Rev. Enferm. UFSM - REUFSM

Santa Maria, RS, v. 9, e50, p. 1-17, 2019

DOI: 10.5902/2179769234767

ISSN 2179-7692

 

 

Submissão: 14/09/2018    Aprovação: 04/09/2019    Publicação: 23/10/2019

Artigo Original      

 

Conhecimento e atitudes da equipe de enfermagem sobre cateter com dispositivo seguro em um hospital brasileiro

Nursing staff knowledge and attitudes about safe device catheters in a Brazilian hospital

Conocimientos y actitudes del personal de enfermería sobre catéteres de dispositivos seguros en un hospital brasileño

 

Priscila do Carmo Freitas de CarvalhoI

Gabriela da Cunha JanuárioII

Damiana Aparecida Trindade MonteiroIII

Silmara Elaine Malaguti ToffanoIV

 

I Enfermeira. Mestre. Servidora da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (FHEMIG). Belo Horizonte, MG, Brasil. E-mail: prisciladcf@yahoo.com.br; ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3933-4510

II Enfermeira. Mestre. Docente na Universidade Estadual de Minas Gerais. Passos, MG. Brasil. E-mail: gabriela_cunha92@hotmail.com; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3585-0705

III Enfermeira. Mestre e Doutoranda em Atenção à Saúde pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Uberaba, MG, Brasil. E-mail: damianaatm@hotmail.com; ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6740-7687

IV Enfermeira. Doutora em Ciências da Saúde. Docente da Universidade Federal do Triangulo Mineiro. Uberaba, MG, Brasil. E-mail: silmara.toffano@uftm.edu.br; ORCID: https:/orcid.org/0000-0002-9080-9123

 

 

Resumo: Objetivo: descrever o conhecimento e atitudes dos profissionais de enfermagem sobre um Dispositivo Seguro com Controle de Engenharia. todo: estudo transversal descritivo, realizado em um hospital público brasileiro, especializado para o tratamento de HIV/aids. Foram entrevistados profissionais de enfermagem no período de maio a julho de 2015. Os dados foram analisados por meio da estatística descritiva e inferencial. Resultados: dos 180 entrevistados, 72,2% não participaram de treinamento que propiciava conhecimento para o uso do cateter com dispositivo de segurança. Quanto às atitudes de risco, a reinserção de um mesmo cateter periférico antes de acionar a proteção da agulha, em mais de uma punção, no mesmo paciente foi citada como prática rotineira por 48 (26,7%) participantes. Conclusão: a maioria dos profissionais de enfermagem não recebeu treinamentos para uso de dispositivos, mas reconheceu características e mecanismos de proteção contra picada de agulha e contato com sangue.

Descritores: Profissionais de enfermagem; Ferimentos penetrantes produzidos por agulha; Cateteres; Saúde do trabalhador

 

Abstract: Objective: describing the knowledge and attitudes of nursing professionals regarding a Safe Device with Engineered Controls. Methods: cross-sectional descriptive study, carried out in a Brazilian general hospital, specialized in the treatment of HIV/aids. Nursing professionals were interviewed from May to July 2015. Data was analyzed using descriptive and inferential statistics. Results: from the 180 interviewees, 72.2% did not participate in any training that offered knowledge about the use of the catheter with a safety device. Regarding the risk attitudes, reinserting the same peripheral catheter before activating the needle protection, in more than one puncture, in the same patient, was mentioned as a routine practice by 48 (26.7%) participants. Conclusion: most nursing professionals did not receive training in the use of the devices but could recognize characteristics and mechanisms of protection against needle punctures and contact with blood.

Descriptors: Nurse Practitioners; Needlestick Injuries; Catheters; Occupational Health

 

Resumen: Objetivo: describir el conocimiento y las actitudes de los profesionales de enfermería sobre un Dispositivo de Seguridad con Controlo de Ingeniería. Método: estudio trasversal descriptivo, conducido en un hospital público brasileño, especializado en el tratamiento de HIV/sida. Se entrevistó profesionales de enfermería de mayo a julio de 2015. Se analizó a los datos utilizando estadística descriptiva e inferencial. Resultados: 72.2% de los 180 entrevistados no participaron de ningún entrenamiento sobre el uso del catéter con dispositivo de seguridad. Con respecto a las actitudes de riesgo, la reinserción del mismo catéter periférico antes de accionar la protección de la aguja, en más de una punción, en el mismo paciente, fue citada como práctica común por 48 (26.7%) de los participantes. Conclusión: la mayoría de los profesionales de enfermería no recibió entrenamiento para utilizar los dispositivos, pero reconoció características y mecanismos de protección contra pinchazos y contacto con la sangre.

