOS |
PASSOS PEDAGÓGICOS |
1) |
Prática social como ponto de partida |
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2) |
Tempos de problematização (a síncrese como ponto de partida); |
Quando os educandos enfrentam os problemas da prática social a partir de seus próprios conhecimentos. |
3) |
Tempos de instrumentalização (ensino de conteúdos disciplinares com sua historicidade): |
O conhecimento já produzido precisa ser aprendido pelos estudantes de forma sistematizada e didática para que se tornem mediações para a superação da síncrese em direção à síntese, isto é, a compreensão do processo, do fenômeno, do problema ou do fato, agora não mais somente por sua sensibilidade empírica cotidiana, mas de forma pensada e elaborada. |
4) |
Tempos de experimentação (prática produtiva e social); |
Momentos disciplinares e / ou interdisciplinares de contato direto e, o quanto possível, prático, com o processo, fenômeno, problema ou fato, promovendo momentos em que se percebe a insuficiência dos conhecimentos que os estudantes possuem até então e se há a necessidade de aprendizagem de novos conhecimentos. |
5) |
Tempos de orientação (acompanhamento disciplinar ou interdisciplinar); |
Estudantes estão com o(s) professor(es) em relação dialógica, individualmente ou em grupo, sendo esses os propositores, cabendo aos professores conduzir o processo segundo as necessidades identificadas pelos estudantes. |
6) |
Tempos de sistematização (revisão de problemas, conteúdos e relações); |
Estudantes e professores estão juntos para atividades de sistematização dos conteúdos; permanecem como relação dialógica, mas o professor especialista assume o protagonismo, a partir dos conteúdos a serem trabalhados sistematicamente, inclusive por meio da exposição didática. Este é o momento em que se preserva a especificidade epistemológica e metodológica dos diferentes campos do saber. |
7) |
Tempos de consolidação (sínteses); |
Momentos de avaliações, sempre com a finalidade formativa, em que o estudante é desafiado e pode perceber singularmente limites e perspectivas de sua nova aprendizagem. |
8) |
Catarse como ponto de chegada |
Fonte: Ramos (2016, p. 71).
Segundo essa proposta, 1) uma pedagogia do ensino integrado parte de uma prática social. Concebemos essa prática como o conteúdo agregador ou tema/tópico guarda-chuva de outros conteúdos correlatos do currículo ou que possam surgir ao longo do processo de ensino-aprendizagem. 2) Uma vez escolhida a prática social, vigoram os Tempos de problematização, uma contextualização ou apresentação da prática social, em que esta é abordada por estudantes a partir de seus conhecimentos prévios, que pressupõem a síncrese – uma visão caótica da realidade analisada. 3) Passa-se, então, aos Tempos de instrumentalização, em que uma perspectiva ordenada da realidade sob análise, na forma de teorias histórico-científicas, é conhecida pelos estudantes por meio da mediação didática. 4) Seguem-se Tempos de experimentação, em que os estudantes buscam aplicar o que aprenderam, até então, de uma forma prática, para se promover a identificação dos aspectos do conhecimento que ainda precisam de maior pesquisa e/ou consolidação. 5) Sucedem-se Tempos de orientação, nos quais o professor orienta a agência dos estudantes na busca de preencher as lacunas dos conhecimentos identificados anteriormente. 6) Em seguida, vêm os Tempos de sistematização, quando o professor busca valer-se do conhecimento específico de sua área para sistematizar, pela mediação didática, os conhecimentos construídos pelos estudantes até então. 7) A última das fases operacionais são os Tempos de consolidação, ou seja, a avaliação, na perspectiva formativa, para o estudante perceber os resultados e os limites de suas aprendizagens. 8) Assim, chega-se ao resultado de catarse – apropriação dos conhecimentos culturais como elementos ativos para a transformação social.
Ramos (2016) explicitamente adverte contra uma interpretação excessivamente rígida e categórica dos passos apresentados, em reconhecimento à complexidade do ensino. Assim, admite o benefício da razoável flexibilização da estrutura e das etapas propostas, para acomodar a não-linearidade do processo educativo, bem como as ocorrências simultâneas de processos de aprendizagem diacrónicos e sincrônicos. Dessa forma, dispomos de uma proposta para se pensar a execução da ação pedagógica e para balizar a elaboração de sequências didáticas, no âmbito da sala de aula, por uma perspectiva educacional provinda da própria concepção de formação integrada.
O pensamento crítico no ensino de LI e processos cognitivos da aprendizagem
O que o ordenamento e o sequenciamento da proposta de passos pedagógicos para uma formação integrada, de Ramos, evidenciam é a lógica do planejamento didático com base na complexificação de processos educativos e na noção de pré-requisitos para a aprendizagem, segundo os princípios de causalidade e de progressividade. Essa lógica coaduna-se com a concepção dos processos do domínio cognitivo subjacente ao arcabouço teórico-metodológico proposto por Dummett e Hughes (2019), para o desenvolvimento do pensamento crítico no ensino de LI (para falantes de outras línguas).
Dummett e Hughes (2019) elaboraram um modelo prático e ilustrativo de articulação dos processos cognitivos e atividades típicas do campo de Ensino de Língua Inglesa (ELT – English Language Teaching), direcionado a estudantes que aprendem o idioma-alvo como uma língua adicional. Apresentamo-lo abaixo:
Figura 1 – Modelo prático para o pensamento crítico no ensino de LI
Fonte: Dummett e Hughes (2019, p. 103, tradução nossa).
