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Rev. Enferm. UFSM, v.12, e7, p.1-20, 2022
https://doi.org/10.5902/2179769266542
ISSN 2179-7692
Submissão: 02/07/2021 • Aprovação: 28/01/2022 • Publicação: 09/03/2022
Artigo Original
Aptidão, conhecimento e atitude de profissionais da educação infantil sobre primeiros socorros*
Aptitude, knowledge and attitude of early childhood education professionals about first aid*
Aptitud, conocimiento y actitud de los profesionales de la educación infantil sobre los primeros auxilios
Tatiana Carvalho Reis MartinsI
I Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Três Lagoas, MS, Brasil
* Extraído da dissertação “Efetividade de uma intervenção educativa em primeiros socorros para profissionais que atuam na educação infantil”, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Enfermagem do Campus Três Lagoas (CPTL), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, 2021.
Resumo
Objetivo: analisar a aptidão, o conhecimento e a atitude de profissionais da educação infantil que participaram ou não de capacitação em primeiros socorros. Método: estudo transversal, desenvolvido com 132 profissionais da educação infantil do município de Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, Brasil, por meio de questionário no Google Forms. Aplicaram-se os testes qui-quadrado ou Exato de Fisher. Resultados: dos 132 profissionais, 67 relataram não ter participado anteriormente de capacitação em primeiros socorros. A maioria sente-se apta a prestar atendimento nas situações de febre, ferimentos e sangramentos. Aqueles que já participaram de capacitação acertaram mais respostas referentes ao conhecimento dos conceitos de febre, convulsão, desmaio, trauma, parada cardiorrespiratória e acidente por animal peçonhento; e referente às atitudes para convulsão, desmaio, engasgo, queda/trauma e parada cardiorrespiratória. Conclusão: ter participado de capacitação proporcionou aos profissionais maior conhecimento e assertividade referente à atitude a ser tomada nas situações de emergência.
Descritores: Educação em Saúde; Emergências; Primeiros Socorros; Educação Infantil; Promoção da Saúde
Abstract
Objective: to analyze the aptitude, knowledge and attitude of early childhood education professionals who participated or not in first aid training. Method: cross-sectional study, developed with 132 professionals in early childhood education in the municipality of Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, Brazil, using a questionnaire on Google Forms. The Chi-square or Fisher’s Exact tests were applied. Results: of the 132 professionals, 67 reported that they had not previously participated in first aid training. Most feel able to provide care in situations of fever, wounds and bleeding. Those who had participated in training had more answers regarding knowledge of the concepts of fever, seizure, fainting, trauma, cardiorespiratory arrest and accidents caused by poisonous animals; and regarding attitudes towards seizure, fainting, choking, fall/trauma and cardiorespiratory arrest. Conclusion: having participated in training provided professionals with greater knowledge and assertiveness regarding the attitude to be taken in emergency situations.
Descriptors: Health Education; Emergencies; First Aid; Child Rearing; Health Promotion
Resumen
Objetivo: analizar la aptitud, los conocimientos y la actitud de los profesionales de la educación infantil que participaron o no en la formación en primeros auxilios. Método: estudio transversal, desarrollado con 132 profesionales de la educación infantil del ayuntamiento de Três Lagoas, Mato Grosso do Sul, Brasil, mediante preguntas en Google Forms. Se aplicaron las pruebas de Chi-cuadrado o Exacta de Fisher. Resultados: de los 132 profesionales, 67 declararon no haber participado previamente en la formación de primeros auxilios. La mayoría de ellos se sienten capaces de brindar atención en situaciones de fiebre, heridas y hemorragias. Los que habían participado en la formación tenían más respuestas correctas en cuanto al conocimiento de los conceptos de fiebre, convulsión, desmayo, trauma, parada cardiorrespiratoria y accidentes con animales venenosos; y en cuanto a las actitudes hacia la convulsión, el desmayo, el atragantamiento, la caída/el trauma y la parada cardiorrespiratoria. Conclusión: haber participado en la capacitación proporcionó a los profesionales un mayor conocimiento y asertividad en relación con la actitud a tomar en las situaciones de emergencia.