Descriptores: Enfermeras Practicantes; Lesiones por Pinchazo de Aguja; Catéteres; Salud Laboral


 

 

Introdução

A enfermagem é a categoria profissional mais encontrada nas instituições hospitalares, e em sua rotina realiza procedimentos diversos com uma frequência maior no cuidado direto ao paciente, sendo a principal executora da punção venosa periférica (PVP). Dessa forma, como consequência, há uma constante manipulação e descarte de materiais perfurocortantes, o que favorece a exposição a material biológico e ao risco de acidentes.  Dentre os riscos em que o profissional da enfermagem está exposto, destaca-se o risco biológico, caracterizado como a exposição a agentes biológicos como microrganismos, modificados ou não geneticamente, as culturas de células, os parasitas, as toxinas e os príons. Para a proteção desses profissionais, são necessários conhecimento e atenção voltados para a realização desses procedimentos.1-3

 Devido a essa rotina, a exposição ocupacional a material biológico durante a PVP tem sido documentada na literatura, envolvendo principalmente profissionais de enfermagem.4 Dados da literatura mostraram que grande parte dos acidentes de trabalho envolvendo profissionais de enfermagem ocorreu com materiais perfurocortantes 77,7%.5

Considerando os fatores de risco inerentes as atividades realizadas pelos profissionais de enfermagem, como o uso de cateter venoso periférico, o risco de contato com sangue, a lesão percutânea, a carga horária de trabalho, o tempo de experiência e ausência de treinamentos para manuseio de perfurocortantes4,6 torna-se importante ressaltar o uso de Dispositivos Seguros com Controle de Engenharia (DSCE).7-9 Isto é fundamental para evitar não só acidente com material perfurocortante como também o contato com o sangue.7-9

Os DSCE são materiais usados para a PVP e outros procedimentos que contam com diferentes características para proteger a ponta da agulha ou toda a agulha ou ainda, com mecanismos que impedem ou minimizam o contato com sangue antes ou após a punção.10-11 São classificados de acordo com o mecanismo de ativação de proteção da agulha, ou seja: DSCE com técnica de ativação passiva, no qual o usuário não precisa ativar nenhum recurso para a proteção da agulha após o uso e, com técnica de ativação ativa, ou seja, para que a agulha fique protegida após o uso, o usuário precisará acionar algum mecanismo de segurança, como botão, tampa ou trava.10

Com o intuito de reduzir as picadas de agulha e/ou à exposição a sangue, o uso do DSCE tornou-se obrigatório em alguns países.4,12 No Brasil em 2008, a Portaria GM nº. 939, de 18 de novembro, estabeleceu o prazo de seis meses para divulgação dos dispositivos e treinamento; 18 meses após o prazo de divulgação e treinamento para implementação e adaptação de mercado e 24 meses a partir da data de publicação da portaria, para que os empregadores façam a substituição dos materiais perfurocortantes por outros com dispostivo de segurança.13 A legislação e as portarias têm estabelecido em suas diretrizes o uso desses dispositivos, a fim de reduzir acidentes com materiais perfurocortantes.1,13

Estudos internacionais apontaram para redução no número de acidentes percutâneos, após a introdução dos DSCE, associados a programas de capacitação ou treinamento.9,14-15 No Brasil, uma investigação apontou que a adoção de um único dispositivo de segurança reduziu, significativamente, o número de acidentes percutâneos entre a equipe de enfermagem.8

Por se tratar de uma estratégia inovadora, de alto custo para o sistema de saúde e que contribui diretamente para os programas de prevenção de acidentes envolvendo profissionais de enfermagem, foi feita a seguinte questão de pesquisa: qual o conhecimento dos profissionais de enfermagem que trabalham em um hospital especializado em doenças infectocontagiosas acerca de um novo dispositivo para PVP? Nesse sentido, esta investigação teve como objetivo descrever o conhecimento e atitudes dos profissionais de enfermagem sobre um DSCE.

