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Rev. Enferm. UFSM, v.12, e9, p.1-16, 2022
https://doi.org/10.5902/2179769266828
ISSN 2179-7692
Submissão: 21/07/2021 • Aprovação: 28/01/2022 • Publicação: 15/03/2022
Artigo Original
Teenagers’ knowledge about alcohol and other drugs and their opinion about educational technologies
El conocimiento de los adolescentes acerca del alcohol y otras drogas y su opinión acerca de las tecnologías educativas
Laura Cristhiane Mendonça Rezende ChavesI
Gesualdo Gonçalves de AbrantesII
I Universidade Federal de Pernambuco. Recife, Pernambuco, Brasil
II Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa, Paraíba, Brasil
III Universidade de Dundee. Escócia, Reino Unido
Resumo
Objetivo: investigar o conhecimento de adolescentes escolares sobre álcool e outras drogas e sua opinião acerca de tecnologias educacionais para prevenção do consumo. Método: estudo descritivo com abordagem qualitativa realizado com 86 adolescentes cursando o ensino médio. Os dados foram coletados utilizando um instrumento de aplicação autoadministrada e processados nos programas IRaMuTeQ 0.7 alpha 2 e SPSS versão 20.0. Resultados: a análise lexical mostrou três classes semânticas: consequência, representação e definição do álcool e outras drogas para os adolescentes. A tecnologia educacional escolhida pela maioria foi o vídeo e o aplicativo móvel, que versam sobre consequências e efeitos associados ao uso das substâncias e as formas de se evitar ou até mesmo utilizá-las. Conclusão: os resultados mostraram que os adolescentes possuem pouco conhecimento sobre a temática e que tecnologias educacionais digitais podem ser estratégias de educação em saúde eficazes para prevenção do consumo de álcool e outras drogas entre o público-alvo.
Descritores: Tecnologia Educacional; Alcoolismo; Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias; Adolescente; Prevenção Primária
Abstract
Objective: investigating the knowledge of school teenagers about alcohol and other drugs and their opinion about educational technologies for prevention of consumption. Method: a descriptive study with qualitative approach conducted with 86 teenagers attending high school. Data were collected using a self-administered and processed application instrument in the IRaMuTeQ 0.7 alpha 2 and SPSS version 20.0 programs. Results: a lexical analysis showed three semantic classes: consequence, representation and definition of alcohol and other drugs for teenagers. The educational technology chosen by the majority were video and the mobile application, which deal with consequences and effects associated with the use of substances and ways to avoid or even use them. Conclusion: the results showed that teenagers have little knowledge about the subject and that digital educational technologies can be effective health education strategies to prevent alcohol and other drugs consumption among them.
Descriptors: Educational Technology; Alcoholism; Substance-Related Disorders; Teenager; Primary Prevention
Resumen
Objetivo: poner en claro el conocimiento de los adolescentes escolares acerca del alcohol y otras drogas y su opinión acerca de las tecnologías educativas para la prevención del consumo. Método: un estudio descriptivo con enfoque cualitativo realizado con 86 adolescentes que asistían a la escuela secundaria. Los datos se recogieron mediante un instrumento de aplicación autoadministrado y procesado en los programas IRaMuTeQ 0.7 Alpha 2 y SPSS versión 20.0. Resultados: el análisis léxico mostró tres clases semánticas: consecuencia, representación y definición de alcohol y otras drogas para adolescentes. La tecnología educativa elegida por la mayoría fue el video y la aplicación móvil, que se ocupan de las consecuencias y efectos asociados con el uso de sustancias y las formas de evitarlas o incluso usarlas. Conclusión: los resultados mostraron que los adolescentes tienen poco conocimiento sobre el tema y que las tecnologías educativas digitales pueden ser estrategias efectivas de educación para la salud para prevenir el consumo de alcohol y otras drogas entre ellos.
