Educação Crítica: Uma aliança entre Educação Ambiental e M-learning
Critical Education: An alliance between Environmental Education and M-learning
Amanda Pereira Santos
Mestra na Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.
amandapsantos1@gmail.com – https://orcid.org/0000-0003-4418-9805
Eder Batista da Silva
Mestre na Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.
eder7bs@gmail.com – https://orcid.org/0000-0001-7698-952X
Ana Lúcia Bezerra Candeias
Professora Associada da Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.
analucia@ufpe.br – https://orcid.org/0000-0002-9021-7603
Maria Aparecida Tenório da Costa
Professora Associada da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil.
aparecidatcosta@hotmail.com – http://orcid.org/0000-0003-1474-5516
Recebido em 24 de junho de 2019
Aprovado em 12 de setembro de 2019
Publicado em 20 de novembro de 2019
RESUMO
O Bairro do Recife, um patrimônio do estado de Pernambuco, possui uma dinâmica única, e faz parte do imaginário cultural e afetivo dos recifenses, por ser parte da história da formação tanto da cidade, como também do estado. Dessa forma, é importante que o mesmo seja trabalhado na sala de aula, de forma interdisciplinar, aproximando os conteúdos formais com o cotidiano dos estudantes. Para superar esse desafio, um trabalho de educação ambiental atrelado às tecnologias móveis é essencial, pois assim o processo de aprendizado acompanhará o ritmo frenético do mundo globalizado. Diante de dessa realidade a educação ambiental, em conjunto com o M-learning, respeita o tempo de aprendizagem de cada aluno, e possibilita a construção de conhecimento a qualquer hora e lugar. O objetivo da pesquisa é analisar a maneira como os alunos do ensino médio se apropriam de conhecimentos acerca do Bairro do Recife utilizando as tecnologias móveis. Para isso fez-se uso da metodologia qualitativa durante a realização de oficinas participativas com estudantes dos três anos do ensino médio de uma escola de referência da cidade do Recife. Durante as atividades desenvolvidas os participantes puderam utilizar os smartphones para pesquisar e compartilhar notícias. A observação pelo olhar da sociologia reflexiva e a análise dos discursos dos educandos permitiu afirmar que as tecnologias móveis são ferramentas importantes no processo de ensino e aprendizagem, e com o adequado emprego destas é possível refletir criticamente na construção de novos conhecimentos acerca do Bairro do Recife.
Palavras-chave: Educação crítica; M-learning; Bairro do Recife.
ABSTRACT
The Neighborhood of Recife, a patrimony of the state of Pernambuco, has a unique dynamic, and is part of the cultural and affective imagination of Recife, as it is part of the history of the formation of both the city and the state. In this way, it is important that it be worked in the classroom, in an interdisciplinary way, bringing the formal contents closer to the daily life of the students. To overcome this challenge, an environmental education, linked to mobile technologies is essential, because only then the learning process will accompany the frenetic pace of the globalized world. Faced with this reality, environmental education, together with M-learning, respects the learning time of each student, and enables the construction of knowledge at any time and place. The objective of the research is to analyze the way in which high school students appropriate knowledge about the Neighborhood of Recife using mobile technologies. For this, the qualitative methodology was used, with participatory workshops with students from the three years of high school, from a reference school in the city of Recife. During the activities, participants were able to use smartphones to search and share news. The analysis of the discourse of the students allowed us to affirm that, the mobile technologies are important during the learning process and with them help was possible to build knowledge about the Neighborhood of Recife.
Keywords: Critical education; M-learning; Neighborhood of Recife.
O Bairro do Recife, afetuosamente chamado de Recife Antigo, uma ilha que compõe o centro histórico da cidade, atualmente é um importante centro turístico e o maior polo tecnológico da capital pernambucana. No entanto, nem sempre o bairro contou com todo esse prestigio, em 1960, com o surgimento de outros bairros, o centro histórico enfrentou um processo de marginalização perante o poder público local, fato que culminou no surgimento da Comunidade Nossa Senhora do Pilar em 1970 e aprofundou vários problemas sociais, como por exemplo: moradores de rua, uso de drogas, de álcool e prostituição.
Atualmente, o bairro está passando por um processo de revitalização, que visa transformar o mesmo em uma grande atração turística, para isso o mercado imobiliário tem se apropriado de áreas subutilizadas da ilha, transformando-as em investimentos de alto padrão econômico e consequentemente excluindo a população pauperizada que frequentava o centro histórico. Intervenções pontuais estão transformando a antiga ilha portuária em um importante ponto turístico, o qual é utilizado como uma propaganda da cidade (city marketing) para atrair investimentos públicos e privados, que apoiados pela mídia propagam um imaginário de estética segurança e lazer, mas que não resolvem os problemas do consumo de álcool, prostituição e uso de drogas, que sempre estiveram presentes na ilha.
Ante a relevância apresentada pelo centro histórico da cidade, torna-se importante utilizar esse espaço para discussões em sala de aula, assim chegamos em uma das maiores discussões da atualidade: Como a instituição escolar pode construir uma educação crítica e formar cidadãos participantes aproximando a realidade dos mesmos aos conteúdos trabalhados em salas de aulas?