Método

Trata-se de um estudo transversal descritivo, em que a coleta de dados foi realizada no período de maio a julho de 2015, em um hospital público brasileiro, especializado para o tratamento de HIV/aids, que desde o final de 2008 adotou DSCE para PVP.

No período de coleta de dados a instituição contava com um DSCE com sistema passivo de segurança. A proteção é efetivada após a retirada da agulha da cânula e sua ativação segura independe da ação do usuário, com a cobertura da ponta da agulha.

A população foi composta inicialmente por 210 profissionais de enfermagem, distribuídos em três categorias: enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem. Considerando os critérios de inclusão (atuar na assistência direta ao paciente) e de exclusão (afastamento do trabalho durante o período de coleta de dados) 184 profissionais estavam aptos a participarem da pesquisa.

Para tanto, um instrumento com questões abertas e fechadas contemplando: variáveis sobre a caracterização sociodemográfica, profissional, ocorrência de acidentes; aspectos referentes aos DSCE usados atualmente, como facilidades e dificuldades do seu uso. Tal instrumento foi construído pelos autores e submetido à apreciação de três especialistas na temática, que procederam à avaliação quanto à forma e a pertinência das questões em relação ao objetivo da pesquisa. O estudo piloto foi realizado com 10 profissionais de enfermagem da unidade ambulatorial, quatro enfermeiros e seis técnicos de enfermagem do mesmo hospital. O questionário desses profissionais não foi incluído no estudo final. O instrumento de coleta de dados foi respondido por 180 profissionais de enfermagem, houve uma perda de quatro profissonais que não foram encontrados no setor de trabalho nos dias da coleta de dados.

Os dados foram coletados pelos pesquisadores, que durante todos os turnos de trabalho, abordavam os profissionais, nos momentos mais oportunos. Após compreensão dos objetivos da pesquisa e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), os participantes respondiam ao instrumento de coleta de dados, os quais eram guardados em envelopes separados e lacrados pelos pesquisadores. Posteriormente, os envelopes eram abertos e os dados digitados em um banco de dados no Excel. A análise estatística descritiva e inferencial (testes Kolmogorov-Smirnov e Qui-Quadrado; p<0,05) foi feita no software IBM SPSS®, versão 22.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética do Hospital, sob o Parecer nª 956.314 e registro CAAE: 35510714.2.3001.5124, de 10 de fevereiro de 2015 e pelo Comitê de Ética da Universidade, sob o Parecer nª 863.814 e registro CAAE: 35510714.2.0000.5545, de 30 de outubro de 2014. Os autores conduziram a investigação conforme os princípios éticos das resoluções referentes às pesquisas com seres humanos.

 

Resultados

Dos participantes, 27 (15,0%) eram enfermeiros, 140 (77,7%) técnicos de enfermagem e 13 (7,2%) auxiliares de enfermagem; a maioria (53,9%) do sexo masculino; média de idade de 40,2 anos, com Desvio Padrão (DP)= 8,33, com menos de cinco anos de experiência de trabalho (n=138/76,7%). A média de horas trabalhadas na semana (somando-se outros locais) foi de 47,8 (DP=17,2).

Com relação ao setor de trabalho, 62,8% lotados em unidades de internação, 30,0% em unidade de terapia intensiva (UTI) e 1,1% na assistência domiciliar terapêutica.

Dos 50 (27,8%) profissionais que disseram ter feito treinamento para uso de DSCE, 20,0% afirmaram que o mesmo foi oferecido pelo hospital e 6,7% pelo fabricante do produto; outros dois (1,1%) não responderam. Ao comparar a realização de treinamentos para uso do DSCE com a categoria profissional, foi evidenciada diferença estatística (p=0,009), ou seja, o percentual de treinamentos foi significativamente superior no grupo Enfermeiro, no que nas demais categorias.

A Tabela 1 apresenta a caracterização dos profissionais de enfermagem de acordo com a categoria ocupacional, sexo, idade, setor, tempo de trabalho e treinamento para o uso do DSCE.

 

Tabela 1 - Caracterização dos profissionais de enfermagem de um hospital público, segundo categoria, sexo e setor de trabalho. Belo Horizonte/MG, 2015.