Descriptores: Tecnología Educacional; Alcoholismo; Trastornos Relacionados con Sustancias; Adolescente; Prevención Primaria
A adolescência é um período de mudança no desenvolvimento, situada entre a infância e a vida adulta, que impõe transformações físicas, cognitivas e psicossociais. É uma fase considerada de predisposição e vulnerabilidade ao consumo de álcool e outras drogas, o que pode trazer danos e prejuízos, considerando o efeito devastador na saúde, aprendizagem e nas relações familiares e sociais do adolescente.1-2 O uso destas substâncias neste momento da vida constitui um problema de saúde pública no Brasil e em outros países.2
O conhecimento sobre a temática é considerado um importante fator de proteção, pois informações sobre as consequências do consumo de drogas interfere positivamente para não as utilizar.3 Possibilita ao adolescente desenvolver uma visão crítica da realidade, capacitando-o a assumir a responsabilidade por suas escolhas, inclusive a escolha de usar ou não drogas.4
A educação em saúde para adolescentes pode ser vista como uma estratégia preventiva, educativa e social, ao ponto de emergir, na comunidade, ações capazes de promover proteção frente ao uso de drogas lícitas e ilícitas pelos adolescentes. Estratégias de educação em saúde que visem possibilitar a estes jovens conhecimento sobre prevenção são necessárias, pois permitem acesso a informações sobre a importância de se evitar o contato com essas substâncias e minimizar os efeitos e consequências indesejáveis quando esse contato já ocorreu.5
As Tecnologias Educacionais (TE), como instrumentos de educação em saúde, têm mostrado recursos capazes de proporcionar benefícios aos adolescentes, como a participação ativa, o esclarecimento de dúvidas e a apropriação real do conhecimento.6 Folders, cartazes, cartilhas, manuais, cadernos de orientações e apostilas, álbum seriados e gibis são exemplos de TE produzidas para ações de educação em saúde entre adolescentes.7 Podem ser citadas, também, as baseadas nas Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC’s), como as mensagens de texto para smarthphone, websites, ambientes virtuais de aprendizagem, cursos on-line, chat, jogos virtuais, blogs e mídias sociais. Estudo de revisão sobre o uso de TIC’s na educação em saúde de adolescentes, obteve como resultados que, dentre os profissionais da saúde, os da enfermagem lideram as pesquisas sobre a construção dessas tecnologias.8
Tem-se notado que a prevenção do consumo de álcool e outras drogas na adolescência é pouco abordada em TE ou estão apresentadas juntamente com outras temáticas, não permitindo uma abordagem mais ampla e adequada para tratar do assunto.9 Materiais educativos são recursos eficazes para sensibilizar os adolescentes acerca dos danos ocasionados pelo consumo de drogas, principalmente quanto ao desenvolvimento pessoal, profissional e qualidade de vida.10
A construção de TE requer a utilização de métodos que gerem recursos adequados ao propósito e ao contexto educacional, sendo necessário, portanto, a participação do usuário nas etapas de construção.11 Na saúde, as recomendações acerca da produção destes recursos é que incorporem os atores como sujeitos de conhecimento, não apenas como público-alvo de produtos construídos fora de suas realidades. As TE devem ser produzidas a partir das necessidades dos adolescentes, para quem são as ações educativas, considerando o contexto e a finalidade do seu uso.12
De acordo com o exposto, o presente estudo tem o objetivo investigar o conhecimento de adolescentes escolares sobre álcool e outras drogas e sua opinião acerca de tecnologias educacionais para prevenção do consumo.
Estudo descritivo e exploratório, com abordagem qualitativa, realizado em junho de 2019 em uma escola estadual de ensino médio e técnico da rede pública do estado da Paraíba, Brasil, que possui cerca de 489 alunos matriculados.
Os dados foram coletados em um momento previamente agendado com a diretora da escola e professores. O contato com os participantes e coleta, ocorreu em sala de aula, em concordância com o professor da disciplina a qual estava sendo ministrada. Os objetivos, procedimentos e aspectos éticos do estudo foram explicados a todos os alunos e disponibilizado o instrumento autoadministrado. Ressalta-se que a equipe de pesquisa, sobretudo a orientadora e pesquisadora principal, possuíam vínculo anterior com a instituição, profissionais e alunos, devido a contatos e realização de pesquisas em momentos anteriores na referida escola.
Os dados foram coletados utilizando um instrumento com 14 questões, de aplicação autoadministrada, estruturado com variáveis de respostas fechadas para caracterização sociodemográfica dos participantes, além de questões abertas acerca do consumo, conhecimento da definição, tipos e consequências do álcool e outras drogas. A opinião dos participantes sobre os formatos de TE relacionada à temática, bem como ao conteúdo a ser apresentado por elas, também foi explorada. O instrumento foi elaborado pelos autores e avaliado quanto a sua estrutura e pertinência por duas docentes com expertise na área. O tempo médio de preenchimento pelos participantes foi de 15 minutos.