Nesta ótica destacam-se aspectos importantes, os quais são contemplados pela visão da educação ambiental, tais como o reconhecimento da importância em aproximar os conteúdos trabalhados em sala de aula com a realidade dos estudantes, o estudo do espaço no qual estudante participa (aqui contemplado pelo Bairro do Recife) e a abertura para utilização de ferramentas tecnológicas como auxílio as atividades em salas de aula.
Todas essas questões fazem parte da educação ambiental vai além dos conhecimentos sobre o ambiente natural, reciclagem e o bem viver, ela abrange também as relações políticas, humanas, econômicas, etc., que perpassam o espaço. Assim, possibilitando uma visão ampla e crítica dos envolvidos no processo de ensino. Para formar cidadãos ativos que lutem e, exerçam o seu direito à cidade é preciso que a educação ambiental exerça o seu dever de considerar o estudante como parte fundamental da construção do conhecimento, aproximar o indivíduo do seu espaço, contemplando os vários componentes que o compõe (forma, função, processo e conteúdo).
O processo educacional precisa considerar o estudante como o sujeito principal, deixando de lado os paradigmas positivistas que colocam o professor como o único detentor do conhecimento e desconsidera os aprendizados e vivencias dos alunos, igualando todos eles sem analisar as individualidades, capacidades, aptidões de cada um. Além disso, a escola precisa acompanhar o ritmo frenético da circulação das informações do mundo globalizado, para isso é fundamental que o ensino se alie as tecnologias, já que as mesmas diminuem o espaço pelo tempo e permitem que os sujeitos participantes do processo de aprendizagem acessem e compartilhem informações a qualquer momento e lugar.
As tecnologias também permitem o respeito ao tempo de apropriação dos conteúdos de cada estudante, além de ampliar e extrapolar os limites físicos da sala de aula, proporcionando uma viagem ao redor do mundo na busca por novos conhecimentos. Neste sentido cria-se uma rede de conhecimentos formada pelas tecnologias e pelos paradigmas sociais e holístico que a educação ambiental possibilita, assim, culminando num processo de educação crítica que respeita o ambiente, valoriza as vivências pessoais dos sujeitos e fortalece a compreensão dos espaços de vida.
Diante do exposto, o objetivo da pesquisa é investigar a maneira como os alunos do ensino médio de uma escola de referência da cidade do Recife se apropriam de conhecimentos acerca do Bairro do Recife, utilizando-se de tecnologias móveis como ferramentas de auxílio.
A pesquisa teve caráter qualitativo, os resultados obtidos através das oficinas permitiram afirmar que as tecnologias móveis são ferramentas importantes no processo de aprendizagem, no qual, através do emprego de tais ferramentas foi possível propor a construção de um conhecimento crítico acerca do Bairro do Recife.
Para compreender de forma crítica e se aproximar da realidade do bairro, os estudantes foram estimulados a pesquisar durante as oficinas e para isso, poderiam fazer uso dos seus smartphones, fato que os motivou a compartilhar informações e complementar as discussões da sala de aula com dados, informações, notícias, imagens e cartografia atualizadas.
Em suma, os estudantes corresponderam com a construção de um conhecimento crítico sobre o centro histórico da capital pernambucana, contemplando a forma, função, processo e conteúdo do espaço, percebendo que, também são parte do ambiente e, portanto, cidadãos, integrantes do Bairro do Recife.
Os pressupostos teóricos que alicerçam a pesquisa partem da ideia que, o modelo de educação ideal, tem por objetivo transformar o processo de aprendizagem numa alternativa de libertação dos sujeitos, ou seja, esta não poderá limitar-se a um modelo educacional que vislumbre unicamente depositar informações nos indivíduos.
De forma resumida, a missão de um sistema educativo amparado num modelo educacional que apresente um senso mínimo de educação crítico-libertadora, pode ser traduzido nas palavras de Luzzi (2012):
A educação deve produzir a sua própria transformação, focando-se em formar as gerações atuais, não só para aceitar a falta de certeza do conhecimento, mas também para gerar um pensamento compreensivo, complexo e aberto à dinâmica de um conhecimento inacabado, em permanente processo de construção. Um conhecimento subjetivo, atravessado por valores e preceitos (LUZZI, 2012, p. XVII).
O autor ainda afirma que para este processo acontecer, é necessário que ele esteja “[...] sobre a base da realidade existente, da realidade da escola. Não é com mais normas e conteúdos educativos que vamos mudar a educação, a educação possui a sua própria crise, que temos que considerar” (LUZZI, 2012, p. XVII). Ao nos aprofundarmos um pouco mais no pensamento do referido autor, é possível concluir que a necessidade de construção de um olhar crítico sobre aquilo que se está vivenciando, advém da necessidade de formação de sujeitos que possam refletir sobre as realidades nas quais estão inseridos.
Diante disso, destacamos a educação ambiental como uma possível ferramenta para a libertação dos estudantes e, portanto, para a construção de um conhecimento crítico. Neste sentido a inclusão da dimensão ambiental no sistema educacional formal exige um novo conceito de educação, assim, para Leff (2012, p. 22) esta nova visão da educação surge a partir da “internalização de uma dimensão ambiental nas diversas áreas do conhecimento”.
É importante ainda destacar que a educação ambiental deve ser regada continuamente pelo saber ambiental, o qual considera a cultura, os conhecimentos prévios, as etnias de cada um, dessa forma, respeitando as diferenças de cada indivíduo.