Variável

N

%

Categoria

Enfermeiro

27

15,0

Técnicos de enfermagem

140

77,7

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Auxiliares de enfermagem

13

7,2

Sexo

Feminino

83

46,1

Masculino

97

53,9

Idade

< 19

12

6,7

20 – 29

13

7,2

30 – 39

72

42,9

40 - 49

55

30,6

> 50

28

15,6

Setor de trabalho

Internação

113

62,8

Unidade de Terapia Intensiva

54

30,0

Bloco Cirúrgico

07

3,9

Hospital dia

04

2,2

Assistência Domiciliar Terapêutica

02

1,1

Tempo de trabalho na instituição

< 5

138

76,7

5 – 10

15

8,3

> 10

27

15,0

Curso/Treinamento para uso de dispositivo seguro com controle de engenharia

Sim

50

27,8

Não

130

72,2

Fonte: Dados da pesquisa.

 

A Tabela 2 descreve respostas quanto ao conhecimento dos profissionais de enfermagem acerca das características do DSCE usado no hospital no período da investigação.

Dos entrevistados 77,2% responderam não se sentirem protegidos da picada de agulha e contato com o sangue utilizando o DSCE atual, a maioria, 81,1%, afirmou que houve mudança na técnica de inserção comparada com o cateter convencional. Do total de profissionais entrevistados, 60,6% disseram que o DSCE permite à cobertura da ponta da agulha e 78,3% a sua cobertura total após o uso. Em relação ao contato com sangue ao utilizar o cateter com dispositivo, 81,1% dos profissionais relataram que o dispositivo não permite contato com sangue durante a punção. Sobre o contato com sangue após o procedimento de punção, 78,3% afirmaram que o mesmo permite contato com este fluido.

 

Tabela 2 - Respostas dos participantes referentes às características de um DSCE para PVP. Belo Horizonte/MG, 2015.

Variável

Sim

Não

Em

Branco

N

%

N

%

N

%

Sente-se protegido da picada de agulha e contato com o sangue utilizando o cateter com dispositivo de segurança atual

35

19,4

139

77,2

06

3,3

Houve mudança na técnica de inserção (comparada com o cateter convencional)

146

81,1

24

13,3

10

5,6

Permite a cobertura da ponta da agulha

109

60,6

71

39,4

-

-

Permite a cobertura total da agulha após o uso

39

21,7

141

78,3

-

-

Permite contato com sangue durante a punção

34

18,9

146

81,1

-

-

Permite contato com sangue após a punção

141

78,3

39

21,7

-

-

Fonte: Dados da pesquisa.

A Tabela 3 apresenta as facilidades e as dificuldades sobre o uso de DSCE.

 

Tabela 3 - Facilidades e dificuldades descritas pelos profissionais de enfermagem sobre um DSCE para PVP. Belo Horizonte/MG,2015.

Variável

Sim

Não

N

%

N

%

Facilidades

 

 

 

 

Proteção contra picada de agulha

141

78,3

39

21,7

Proteção contato com sangue

57

31,7

123

68,3

Praticidade

92

51,1

88

48,9

Fácil manejo

81

45,0

99

55,0

Nenhuma facilidade

  03

1,7

177

98,3

Dificuldades

 

 

 

 

Proteção somente da ponta da agulha

32

17,8

148

82,2

Falta de treinamento

44

24,4

136

75,6

Falta de habilidade

12

6,7

168

93,3

Manuseio difícil

20

11,1

160

88,9

Nenhuma dificuldade

84

46,7

96

53,3

Fonte: Dados da pesquisa.

Quanto às facilidades descritas pelos profissionais de enfermagem com a introdução do DSCE, a mais citada foi à proteção contra picada de agulha (78,3%). Em relação às dificuldades abordadas, a maioria dos profissionais não afirmou nenhuma dificuldade, tanto de manuseio, quanto de treinamento ou proteção somente da ponta da agulha.

Quanto à segurança percebida, 166 (92,2%) responderam que o cateter com dispositivo seguro atual não funcionava de maneira confiável, pois atribuíram que o cateter usado protegia apenas a ponta da agulha e permitia o contato com o sangue e como trabalhavam em hospital de doenças infecciosas tal proteção seria fundamental; nove (5,0%) responderam que confiavam na proteção do dispositivo e cinco (2,8%) não souberam responder. Não houve diferença significativa (p=0,85) ao comparar a categoria profissional e a confiança no dispositivo usado na instituição.