Os critérios de inclusão compreenderam adolescentes regularmente matriculados em um dos três anos do ensino médio, na faixa etária entre 14 e 19 anos e que estivessem presentes em sala de aula no momento da coleta de dados. Foi considerado como critérios de exclusão, adolescentes que não estivessem frequentando as aulas regularmente, conforme informação disponibilizada pela direção da escola, mediante frequência da turma. Participaram do estudo 86 adolescentes, selecionados por conveniência, cursando o ensino médio. Não houve recusa ou necessidade de exclusão de participantes.
Os dados quantitativos foram analisados com o auxílio do software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 20.0, em que foram obtidas as frequências das variáveis sociodemográficas. A análise textual foi realizada por meio de Classificação Hierárquica Descendente (CHD) e Nuvem de palavras e contaram com o auxílio do software Interface de R pourles Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRaMuTeQ) 0.7 alpha 2.13
A análise por CHD ocorre a partir da identificação da quantidade e frequência média das palavras, classificando os Segmentos de Texto (ST) em função de seus respectivos vocabulários, e seu conjunto repartido em função da frequência das formas reduzidas. A função é obter classes de ST compostas por vocabulários semelhantes entre si, mas ao mesmo tempo distintas dos ST de outras classes. Esses resultados são apresentados para visualização em um dendrograma de CHD, que ilustra as relações entre as classes. Já a Nuvem de Palavras é uma análise mais simples, que tem por intuito fornecer uma visualização gráfica referente à frequência de utilização das palavras.13
Quanto aos aspectos éticos, a pesquisa obedeceu às determinações da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, que dispõe sobre a pesquisa envolvendo seres humanos no Brasil,14 sendo o projeto aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa no dia 17 de outubro de 2018, sob CAEE nº 94744518.7.000.5208. O estudo teve autorização para dispensa da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelos pais/responsáveis dos participantes, o que foi justificado pelo tema abordado (uso de drogas). Obteve-se, portanto, a assinatura do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido de todos os participantes menores de 18 anos.
A análise dos resultados mostrou a predominância de adolescentes escolares do sexo masculino (53,5%; n=46), com idades entre 14 e 18 anos, sendo a maioria com 16 anos (33,7%; n=29), que moram com os pais (59,3%; n=51); possuem renda familiar de mais de um salário-mínimo (50%; n=43); que se autodeclararam pardos (45,3%; n=39) e evangélicos (43%; n=37). Dos 86 adolescentes participantes do estudo, (39,5%; n=34) cursam o 1º ano do ensino médio; (33,7%; n=29) o 3º ano; e (26,8%; n=23) o 2º ano.
Quanto às características de consumo do álcool, os adolescentes relataram nunca ter utilizado (51,2%; n=44), usado raramente (29,1%; n=25), usado algumas vezes (9,3%; n=08), usado muitas vezes (3,5%; n=03) e usado sempre que podiam (4,7%; n=04). Além disso, relataram nunca ter utilizado tabaco (95,3%; n=82), usado raramente (3,5%; n=03) e já utilizaram muitas vezes (1,2%; n=01). Quanto as drogas ilícitas, 77 estudantes (91,4%) destacaram nunca ter feito uso; 3 (3,7%) terem usado raramente; o mesmo percentual foi visto para o consumo “sempre que posso” e “as vezes” (1,5%; n=1). Os demais preferiram não responder à questão.
O corpus do IRaMuTeQ foi desenvolvido a partir das respostas dos adolescentes às perguntas do estudo: “para você, o que são drogas?”, “quais tipos de drogas você conhece?”, e “quais as consequências relacionadas ao uso de álcool e outras drogas?”. As palavras mais evocadas foram organizadas na CHD, em que surgiram três classes apresentadas no dendrograma.
Foram identificadas 2924 ocorrências de palavras, distribuídas em 435 formas ativas. A análise do corpus proveniente das entrevistas dos adolescentes originou 101 ST, com ≥ 3:130 de frequências das formas ativas e um aproveitamento de 85,08% do corpus.