Nesse sentido, Leff (2002) afirma que:
O saber ambiental propõe a questão da diversidade cultural, no conhecimento da realidade, mas também o problema da apropriação de conhecimento e saberes dentro de diferentes ordens culturais e identidades étnicas. O saber ambiental não apenas gera um conhecimento cientifico mais objetivo e abrangente, mas também produz novas significações sociais, novas formas de subjetividade e de posicionamento ante o mundo (LEFF, 2002, p.169).
Ainda segundo o autor, o saber ambiental possibilita mudar o “olhar do conhecimento e com isso transforma as condições do saber no mundo na relação que estabelece o ser com o pensar e o saber, com o conhecer e o atuar no mundo” (LEFF, 2009, p.18).
Contudo, é importante destacar aqui, que o campo da educação ambiental não deve ser reduzido a uma simples prática meramente conservacionista, focada na resolução de problemáticas oriundas da ocupação humana nos sistemas biofísicos (LUZZI, 2012), esta vai muito além de uma prática, a mesma configura-se numa área de conhecimento que está em constante evolução, sensível as novas demandas e temáticas sociais, no intuito de não só compreende-las, mas também de refletir sobre elas e, os processos que provocam sua necessidade de reflexão.
Essa evolução é apontada por Rodrigues e Colesanti (2008, p. 52), como sendo uma “[...] grande proliferação e abertura de novos espaços de comunicação para a Educação Ambiental, [...] fóruns, congressos [...] sites na internet [..] que acabam por sensibilizar a população em geral para os problemas da degradação ambiental”.
É de conhecimento comum que, há algum tempo, teóricos que se debruçam sobre o campo da educação, em especial aqueles que trabalham a temática da educação ambiental, defendem a interdisciplinaridade de conhecimentos como uma prática necessária para abordar a complexidade das distintas realidades vivenciadas e discutir a emancipação social dos sujeitos a partir da problematização destas realidades através de um processo educativo crítico e inclusivo.
A partir desta concepção de educação contextualizada, visando auxiliar na emancipação social dos sujeitos através do pensamento crítico, surge a necessidade da construção de conhecimentos que relacionem os conteúdos formais com os saberes oriundos da realidade vivenciada pelos educandos.
O desafio posto é constante e requer um continuo esforço dos educadores na adequação dos conteúdos a serem trabalhados durante as atividades pedagógicas, de maneira que os educandos se sintam estimulados a buscar novos meios para obtenção de informações que lhes sejam relevantes e que permitam solidificar o conhecimento que está sendo construído.
À escola, caberá então o papel de mediação das questões acerca do cotidiano dos educandos, estando assim preparada para sensibilizar estudantes, pais e a comunidade, em que estes estão inseridos, na busca por valores que objetivam o cuidado com o ambiente que os cerca. A instituição de ensino é um “espaço privilegiado para que sejam realizadas atividades que propiciem uma maior divulgação, interação e reflexão sobre as ações humanas e as suas consequências” (MOTA, 2014, p.11).
Dessa forma, torna-se importante que o estudante compreenda criticamente o espaço no qual está inserido. Dessa maneira o conhecimento poderá ser expandido e alcançar uma escala global, e, portanto, fortalecer a visão crítica, social e política do estudante.
Assim como defende Santos e Souza (2010):
Compreender e aprender o espaço. No lugar de uma geografia meramente descritiva, os novos tempos dão lugar a uma geografia que acontece a partir da realidade vivida pelo educando e a sua situação nesse contexto. Desse modo, procuramos garantir hoje, como objeto de estudo uma análise da forma pela qual o homem se apropria, produz e organiza o seu espaço, ou seja, conceber o espaço associado à existência humana (Santos; Souza, 2010, p. 25).
A partir desses pressupostos pode-se afirmar que apenas a transmissão do conhecimento por parte do professor não é suficiente, é necessário que a relação entre a vivência dos estudantes, com seus conhecimentos prévios, seja valorizada e incorporada no processo de aprendizagem, relacionando-a sempre com os conteúdos trabalhados em sala de aula. Ou seja, o processo pedagógico a ser adotado pressupõem uma prática que “[...] articule conhecimentos, concepções e valores que ajudem na mudança da visão de mundo e do viver do mundo [...]” (MAGALHÃES, 2016, p. 110).
O Desafio aqui é a criação de espaços para diálogo de saberes, que implica também na dimensão do confronto desses, assim poderá resultar numa complementariedade de práticas no sentido de ressignificar as questões da realidade que estejam sendo pautadas naquele momento (LUCA; ANDRADE, 2013). Neste sentido é possível compreender que tais situações de conflitos pautada pelo diálogo, constituem-se então em situações que são capazes de tornar concreto aquilo que é inédito para transformação da realidade e ressignificação de saberes dos sujeitos envolvidos (LOUREIRO; FRANCO, 2014).
Quando o estudante se reconhece, percebe que faz parte de um espaço complexo, e o professor faz a mediação para construção de uma aprendizagem transdisciplinar que permite interpretar a realidade, as imagens, as paisagens e a cartografia, o estudante apreende a interpretar o espaço local e global na sua forma, função, processo e conteúdo (SANTOS, M. 1999) de maneira interdisciplinar e crítica. Essas habilidades estão previstas na Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (BRASIL, 1996).