Segundo esse esquema, o Pensamento Crítico articula processos cognitivos de Compreensão Básica em favor do Pensamento Criativo. Os autores, portanto, focam no Pensamento Crítico, por este servir de ponte que relaciona os processos de cognição de ordem simples com os de ordem complexa. Ao contemplar os tipos de atividades pedagógicas que integram cada uma dessas três grandes categorias do pensamento propostas (Compreensão Básica, Pensamento Crítico e Pensamento Criativo), nota-se que porção significativa do trabalho pedagógico em sala de aula de inglês tradicionalmente figura no âmbito do campo da Compreensão Básica. Esse é uma alerta feita por Dummett e Hughes que ecoa preocupação implícita à teoria cognitiva na qual seu modelo se baseia: a Taxonomia de Bloom de 1956.
Originalmente, em 1956, Bloom apresentou uma esquematização de processos cognitivos, para se pensar os objetivos educacionais de forma geral e de “como educadores poderiam explicitamente incorporar competências cognitivas de ordem elevada [complexa] em seus programas [educativos]” (DUMMETT; HUGHES, 2019, p. 6, tradução nossa). Assim, listou seis processos cognitivos, hierárquicos e acumulativos, do mais simples ao mais complexo, conforme a figura:
Figura 2 – Taxonomia original de Bloom
Fonte: Bloom (1956 apud DUMMETT; HUGHES, 2019, p. 6, tradução nossa).
Quase meio século mais tarde, em 2001, essa esquematização foi revista por Anderson e Krathwohl. O resultado foi a concepção dos processos cognitivos como ações interdependentes (expresso por verbos), com hierarquia mais difusa, ainda que se tenha reconhecido e mantido uma gradação crescente de complexidade cognitiva entre eles. Portanto, a sequência das seis categorias originais foi, assim, atualizada:
Figura 3 – Taxonomia revista de Bloom
Processos Cognitivos
Lembrar |
Entender |
Aplicar |
Analisar |
Avaliar |
Criar |
Fonte: Anderson e Krathwohl (2001 apud DUMMETT; HUGHES, 2019, p. 7, tradução nossa).
Com base em Dummett e Hughes (2019), grosso modo, Lembrar é resgatar informações às quais já foi exposto; Entender significa compreender informação nova ao valer-se dos conhecimentos prévios; Aplicar refere-se a usar o conhecimento construído recentemente em um outro contexto; Analisar representa a capacidade de decompor o conhecimento em partes e relacioná-los à formação da totalidade; Avaliar expressa a realização de julgamentos com base em critérios; e Criar é articular um conjunto de conhecimentos para a produção. Segundo Dummett e Hughes (2019), os três primeiros configurariam o que se concebeu como processos mentais de ordem simples, enquanto os três últimos seriam os considerados de ordem complexa. Ademais, central à revisão de Anderson e Krathwohl é a ideia de que o pensamento é um continuum dos processos cognitivos que se sobrepõe e entre os quais se transita constantemente de forma pendular – uma conceptualização em maior consonância também com a realidade da aprendizagem na sala de aula.
Conforme explicam Dummett e Hughes (2019) segundo seu esquema pragmático (Figura 1), Lembrar, Entender e Aplicar comporiam a primeira grande categoria do pensamento: Compreensão Básica, associando-se ao modelo histórico e tradicional de ensino da língua representado pelo método Present, Practice e Produce (PPP – Apresentar, Praticar, Produzir). Segundo esse modelo metodológico, apresentam-se aos estudantes elementos linguísticos novos, os quais praticam seu domínio com atividades controladas e depois tentam aplicar a um outro contexto mais livre, geralmente em relação a um aspecto de sua vida pessoal, para demonstrar o resultado da aprendizagem. Já o Analisar e o Avaliar constituiriam a categoria de Pensamento Crítico, que diz respeito a instigar os estudantes a analisar e a avaliar os sentidos construídos linguisticamente, seja escrito ou oralmente, na aquisição do idioma-alvo. Isso poderia ser feito, por exemplo, ao conduzi-los a induzir regras linguísticas, em vez de apresentá-las; ou ainda ao solicitar que expressem e justifiquem suas opiniões sobre afirmações em itens enunciativos de exercícios, que outrora só serviam para testar seu domínio de gramática e vocabulário. O Criar, por sua vez, representaria a categoria do Pensamento Criativo, o processo de gerar ideias novas e originais ou descobrir novas possibilidades. Por exemplo, poderia se lançar uma situação hipotética para que os estudantes pensassem em como agiriam; ou, ainda, propor a identificação dos elementos constitutivos de determinado gênero textual, a partir da qual se produziria texto próprio.
Observa-se, nesse modelo conceitual prático de promoção do pensamento crítico e, consequentemente, criativo (Figura 1), a sobreposição da categoria do Pensamento Crítico aos demais processos mentais e, logo, seu papel na articulação de todos para efetivar o Pensamento Criativo. O modelo permite reconhecer que a criatividade pode ocorrer com ou sem o pensamento crítico (DUMMETT; HUGHES, 2019).