O dendrograma mostra o corpus delimitado em três classes em função da ocorrência e coocorrência das palavras mais significativas evocadas pelos adolescentes. Foi realizada a identificação, análise dos domínios textuais e interpretação dos significados das palavras para nomear suas respectivas classes. A CHD intitulada “Conhecimento de adolescentes sobre álcool e outras drogas” dividiu os ST em dois eixos, o primeiro eixo formou a classe 2 (Consequências) e a classe 1 (Representação), que se interligou com o segundo eixo, formando a classe 3 (Definição). A classe 1 contribuiu com 45,57% do total dos ST, sendo a principal classe a se analisar. As demais classes 2 e 3 contribuíram com 24,05% e 30,38%, respectivamente (Figura 1).
Figura 1 – Dendrograma da Classificação Hierárquica Descendente com as palavras representativas das classes de acordo com o software IRaMuTeQ. João Pessoa/PB, Brasil, 2019.
A Classe 2 – Consequências, abrange 24,05% do total dos ST, formada principalmente por adolescentes de 16 anos, do primeiro ano do ensino médio, religião umbandista, residindo apenas com a mãe, que fazem uso de álcool sempre que possível e fizeram uso de tabaco raramente e tiveram sua primeira exposição ao álcool e/ou outras drogas entre 13 e 14 anos. Esta classe foi constituída pelas palavras: mal, corpo, levar, pedra, viciar, não sei, morte, prejudicar e nenhum.
As drogas, representadas nessa classe pela palavra “pedra” são apresentadas pelo mal causado ao corpo, além de viciar e prejudicar o indivíduo, podendo causar sua morte. As respostas “não sei” ou “nenhum”, significativas nesta classe, estão associadas à fala dos adolescentes que não sabem ou não reconhecem as consequências das drogas.
Os adolescentes reportam causas e aspectos físicos que são provenientes do uso abusivo de drogas. Essas, por sua vez, ocasionam eventos negativos acarretando mudanças graves nesse processo. A natureza da violência é presente no seu contexto familiar e social, muitos designaram que não tem no seu ciclo familiar uma estrutura familiar, mostrando que a falta de conhecimento e de uma figura paterna e/ou de um arranjo familiar ineficiente funciona como um feedback negativo para adentrar no mundo das drogas ou fugir da sua realidade.
A Classe 1 – Representação, composta por 45,57% do total dos ST, formada principalmente por adolescentes com 18 anos de idade, do sexo masculino, residindo com os avós, com renda de um salário-mínimo e que nunca fez uso de tabaco. Esta classe foi constituída pelas palavras: ilícito, overdose, dependente, vida, ingerir, cirrose, LSD, fumar, alucinação, usuário, psicológico, droga, álcool, afetar, excessivo, consumir, cigarro, pulmão e lícito.
Essa classe é marcada por aspectos físicos e psicológicos, o primeiro ponto (overdose, dependência, cirrose, pulmão) corresponde aos sintomas e sinais físicos devido aos danos ocasionado pelo uso excessivo ao corpo e o segundo ponto (alucinação, psicológico) expressa consequências psíquicas.
Emergiram nessa classe conceitos da representação do que as drogas causam no organismo. Os adolescentes retratam conceitos mais precisos e impactantes ocasionado pelo uso excessivo de drogas ilícitas e lícitas. Isso se deve a um maior entendimento e conhecimento por parte deles com ênfase nos seus efeitos negativos. Os participantes recorram aos efeitos fisiológicos que as drogas causam ao organismo associado ao consumo excessivo, o qual pode provocar modificações nas funções psíquicas.
Os adolescentes enfatizam a percepção das drogas como algo ruim e danoso, no qual o indivíduo não tem controle. O padrão de consumo foi identificado como forma contínua e periódica podendo ocasionar problemas crônicos em decorrência ao consumo excessivo.
Destacaram-se as ideias de que drogas que são ilícitas estão associadas às formas de utilização: ingerir, fumar, consumo excessivo. Drogas ilícitas também foram associadas aos efeitos no organismo, como alucinação, tornar o indivíduo dependente, afetar o psicológico e causar overdose.