Convém aqui destacar o pensamento de Morin (2015, p.75) que afirma: “a educação para compreensão encontra-se ausente de nossos programas de ensino”, assim, para autor é necessário aproximar as realidades dos sistemas de ensino as do contexto de vida dos educandos para que eles compreendam e reflitam acerca destas realidades. No entanto, para que essas habilidades sejam alcançadas é necessário mais que conhecimento teórico sobre o objeto estudado, é preciso que se desenvolva uma estrutura racional entre o estudante e o espaço observável, sendo fundamental que as vivências dos participantes no processo de aprendizagem sejam valorizadas, relacionando-as com os conteúdos trabalhados e fazendo parte do cotidiano da sala de aula.
A contextualização do conteúdo é fundamental, pois assim eles ganham significados, importância, de forma que desperta interesse e curiosidade dos educandos, estimulando a pesquisa e a construção de novos conhecimentos. Ou seja, ela “[...] visa dar significado ao que se pretende ensinar para o aluno [...], auxilia na problematização dos saberes a ensinar, fazendo com que o aluno sinta a necessidade de adquirir um conhecimento que ainda não tem” (RICARDO, 2003, p.11).
A partir da compreensão crítica do espaço e suas várias interferências, é que os jovens construirão um conhecimento crítico acerca de suas realidades e assim poderão exercer sua cidadania, apropriando-se do direito à cidade e, consequentemente, se posicionar diante das diferentes situações de relevância do contexto social. Nesse sentido, Zibas (2005) afirma que:
[...] a par da inevitável instrumentação dos jovens, para que sobrevivam no mundo real, torna-se fundamental que a escola ensine a “leitura desse mundo”, ou, em outras palavras, que desenvolva a cidadania democrática, aqui entendida como a compreensão histórica das relações estruturantes do mundo econômico e social, de forma que a sociedade seja percebida como passível de ser transformada (ZIBAS, 2005, p. 25).
Quando o educando se conscientiza das relações que ocorrem dentro do espaço, pode interpreta-lo, e compreende-lo passando a construir um conhecimento ambiental crítico sobre a sua realidade. Além disso, é importante ressaltar que as tecnologias são indispensáveis no processo de aprendizagem quando se trata da construção de uma educação crítica, assim sendo possível extrapolar os limites físicos da sala de aula, respeitar o tempo de apropriação do conhecimento de cada estudante e permitir a pesquisa em qualquer hora e lugar.
Diante dos pontos levantados anteriormente, é possível afirmar a importância da prática de uma educação crítica, e que contemple conteúdos acerca de espaços próximos e que façam parte do cotidiano dos educandos. Assim, se trabalha na sala de aula uma lógica de educação contextualizada com a realidade local.
Nesse ponto, surgiu a necessidade de explicar o Bairro do Recife, pois foi esse o espaço estudado pelos sujeitos dessa pesquisa (educandos), comprovando a importância do estudo da realidade e do cotidiano. O local está presente no dia a dia da maioria dos recifenses, seja pela sua importância para a historiografia pernambucana ou pela presença na representação do imaginário afetivo e cultural da cidade.
O Bairro do Recife, popularmente chamado de Recife Antigo, é uma das ilhas que compõe a capital pernambucana, enquadra-se na RPA 1, microrregião 1.1 e possui cerca de 270 hectares², faz fronteira com os bairros, também históricos, Santo Antônio, Santo Amaro e São José.
O bairro em questão foi um dos primeiros do Recife, seu surgimento está atrelado diretamente ao porto da cidade, portanto um bairro voltado para atividades econômicas e portuárias. Não diferente de outros bairros portuários, a sua realidade era um crescimento desordenado, ruas insalubres, proliferação de doenças (LEITE, 2006). Percebe-se, assim, que é um espaço que pode ser trabalhado em disciplinas como história, geografia, artes, etc.
Com o passar do tempo, apesar da tentativa de trazer modernidade ao centro histórico, durante o decorrer do século XX com o surgimento de outros bairros, o mesmo foi perdendo sua supremacia e sendo marginalizado pelo poder público. Esse esquecimento culminou na atração da população de baixa renda que se apropriou de alguns dos armazéns abandonados pelo porto da cidade (URPI, 2010).
Desde então, o centro histórico foi palco de moradores de rua, prostituição, uso de drogas, realidade que contrastava com os bancos, agencias de seguros, pontos comerciais que funcionavam durante o dia servido as atividades do Porto do Recife.
Em paralelo a essa dinâmica urbana de contrastes, por volta de 1970, surge a Comunidade Nossa Senhora do Pilar, situada na porção norte da ilha. A comunidade abriga moradores de baixa renda que compõe uma das áreas mais violentas da cidade, como o maior ponto de distribuição de drogas e, atualmente possui um dos piores Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do Recife. Essas questões fizeram com que a realidade do bairro, em parte, fosse parecida com a qual os estudantes encontravam próximo às suas casas na periferia da capital pernambucana.
Cabe ressaltar que, quando se deseja trabalhar o dia a dia dos estudantes em sala de aula, é importante que o espaço social escolhido tenha características semelhantes com a realidade de convívio deles. É fundamental que os estudantes compreendam o espaço e os relacionem com a dinâmica do dia a dia, assim aproximando e exemplificando os conteúdos da sala de aula. Segundo Milton Santos:
O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como quadro único no qual a história se dá. No começo era a natureza selvagem, formada por objetos naturais, que ao longo da história vão sendo substituídos por objetos técnicos, mecanizados e, depois, cibernéticos, fazendo com que a natureza artificial tenda a funcionar como uma máquina (SANTOS, M. 1997, p. 27).