Assim, o modelo se propõe a orientar um planejamento pedagógico na promoção de atividades de ensino de LI que desenvolvem o pensamento crítico (rumo ao criativo), de forma a articular os diversos processos mentais, em consonância com a concepção de que o pensamento crítico e a tarefas de resolução de problemas tendem a envolver as diversas categorias dos processos cognitivos (ANDERSON; KRATHWOHL, 2001; DUMMETT; HUGHES, 2019). Importante advertência no âmbito dessa teorização é o cuidado para não cair na armadilha de equacionar baixa proficiência linguística com processos mentais de aprendizagem de ordem simples (DUMMETT; HUGHES, 2019). Nesse sentido, persistiria a preocupação inicial implícita à Taxonomia de Bloom de se planejar atividades pedagógicas para se privilegiar os processos cognitivos de ordem complexa.
Toda essa racionalização dos processos cognitivos e suas implicações para o ensino, se não estão implícitas à proposta de Ramos, a ela pode ser justaposta. Podemos identificar (como veremos mais adiante), nos seus passos pedagógicos apresentados, no quadro 1, a concepção do percurso educativo pela articulação de processos mentais mais simples em favor dos mais complexos, admitindo-se a flexibilidade e a fluidez das categorias e da estrutura. Afinal, a formação integral do ser humano e o desenvolvimento de sua autonomia passam pela promoção de processos cognitivos. É por meio deles que se desenvolve o pensamento crítico e criativo, que ecoam os princípios da consciência histórico-social e de transformação da sociedade pelo trabalho da concepção de educação integrada.
Pedagogia dos Multiletramentos e integralidade na formação
A necessidade de ferramentas conceituais para tratar da aprendizagem no nível didático-metodológico em uma nova dimensão tecnológico-comunicacional da realidade social contemporânea do século XXI, tem conferido relevância à teoria dos multiletramentos e sua proposta pedagógica, sobretudo quando se trata do ensino na área da linguagem em um mundo altamente letrado. Nesse sentido, pesquisas no campo de ensino de LI para o ensino médio em EPT têm recorrido a essa teoria, na busca por um ensino mais eficaz (FERRAZ, 2012; SOUZA, 2013; PREDEBON, 2015; ARNT, 2018).
O termo multiletramentos foi cunhado em 1996 por dez acadêmicos da Austrália, dos EUA e da Grã-Bretanha, que se intitularam, the New London Group, em referência à cidade onde se reuniram em Connecticut, EUA. Juntos publicaram um manifesto que preconizava a necessidade de uma nova perspectiva de letramento condizente com o mundo globalizado e tecnológico que emergia. Argumentaram que, na era informacional, a multiplicidade de culturas e de modalidades de comunicação progressivamente condicionavam a vida social de tal forma que se requeria uma concepção de ensino-aprendizagem de leitura e escrita que fosse mais do que a simples soma de letramentos múltiplos. Na academia, a concepção de leitura e escrita já havia evoluído de mera apropriação de sistema de código linguístico, passando por serem considerados processos ativos de formação crítica e cidadã, a recursos linguísticos-comunicacionais para as diversas práticas sociais (ARNT, 2018). Agora, na era tecnológica da globalização, fazia-se necessário a escola considerar a leitura e a escrita no contexto da crescente presença dos vários modos de representação semiótica, muitas vezes mesclados, que faziam interagir diversos contextos culturais e influenciavam a cultura letrada.
As consequências cognitivas, culturais e sociais de tal multiplicidade de modos e culturas demandava, segundo o grupo de educadores, a adoção, pela escola, de uma pedagogia consciente dessa realidade: uma Pedagogia dos Multiletramentos. Com base na síntese dessa teoria por Rojo (2012), podemos dizer que o sujeito multiletrado deve se apropriar de conhecimento e desenvolver competência no domínio dos gêneros e dos modos das linguagens da prática social, por meio do pensamento analítico e crítico, que o capacite a transformar discursos e significações em novas formas, caracterizando-o como um criador de sentidos na recepção ou produção comunicacional. Para que essa perspectiva de formação, de muitos objetivos, pudesse ser efetivada, o New London Group propôs um esquema de categorias procedimentais correspondentes a suas partes: a prática situada, a instrução aberta, o enquadramento crítico e a prática transformada. Tais movimentos pedagógicos, expostos originalmente no seminal manifesto educacional A Pedagogy of Multiliteracies: designing social futures (CAZDEN et al., 1996), são melhor compreendidos pela reformulação pelos quais passaram, posteriormente, por dois pesquisadores do grupo, Mary Kalantzis e Bill Cope (2012), conforme ilustrado na figura abaixo:
Fonte: traduzido e adaptado de Cope e Kalantzis (2015, p. 5).
Podemos perceber na figura os quatro movimentos originais que foram renomeados, mas cujos objetivos e definições se mantêm. Ao mesmo tempo, cada quadrante foi subdividido em dois níveis de análise, criando, assim, maior nuance de operacionalização das etapas, que agora podem ser concebidas como sendo oito. A Exprienciação continua relativa às práticas sociais de linguagem da cultura dos estudantes e de como relacioná-las a outras práticas de outros universos culturais. A Conceituação refere-se a uma sistematização consciente dos elementos das práticas sociais de linguagem, que pode ser no nível de expressões ou no nível das ideias. A Análise representa o enquadramento crítico na interpretação das práticas sociais de linguagem, tanto analiticamente quanto avaliativamente. A Aplicação, por sua vez, representa o campo da prática transformada, em que se aplicam os conhecimentos construídos a um outro contexto, ou, a partir deles, se produz inovação. Para melhor compreender a conceituação desses campos de movimentos pedagógicos, podemos recorrer a um quadro complementar de Kalantzis e Cope, traduzido por Arnt (2018), que os exemplificam com atividades didáticas:
Fonte: Kalantzis e Cope (2012 apud ARNT, 2018, p. 63).