Descriptores: Educacion en Salud; Emergencias; Primeros Auxilios; Crianza del Niño; Promoción de la Salud
Os primeiros socorros consistem no atendimento imediato ao indivíduo que se encontre doente ou ferido, e possuem dois objetivos: evitar o agravamento do estado da vítima e mantê-la viva até que o atendimento especializado seja possível. Esse atendimento inicial pode ser realizado por qualquer pessoa previamente treinada, não sendo restrito a profissionais da área da saúde.1 As situações que necessitam dessa abordagem rápida e eficiente são inúmeras e em muitos casos envolvem crianças, que são mais vulneráveis devido a características específicas de seu desenvolvimento físico e comportamental e merecem atenção especial.2
Os acidentes são a principal causa de morte em crianças em todo o mundo.2 Nesse contexto, o ambiente escolar, local onde as crianças passam a maior parte do dia, é um importante espaço em que se deve trabalhar a prevenção e o primeiro atendimento às vítimas de acidente, visto que situações que requerem primeiros socorros são frequentemente notificadas nas escolas.2
A educação infantil abrange o ensino a crianças de quatro meses a cinco anos de idade, contemplando diversas fases do desenvolvimento infantil, em que há muita curiosidade e descobertas, levando a uma maior suscetibilidade destes indivíduos a sofrerem acidentes. As escolas são locais com grande potencial para acidentes, devido ao tempo que as crianças passam no mesmo espaço, as atividades e brincadeiras realizadas, somados ao número reduzido de profissionais para supervisionar os menores.3
As circunstâncias que requerem atenção médica são comuns nas escolas e os professores são muitas vezes os primeiros indivíduos a presenciar emergências médicas com crianças no ambiente escolar.4 Além do seu compromisso educacional e pedagógico, os funcionários das escolas possuem a responsabilidade de cuidar da segurança das crianças, dedicando-se a sua formação e bem-estar.5 Essa segunda função, às vezes é negligenciada e por isso que diante de situações de urgência e emergência não sabem que atitude tomar.6
Neste contexto, espera-se que os profissionais que trabalham nestas instituições sejam capacitados periodicamente em seus conhecimentos e habilidades, para que se sintam aptos em atuar nas situações de urgência e emergência que possam ocorrer com os alunos.6 Porém, observa-se que há uma deficiência de conhecimento sobre essas temáticas por parte dos profissionais,7 e que apesar de sua relevância são escassos os estudos que avaliam o conhecimento, atitude e prática em primeiros socorros de professores da educação infantil.8 A avaliação dessas competências é fundamental para fornecer às autoridades educacionais e de saúde um panorama da realidade, e assim possam planejar e organizar capacitações sobre a temática com a finalidade de aprimorar o conhecimento, as habilidades e as atitudes desses profissionais.9
As práticas de educação em saúde são importantes na prevenção de doenças e promoção de saúde, visto que a detenção do conhecimento possibilita uma maior argumentação crítica, instrumentaliza o leigo e facilita a incorporação de medidas benéficas para a saúde, que atendam às suas necessidades. No quesito primeiros socorros, a educação em saúde assume papel primordial, por ser a maior premissa à prevenção de agravos e até mesmo colaborando com o salvamento de vidas. No entanto, o não conhecimento das práticas adequadas pode comprometer ainda mais a saúde da vítima.1
Acredita-se que as capacitações em primeiros socorros aumentam o conhecimento dos participantes, melhorando sua confiança no atendimento às situações de emergência. Assim, objetivou-se com esse estudo analisar a aptidão, o conhecimento e a atitude de profissionais da educação infantil que participaram ou não de capacitação em primeiros socorros.
Trata-se de um estudo transversal, desenvolvido nos Centros de Educação Infantil (CEIs) do município de Três Lagoas, Mato Grosso do Sul (MS). Atualmente a Rede Municipal de Ensino de Três Lagoas possui 19 CEIs com um total de 701 funcionários, dentre eles professores, atendentes de educação infantil, estagiários, auxiliares de escola, diretores, coordenadores, entre outros.
A seleção dos CEIs para o estudo foi por conveniência, considerando os que apresentavam uma maior necessidade de educação em saúde sobre primeiros socorros, de acordo com a sugestão da Secretaria de Educação do município, o interesse dos colaboradores e a facilidade de acesso à internet para participar da pesquisa. Foram selecionados para participar do estudo cinco CEIs, o que corresponde a um total de 195 funcionários. O contato dos participantes foi disponibilizado pela direção da escola.
Os critérios de inclusão foram: ser maior de 18 anos de idade e ser profissional que atua diretamente com as crianças nos CEIs. Excluíram-se os funcionários que se encontravam em licença médica, férias ou folga, pela impossibilidade de contatá-los no período do estudo.
A coleta de dados ocorreu de forma on-line, com o auxílio do aplicativo Google Forms em setembro de 2020. O link dos questionários foi enviado para o aplicativo de mensagens instantâneas WhatsApp e/ou e-mail dos participantes. Foram convidadas a participar do estudo 195 pessoas, entretanto, após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, a amostra resultou em n=132 participantes (taxa de resposta 67,7%).
O questionário contemplou dados sociodemográficos, de experiência e conhecimentos específicos sobre primeiros socorros. Como não havia questionário disponível em português no momento do estudo, duas enfermeiras com especialidade e experiência em urgência e emergência se encarregaram de elaborar as questões, pautadas na literatura. Primeiramente foi realizada uma revisão da literatura, de forma a verificar quais questões seriam relevantes conter no instrumento. As questões referentes ao conhecimento e atitudes dos profissionais sobre primeiros socorros foram elaboradas segundo o Protocolo de Suporte Básico de Vida do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU),10 as Diretrizes da American Heart Association e outros estudos com temática semelhante.11-13 O questionário foi composto por questões objetivas e subjetivas. As questões subjetivas estavam relacionadas ao conhecimento e à atitude dos profissionais sobre situações de urgência e emergência, e as respostas foram categorizadas para permitir uma análise quantitativa dos dados. Por fim, a adequação do instrumento foi realizada por meio de um teste piloto com a participação de 10 funcionários que atuam em escolas, solicitando a opinião acerca do conteúdo e clareza do questionário, em que todos aprovaram o questionário e não foi necessário realizar alterações no mesmo.
O questionário foi dividido da seguinte forma:
- Variáveis sociodemográficas: sexo, idade, estado civil, número de filhos, função no CEI, escolaridade.
- Experiência com primeiros socorros: Já participou de alguma capacitação sobre primeiros socorros? Há quanto tempo foi a capacitação? Sente necessidade de saber mais sobre primeiros socorros? A unidade em que trabalha possui kit de primeiros socorros?
- Variáveis relacionadas ao sentimento de aptidão: Sente-se apto para prestar atendimento nas situações de sangramento, febre, ferimento, queimadura, convulsão, desmaio, engasgo, queda/trauma, parada cardiorrespiratória, reação alérgica, choque elétrico, acidente por animal peçonhento?