A Classe 3 – Definição, constituída por 30,38% dos ST, foi estabelecida em sua maioria por adolescentes com 17 anos de idade, do sexo feminino, de cor branca, cursando o terceiro ano do ensino médio, de religião católica, com renda maior que um salário-mínimo e que ingerem álcool muitas vezes. As palavras mais prevalentes desta classe foram: alterar, substância, mental, ecstasy, contato, consequência, funcionalidade, controle, organismo, físico, cocaína, entrar, entorpecente, ser humano e estado.
Nesta classe, as palavras apresentadas são bem diversas, apresentando alguns tipos de drogas, como ecstasy, cocaína e entorpecente. Além de defini-la como uma substância capaz de alterar a funcionalidade do organismo.
Buscou-se ainda no presente estudo, investigar a opinião dos adolescentes quanto as TE para prevenção do consumo de álcool e outras drogas, além das informações de seu interesse. Os resultados mostraram que (50%; n=43) mencionou o vídeo como TE de escolha, seguido de aplicativo (18,6%; n=16) para tecnologia móvel, gibi (17,4%; n=15), áudios e álbum seriado (ambos com 4,7%; n=04) e cartilhas (3,5%; n=03). Ressalta-se que alguns adolescentes mencionaram, ainda, estratégias como palestras, seriados, encenações e momentos de aconselhamento.
Para aprofundar a compreensão sobre a opinião dos adolescentes a respeito dos assuntos para prevenção do consumo de álcool e outras drogas que gostariam de ter acesso nas TE, utilizou-se o método Nuvem de Palavras para analisar suas respostas. Os resultados das evocações dos participantes podem ser visualizados na Figura 2.
Figura 2 – Nuvem de palavras que expressam os assuntos sobre álcool e outras drogas que os adolescentes gostariam de visualizar em uma tecnologia educacional. João Pessoa/PB, Brasil, 2019.
Os adolescentes atribuíram uma maior ênfase às palavras: como (de que maneira), droga, consequência, causar, usar e uso e a expressão “não sei” também foi bastante evocada. Entende-se, portanto, que os interesses dos adolescentes estão relacionados às dúvidas ou assuntos relacionados às consequências e efeitos associados ao uso das substâncias, bem como a forma de usar, mas também de como evitá-las. Semelhante aos resultados obtidos na classe 2 do dendrograma, foram observadas expressões “não sei” ou “não tenho”, representando o desconhecimento ou desinteresse pelo assunto.
Corroborando com os achados do presente estudo, dados epidemiológicos sobre o consumo de álcool e outras drogas entre jovens evidenciam que é na transição da infância para a adolescência que geralmente ocorre o primeiro contato com o álcool. Isso possivelmente ocorre pela busca incessante destes por novas descobertas, sobretudo da fase adulta. Quanto mais cedo ocorre o uso, consequências ainda mais graves podem ocorrer a curto e, também, a longo prazo, no futuro dos adolescentes e de toda a sociedade,15 visto que o consumo precoce de álcool e outras drogas causa prejuízos nos laços afetivos e em atividades laborais de adultos que iniciaram o uso de álcool ainda na adolescência.16
Para os participantes, as drogas representam aquilo que é ilícito e consumido em excesso, percepções estas que os torna vulneráveis ao consumo das substâncias permitidas por lei e socialmente aceitas, além de gerar uma ideia de capacidade do controle de uso. É comum entre os adolescentes considerar apenas as substâncias não permitidas por lei no país, o que está associado a um juízo de valor sobre determinadas drogas, onde as lícitas são entendidas como boas ou menos prejudiciais, enquanto as ilícitas são demonizadas e consideradas um mal que precisa ser combatido.17
As visões dos adolescentes sobre o tema refletem uma interpretação preocupante, pois, consideram que as drogas ilícitas são mais prejudiciais que as lícitas. Logo, os estudantes podem perceber que as drogas lícitas, por serem socialmente aceitas, não trazem tantos problemas quanto às ilícitas. Isso acontece, sobretudo, em relação ao álcool, visto que a mídia e a sociedade estimulam o consumo, seja com propagandas associadas à riqueza, humor, sucesso e ao prestígio, ou por meio da estreita relação da substância com momentos festivos e de confraternização.18
A respeito da representação das drogas pelos participantes sob a perspectiva do “consumo excessivo” ou overdose, estudo aponta que adolescentes com experiência de uso costumam adotar uma postura de controle do consumo, como se fossem capazes de evitar o vício.19 Porém, sabe-se que essas substâncias têm poder abusivo, de tolerância e dependência e o seu consumo está associado a diversos prejuízos, sobretudo na adolescência, pois o uso precoce pode tornar a interrupção ainda mais difícil, contribuindo com o desenvolvimento da dependência.20
Na tentativa de definir álcool e outras drogas, evidencia-se coerência nas respostas dos participantes, que as conceituam como substâncias que alteram o organismo do usuário, sobretudo o mental, embora tenha havido, ainda, uma forte menção ao “ilícito”. A droga, de fato, pode ser conceituada como qualquer substância não produzida pelo organismo que altera o seu funcionamento normal, podendo afetar a maneira de ser, pensar, sentir e agir,21 mas, as reflexões acerca dos seus conceitos não podem se resumir a sua legalidade, como visto em algumas respostas.