No que pese o sequenciamento dos movimentos pedagógicos no qual foram explanadas, não se trata de um processo linear. Como no caso das três teorizações apresentadas anteriormente, os teóricos fazem a mesma ressalva contra uma interpretação de lógica escalonar e de purismo categórico do processo de ensino-aprendizagem. Os movimentos não devem ocorrer em nenhuma ordem específica, nem devem se manifestar, cada um, em sua forma pura (KAWACHI, 2015).
Não é difícil perceber o paralelismo desse esquema da Pedagogia dos Multiletramentos com as demais teorizações apresentadas. As categorias cognitivas empregadas (experienciar, conceituar, analisar e aplicar) ecoam e se sobrepõem à renovada Taxonomia de Bloom em nomenclatura e substância; há um reconhecimento de uma dinâmica flexível entre as categorias. Atesta-se, ainda, pela concepção teorizada, uma preocupação com a promoção de processos cognitivos de ordem complexa como um dos objetivos educacionais principais para a formação humana plena, independentemente do nível escolar.
Além de traçarmos o paralelo entre multiletramentos e a concepção de educação integrada por meio dessa perspectiva dos processos cognitivo, cabe ressaltar que outros elementos sugerem uma compatibilidade entre a Pedagogia dos Multiletramentos e a integração. Conforme já sinalizou Arnt (2018) ambas teorias concebem o formando em uma tridimensionalidade plena. A Pedagogia dos Multiletramentos trata da formação cidadã para participação nas esferas do trabalho, da participação pública e da vida pessoal/comunitária. A integração, por sua vez, mira uma formação do sujeito para as esferas correlatas de participação cidadã ao se referir às categorias: pessoal, civil e profissional, no Documento Base da Ensino Profissional Integrado ao Ensino Médio (2007).
Quadro 2 – Comparação entre as esferas de participação em práticas de letramento na pedagogia de multiletramentos e nos documentos sobre educação profissional de nível médio
Letramentos (KALANTZIS; COPE, 2012) Para |
Ensino Médio Integrado (BRASIL, 2007) prevê formação |
KALANTZIS, COPE (2012) |
Trabalho |
Profissional |
Textos formais e informais, e-mail, relatórios, websites, sistemas. Significados multimodais em equipe, cliente, corporação e treinamento incluindo significados orais, escritos, visuais, gestuais e espaciais. |
Cidadania / Participação Pública |
Civil |
Níveis de cidadania: desde auto regulação de interesse ou grupos comunitários, a governo local, a assuntos de interesse nacional e internacional. Participação, debate e tomada consciente de decisões. |
Vida pessoal e comunitária |
Pessoal |
em interações diárias em famílias, bairros, na internet, etc. |
Fonte: Arnt (2018, p. 32).
Ao comparar ambas as teorizações, constatamos ainda, semelhanças conceituais quanto ao papel do professor e a concepções dos objetivos de formação educacional (ARNT, 2018). Logo, percebe-se uma noção de integralidade na formação do estudante para se inserir no mundo de forma autônoma, crítica, criativa e confiante implícita à teorização dos multiletramentos, que a aproxima conceitualmente da educação integrada.
Justaposições teóricas e a mobilização cognitivo-pedagógica
O que pudemos perceber, após explanar: os passos pedagógicos para uma formação integrada (RAMOS, 2016); o modelo prático para o pensamento crítico no ensino de língua inglesa (DUMMETT; HUGHES, 2019); e a Pedagogia dos Multiletramentos (ARNT, 2018; COPE; KALANTZIS, 2015), é uma concepção comum de mobilização de recursos cognitivos e pedagógicos, a partir de uma noção, igualmente compartilhada, de formação do sujeito em sua integralidade, ainda que essa concepção não seja a mesma entre as teorias. Entretanto, reconhecem que a atenção às diversas dimensões da formação humana capacitaria o sujeito a prosperar na sociedade, em constante mutação, do século XXI. Embora cada teorização apresente origem e enfoque específico, parecem todas concordar que a educação na contemporaneidade não pode negligenciar o desenvolvimento de determinadas faculdades cognitivas. Tal convergência conceitual se reflete nos paralelos das diferentes esquematizações, quando justapostas, conforme quadro abaixo:
Quadro 3 – Comparação de conceptualizações teóricas de processos cognitivos de aprendizagem
Modelo prático de pensamento crítico em LI |
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Compreensão básica |
Pensamento Crítico |
Pensamento Criativo |
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Taxonomia de Bloom (atualizada) |
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Lembrar |
Entender |
Aplicar |
Analisar |
Avaliar |
Criar |
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Pedagogia dos Multiletramentos |
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Experienciar |
Conceitualizar |
Aplicar Aprop. |
Analisar Func. |
Analisar Crit. |
Aplicar Cria. |
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o conh. |
o novo |
por nom. |
com teoria |
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Fonte: autoria própria.