- Conhecimentos específicos: Foram feitas questões abertas sobre o conhecimento dos conceitos relacionados a primeiros socorros (O que é uma febre/ queimadura/ convulsão/ desmaio/ engasgo/ trauma/ parada cardiorrespiratória/ acidente por animal peçonhento?).
- Variáveis relacionadas à atitude: foram elaboradas questões abertas acerca da atitude diante de situações de urgência e emergência que necessitam dos primeiros socorros (O que você faz diante de uma febre/ ferimento sangrando/ sangramento nasal/ queimadura/ convulsão/ desmaio/ engasgo/ queda ou trauma/ parada cardiorrespiratória/ acidente por animal peçonhento?).
As questões dissertativas (conhecimentos específicos e variáveis relacionadas à atitude) foram analisadas de forma minuciosa, baseando-se no Protocolo de Suporte Básico de Vida do SAMU10 e nas Diretrizes da American Heart Association,11 e categorizadas em: corretas, parcialmente corretas, incorretas e não sabe. A análise foi realizada por dois pesquisadores separadamente, e os resultados divergentes foram discutidos em conjunto, para evitar resultados tendenciosos. Os pesquisadores que conduziram a análise são enfermeiros com expertise e experiência na área de primeiros socorros e especialistas em urgência e emergência.
Foram realizadas análises descritivas dos dados com frequências absolutas e relativas. A seguir foram aplicados os testes de qui-quadrado ou Exato de Fisher para analisar as associações entre as respostas e os grupos (com ou sem participação em capacitação sobre primeiros socorros). Todas as análises foram realizadas com auxílio do programa R e com nível de significância de 5% (p ≤ 0,05).
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (CAAE 20536919.5.0000.0021). Executou-se o estudo conforme os termos da Resolução nº 466/2012, que regulamenta as diretrizes e normas da pesquisa com seres humanos. A coleta de dados ocorreu após leitura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Após ler sobre a pesquisa e concordar em responder ao questionário, o participante poderia fazer o download do TCLE.
Participaram deste estudo 132 profissionais que atuam nos CEIs. A maioria dos participantes eram mulheres (97,0%), com média de idade 38,5 anos (±9,81), vivia com companheiro (59,1%), e tinha um ou dois filhos (31,1% cada). Quanto à função exercida no CEI houve predomínio de professores (45,5%), seguidos por atendentes de educação infantil (21,2%), sendo que a maior parte já havia cursado pós-graduação (45,5%). Mais da metade dos participantes (50,8%) não participou de capacitação sobre primeiros socorros, e dentre os que participaram a maioria foi há mais de cinco anos (16,7%). Ressalta-se que todos referiam sentir necessidade de saber mais sobre primeiros socorros, e 56,1% disseram que o CEI que trabalham possui kit de primeiros socorros (Tabela 1).
Tabela 1 - Características sociodemográficas dos profissionais da educação infantil (n=132). Três Lagoas, MS, Brasil, 2020.
Variáveis |
Frequência (%) |
Sexo |
|
Feminino |
128 (97,0) |
Masculino |
4 (3,0) |
Idade (anos, média ± desvio padrão) |
38,5 (±9,81) |
19 a 29 |
25 (18,9) |
30 a 39 |
46 (34,8) |
40 a 49 |
41 (31,1) |
50 a 59 |
17 (12,9) |
60 a 67 |
3 (2,3) |
Estado civil |
|
Com companheiro |
78 (59,1) |
Sem companheiro |
54 (40,9) |
Número de filhos |
|
0 |
28 (21,2) |
1 |
41 (31,1) |
2 |
41 (31,1) |
3 |
14 (10,6) |
4 ou mais |
8 (6,1) |
Função no Centro de Educação Infantil |
|
Diretor (a) |
3 (2,3) |
Coordenador (a) |
5 (3,8) |
Professor (a) |
60 (45,5) |
Atendente de educação infantil |
28 (21,2) |
Auxiliar de escola |
7 (5,3) |
Estagiário (a) |
23 (17,4) |
Outra |
6 (4,5) |
Escolaridade |
|
Fundamental incompleto |
1 (0,8) |
Fundamental completo |
1 (0,8) |
Médio incompleto |
3 (2,3) |
Médio completo |
10 (7,6) |
Superior incompleto |
32 (24,2) |
Superior completo |
25 (18,9) |
Pós-graduação |
60 (45,5) |
Participou de capacitação anterior sobre primeiros socorros |
|
Sim |
65 (49,2) |
Não |
67 (50,8) |
Há quanto tempo foi a capacitação |
|
Menos de 1 ano |
7 (5,3) |
Entre 1 e 3 anos |
19 (14,4) |
Entre 3 e 5 anos |
17 (12,9) |
Mais de 5 anos |
22 (16,7) |
Não respondeu |
67 (50,8) |
Sente necessidade de saber mais sobre primeiros socorros |
|
Sim |
132 (100,0) |
A unidade em que trabalha possui kit de primeiros socorros |
|
Sim |
74 (56,1) |
Não |
58 (43,9) |
Para sentimento de aptidão (Tabela 2), as situações em que a maioria dos participantes se sentem aptos a prestar atendimento foram febre (87,1%), ferimentos (62,1%) e sangramentos (58,3%). Para as outras situações, uma grande porcentagem de profissionais não se sente apta, destacando-se os casos de choque elétrico (84,8%), parada cardiorrespiratória (82,6%), queda/traumas (75,0%), animal peçonhento (75,0%), reação alérgica (72,7%) e convulsão (71,2%). Houve associação significativa para a variável sangramentos (p=0,0124). Entre os profissionais que participaram de capacitação, 69,2% se sentem aptos a prestar atendimento em casos de sangramentos, já no grupo que não participou essa porcentagem é de 47,8%. A variável engasgo apresentou p-valor próximo ao limiar (p=0,0560), sendo que 56,9% e 40,3% dos profissionais com e sem capacitação, respectivamente, se sentem aptos a prestar atendimento em casos de engasgo.