Objetivando ampliar o conhecimento dos adolescentes sobre a temática, e reduzir a visão simplista que muitos apresentam acerca das substâncias, TE aplicadas às ações de educação em saúde para este público apresentam impactos positivos. Benefícios podem ser exemplificados, como: confiabilidade, opção alternativa para o desenvolvimento de ações educativas, viabilidade, eficácia, caráter interativo, meio para aquisição de conhecimento científico, pensamento crítico-reflexivo; possibilidade de promover mudanças e aquisição de comportamentos positivos em saúde.10
Dessa forma, torna-se importante o papel da enfermagem na educação em saúde dos adolescentes e jovens no que diz respeito às novas descobertas da vida, sobretudo quanto ao uso de álcool e outras drogas, um tema permeado por tabus. A enfermagem, por ser a profissão do cuidado, tem a responsabilidade de levar aos adolescentes conhecimentos sobre estas substâncias, alertando principalmente para seus efeitos, de forma educativa e lúdica. Além de ensinar, é preciso provocá-los a pensar sobre a temática, o que pode ser feito por meio das TE, que além de recursos atrativos, são eficazes no aprendizado de quem utiliza.22
O Programa Saúde na Escola (PSE), iniciativa do Ministério da Saúde (MS) e da Educação (MEC), destaca a necessidade de políticas voltadas para trabalhar a prevenção ao uso de álcool e outras drogas entre crianças e adolescentes, por meio de ações educativas e participativas, visando promover o seu desenvolvimento pleno.23 As TE podem ser ferramentas de auxílio para o desenvolvimento destas ações.
O presente estudo buscou ainda, investigar a opinião dos adolescentes sobre as TE para ter acesso ao conteúdo sobre a temática álcool e outras drogas. No processo de desenvolvimento de TE para as ações de educação em saúde, é importante caracterizar a população-alvo antes de sua elaboração, objetivando um recurso adequado ao propósito e ao contexto educacional em que será utilizado.24
Foram mencionados como primeiras escolhas, os recursos baseados nas TIC’s: vídeo e aplicativos móveis. Embora as metodologias tradicionais de educação em saúde, como a transmissão oral de conteúdo, continuem a ser áreas importantes para a educação nas escolas, novas prioridades de saúde para jovens emergem como tendências de saúde e segurança, tais como dispositivos de tecnologia e práticas de mídia social.25 Os adolescentes dos dias de hoje fazem parte de uma geração denominada “Nativos Digitais”, “Geração Z”, ou, ainda, “Geração Digital”, que têm experimentado uma revolução tecnológica e se inquietam e avançam sobre as alterações sociotecnológicas de seu tempo.26
Quanto aos principais assuntos ou dúvidas sobre a temática, a Nuvem de Palavras mostrou o interesse dos adolescentes acerca das consequências do consumo de álcool e outras drogas e aos aspectos relacionados a como evitar ou até mesmo usar. Nas respostas, destacou-se ainda as expressões “não sei” ou “não tenho” dúvidas. É indispensável possibilitar aos adolescentes um conhecimento mais aprofundado sobre drogas, pautado em informações científicas, e que permitam uma aproximação com a complexidade e as implicações sociais e econômicas destas substâncias.18 Dessa forma é necessário a busca por novas estratégias para tentar modificar a realidade do consumo de álcool e outras drogas por eles.21
Intervenções educativas, planejadas e sistematizadas pelos profissionais de saúde, sobretudo pelo enfermeiro, utilizando TE elaboradas e validadas a partir das necessidades do público-alvo, favorecem uma escolha assertiva para se trabalhar temas em saúde. Portanto, tornam-se necessários investimentos em TE eficazes que primem pela autonomia do adolescente no processo de tomada de decisão.27
Limitações podem ser apontadas, como o fato do estudo de ter sido realizado apenas no contexto público de ensino e por meio de um instrumento de coleta de dados autoadministrado, o que pode comprometer a percepção de comportamentos e linguagem não verbal dos participantes, relevantes nas considerações dos pesquisadores. A coleta ter ocorrido em sala de aula também pode ser considerada uma fragilidade, tendo em vista a possibilidade de as respostas sofrerem influências desse ambiente.