Aqui, organizamos três das concepções teóricas que apresentam categorização e tipologia própria para expressar sua abordagem pedagógica. As seis categorias dos processos cognitivos para o ensino-aprendizagem, da Taxonomia de Bloom atualizada, no meio do quadro, funcionam como base de referência. A partir delas, Dummett e Hughes (2019) conceberam as três categorias do modelo prático para o pensamento crítico em LI, na parte superior do quadro. Assim, ao respeitar a sua lógica de sequenciamento de complexificação, correlacionamos os oito movimentos pedagógicos da Pedagogia dos Multiletramentos (COPE; KALANTZIS, 2015), na parte inferior do quadro, para demonstrar o paralelismo conceitual existente. Pela teorização dos multiletramentos apresentar a maior pluralidade de categorias, partimos de seus matizes de cores (inspirados na Figura 4) para sinalizar a aproximação dos conceitos com a Taxonomia de Bloom revisada.
Desse modo, o experienciar o conhecido e o experienciar o novo (multiletramentos) alinham com o Lembrar (Taxonomia de Bloom); nesse mesmo paralelismo, o conceitualizar por nomeação e o conceituar por teoria são compreendidos pelo Entender; o Analisar funcionalmente equipara-se ao Analisar e o Analisar Criticamente relaciona-se ao Avaliar; o Aplicar apropriadamente e o Apropriar criativamente, entretanto, foram separados visualmente, uma vez que o primeiro alinha-se ao Aplicar e o segundo ao Criar – não adjacentes no sequenciamento da Taxonomia de Bloom.
O paralelismo entre as três teorias nos permite concluir que, apesar de especificidades de cada uma, como propostas pedagógicas, as conceptualizações cotejadas reconhecem processos cognitivos similares no processo de ensino-aprendizagem, que se relacionam de forma dinâmica e não-linear, e que precisam ser mobilizados por atividades e recursos didáticos, de forma a desenvolver objetivos maiores de formação educacional. Não se pode pensar em formar o sujeito em uma concepção de integralidade, qualquer que seja, sem atentar-se a isso que denominamos de mobilização cognitivo-pedagógica.
Ao pensarmos especificamente na concepção de integralidade da teoria de educação integrada, cujo âmbito nos circunscrevemos, em resposta à lacuna didático-metodológica de seu campo, buscamos identificar esse conceito de mobilização cognitivo-pedagógica na proposta de ação docente em sala de aula que dispomos, apresentado de início, conforme quadro abaixo:
Quadro 4 – Mobilização cognitivo-pedagógica transversal às teorizações
Mobilização cognitivo-pedagógica transversal às teorias |
Modelo prático de pensamento crítico em LI |
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Compreensão básica |
Pensamento Crítico |
Pensamento Criativo |
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Taxonomia de Bloom (atualizada) |
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Lembrar |
Entender |
Aplicar |
Analisar |
Avaliar |
Criar |
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Pedagogia dos Multiletramentos |
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Tempos / espaços e práticas / passos pedagógicos p/ formação integrada |
Experienciar |
Conceitualizar |
Aplicar Aprop. |
Analisar Func. |
Analisar Crit. |
Aplicar Cria. |
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PASSOS PEDAGÓGICOS |
o conh. |
o novo |
por nom. |
com teoria |
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1) |
Prática social como ponto de partida |
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2) |
Quando os educandos enfrentam os problemas da prática social a partir de seus próprios conhecimentos. |
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3) |
O conhecimento já produzido precisa ser aprendido pelos estudantes de forma sistematizada e didática para que se tornem mediações para a superação da síncrese em direção à síntese, isto é, a compreensão do processo, do fenômeno, do problema ou do fato, agora não mais somente por sua sensibilidade empírica cotidiana, mas de forma pensada e elaborada. |
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4) |
Momentos disciplinares e / ou interdisciplinares de contato direto e, o quanto possível, prático, com o processo, fenômeno, problema ou fato, promovendo momentos em que se percebe a insuficiência dos conhecimentos que os estudantes possuem até então e se há a necessidade de aprendizagem de novos conhecimentos. |
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5) |
Estudantes estão com o(s) professor(es) em relação dialógica, individualmente ou em grupo, sendo esses os propositores, cabendo aos professores conduzir o processo segundo as necessidades identificadas pelos estudantes. |
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6) |
Estudantes e professores estão juntos para atividades de sistematização dos conteúdos; permanecem como relação dialógica, mas o professor especialista assume o protagonismo, a partir dos conteúdos a serem trabalhados sistematicamente, inclusive por meio da exposição didática. Este é o momento em que se preserva a especificidade epistemológica e metodológica dos diferentes campos do saber |
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7) |
Momentos de avaliações, sempre com a finalidade formativa, em que o estudante é desafiado e pode perceber singularmente limites e perspectivas de sua nova aprendizagem. |
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8) |
Catarse como ponto de chegada |
Fonte: autoria própria.
Com base no alinhamento das outras três teorizações abordadas, partimos para a identificação dos processos dominantes nos passos pedagógicos propostos por Ramos (2016) para uma formação integrada. Destacamos essa relação de dominância de processos cognitivos ao aplicar a codificação das cores aos termos empregados na descrição dos procedimentos pedagógicos, nas colunas à esquerda do quadro. Buscamos ainda representar os processos cognitivos predominantes de cada etapa didática pelo preenchimento das colunas da direita da tabela, com suas respectivas cores. Dessa forma, pode-se perceber a extensão do paralelismo que estabelecemos entre as três primeiras teorias a essa quarta teorização da prática educativa, mais propriamente associada à concepção de educação integrada.
