ReTER, Santa Maria, v.3, n.2, 2022. ISSN:2675-9950 Dossiê IV Simpósio Internacional sobre Games, Gamification e Tecnologias na Educação

INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS: O USO DA JOGABILIZAÇO PARA O DESENVOLVIMENTO DE JOGOS EDUCATIVOS

 

Anderson Kley Baumgartner Câmara Pinheiro

Universidad Columbia del Paraguayandersonkbcp@gmail.com

Shirley Magnólia Baumgartner Câmara de Oliveira

Universidad Europea del Atlánticopsishirleymagnolia@gmail.com

 

  

Resumo: Uma das maiores causas da evasão escolar está no fato dos alunos não se sentirem motivados com as metodologias de ensino utilizadas. Em 2019 o IBGE realizou uma pesquisa em todas as regiões brasileiras com estudantes entre 14 a 29 anos, a evasão escolar oriunda de desinteresse pelo conteúdo e metodologia empregada superou 25% em todas as regiões, abaixo somente do abandono pela urgência de trabalhar. As metodologias de ensino, as avaliações como um fim, o ambiente escolar ultrapassado e a fragmentação disciplinar são algumas das causas para este esvaziamentoescolar. Os jogos são ferramentas que conseguem divertir, motivar e desenvolver competências variadas de forma muito eficiente, além de preparar o indivíduo para situações não planejadas. O jogo em tela possui 83 cartas colecionáveis e ilustrações das grandes personalidades na história da humanidade, sempre contextualizando sua época, feitos e relação com o conhecimento em destaque. O jogo colecionável Múltiplas Inteligências, baseado na teoria das Inteligências Múltiplas de Howard Gardner, estimula a descoberta pelos diferentes tipos de inteligências, envolvendo professor e aluno através de uma mecânica simples, divertida, estratégica e colecionável que visa o desenvolvimento Socio-educacional cognitivo do aluno ao mesmo tempo em que os torna protagonistas na utilização, distribuição e conquista da coleção completa. O jogo de cartas Múltiplas Inteligências trabalha com as competências da Base Nacional Comum Curricular e utiliza a metodologia da Jogabilização para atingir 100% do seu objetivo sociocultural e cognitivo.

Palavras-chave: Motivação; Jogo colecionável; Jogabilização.

 

 

MULTIPLE INTELLIGENCES: THE USE OF GAMEPLAY FOR THE DEVELOPMENT OF EDUCATIONAL GAMES

 

Abstract: One of the biggest causes of school dropout is the fact that students do not feel motivated with the teaching methodologies used. In 2019, the IBGE conducted a survey in all Brazilian regions with students aged 14 to 29 years, school dropouts arising from lack of interest in the content and methodology used exceeded 25% in all regions, below only abandonment due to the urgency of working. Teaching methodologies, assessments as an end, the outdated school environment and disciplinary fragmentation are some of the causes for this school emptying. Games are tools that can amuse, motivate and develop varied skills very efficiently, in addition to preparing the individual for unplanned situations. The game on screen has 83 collectable cards and illustrations of the great personalities in human history, always contextualizing their time, achievements and relationship with knowledge highlighted. The Multiple Intelligences collectible game, based on Howard Gardner's Multiple Intelligences theory, stimulates the discovery of different types of intelligences, involving teacher and student through a simple, fun, strategic and collectible mechanic that aims at the cognitive socio-educational development of the student at the same time, it makes them protagonists in the use, distribution and conquest of the complete collection. Multiple Intelligences Card Game works with the competences of the Common National Curriculum Base and uses the Jogabilização methodology to achieve 100% of its sociocultural and cognitive objective.

Keywords: Motivation; Collectible Game; Jogabilização.