Tabela 2 - Sentimento de aptidão em prestar atendimento em situações de urgência e emergência em profissionais da educação infantil que participaram ou não de uma capacitação em primeiros socorros (n=132). Três Lagoas, MS, Brasil, 2020.
Variáveis |
Total |
Participou de capacitação sobre primeiros socorros |
p-valor* |
|
Sim |
Não |
|||
n (%) |
n (%) |
|||
Sangramentos |
|
|
|
|
Sim |
77 (58,3) |
45 (69,2) |
32 (47,8) |
0,0124 |
Não |
55 (41,7) |
20 (30,8) |
35 (52,2) |
|
Febre |
|
|
|
|
Sim |
115 (87,1) |
57 (87,7) |
58 (86,6) |
0,8470 |
Não |
17 (12,9) |
8 (12,3) |
9 (13,4) |
|
Ferimentos |
|
|
|
|
Sim |
82 (62,1) |
40 (61,5) |
42 (62,7) |
0,8919 |
Não |
50 (37,9) |
25 (38,5) |
25 (37,3) |
|
Queimaduras |
|
|
|
|
Sim |
45 (34,1) |
22 (33,8) |
23 (34,3) |
0,9534 |
Não |
87 (65,9) |
43 (66,2) |
44 (65,7) |
|
Convulsão |
|
|
|
|
Sim |
38 (28,8) |
22 (33,8) |
16 (23,9) |
0,2061 |
Não |
94 (71,2) |
43 (66,2) |
51 (76,1) |
|
Desmaio |
|
|
|
|
Sim |
44 (33,3) |
24 (36,9) |
20 (29,9) |
0,3888 |
Não |
88 (66,7) |
41 (63,1) |
47 (70,1) |
|
Engasgo |
|
|
|
|
Sim |
64 (48,5) |
37 (56,9) |
27 (40,3) |
0,0560 |
Não |
68 (51,5) |
28 (43,1) |
40 (59,7) |
|
Queda/traumas |
|
|
|
|
Sim |
33 (25,0) |
18 (27,7) |
15 (22,4) |
0,4817 |
Não |
99 (75,0) |
47 (72,3) |
52 (77,6) |
|
Parada cardiorrespiratória |
|
|
|
|
Sim |
23 (17,4) |
12 (18,5) |
11 (16,4) |
0,7570 |
Não |
109 (82,6) |
53 (81,5) |
56 (83,6) |
|
Reação alérgica |
|
|
|
|
Sim |
36 (27,3) |
18 (27,7) |
18 (26,9) |
0,9151 |
Não |
96 (72,7) |
47 (72,3) |
49 (73,1) |
|
Choque elétrico |
|
|
|
|
Sim |
20 (15,2) |
10 (15,4) |
10 (14,9) |
0,9414 |
Não |
112 (84,8) |
55 (84,6) |
57 (85,1) |
|
Animal peçonhento |
|
|
|
|
Sim |
33 (25,0) |
18 (27,7) |
15 (22,4) |
0,4817 |
Não |
99 (75,0) |
47 (72,3) |
52 (77,6) |
|
*Teste de qui-quadrado.
Quanto ao conhecimento dos conceitos das situações relacionadas a primeiros socorros (Tabela 3), tiveram maior porcentagem de respostas totalmente corretas às situações de acidente por animal peçonhento (69,7%), desmaio (68,9%) e engasgo (67,4%). As maiores proporções de respostas incorretas foram febre (22,7%) e parada cardiorrespiratória (22,0%). Nota-se associação significativa para situações de febre, convulsão, desmaio, trauma, parada cardiorrespiratória e acidente por animal peçonhento, com menores porcentagens de respostas corretas no grupo que não participou de capacitação.
Tabela 3 – Conhecimento sobre os conceitos das situações relacionadas a primeiros socorros entre os profissionais que participaram ou não de uma capacitação em primeiros socorros (n=132). Três Lagoas, MS, Brasil, 2020.