Assim, ao aproximar o espaço e, portanto, sua complexidade a da sala de aula abre-se um leque de possibilidades que pode ser trabalhado em apenas uma disciplina ou de forma interdisciplinar. Sendo possível alcançar uma educação ambiental crítica capaz de formar uma rede entre os paradigmas holístico, social e a própria tecnologia.
Como consequência da aproximação dos conteúdos na sala de aula, os estudantes possivelmente irão desenvolver a necessidade da pesquisa, que segundo Richardson (1999)
Tomada num sentido amplo, pesquisa é toda atividade voltada para a solução de problemas; como atividade de busca, indagação, investigação, inquirição da realidade, é a atividade que vai nos permitir, no âmbito da ciência, elaborar um conhecimento, ou um conjunto de conhecimentos, que nos auxilie na compreensão desta realidade e nos oriente em nossas ações (RICHARDSON 1996, p. 29).
É possível estimular a autonomia dos educandos e proporcionar atividades nas quais os mesmos sejam os protagonistas e o professor seja o mediador, fazendo com que se construa o conhecimento de forma articulada, relacionando a vivência de cada indivíduo presente no processo de aprendizagem.
Para que isso aconteça é fundamental que o professor também seja pesquisador.
Todo professor deveria atuar como um investigador para ser capaz de criar o próprio currículo, baseado nas necessidades reais de seus alunos. Acreditava que todo educador tinha de assumir seu lado experimentador no 5 cotidiano, pois quem mais precisa aprender é aquele que ensina. Ao transformar a sala de aula em laboratório, é possível garantir a aprendizagem dos alunos das classes sociais menos favorecidas com maior autonomia e assim fazê-los alcançar um nível intelectual mais elevado (MATTOS; CASTANHA, 2008, p. 4).
Outro ponto, que o Bairro do Recife proporciona é reflexão sobre a sua realidade social, pois apresentava uma considerável quantidade de moradores de ruas, e uma rede de atividades ilícitas, com o consumo e tráfico de drogas, além de um forte esquema de prostituição que funcionava durante as movimentadas noites do centro histórico. Questões que fazem parte, também, da realidade da periferia e que proporcionam uma discussão sobre as intervenções que são proporcionadas, seja pela iniciativa pública ou privada, com a justificativa de melhora da condição social.
Intervenções, essas, que também aconteceram no Bairro do Recife, pois o mesmo presenciou uma revitalização a partir do ano de 2010 (Porto Novo), inspirada no Plano Urbanístico do Complexo Turístico Cultural Recife – Olinda, apresentado em 2003. O principal objetivo dessa revitalização é transformar o Bairro do Recife em um espaço turístico, no entanto, não é diferente das outras políticas de revitalização pelas quais o centro histórico já passou e não abrange toda a complexidade urbana da ilha.
Com a revitalização, o bairro ganhou mais espaços culturais, novos museus, bares frequentados por pessoas de alto padrão aquisitivo, renovação das fachadas dos prédios, o projeto Recife de Coração que funciona todos os domingos com atividades esportivas e atividades lúdicas, além de shows gratuitos no último domingo do mês. No entanto, apesar desses avanços na área cultural, a população pauperizada do Bairro do Recife ficou à margem das mesmas.
Portanto, pode-se afirmar que apesar do projeto mencionar a intensão de inclusão dos moradores de baixa renda e da Comunidade do Pilar nessa nova realidade do centro histórico com entrega de habitacionais, possível rota turística, projetos de educação ambiental. Essa inclusão de fato ainda não ocorreu, um dos motivos é o plano considerar a comunidade como uma área de possível investimento imobiliário. Assim, comprova-se que a revitalização em curso é uma tentativa de elitização do bairro.
O bairro possibilita grandes debates sobre as intervenções que são proporcionadas em toda a cidade, estimulando um conhecimento crítico e aprofundado sobre a cidade, sobre o espaço. Uma educação ambiental crítica que aproxima o dia a dia dos conteúdos e conceitos trambalhados em sala de aula.
Neste sentido, a adoção de tecnologias que estejam acessíveis a realidade dos alunos, permite ao professor explorar um vasto campo de trabalho, estimulando a busca por novos conhecimentos que alie os conteúdos trabalhados no ambiente escolar com as vivências de cada participante desse processo.
O M-learning caracteriza-se pelo uso de tecnologias móveis aliadas ao processo de ensino. A pesquisa se deteve no uso dos smartphones, que se tornaram indispensáveis para nossas vidas, principalmente para os jovens. Essas tecnologias nos acompanham a todo momento diminuindo o espaço pelo tempo, e, portanto, possibilitando entrar em contato com notícias, e informações sobre qualquer parte do mundo a qualquer hora e lugar.
O uso das tecnologias móveis permite que, os estudantes pesquisem em qualquer website no momento da aula, trazendo dados atuais e, assim podendo complementar a discussão e as informações trazidas pelo professor, além de extrapolar os limites físicos da sala de aula.