 

 

Introdução

 

Com a evolução da tecnologia e a velocidade na troca de informações, o conteúdo apresentado nas salas de aula distanciam-se cada vez mais da realidade dos alunos Nativos Digitais (PRENSKY, 2010). Somado a isso, a escola mantém uma metodologia tradicional oriunda da segunda revolução industrial onde as avaliações escolares ainda recorrem ao modelo criado em 1914, cujo objetivo era eliminar o julgamento subjetivo” do professor e acelerar o processo da avaliação por meio dos testes de múltipla escolha.

A atual prática da avaliação escolar estipulou como função do ato de avaliar a classificação e não o diagnóstico, como deveria ser constitutivamente. Ou seja, o julgamento de valor sobre o objeto avaliado passa a ter a função estática de classificar um objeto ou um ser humano histórico num padrão definitivamente determinado. Do ponto de vista da aprendizagem escolar, poderá ser definitivamente classificado como inferior, médio ou superior. Classificações essas que são registradas e podem ser transformadas em números e por isso, adquirem a possibilidade de serem somadas e divididas em médias. (LUCKESI, 2018, p. 77).

 

Ainda segundo Luckesi (2018) a avaliação é uma ferramenta da qual o ser humano não se livra. Ela faz parte de seu modo de agir, por isso é necessário que seja usada da melhor forma possível. Com o advento da Segunda Revolução Industrial (1850) após a descoberta e o aproveitamento de novas fontes de energia, possibilitou-se o surgimento de novas engenharias fabris, como a linha de montagem, otimizando a produção e gerando demanda por novos trabalhadores. Para acompanhar a rápida evolução que ocorrera na indústria, a escola adotou uma metodologia análoga ao seu modelo mais difundido, conhecido como Fordismo. Nesse  contexto, a Escola  Tradicional foi criada no século XIX com o intuito de massificação da alfabetização e qualificação da população para o trabalho nas indústrias e outros meios de produção. Assim como no meio de produção (Fordismo), a formação escolar ganhou formatos padronizados para massificar e acelerar seus procedimentos. A metodologia e o processo de ensino-aprendizagem se tornaram mecânicos, se equivalendo à linha de montagem do modelo de produção supramencionado. Nesse ínterim, houve também a fragmentação curricular, que pode ser comparada às funções repetitivas e desvinculadas do produto final, além da hierarquização intelectual, onde o professor é detentor do conhecimento, assim como o dono do meio de produção; o único que conhece o projeto completo do produto que está sendo produzido. A disposição da sala de aula, a sirene que serve para informar o horário de intervalo, em que é autorizado se alimentar e descansar, e a perda de autonomia por parte do aluno e do empregado são algumas outras, dentre tantas mais, características comuns a ambos os contextos.

A escola tradicional surgiu em um período em que havia uma necessidade específica, e conseguiu suprir uma carência, igualmente específica: preparar o cidadão para o mercado de trabalho de forma rápida e satisfatória para as funções previsíveis e necessárias daquela época. Na dimensão do processo cognitivo desenvolvido por Benjamin Samuel Bloom, em 1956 no seu continuum, a escola transmitia o conhecimento e sua aplicação em um tempo hábil. A taxonomia dos objetivos educacionais, ou simplesmente taxonomia de Bloom, como ficou popularmente conhecida, apresenta seis classes maiores: conhecimento, compreensão, aplicação, análise, síntese e avaliação.

Seja qual for o caso no passado, é muito claro que, em meados do século 20, nos encontramos em uma cultura em rápida mudança e imprevisível. Parece quase impossível prever as maneiras específicas pelas quais isso mudará no futuro próximo, ou os problemas específicos que serão fundamentais em cinco ou dez anos. Nessas condições, muita ênfase deve ser colocada nas escolas no desenvolvimento de formas generalizadas de atacar os problemas e no conhecimento que pode ser aplicado a uma ampla gama de novas situações. Ou seja, temos a tarefa de preparar os indivíduos para problemas que não podem ser previstos com antecedência, e tudo o que pode ser feito nessas condições é ajudar o aluno a adquirir habilidades intelectuais generalizadas e habilidades que o servirão bem em muitas novas situações. Isso coloca a fé nas virtudes intelectuais como fornecendo alguma forma de estabilidade para o indivíduo que deve encontrar ou fazer alguma ordem em seu mundo. (BLOOM, 1956, p. 40, tradução nossa)

 

No final do século XIX surge a escola tradicional, em 1914 surgem os testes de múltipla escolha, em 1956 Bloom apresenta sua taxonomia dos objetivos educacionais visando o domínio cognitivo. Será que a prática de avaliação denunciada por Cipriano Luckesi deixou de ser uma realidade nas escolas? O futuro próximo do qual Benjamin S. Bloom já chegou?