Para efeitos da descrição da análise, utilizaremos uma mescla de terminologia das teorizações. Privilegiaremos a terminologia de Anderson e Krathwohl (2001), visto que é a mais distintiva entre as categorias e recorreremos à terminologia dos multiletramentos no caso da subdivisão das categorias da Taxonomia (o caso de Lembrar e Entender) e para reforçar semântica-chave à conceptualização do processo cognitivo, ao conservar termo relevante em parêntesis. Assim, as oito categorias a que nos referiremos são: Experienciar o conhecido, Experienciar o novo, Conceitualizar por nomeação, Conceitualizar por teoria, Aplicar (apropriadamente), Analisar (funcionalmente), Avaliar (criticamente) e Criar.
Assim, na etapa 2) Tempos de problematização, destacamos os processos cognitivos de Experienciar o conhecido, por meio da Aplicação (apropriada) de conhecimentos prévios ao problema da prática social contemplado. No momento 3) Tempos de instrumentalização, a compreensão dos conteúdos sistematizados alude ao entendimento implícito à Conceitualização por teoria, que engloba Conceituação por nomeação. Tal compreensão desperta um Experienciar o novo relativo ao conteúdo trabalhado, para mediar a superação da visão caótica da realidade, e sugere um Analisar (funcionalmente) nesse processo. Nos 4) Tempos de experimentação, segue o Experienciar o novo pelos conteúdos apresentados, preferencialmente pela Aplicação (apropriada) em contexto da prática, e possivelmente envolvendo Conceitualização por teoria e/ou por nomeação pelas perspectivas de outras áreas do conhecimento – o que enseja o Analisar (funcionalmente) no contínuo processo de apreensão de conteúdos e o Avaliar (criticamente) das lacunas na aprendizagem (em consonância com atividade apresentada na Figura 5, na perspectiva dos multiletramentos). Na etapa 5) Tempos de orientação, a relação dialógica entre professor e aluno demanda uma Aplicação (apropriada) dos conhecimentos construídos até então e faz prosseguir o Avaliar (criticamente) das próprias insuficiências pelos estudantes, pautado pela Conceitualização (por teoria e nomeação) promovida pela orientação docente. Em seguida 6) Tempos de sistematização representa a continuidade da relação dialógica professor-aluno, que abrange o Analisar (funcionalmente) e o Avaliar (criticamente) e o Conceitualizar (por teoria e nomeação), por meio da instrução explícita docente (ou instrução aberta, para referenciar terminologia oficial dos multiletramentos).
A descrição da última etapa operacional 7) Tempos de consolidação, por Ramos, configura-se um tanto lacônica, para os nossos propósitos, limitando-se a referenciar o Avaliar (criticamente), pelo monitoramento dos limites do processo de ensino-aprendizagem pelo estudante. No entanto, respaldado nas demais teorias e na perspectiva da avaliação formativa (VILLAS BOAS, 2006), mencionada na descrição da etapa, podemos inferir que o movimento pedagógico de consolidação do aprendizado envolveria a criatividade. Isso porque a noção de usar o conhecimento aprendido para promover novas ideias e novas possibilidades se coadunaria com atividades de aplicação de conhecimentos estudados a um novo contexto/desafio, típico de atividades elaboradas, para se verificar o resultado da aprendizagem. Nesse sentido, articular-se-ia o Experienciar (o novo transformado em) o conhecido, a Conceitualização por teoria e por nomeação da mediação didática e o Aplicar (apropriadamente) dos conhecimentos, com postura de Analisar (funcionalmente) a resolução da tarefa avaliativa proposta, para uma produção que implica o Criar com o Avaliar (criticamente) – de acordo com a observação de que atividade de pensamento crítico e de resolução de problemas tendem a envolver os diversos processos cognitivos (ANDERSON; KRATHWOHL 2001; DUMMETT; HUGHES, 2019).
Assim, concebemos que, em momentos de produção sujeitos à avaliação, deve-se exigir dos estudantes a articulação de todos os conhecimentos adquiridos na realização de alguma tarefa pedagógica. Tal tipo de tarefa deve mobilizar algum aspecto de todos os seis domínios de processos cognitivos (Taxonomia de Bloom). Precisa-se usar da memória, da conceituação e da capacidade de aplicação de conhecimentos para que se possa pensar criticamente e criativamente na solução de problemas postos e, posteriormente, no próprio processo de ensino-aprendizagem. Assim compreendemos os Tempos de consolidação pela perspectiva da avaliação formativa e de um ensino integrado.
Visto que a esquematização de passos pedagógicos de Ramos representa uma organização pedagógica que pretende ser cíclica ao longo de sequências didáticas concatenadas nas aulas, os Tempos de consolidação acabam se tornando momentos intermediários de avaliação durante o curso, em conformidade com a perspectiva de avaliação formativa preconizada. Assim, o Criar não se reservaria somente para o fim do processo de ensino-aprendizagem, mas aconteceria diversas vezes em seu percurso, sendo, portanto, incorporado ao grande esquema didático, como um todo.