O termo M-learning aparece nos anos 2000 no contexto da educação “como uma prática para enriquecer o processo de aprendizagem, com uso de dispositivos móveis, sem fios e em rede” (SANTOS, A. 2012, p. 80-82). Existem vários conceitos para M-learning (aprendizagem móvel), cada um desses foca em um ponto especifico: nas ferramentas, no usuário ou nas ações com dispositivos móveis (DM).
Para esta pesquisa, consideramos que todos esses fatores envolvidos no processo de aprendizagem possuem sua importância, pois não há sentido no emprego das tecnologias sem o devido interesse dos sujeitos e/ou o acesso aos equipamentos necessários, assim como o contrário também não é possível.
Apesar da literatura apontar uma significativa importância do emprego dessas ferramentas como instrumentos de facilitação e aprimoramento do processo de ensino e aprendizagem, ainda há uma grande resistência das instituições escolares em aceitar a sua inclusão no cotidiano de suas atividades pedagógicas. Tal resistência normalmente justifica-se sob alegação de falta de estrutura e preparo adequado dos profissionais para lidar com essas ferramentas, além das restrições legais (RECIFE, 2012).
O fato de cada envolvido no processo de aprendizagem poder utilizar seu próprio smartphone, permite que o mesmo esteja configurado de forma que reflita a personalidade de cada um, com as cores do seu agrado, aplicativos, e até mesmo as ferramentas, além da possibilidade de armazenar fotos e documentos importantes.
Favorecendo uma utilização mais frequente, existe a possibilidade de personalização destes dispositivos que acompanham o estilo de vida de cada pessoa, permitindo a customização e o acompanhamento de tendências de moda bem como de aplicativos que podem, desde facilitar o dia a dia, até aplicativos de entretenimento. Não é difícil encontrarmos pessoas de diferentes idades em fila de bancos, ônibus, ou sala de espera de consultório médicos acessando a internet, interagindo em redes sociais, fazendo compras, jogando sozinhos ou com outros usuários, acessando conteúdos de cursos, etc. (SABOIA; VIVA; VARGAS, 2013, p. 4).
Dessa forma, é possível que o estudante entre em contato com uma aprendizagem na qual ele seja o principal sujeito, um processo de aprendizagem individualizado, porém ainda com o papel indispensável do professor como mediador.
Com uma educação contextualizada e com o implemento das tecnologias, os estudantes ganham autonomia para a realização de pesquisas a qualquer momento e lugar, assim respeitando o tempo de apropriação do conteúdo que está sendo trabalhado (MORAN; BEHRENS; MASETTO, 2004).
No entanto, apesar da intimidade que os estudantes possuem com seus smartphones, é essencial que os professores estejam devidamente capacitados para explorar a ferramenta, que a escola esteja aberta a essa possibilidade. Fato que ainda é difícil de se atingir, pois boa parte dos atuais profissionais da educação são oriundos de um sistema de ensino tradicional que não foi pensando para adequar-se as tecnologias existentes.
Atualmente, os professores que não fazem uso das tecnologias móveis, justificam alegando o não uso devido à baixa memória das ferramentas, o visor pequeno e por ser uma possível fonte de distração, devido ao acesso a jogos, rede sociais, etc (GRAZIOLA JUNIOR, 2009).
Em suma, é possível afirmar que a dinâmica urbana do Bairro do Recife, precisa ser abordada na sala de aula, pois é uma localidade importante para a historiografia pernambucana, para a cultura e imaginário afetivo da cidade, além de estar presente no cotidiano dos estudantes e de ser palco de problemas sociais que envolvem o consumo de drogas, uso de álcool e a prostituição. Neste sentido, compreende-se que um processo de educação ambiental crítica aliada ao uso das tecnologias móveis são uteis e, indispensáveis para a construção de um processo de ensino e aprendizagem interdisciplinar e crítico.
A pesquisa configura-se como uma investigação qualitativa, partindo de uma abordagem exploratória dos conhecimentos dos alunos acerca do objeto de investigação. A coleta de dados foi realizada através de: 1) aplicação de questionários; 2) realização de entrevistas semiestruturadas, com os alunos das três séries do ensino médio da EREM Cândido Duarte; 3) observação direta das turmas durante as atividades pedagógicas realizadas pelos bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID, do curso de Ciências Agrárias e Ciências biológicas da UFRPE, nos horários disponibilizados pela escola.
As intervenções pedagógicas efetuadas pelos bolsistas do PIBID foram realizadas sempre às quartas-feiras no período da tarde e tinham duração de aproximadamente duas horas, atendendo todas as turmas das três séries do ensino médio ofertadas pela escola e contemplavam todas as áreas de conhecimento que integravam o currículo escolar da instituição.
Assim, as atividades de educação ambiental poderiam ser realizadas individualmente pelos bolsistas através de conteúdos de reforço escolar e/ou em conjunto, com estudantes de outras licenciaturas (incluindo também os estagiários não-bolsistas do PIBID) como geografia, através de sequências pedagógicas pensadas para trabalhar de maneira interdisciplinar conteúdos que apresentassem relação direta com o cotidiano dos alunos, tais como consumo de álcool, de drogas, e prostituição no Bairro do Recife.
Durante as oficinas, sob mediação dos bolsistas responsáveis, os estudantes fizeram uso dos seus smartphones para pesquisar novas informações e compartilha-las entre si, complementando os debates e ampliando seus conhecimentos a respeito do centro histórico.