Variáveis |
Total |
Participou de capacitação sobre primeiros socorros |
p-valor |
|
Sim |
Não |
|||
n (%) |
n (%) |
|||
Febre |
|
|
|
|
Correto |
62 (47,0) |
38 (58,5) |
24 (35,8) |
*0,0076 |
Parcialmente correto |
40 (30,3) |
19 (29,2) |
21 (31,3) |
|
Incorreto |
30 (22,7) |
8 (12,3) |
22 (32,8) |
|
Queimadura |
|
|
|
|
Correto |
50 (37,9) |
28 (43,1) |
22 (32,8) |
†0,1205 |
Parcialmente correto |
71 (53,8) |
35 (53,8) |
36 (53,7) |
|
Incorreto |
1 (0,8) |
0 (0,0) |
1 (1,5) |
|
Não sabe |
10 (7,6) |
2 (3,1) |
8 (11,9) |
|
Convulsão |
|
|
|
|
Correto |
28 (21,2) |
19 (29,2) |
9 (13,4) |
*0,0328 |
Parcialmente correto |
55 (41,7) |
27 (41,5) |
28 (41,8) |
|
Incorreto |
21 (15,9) |
11 (16,9) |
10 (14,9) |
|
Não sabe |
28 (21,2) |
8 (12,3) |
20 (29,9) |
|
Desmaio |
|
|
|
|
Correto |
91 (68,9) |
52 (80,0) |
39 (58,2) |
†0,0067 |
Parcialmente correto |
28 (21,2) |
10 (15,4) |
18 (26,9) |
|
Incorreto |
3 (2,3) |
2 (3,1) |
1 (1,5) |
|
Não sabe |
10 (7,6) |
1 (1,5) |
9 (13,4) |
|
Engasgo |
|
|
|
|
Correto |
89 (67,4) |
46 (70,8) |
43 (64,2) |
†0,4327 |
Parcialmente correto |
25 (18,9) |
13 (20,0) |
12 (17,9) |
|
Incorreto |
9 (6,8) |
4 (6,2) |
5 (7,5) |
|
Não sabe |
9 (6,8) |
2 (3,1) |
7 (10,4) |
|
Trauma |
|
|
|
|
Correto |
34 (25,8) |
26 (40,0) |
8 (11,9) |
*<0,0001 |
Parcialmente correto |
60 (45,5) |
29 (44,6) |
31 (46,3) |
|
Incorreto |
13 (9,8) |
6 (9,2) |
7 (10,4) |
|
Não sabe |
25 (18,9) |
4 (6,2) |
21 (31,3) |
|
Parada cardiorrespiratória |
|
|
|
|
Correto |
47 (35,6) |
26 (40,0) |
21 (31,3) |
*0,0217 |
Parcialmente correto |
32 (24,2) |
17 (26,2) |
15 (22,4) |
|
Incorreto |
29 (22,0) |
17 (26,2) |
12 (17,9) |
|
Não sabe |
24 (18,2) |
5 (7,7) |
19 (28,4) |
|
Acidente por animal peçonhento |
|
|
|
|
Correto |
92 (69,7) |
51 (78,5) |
41 (61,2) |
†0,0385 |
Parcialmente correto |
31 (23,5) |
12 (18,5) |
19 (28,4) |
|
Incorreto |
4 (3,0) |
2 (3,1) |
2 (3,0) |
|
Não sabe |
5 (3,8) |
0 (0,0) |
5 (7,5) |
|
*Teste de qui-quadrado; †Teste Exato de Fisher.
Foram também analisadas as respostas quanto às atitudes que tomariam diante das situações que necessitam de primeiros socorros (Tabela 4). As situações com mais atitudes corretas foram febre e ferimento sangrando (51,5% cada). E as com maior proporção de atitudes incorretas foram sangramento nasal (51,5%) e engasgo (20,5%). As respostas em relação à convulsão, desmaio, engasgo, queda/trauma e parada cardiorrespiratória apresentaram associação significativa, com menor porcentagem de respostas corretas entre os profissionais sem participação em capacitação. Para parada cardiorrespiratória, apesar da porcentagem de respostas corretas ter sido significativamente menor no grupo sem capacitação (6,0%), essa também foi baixa no grupo com capacitação (10,8%).
Tabela 4 – Atitude dos profissionais diante de situações de urgência e emergência que necessitam de primeiros socorros entre aqueles que participaram ou não de uma capacitação em primeiros socorros (n=132). Três Lagoas, MS, Brasil, 2020.
Variáveis |
Total |
Participou de capacitação sobre primeiros socorros |
p-valor |
|
Sim |
Não |
|||
n (%) |
n (%) |
|||
Febre |
|
|
|
|
Correto |
68 (51,5) |
39 (60,0) |
29 (43,3) |
†0,1676 |
Parcialmente correto |
39 (29,5) |
17 (26,2) |
22 (32,8) |
|
Incorreto |
6 (4,5) |
1 (1,5) |
5 (7,5) |
|
Não sabe |
19 (14,4) |
8 (12,3) |
11 (16,4) |
|
Ferimento sangrando |
|
|
|
|
Correto |
68 (51,5) |
37 (56,9) |
31 (46,3) |
†0,6076 |
Parcialmente correto |
45 (34,1) |
20 (30,8) |
25 (37,3) |
|
Incorreto |
8 (6,1) |
4 (6,2) |
4 (6,0) |
|
Não sabe |
11 (8,3) |
4 (6,2) |
7 (10,4) |
|
Sangramento nasal |
|
|
|
|
Correto |
16 (12,1) |
9 (13,8) |
7 (10,4) |
*0,4243 |
Parcialmente correto |
37 (28,0) |
20 (30,8) |
17 (25,4) |
|
Incorreto |
68 (51,5) |
33 (50,8) |
35 (52,2) |
|
Não sabe |
11 (8,3) |
3 (4,6) |
8 (11,9) |
|
Queimadura |
|
|
|
|
Correto |
50 (37,9) |
26 (40,0) |
24 (35,8) |
*0,7174 |
Parcialmente correto |
25 (18,9) |
14 (21,5) |
11 (16,4) |
|
Incorreto |
24 (18,2) |
10 (15,4) |
14 (20,9) |
|
Não sabe |
33 (25,0) |
15 (23,1) |
18 (26,9) |
|
Convulsão |
|
|
|
|
Correto |
63 (47,7) |
40 (61,5) |
23 (34,3) |
*0,0079 |
Parcialmente correto |
13 (9,8) |
7 (10,8) |
6 (9,0) |
|
Incorreto |
17 (12,9) |
5 (7,7) |
12 (17,9) |
|
Não sabe |
39 (29,5) |
13 (20,0) |
26 (38,8) |
|
Desmaio |
|
|
|
|
Correto |
40 (30,3) |
28 (43,1) |
12 (17,9) |
*0,0045 |
Parcialmente correto |
30 (22,7) |
16 (24,6) |
14 (20,9) |
|
Incorreto |
19 (14,4) |
7 (10,8) |
12 (17,9) |
|
Não sabe |
43 (32,6) |
14 (21,5) |
29 (43,3) |
|
Engasgo |
|
|
|
|
Correto |
40 (30,3) |
29 (44,6) |
11 (16,4) |
*0,0024 |
Parcialmente correto |
35 (26,5) |
17 (26,2) |
18 (26,9) |
|
Incorreto |
27 (20,5) |
9 (13,8) |
18 (26,9) |
|
Não sabe |
30 (22,7) |
10 (15,4) |
20 (29,9) |
|
Queda/Trauma |
|
|
|
|
Correto |
26 (19,7) |
18 (27,7) |
8 (11,9) |
*0,0257 |
Parcialmente correto |
45 (34,1) |