 

As novas gerações necessitam de novas tecnologias.

 

Uma das questões curriculares mais comuns e mais antigas é: O que vale a pena aprender? esta é a primeira das questões organizacionais. Em um nível abstrato, a resposta define o que significa ser uma pessoa educada. Em um nível mais concreto, a resposta define o significado da matéria que está sendo ensinada. A matemática, por exemplo, é um corpo discreto de conhecimento a ser memorizado ou um sistema conceitual organizado e coerente a ser compreendido? A leitura consiste em lembrar um conjunto de relações entre som e símbolo ou ganhar significado a partir das palavras de uma página impressa? Perguntas semelhantes podem ser feitas em ciências, história, arte, música e outros campos. (ANDERSON, L. W. et. al, 2001. p. 06 - tradução nossa)

 

Os testes de múltipla escolha possuem caráter classificatório excludente, e muitas vezes são utilizados como um fim, não um meio. Esse modelo de avaliação prioriza a memorização e a reprodução do conhecimento, deixando em segundo plano as diversas inteligências e a aprendizagem de conhecimentos complexos. Esses testes são muito grosseiros para serem usados e devem ser abandonados, frase atribuída a Frederick J Kelly, criador do teste de múltipla escolha.

Em 2019 o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados de sua Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) apontando informações sobre o sistema educacional brasileiro. Segundo o levantamento, considerando o quantitativo de jovens de 14 a 29 anos do país, cerca de 50 milhões de estudantes, 20,2% não completam o ensino médio. Dentre os principais motivos encontra-se a opção não ter interesse em estudar, abaixo apenas da necessidade para trabalhar e mantendo-se acima de 25% dentre os motivos em todas as regiões do país.

Segundo dados do último Programa de Avaliação Internacional de Alunos (PISA, sigla do inglês) que ocorre a cada três anos, realizado em 2018, o Brasil ocupou a quinquagésima sétima posição, descendo algumas posições em comparação a avaliação anterior. O baixo desempenho brasileiro nas avaliações se repete no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) com 5,9 de média no Ensino Fundamental Anos Iniciais, 4,9 Anos Finais e 4,2 no Ensino Médio.

Com dados comprovando que as metodologias utilizadas na grande maioria das escolas brasileiras não está funcionando de forma satisfatória enquanto difusora de conhecimento e motivacional, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) lançada em 2018 se comprometeu com uma:

construção intencional de processos educativos que promovam aprendizagens sintonizadas com as necessidades, as possibilidades e os interesses dos estudantes e, também, com os desafios da sociedade contemporânea. Isso supõe considerar as diferentes infâncias e juventudes, as diversas culturas juvenis e seu potencial de criar novas formas de existir. Assim, a BNCC propõe a superação da fragmentação radicalmente disciplinar do conhecimento, o estímulo à sua aplicação na vida real, a importância do contexto para dar sentido ao que se aprende e o protagonismo do estudante em sua aprendizagem e na construção de seu projeto de vida. (BRASIL, 2018, p. 14;15).