Ainda nesta questão, 18 (10,0%) responderam que já passaram por alguma situação em que o mesmo não foi acionado de maneira correta após a punção; 11 (6,7%) não responderam. 

A Tabela 4 apresenta as atitudes dos profissionais quanto ao uso de luvas e reinserção do cateter com DSCE.

 

 

 

Tabela 4 - Atitude dos profissionais de enfermagem quanto ao uso de luvas e reinserção do cateter com DSCE.

Variável

Sim

Não

Às vezes

N

%

N

%

N

%

Você utiliza luvas de procedimento em todas as punções venosas com cateter com DSCE usado atualmente

 

167

 

92,8

 

04

 

2,2

 

09

 

5,0

Você já reutilizou o cateter venoso periférico com DSCE antes de acionar a proteção da agulha em mais de uma punção (comparada com o cateter convencional)

48

26,7

125

69,4

07

3,9

 

Em relação às atitudes de risco para a segurança do profissional e do paciente, a PVP sem luvas foi citada por quatro (2,2%), com a justificativa de atrapalhar a palpação da veia; nove (5,0%) responderam que as utilizavam somente em algumas situações e outros 167 (92,8%) afirmaram fazer uso sempre.

A reinserção de um mesmo cateter periférico antes de acionar a proteção da agulha, em mais de uma punção, no mesmo paciente foi citada como prática rotineira por 48 (26,7%) participantes; outros sete (3,9%) responderam que realizavam esta prática algumas vezes; a maioria (69,4%) sempre utilizava um novo cateter a cada punção. Não houve diferença significativa (p=0,10) ao comparar a categoria profissional e o uso de luvas, bem como ao comparar o reuso com acidente percutâneo notificados no setor de saúde e segurança do trabalhador (p=0,82). Já em relação ao reuso do cateter e a categoria profissional, houve diferença significativa (p=0,006), o percentual de Reuso = 1 é significativamente superior no grupo de técnicos e auxiliares de enfermagem (73,2% > 48,1%); o percentual de Reuso = 2 é significativamente superior no grupo Enfermeiro (51,9% > 22,2%).

 

 

Discussão

Nesta pesquisa houve maior participação de técnicos e auxiliares de enfermagem. Isso pode ser justificado pela equipe de enfermagem ser composta 80% de técnicos e auxiliares e 20% enfermeiros.16

Quanto ao sexo, o masculino foi mais presente, resultado distinto de outros estudos encontrados na literatura nacional e internacional,7,17 bem como pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz, que embora revele uma tendência de masculização da profissão, 84,6% dos trabalhadores desta área ainda são constituídos por mulheres.18 Em relação à faixa etária, a maioria possui idade entre 30-39 anos, corroborando com outro estudo da literatura.19

Quanto à realização de Curso/Treinamento para uso de DSCE, apesar da sua obrigatoriedade, os dados desta investigação apontaram que a maioria dos trabalhadores da equipe de enfermagem respondeu não ter recebido nenhum treinamento, seja pelo fabricante ou pelo próprio hospital. O teste estatístico mostrou que os enfermeiros realizam mais treinamentos do que os técnicos e auxiliares de enfermagem.

A falta de motivação, incentivo e pouco investimento por parte dos gestores e a não liberação da chefia por causa dos treinamentos acontecerem no mesmo horário de trabalho, são algumas dificuldades para a não adesão dos profissionais de enfermagem às capacitações.20 Treinamentos para o uso correto de DSCE associados a programas de capacitação ou treinamento podem contribuír para a redução de acidentes com agulha e devem ser incentivados e realizados periodicamente.21

Os profissionais de enfermagem devem receber educação permanente, pois as tecnologias relacionadas à saúde sofrem constantes transformações, e atualização para acompanhar os avanços na área são necessárias. 22

No Brasil, a Norma Regulamentadora Nº 32 estabelece que a capacitação da correta utilização do DSCE deve ser disponibilizada para os trabalhadores dos serviços de saúde pelas empresas que produzem ou comercializam materiais perfurocortantes.1,13