25 (38,5) |
20 (29,9) |
|
Incorreto |
10 (7,6) |
3 (4,6) |
7 (10,4) |
|
Não sabe |
51 (38,6) |
19 (29,2) |
32 (47,8) |
|
Parada cardiorrespiratória |
|
|
|
|
Correto |
11 (8,3) |
7 (10,8) |
4 (6,0) |
†0,0038 |
Parcialmente correto |
54 (40,9) |
34 (52,3) |
20 (29,9) |
|
Incorreto |
4 (3,0) |
3 (4,6) |
1 (1,5) |
|
Não sabe |
63 (47,7) |
21 (32,3) |
42 (62,7) |
|
Acidente por animal peçonhento |
|
|
|
|
Correto |
22 (16,7) |
12 (18,5) |
10 (14,9) |
*0,6640 |
Parcialmente correto |
32 (24,2) |
17 (26,2) |
15 (22,4) |
|
Incorreto |
12 (9,1) |
7 (10,8) |
5 (7,5) |
|
Não sabe |
66 (50,0) |
29 (44,6) |
37 (55,2) |
|
*Teste de qui-quadrado; †Teste Exato de Fisher.
Participaram deste estudo 132 profissionais que atuam em CEIs, e constatou-se que a maioria dos participantes era do sexo feminino, o que é uma característica observada no cenário brasileiro, como observado em outro estudo com profissionais da educação infantil no país.14
A educação em saúde mostra-se efetiva na capacitação de leigos em primeiros socorros, mediante diferentes metodologias, destacando-se os cursos de capacitação, ministrados principalmente por profissionais de saúde e do corpo de bombeiros, os quais evidenciam melhora significativa das respostas corretas pós-intervenção.1 Apenas 49,2% dos participantes deste estudo referem já ter participado de alguma capacitação sobre primeiros socorros, dentre os que realizaram, a maioria foi há mais de 5 anos. Uma pesquisa realizada no Brasil mostra uma realidade parecida, em que 56,8% dos profissionais de educação não tinham nenhuma capacitação sobre o tema, e 68,5% dos que realizaram foi há mais de dois anos.13 Uma investigação realizada na Etiópia com professores do Jardim de Infância encontrou que cerca de um terço dos entrevistados teve treinamento prévio em primeiros socorros, valor inferior ao encontrado no presente trabalho.8
Em contrapartida, nos países desenvolvidos o acesso aos treinamentos em primeiros socorros é maior do que naqueles em desenvolvimento.8 Na Noruega, em uma pesquisa realizada por telefone, os resultados foram mais satisfatórios, o que pode ser justificado porque nesse país o treinamento em primeiros socorros faz parte do currículo escolar e também é uma exigência para a obtenção da carteira de habilitação. No estudo, os participantes tinham 15 anos de idade ou mais, e a maioria relatou ter pelo menos algum treinamento em primeiros socorros (90%), sendo esse treinamento nos últimos cinco anos (54%).15 Os achados da atual investigação e de outras realizadas em países em desenvolvimento confirmam a desatenção das autoridades em relação a necessidade de planejar e implementar programas de treinamento de primeiros socorros para todos os professores e funcionários que atuam nas escolas.6,8
Nos acidentes escolares, os professores são geralmente aqueles que prestam o atendimento inicial às crianças, por isso, é fundamental que se sintam aptos a realizar uma intervenção adequada. Um estudo realizado com 331 professores na Turquia, evidenciou que eles possuíam informações sobre primeiros socorros, mas não confiavam em si mesmos para praticá-los.16 O conhecimento teórico nem sempre reflete as habilidades práticas,15 reforçando a necessidade de que a capacitação envolva tanto o conteúdo teórico como a parte prática, para o desenvolvimento das habilidades requeridas nestas situações.
Neste estudo a porcentagem de profissionais que não se sentiam aptos em prestar atendimento em diversas situações que requeriam primeiros socorros foi elevada. Em outras investigações, grande parte dos professores também afirmou que não se sentiam aptos para prestar os primeiros socorros. O nível de confiança dos professores em administrar os primeiros socorros estava associado a ter participado de um treinamento anterior. Assim, é importante assegurar que os treinamentos em primeiros socorros sejam permanentes, de forma a garantir que as informações fornecidas, bem como as habilidades desenvolvidas para aplicação, sejam constantemente relembradas e atualizadas.6,16
O conhecimento insuficiente dos professores sobre os primeiros socorros pode reduzir a chance de oferecer atendimento adequado e oportuno nas situações de urgência e emergência, o que pode aumentar o risco de complicações após qualquer acidente no ambiente escolar. Estudos transversais desenvolvidos na Etiópia (n=194) e Índia (n=146) que tinham como um dos objetivos investigar o conhecimento dos professores sobre primeiros socorros encontraram que o conhecimento foi significativamente maior entre aqueles que receberam treinamento prévio,6,8 resultado semelhante aos nossos achados. No presente estudo, todos os entrevistados sentiam necessidade de saber mais sobre primeiros socorros, o que reflete a necessidade de proporcionar aos professores mais oportunidades de treinamento nessa temática.