Ao todo, reconhecemos que a correlação entre as teorias não é perfeita. No entanto, nosso quadro comparativo serve para o conjunto das teorias, e suas similaridades conceituais legitimam a ideia a elas transversal: a mobilização cognitivo-pedagógica. A ideia de que o processo de aprendizagem é complexo e dinâmico nas suas várias categorias mentais e que se deve planejar a ação pedagógica para articular tais faculdades cognitivas, de tal maneira a garantir o desenvolvimento dos de ordem mais complexa – o pensamento crítico (Analisar e Avaliar) e o pensamento criativo (Criar). Essa é uma abordagem pedagógica que encontra respaldo em teorizações didático-metodológicas para a formação integrada, para o ensino de LI e para o multiletramento; assim, apresenta-se como uma concepção promissora a partir do qual se possa pensar um ensino-aprendizagem para a concepção de educação integrada.
Um exemplo prático
Para tornar mais claro como essa concepção de mobilização cognitivo-pedagógica pode operar na prática educativa, apresentamos uma breve sequência didática elaborada a partir do esforço de consubstanciação desse constructo. Trata-se de uma atividade que pretendia melhor habilitar estudantes a lidarem com a tradução automática disponível na internet (ex. Google Tradutor).
Atividade didática: Survey - “Why is the Greengo Dictionary so funny?”
Objetivo: Verificar a interpretação de tom no gênero textual de verbetes do Greengo Dictionary (popular perfil no Instagram, que traduz expressões idiomáticas do português para o inglês, de forma literal, para efeitos cômicos). Pré-requisito: Acessar/apresentar vários exemplos de verbetes do Greengo Dictionary; Estratégias de leitura (palavras conhecidas, cognatas, estratégia de predição e esquemas mentais). Agrupamento: Trios (ou pares ou individual). Meios: AnswerGarden.com, nos computadores; projetor. Tempos: aprox. 15 min. Espaços: Em sala de aula, na internet.
Passos:
1) (Preparação) Crie a pergunta “Why is the Greengo Dictionary so funny?” no AnswerGarden.com e guarde o código numérico, para acesso posterior à pergunta. 2) Organize estudantes em trios e peça para que visitem o perfil Greengo Dictionary no Instagram (aprox. 10 min). 3) Depois de se familiarizarem com vários exemplos do gênero textual, divulgue o endereço do site (answergarden.com) e o código numérico de acesso e peça para que os trios escreverem suas respostas (em português ou inglês) à pergunta, na tela do computador. À medida que uma resposta seja enviada, ela aparecerá para a visualização de todos(as), junto com as demais já submetidas, em forma de um doodle de nuvem de palavra (para tal, basta atualizar a página). |
Fonte: autoria própria
Essa atividade pedagógica foi idealizada para e realizada em uma turma de 1º ano do EMI em hospedagem, em um Campus do Instituto Federal de Brasília. O quadro abaixo busca relacionar essa atividade ao constructo da mobilização cognitivo-pedagógica desenvolvida anteriormente.
Quadro 5: Mobilização cognitivo-pedagógica em uma sequência didática
Sequência Didática |
Articulação dos Processos Cognitivos para o ensino-aprendizagem |
Passos Pedagógicos de Ramos (2016) |
Uso irrefletido da tradução automática para lidar com a língua inglesa. |
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Prática social como ponto de partida |
Por meio do lembrar (experienciar o conhecido) e do aplicar (apropriadamente) os(as) estudantes: 1) procuram associar a decodificação das expressões idiomáticas em língua inglesa a seu conhecimento de expressão do mundo na sua língua materna; 2) mobilizam recursos, para buscar a expressão equivalente correta na internet. |
Tempos de problematização (a síncrese como ponto de partida); |
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2. Ao reconhecerem que a versão em inglês das expressões idiomáticas está demasiadamente literal e não correspondem às reais expressões equivalentes em língua inglesa, os times são desafiados(as) a descobrirem as expressões corretas na língua-alvo na internet. |
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3. Os times apresentam seus resultados e compartilham as estratégias que utilizaram para alcançá-los. |
Os(as) estudantes articulam o conceituar por nomeação e o analisar funcionalmente ao relatarem as estratégias a que recorreram para realizar a tarefa. A exposição do(a) professor(a) mobiliza o conceituar por teorização e o analisar funcionalmente dos(as) estudantes na sua compreensão das limitações da tradução automática e das dicas que podem aperfeiçoar seu uso. |
Tempos de instrumentalização (ensino de conteúdos disciplinares com sua historicidade): |
4. O(A) professor(a) chama atenção para o contraste entre as expressões corretas na língua-alvo, com as traduções cômico-literais do perfil do Instagram, e com as traduções fornecidas pelo Google Tradutor, que os(as) estudantes costumam usar. |
||
5. O(A) professor(a) destaca as estratégias de bons resultados compartilhados pelos(as) estudantes(as) e apresenta dicas complementares, para maximizar os resultados do tradutor automático e de verificação dos resultados obtidos. |
||
6. Cada dica é exemplificada ao se pedir que os(as) estudantes a realizem na prática, com nova expressão selecionada, para que constatem seu funcionamento. |
Conforme explicação do(a) professor(a), os(as) estudantes experienciam o novo, ao aplicar apropriadamente as dicas sugeridas. Ao exercitar tais procedimentos nos exercícios de fixação, por tentativa e erro, os(as) estudantes mobilizam tanto o analisar funcionalmente da operacionalização das dicas, quanto o analisar criticamente delas. Isso reforça o conceituar por teorização do uso crítico da tradução automática. |
Tempos de experimentação (prática produtiva e social); |