Ressalta-se que as atividades pedagógicas, chamadas de oficinas, ao objetivarem trabalhar algum conteúdo específico, não estavam limitadas unicamente ao espaço da sala de aula. Tais intervenções foram pensadas para ocupar os mais diversos espaços possíveis, desde os vários ambientes dentro da escola até espaços públicos externos, como: outras instituições de ensino, museus e o centro histórico da cidade.
Como recorte de investigação, foi adotado o levantamento dos conhecimentos dos alunos acerca do Bairro do Recife, importante centro tecnológico e cultural da cidade. A escolha deste espaço ocorreu em virtude da mística que envolve a sua história, que está presente no dia a dia dos recifenses e demais sujeitos da Região Metropolitana do Recife, consequentemente também envolve a realidade dos estudantes da escola estudada.
Desta forma, por apresentar características tão peculiares, o Bairro do Recife configura-se como um laboratório vivo e, consequentemente, uma interessante alternativa para trabalhar os conceitos básicos de educação ambiental fora do espaço escolar, o que também o torna um perfeito cenário para estudo dos diversos componentes do currículo escolar a partir de um cenário que muitos estudantes já conhecem.
Como metodologia de análise dos dados coletados a pesquisa apoiou-se na triangulação de métodos que consistiu na: Sociologia Reflexiva de Alberto Melucci (2005); Análise Crítica do Discurso – AD amparada na perspectiva de Dijk (2008a; 2008b); e na Linguística Ecossistêmica Crítica ou Análise do Discurso Ecológica – ADE de Couto, Couto e Borges (2015).
O intuito do cruzamento das metodologias de análise foi o de buscar compreender como se forma a visão ecológica de mundo dos estudantes acerca do espaço urbano estudado e suas implicações no cotidiano de quem frequenta o local a partir da compreensão de questões como o consumo de álcool e drogas por jovens, a violência urbana e marginalização da sociedade, e a higienização da área promovida pelo poder público local.
Durante o processo investigativo, foi possível identificar que os alunos já traziam consigo alguns conhecimentos prévios sobre o Bairro do Recife, em boa parte amparados pela visão dos meios de comunicação locais, os quais costumeiramente tratam este espaço com evidência em virtude das opções culturais que ele apresenta.
No entanto, poucos conheciam em si a história do bairro, porém com a possibilidade de uso dos smartphones, ferramenta do cotidiano dos adolescentes, para acessar a internet de maneira orientada durante as atividades puderam buscar informações sobre o bairro e conhecer suas opções culturais, espaços de lazer, além da história da ilha.
Nesse ponto a tecnologia móvel possibilitou que a discussão do bairro fosse complementada, assim como previa Moran; Behrens; Masetto (2004), com curiosidades, dados geográficos e diferentes imagens de vários ângulos e escalas.
Todos os estudantes conheciam o bairro, pois já tinham participado de eventos culturais como o carnaval e/ou visitado instituições como museus, teatros e o espaço de midiateca de uma renomada livraria existente na ilha (Livraria Cultura[1]).
O interesse dos estudantes pela pesquisa ligada a esse espaço, tornavam-se mais evidente na medida que começavam a descobrir que o importante centro histórico-cultural também apresentava problemas em relação ao consumo de álcool, drogas, prostituição, exclusão social da população de baixa renda, dentre outras problemáticas sociais que eles vivenciavam em suas respectivas localidades de origem. Ou seja, o imaginário criado pelos meios de comunicação que sempre mostravam o Bairro do Recife como um local voltado para o lazer familiar com segurança, ocultava todas as problemáticas sociais existentes nesta localidade.
Essa motivação confirma a importância do estudo do espaço local, fato essencial para que os estudantes se tornem cidadãos críticos, compreendendo os componentes do espaço e posteriormente ampliando o seu conhecimento para escalas maiores (SANTOS; SOUZA, 2010).
Os estudantes também compreenderam que as intervenções que o bairro vem recebendo nos últimos anos são pontuais e criam um city marketing que não resolve os problemas sociais, questões ainda presentes na ilha. Os temas anteriormente citados, foram recorrentes durante os debates e apontados pelos alunos, fato que corrobora o caráter interdisciplinar, social, e cultural, considerando a individualidade e complexidade de cada sujeito do processo de aprendizagem (LEFF, 2002; 2012; MORIN, 2015).
Um ponto de questionamento apontado pelos estudantes refere-se à revitalização dos centros históricos da cidade, aqui incluso o Bairro do Recife, no qual a higienização promovida pelo poder público afastou pessoas de baixa renda para a periferia desses espaços culturais. Para eles essa higienização também reforça a prática do racismo, principalmente o institucional, que segundo eles costuma ser uma prática recorrente por parte do poder público local contra grupos periféricos que frequentam a ilha.
Dentre as questões apontadas pelos estudantes, destaca-se a ação do Estado, aqui representada pela força policial e outras entidades de segurança pública que atuam no bairro, que adotavam uma postura truculenta e desproporcional contra pessoas de origem pobre. Alguns dos estudantes afirmaram já terem sido alvo e/ou conhecerem alguém próximo que foram alvo de algumas dessas ações, em virtude dessa estereotipagem visual que é atribuída a aqueles que não se enquadram no perfil ideal de pessoas qualificadas para frequentar o bairro.