Visto que na educação infantil as crianças estão com sua psicomotricidade em início de desenvolvimento, é importante considerar que essas tornam-se mais expostas a quedas e cortes.17 Em relação aos sangramentos, geralmente provenientes desses acidentes, foi possível observar que a porcentagem de profissionais que se sentem aptos em prestar atendimento de controle de ferimento sangrando foi maior no grupo que participou de capacitações sobre primeiros socorros (69,2%) do que no grupo que não participou (47,8%), ressaltando a importância das orientações práticas dadas nesses encontros.
Os resultados mostraram que os colaboradores que haviam participado de uma capacitação em primeiros socorros tiveram um melhor conhecimento em relação ao conteúdo de febre (p=0,0076). É essencial desmitificar crenças negativas e concepções errôneas, de forma que os profissionais que atuam na educação infantil saibam como agir na assistência a uma criança febril, buscando atendimento médico apenas quando necessário.
Os participantes desse estudo demonstraram baixo conhecimento prévio sobre o conceito de convulsão e sobre socorro adequado à crise convulsiva, ambos com significância estatística. Achado semelhante ao de um estudo quase experimental realizado em Cuiabá, Mato Grosso, com 162 profissionais, da equipe multidisciplinar de escolas de ensino especializado, em que apenas 21,6% apresentaram conhecimento prévio correto sobre o que fazer diante de uma criança em momento de convulsão.13 Um estudo transversal realizado na Tailândia com 1040 escolares na faixa etária de 9 e 14 anos sugere que os materiais educacionais devem contemplar os conhecimentos básicos sobre a patogênese simples da convulsão, tipos e características das convulsões, e expliquem sobre o correto procedimento às pessoas com crise convulsiva.18
A perda de consciência é frequentemente observada em crianças, mas normalmente os potenciais cuidadores (pais e professores) não sabem como agir. Um estudo multicêntrico europeu que avaliou o efeito potencial da posição de recuperação em crianças com perda de consciência constatou que os pais costumam ter um desempenho inadequado das manobras quando uma criança fica inconsciente, e que o manejo adequado pode impactar na redução das taxas de internação hospitalar. Os autores também observaram que outras condutas frequentes foram sacudir, colocar água no rosto, dar tapas e sopro no rosto, sendo que algumas delas foram consideradas potencialmente perigosas pelos pediatras.19 No presente estudo, o conhecimento e a atitude dos profissionais diante de uma situação de desmaio foram mais satisfatórios entre aqueles que haviam participado de alguma capacitação. Tais achados reforçam a necessidade de promover ações destinadas a aumentar o conhecimento e as habilidades dos adultos para prestar primeiros socorros seguros às crianças com perda de consciência.
Quanto à situação de engasgo, ao analisar as repostas dos profissionais com e sem participação em capacitação, observou-se que houve diferença significativa para conhecimento e atitudes. Aqueles que haviam participado de alguma capacitação obtiveram melhores resultados, mas destaca-se que aproximadamente metade dos professores avaliados não saberiam como agir corretamente frente a essa situação, o que poderia resultar na morte da criança em poucos minutos. Outros estudos realizados no Brasil e na Índia constataram pouco conhecimento dos professores quanto às manobras de desobstrução de vias aéreas em lactentes e em crianças maiores/adolescentes.6,13 A aspiração de corpo estranho (ACE) continua a ser um problema comum e que pode ter consequências graves, pois pode resultar em problemas de saúde agudos e crônicos.20 Faz-se necessário que os funcionários das escolas saibam realizar corretamente a manobra de Heimlich, pois em caso de corpo estranho ou engasgo no ambiente escolar, serão os primeiros a poder prestar assistência.13
A queda de um nível alto é uma causa importante de morbimortalidade na infância, sendo considerada uma temática de relevância individual e social. Nessa situação, quando as práticas de primeiros socorros não são realizadas de maneira adequada, podem causar lesões na medula espinhal ou fazer que um corte incompleto se torne um corte completo. Esse evento pode ocasionar danos neurológicos permanentes, problemas psicológicos e sociais, impactando na mudança no estilo de vida. Em um estudo realizado na Turquia, constatou-se que apenas 20,9% dos professores sabiam como imobilizar de forma adequada uma de criança que caiu de nível elevado21 corroborando com os resultados que evidenciaram que 19,7% dos participantes sabiam como agir corretamente diante de uma situação de queda/trauma. Dessa forma, a capacitação dos professores e demais funcionários das escolas é indispensável para que saibam como realizar o primeiro atendimento, evitando sequelas e até a morte.