O estudo poderá auxiliar pesquisadores que buscam desenvolver TE para prevenção do uso de álcool e outras drogas entre adolescentes, uma vez que que os resultados obtidos permitem visualizar as necessidades de conhecimento destes jovens, bem como sua opinião sobre o tipo de tecnologia e assuntos que mais têm interesse.
O presente estudo permitiu identificar, por meio das respostas dos adolescentes escolares, que drogas são substâncias que acarretam aos indivíduos consequências negativas, mas que, embora conscientes desses danos, somente 51,2% relatam nunca terem utilizado álcool. Observou-se que para os participantes, as drogas representam as substâncias ilícitas e que sejam consumidas em excesso, podendo caracterizar uma desconsideração das substâncias permitidas por lei como danosas e a possibilidade de uso, desde que não seja em grandes quantidades, demostrando uma ideia de autocontrole do consumo.
Quanto à opinião sobre as tecnologias educacionais na temática de álcool e outras drogas, houve destaque para os recursos baseados nas TIC’s, como o vídeo e aplicativos móveis. Os adolescentes evidenciaram a importância de recursos que disponibilizem informações sobre as consequências do consumo, aspectos relacionados a estratégias para evitar utilizar essas substâncias, assim como formas de utilização delas.
Estes resultados mostram a necessidade de se desenvolver estratégias de educação em saúde para prevenção do uso de álcool e outras drogas entre adolescentes. Revela-se necessário garantir o acesso a informações corretas e adequadas sobre essa questão de saúde pública. As TE são importantes ferramentas nesse processo, mas precisam ser desenvolvidas considerando as especificidades do público a que se destina.
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Contribuições de autoria
1 – Laura Cristhiane Mendonça Rezende Chaves
Autor Correspondente
Enfermeira. Mestre em Enfermagem - E-mail: lauracristhiane@hotmail.com
Concepção e/ou desenvolvimento da pesquisa e/ou redação do manuscrito, revisão e aprovação da versão final.
2 – Iracema da Silva Frazão
Enfermeira. Doutora em Serviço Social - E-mail: isfrazao@gmail.com
Concepção e/ou desenvolvimento da pesquisa e/ou redação do manuscrito, revisão e aprovação da versão final.
3 – Letícia Menezes de Oliveira
Graduanda em Enfermagem - E-mail: leticia_menezmenezes@hotmail.com
Concepção e/ou desenvolvimento da pesquisa e/ou redação do manuscrito.
4 – Gesualdo Gonçalves de Abrantes
Enfermeiro. E-mail: gesualdomandragora@hotmail.com
Concepção e/ou desenvolvimento da pesquisa e/ou redação do manuscrito.
5 – Camila Biazus-Dalcin
Enfermeira. Doutora em Enfermagem - E-mail: cdalcin001@dundee.ac.uk
Concepção e/ou desenvolvimento da pesquisa e/ou redação do manuscrito.
6 – Selene Cordeiro Vasconcelos
Enfermeira. Pós-doutorado em Neurociências. E-mail: selene.cordeiro@academico.ufpb.br
revisão e aprovação da versão final.
Editora Científica Chefe: Cristiane Cardoso de Paula
Editora associada: Nara Marilene Oliveira Girardon-Perlini
Como citar este artigo
Chaves LCMR, Frazão IS, Oliveira LM, Abrantes GG, Biazus-Dalcin C, Vasconcelos SC. Teenagers’ knowledge about alcohol and other drugs and their opinion about educational technologies. Rev. Enferm. UFSM. 2022 [Access in: Year Month Day]; vol.12 e9: 1-16. DOI: https://doi.org/10.5902/2179769267045