Para os estudantes, ao tentar afastar certos grupos sociais desse espaço de lazer, o poder público local almeja mascarar a verdadeira realidade do bairro com intuito de proteger o imaginário local construído. Para eles o foco deveria ser a promoção da igualdade entre aqueles que frequentam e não a exclusão de alguns em prol da manutenção de um status.
Essa reflexão apresentada dialoga com a crítica realizada por Dijk (2008b), quando afirma que a perpetuação desse processo de exclusão de grupos sociais através do racismo é reflexo de uma visão de mundo imposta por uma elite simbólica dominante que detém uma ideologia que pouco se interessa pelas questões étnicas e sociais.
Ressalta-se que a importância de compreensão do espaço local pelos estudantes, é essencial para que estes possam ter ciência sobre o seu papel na sociedade, pois só quando os processos educativos praticados pelos sistemas formais de ensino, aqui representados pela escola, se aproximam da realidade de vida dos estudantes, esses poderão exercer adequadamente o seu direito à cidadania e acesso aos recursos e equipamentos sociais da cidade (ZIBAS, 2005).
Durante as oficinas ficou evidente que a possiblidade dos estudantes personalizarem suas tecnologias móveis facilita a navegação nos smartphones contribuindo desse modo para a atividade de pesquisa, assim como prevê Saboia; Viva; Vargas (2013).
Por fim, dadas as características geográficas e ambientais da localização do bairro, as atividades de educação ambiental permitiram, também, que os alunos realizassem uma reflexão sobre como utilizamos os nossos recursos ambientais. Assim, para os alunos esse espaço de discussão provocava maiores reflexões sobre o quanto eles poderiam evoluir como pessoas e buscar conscientizar outros sujeitos de suas comunidades acerca de suas ações cotidianas.
A realização de oficinas é uma forma diferenciada de trabalhar conteúdos temáticos em sala de aula. A participação dos estudantes dos três anos do ensino médio nas atividades práticas relacionadas a esta pesquisa, configura-se numa forma de estímulo, a construção coletiva do conhecimento de maneira continuada, onde, através da socialização das experiências pessoais entre os próprios estudantes professores, possibilita-se a construção de teias de transdisciplinares de observação do mundo como como prevê os fundamentos da educação ambiental.
Ao seguir os pressupostos da educação ambiental é possível estabelecer uma rede entre os paradigmas holístico, social e de pesquisa, aproximando os conteúdos estudados em sala de aula com a realidade do estudante para construção de um conhecimento crítico e interdisciplinar sobre o espaço local. Assim, ao atrelar tais pontos ao uso conjunto das tecnologias móveis no processo educacional tornou-se possível partir na busca da construção um conhecimento crítico a respeito do bairro histórico da cidade do Recife.
As tecnologias possibilitaram que a pesquisa sobre o ambiente de vivência pudesse ser realizada pelos estudantes a qualquer momento e qualquer lugar, complementando então o debate ocorrido durante as oficinas. Além disso, ficou evidente que os estudantes sentiram uma motivação maior ao estudarem um bairro que possui uma importância histórica e cultural para a capital pernambucana, mas que também é rotineiramente frequentado por eles devido a fácil acessibilidade ao local, embora que muitos não usufruam dos diversos equipamentos de lazer ali encontrados. Corroborando a importância de aliar as tecnologias ao processo educativo, convém ressaltar a importância da capacitação dos professores para a utilização destas ferramentas em suas atividades pedagógicas.
Caso este recurso não seja utilizado da maneira adequada ou o estudante não esteja motivado sobre o conteúdo vivenciado na sala de aula, as tecnologias móveis podem tornar-se uma distração que dificultará o aprendizado, não permitindo que se alcance o objetivo esperado ao adotar tais ferramentas como auxílio no processo didático pedagógico.
Por fim, foi possível considerar que os estudantes se apropriaram da construção dos novos conhecimentos acerca do Bairro do Recife de maneira satisfatória, na medida em que estes passaram a relacionar a situação estudada com o contexto vivenciado em suas comunidades de origem. Essa correlação permite afirmar que uma educação crítica, que reconhece todos os envolvidos no processo educacional, é possível ao aliar a educação ambiental com a adoção de tecnologias móveis para alcançar fins específicos no processo educativo, e, portanto, acompanhar a rapidez do mundo globalizado sem deixar de valorizar as realidades locais vivenciadas por cada aluno, os seus conhecimentos prévios e/ou o tempo de assimilação dos conteúdos pelos sujeitos envolvidos neste processo.
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Correspondência
Amanda Pereira Santos — Universidade Federal de Pernambuco — Rua Acadêmico Hélio Ramos s/nº, Cidade Universitária, CEP 50740530, Recife, Pernambuco, Brasil.
Notas
[1] No momento da realização das oficinas, a livraria Cultura instalada no Bairro do Recife, que por mais de uma década serviu como opção de laser e cultura para pessoas de todas as faixas etárias e configurava-se como um importante espaço de formação crítico-intelectual na cidade do Recife, ainda estava em pleno funcionamento. Porém, durante o primeiro semestre de 2018 a livraria encerrou suas atividades nesse espaço, que implica na ausência de um equipamento cultural de fácil acessibilidade aos mais diversos públicos que frequentam o Bairro do Recife.