Ressalta-se também a temática de parada cardiorrespiratória, em que houve conhecimento insuficiente acerca do conceito e a maioria dos participantes não sabiam como agir frente a essa situação de emergência, o que corrobora com outro estudo que evidencia déficit de conhecimento sobre o tema por parte de profissionais da educação.13 Em uma investigação espanhola, realizada com pais e professores do pré-escolar e do ensino fundamental, apesar da maioria dos participantes ter formação em primeiros socorros, eles não responderam corretamente às questões referentes ao suporte básico de vida e à ressuscitação cardiopulmonar.22 A parada cardiorrespiratória é uma situação de emergência em que há ausência de respiração e batimentos cardíacos, e necessita de um atendimento rápido e eficiente para aumentar a sobrevida das vítimas, por esse motivo incentiva-se cada vez mais a capacitação de pessoas leigas para a realização de manobras de ressuscitação cardiopulmonar.11
Nos acidentes por animal peçonhento, a maioria dos métodos tradicionais populares utilizados, como fazer incisões, sugar o veneno e aplicar torniquetes apertados, é inútil ou até prejudicial.23 No presente estudo, metade dos participantes relatou não saber como agir frente a um acidente por animal peçonhento. Ofertar ações de educação em saúde em primeiros socorros pode contribuir com a redução das complicações para aqueles que sofrem acidentes por animal peçonhento.23
De acordo com os resultados, e em consonância com diversos artigos que tratam sobre esse tema, os participantes em sua totalidade entendem a relevância e a necessidade de aprender sobre primeiros socorros.3,6,8,13,22 No entanto, o desconhecimento é significativo e impacta diretamente nos desfechos, uma vez que não há treinamento e capacitação como deveria. Nesse contexto, seria oportuno se o Ministério da Educação incluísse o curso de primeiros socorros na formação de professores de jardim de infância, uma vez que já existe a Lei nº 13.722, aprovada em 04 de outubro de 2018, conhecida como Lei Lucas, que obriga todos os profissionais que atuam nas redes de ensino públicas e privadas a se capacitarem em noções básicas de primeiros socorros.24
Os resultados do presente estudo devem ser interpretados à luz de algumas limitações. Primeiro, embora o questionário tenha sido elaborado de acordo com o Protocolo de Suporte Básico de Vida do SAMU10 e com as Diretrizes da American Heart Association11 e tenha sido testado anteriormente, ele não foi validado, o que dificulta a comparação dos resultados com os de outras pesquisas semelhantes. Não se trata de um estudo com amostra representativa, de forma que não é possível extrapolar os resultados. Deste modo, recomenda-se a realização de estudos mais amplos e multicêntricos para investigar o conhecimento de primeiros socorros dos profissionais que atuam no ensino infantil em todo o país, visando a implementação de programas educacionais direcionados às necessidades. Apesar dessas limitações, os resultados fornecem evidências sobre as necessidades educacionais específicas desses profissionais sobre primeiros socorros.
Assim, fomentar o estabelecimento de parcerias entre os profissionais de educação com os da saúde é uma estratégia promissora no planejamento e discussões no campo da saúde e sua forma de abordagem no ambiente educacional, auxiliando a construção de novos métodos, estratégias e formas de pensar.12 Destaca-se nesse contexto a enfermagem, que é responsável pela maior parte dos trabalhos de educação em saúde nas escolas, pois são capacitados em atividades de promoção da saúde. Em alguns lugares estes profissionais estão inseridos no ambiente escolar, atuando além da educação em saúde, no acompanhamento das crianças.10
Os profissionais que participaram de capacitação em primeiros socorros sentem-se mais aptos a prestar atendimento somente em situações de sangramentos. Ter participado de alguma capacitação também proporcionou aos profissionais um melhor conhecimento sobre os conceitos avaliados e um maior número de acertos no que se refere a atitude que deve ser tomada nas situações de urgência e emergência que necessitam de primeiros socorros.
As capacitações contribuíram de forma positiva no conhecimento e atitude dos profissionais da educação em relação a maioria das temáticas de primeiros socorros. Tais achados evidenciam a importância das capacitações, sendo essa uma responsabilidade dos profissionais de saúde junto aos educadores e cuidadores, com intuito de promover maior segurança na atuação dos profissionais frente aos possíveis agravos à saúde em ambiente escolar infantil, qualificando o cuidado prestado de modo a garantir o crescimento e desenvolvimento saudável e minimizar os riscos e agravos.
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24. BRASIL. Lei nº 13.722, de 04 de outubro de 2018. Torna obrigatória a capacitação em noções básicas de primeiros socorros de professores e funcionários de estabelecimentos de ensino públicos e privados de educação básica e de estabelecimentos de recreação infantil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, n. 193, p. 2-3, 05 out. 2018.
Fomento: O presente trabalho foi realizado com apoio da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ─ Código de Financiamento 001.
Contribuições de autoria
1 – Karine Bianco da Cruz
Autor Correspondente
Enfermeira, Mestre em Enfermagem - karine.bianco@yahoo.com.br
Concepção ou desenho da pesquisa; análise e interpretação dos dados; revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
2 – André Gustavo de Lima Godas
Graduando em Medicina - E-mail: andrelgodas@gmail.com
Revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
3 – Rayssa Gonçalves Galvão
Graduanda em Medicina - E-mail: rayssaggalvao@hotmail.com
Revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
4 – Thaís Cavichio David
Graduanda em Medicina - E-mail: thaiscavichio@gmail.com
Revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
5 – Bruna Moretti Luchesi
Enfermeira. Doutora em Enfermagem - E-mail: bruna_luchesi@yahoo.com.br
Concepção ou desenho da pesquisa; análise e interpretação dos dados; revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
6 – Tatiana Carvalho Reis Martins
Enfermeira. Doutora em Ciências da Saúde- E-mail: tatycnn@hotmail.com
Concepção ou desenho da pesquisa; análise e interpretação dos dados; revisão final com participação crítica e intelectual no manuscrito.
Editora Científica: Tânia Solange Bosi de Souza Magnago
Editora Associada: Aline Cammarano Ribeiro
Como citar este artigo
Cruz KB, Godas AGL, Galvão RG, David TC, Luches BM, Martins TCR. Aptitude, knowledge and attitude of early childhood education professionals about first aid. Rev. Enferm. UFSM. 2022 [Access in: Years Month Day]; vol.12 e7: 1-20. DOI: https://doi.org/10.5902/2179769266542