7. Exercício de fixação: os(as) estudantes realizam tarefas de tradução automática para responder a questões de tradução, em formato de múltipla escolha ou respostas abertas. |
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8. A correção de cada item oportuniza o preenchimento das lacunas nas estratégias de tradução automática, por meio de exposição didática do professor. |
À medida que cada questão é corrigida com a turma, os estudantes analisam funcionalmente e criticamente o seu experienciar o novo, dialogando com a correção do(a) professor(a) e identificando lacunas na aprendizagem. A exposição do(a) professor(a) propicia que os(as) estudantes conceituem por nomeação e por teorização as dicas referidas e as experienciem por uma análise crítica, viabilizada pela sua aplicação apropriada das dicas aprendidas. Assim, busca-se suprir as lacunas de aprendizagem e sedimentar as condições para o aplicar criativamente em novos contextos que possam surgir. A consolidação dos conteúdos ocorre com o uso reiterado do uso crítico construído da ferramenta de tradução automática nas tarefas das sequências didáticas subsequentes que incorporam o recurso à tarefa. Dessa forma, o conteúdo aprendido torna-se um experienciar o conhecido, que se articula com as outros processos mentais quando novas dúvidas e desafios linguísticos surgem, pelo uso da ferramenta de operacionalização da língua-alvo. |
Tempos de orientação (acompanhamento disciplinar ou interdisciplinar);
Tempos de sistematização (revisão de problemas, conteúdos e relações);
Tempos de consolidação (sínteses); |
9. Oportunidade de reaplicação de dicas surgem em exercícios e tarefas posteriores. |
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Uso crítico da tradução automática para lidar com a língua inglesa. |
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Catarse como ponto de chegada |
Fonte: autoria própria.
Incluímos as etapas da proposta pedagógica de Ramos (2016) na última coluna para podermos situar, mais facilmente, a sequência didática em relação ao Quadro 4, com o comparativo das teorizações que revelam a mobilização cognitivo-pedagógica. No entanto, é na segunda coluna que fica clara a articulação dos movimentos/processos de conhecimento para a promoção dos níveis de pensamento crítico. Embora o conteúdo trate de um uso crítico de uma ferramenta de apoio linguístico, promove sua apropriação de tal forma a ser passível de aplicação criativa, pois, os/as estudantes estariam em condições de articular os conhecimentos aprendidos de forma criativa. Nesse sentido, se poderia acrescentar uma décima atividade, que incluísse a produção, pelos alunos e pelas alunas, de seu próprio verbete cômico de tradução literal a ser postado em rede social, inspirados no ponto de partida da sequência didática.
Enfim, o que queremos pontuar com este breve exemplo é a concepção de se articular os movimentos/processos de conhecimento para se garantir a convergência dos recursos e esforços pedagógicos para o desenvolvimento de níveis de pensamento crítico e criativo – a mobilização cognitivo-pedagógica. Diferentes teorizações de como ensinar, e que se coadunam com a perspectiva do ensino integrado, parecem concordar nesse aspecto. Podemos observar, entretanto, que essa esquematização abstrata, resultado da justaposição de quatro visões teóricas distintas da prática pedagógica, não permite captar várias outras dimensões de um ensino integrado; entretanto serve de um promissor ponto de partida para a estruturação de uma metodologia de ensino de LI no EMI em EPT.
Conclusão: em perspectiva
Em resposta à lacuna didático-metodológica da literatura sobre educação integrada e, mais especificamente, em relação ao ensino de LI no EMI em EPT, cotejamos diferentes propostas teórico-pedagógicas, para sinalizar que uma educação para o mundo contemporâneo precisa pensar na formação de sujeitos por suas múltiplas dimensões. Assim, seja para promover uma educação integrada no EMI, conforme propôs os passos pedagógicos de Ramos (2016), seja para promover o pensamento crítico rumo ao criativo, conforme modelo pedagógico para o ensino de LI de Dummett e Hughes (2019), ou seja, ainda, para formar um sujeito multiletrado, segundo concepção de Pedagogia de Multiletramentos na área de linguagens de Cope e Kalantzis (2015), há um certo consenso de que o desenvolvimento do ser humano deve se pautar por uma articulação dos processos mentais em favor dos de ordem mais complexa; e de que o ensino, portanto, deve se encarregar de elaborar atividades didáticas nesse sentido, independentemente de séries e níveis de proficiência.
Assim, embora consideremos tal concepção um ponto de partida para um ensino integrado, não podemos deixar de reconhecer que se circunscreve exclusivamente ao domínio cognitivo da aprendizagem. Dentro da noção de integralidade e multidimensionalidade na formação do sujeito, há outros domínios para serem considerados. A própria teoria original de Taxonomia de objetivos educacionais de Bloom concebia os domínios psicoafetivo e psicomotor (FERRAZ; BELHOT, 2010). Similarmente, Zabala (1998) racionaliza a prática educativa para uma formação integral do sujeito ao contemplar conteúdos e objetivos educacionais conceituais, procedimentais e atitudinais.
No caso especifico da docência em LI, a ideia subjacente à mobilização cognitivo-pedagógica é de que o professor de inglês, no EMI em EPT, não é responsável somente por promover a aquisição da língua-alvo, mas também de cultivar, por meio desse processo, habilidades necessárias, para que estudantes desenvolvam uma formação apropriada aos desafios da sociedade no século XXI.
Referências
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