Antes da introdução de qualquer DSCE na área da saúde, é necessário avaliar a saúde e a segurança do trabalhador, a satisfação do usuário, a segurança e o conforto do paciente, para assim assegurar a adequação desse dispositivo na prática segura e eficaz.10 Os DSCE usados para a PVP podem apresentar características específicas segundo o modelo e fabricantes, como acionamento do mecanismo de proteção da agulha por técnica passiva ou ativa ou sistemas que impedem refluxo do sangue, reduzindo as chances de respingo ou contato com o sangue após a retirada da agulha e ou conexão do equipo.10-12 Neste sentido, identificar tais características e todos os requisitos necessários para o bom funcionamento do mesmo pode ser difícil para o profissional, uma vez que está em contato direto com uma gama de produtos usados na assistência hospitalar.

Quanto ao conhecimento dos profissionais de enfermagem em relação ao DSCE, identificou-se que a maioria soube responder informações quanto às suas características, como proteção da ponta da agulha ou contato com o sangue. Tais fatores são importantes para identificar o tipo de dispositivo usado e as características de segurança que oferecem ao profissional.

Tal resultado mostra a importânica da participação dos profissionais na escolha do produto que irão usar, bem como no envolvimento dos gestores. Autores de pesquisas relacionadas à satisfação e avaliação de DSCE apontaram ser fundamental a capacitação dos profissionais antes, durante e após um novo DSCE, sendo indispensável para evitar não só as exposições, como também gastos desnecessários à instituição.23-25

Nesta investigação, as luvas foram citadas pela maioria dos profissionais, mas por se tratar de um instrumento auto respondido, os dados podem estar superestimados. Neste aspecto, um estudo sobre os cuidados realizados pelos profissionais de enfermagem durante a PVP evidenciou que apesar da maioria responder que sempre usava luvas de procedimentos, um percentual ainda refere não usar e os motivos devem ser mais explorados, pois se trata de um procedimento de risco.2

 

Conclusão

         Neste estudo identificou-se que a maioria dos profissionais de enfermagem mostrou conhecer as características do DSCE usado atualmente na instituição em que trabalham, embora relatassem não se sentirem protegidos com a utilização do cateter. Sobre as atitudes nos procedimentos realizados com o DSCE, a maior parte deles apresentou comportamento de segurança, o que não exclui o risco de exposição a material biológico e acidente com perfurocortante.

Portanto, ressalta-se a necessidade de que com a inserção de novos dispositivos, hospitais e fornecedores possam proporcionar aos profissionais de enfermagem programas de treinamentos, antes, durante e após a introdução de um novo produto, como os DSCE, além de medidas de prevenção à exposição com material biológico.

Os dados foram coletados em um único momento e em uma única instituição e, portanto, não refletem a realidade de outros cenários. Novos estudos com outras metodologias que permita a identificação e compreensão das atitudes de profissionais de enfermagem na PVP e DSCE serão importantes para a prática de enfermagem.

 

Referências

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Autor correspondente

Nome: Priscila do Carmo Freitas de Carvalho

E-mail: prisciladcf@yahoo.com.br

Endereço:  Rua Castelo de Óbidos, 201, bairro Castelo, Belo Horizonte, MG

CEP: 31330-320

 

 

Contribuições de Autoria

1 – Priscila do Carmo Freitas de Carvalho

Concepção e planejamento do projeto de pesquisa, obtenção, análise e interpretação dos dados, redação e revisão crítica do artigo.

 

2 – Gabriela da Cunha Januário

Análise e interpretação dos dados, redação e revisão crítica do artigo.

 

3 Damiana Aparecida Trindade Monteiro

Análise e interpretação dos dados, redação e revisão crítica do artigo

 

4 Silmara Elaine Malaguti Toffano

Concepção e planejamento do projeto de pesquisa, obtenção, análise e interpretação dos dados, redação e revisão crítica do artigo.

 

 

Como citar este artigo

Carvalho PCF, Januário GC, Monteiro DAT, Toffano SEM. Conhecimento e atitudes da equipe de enfermagem sobre cateter com dispositivo seguro em um hospital brasileiro. Rev. Enferm. UFSM. 2019 [Acesso em: Anos Mês Dia];vol9 e50: P1-17. DOI:https://doi.org/10.5902/2179769234767