 

O presente artigo se propõe a construir novos processos educativos utilizando-se da Jogabilização: metodologia motivacional que se utiliza de design e características dos jogos, valorizando ferramentas atemporais e vanguardistas que se adaptam à realidade e interesse dos envolvidos em um ambiente de ensino-aprendizado. Isso, por meio da apresentação e análise do jogo de cartas colecionáveis Múltiplas Inteligências. A ferramenta mencionada, conta com uma linguagem atual e em sintonia com o universo acadêmico e do estudante, trazendo informações curtas, rápidas e objetivas que abrangem interesses do aluno e do professor, sem deixar de abordar o conteúdo acadêmico. Tem por objetivo despertar a curiosidade dos envolvidos no contexto escolar e estimular o aprofundamento do conhecimento de forma autônoma na evolução das habilidades e competências adquiridas no decorrer da coleção das cartas que compõem o jogo, sem renunciar a um fator extremamente importante: a diversão, que gera engajamento, propicia um ambiente interno favorável a aquisição e retenção do conhecimento profundo.

 

Utilizando o método EDUCAR para o desenvolvimento e validação do jogo de cartas colecionáveis Múltiplas Inteligências.

 

EDUCAR é um acrônimo para o processo de implementação da metodologia Jogabilização. Consiste em seis passos: Empatia; Diversão; União; Competência; Autonomia e Recursos, que visam a melhora do bem-estar, mudança de comportamento e aprendizagem profunda. O jogo MI foi desenvolvido seguindo o método EDUCAR e com realizações de testes periódicos com alunos do Ensino Fundamental Anos Finais para reajustes de equilíbrio matemático e de diversão.

 

Empatia

 

Até o final da década de 1990, os designers de jogos eletrônicos projetavam os fantásticos mundos virtuais seguindo apenas o seus instintos artísticos. Com a publicação do artigo Hearts, Clubs, Diamonds, Spades: Players who Suit MUDs, Richard A. Bartle examinou diferentes estilos de jogadores e os classificou em quatro tipos (em tradução livre): competidores, realizadores, exploradores e socializadores. Conhecer as categorias de jogadores e entender os seus gostos e interações com o seu mundo e com seus pares foi fundamental para a revolução dos jogos virtuais.

Os chamados nativos digitais, onde jogadores e alunos são vistos como um só, vivem sua Era, os professores são imigrantes, é preciso conhecer sua cultura e se adaptar a sua forma de aprendizado. Assim como outras tecnologias foram substituídas, independentemente da geração anterior aceitá-la ou não, os nativos digitais vo trazer suas tecnologias, e o desenho industrial de jogos é o centro dessa tecnologia. Adaptar-se a elas é necessário para não ser ultrapassado. (PRENSKY, 2010) 

Conhecer o aluno não é suficiente, é preciso mais do que isso, é necessário também relacionar-se com ele. Estudos da teoria da autodeterminação (RYAN; DECI, 2020) apontam para uma aprendizagem profunda quando três necessidades básicas que compõem o bem-estar são preenchidas: o relacionamento, a autonomia e a competência.

Relacionar-se com os alunos irá trazer grandes benefícios na aprendizagem profunda dentro e fora da sala de aula, para o desenvolvimento socio-emocional, intrapessoal e interpessoal. Ouvir o que eles têm a dizer, valorizar e reconhecer sua cultura e inteligências os tornarão mais confiantes e cientes de suas verdadeiras potencialidades. O jogo MI fortalecerá o sentimento de pertencimento e representatividade através das ilustrações de grandes personalidades que trarão informações valiosas auxiliando os componentes curriculares e criando uma relação direta com a Teoria das Inteligências Múltiplas de Howard Gardner (1994; 2000; 2019), onde apresentarão pontuações para cada inteligência mantendo o máximo de verossimilhança com as biografias dos personagens.

 

Diversão

 

Os animais brincam tal como os homens. Bastará que observemos os cachorrinhos para constatar que, em suas alegres evoluções, encontram-se presentes todos os elementos essenciais do jogo humano. Convidam-se uns aos outros para brincar mediante um certo ritual de atitudes e gestos. Respeitam as regras que os proíbem morderem, ou pelo menos com violência, a orelha do próximo. Fingem estar zangados e, o que é mais importante, eles, em tudo isto, experimentam evidentemente imenso prazer e divertimento. Essas brincadeiras dos cachorrinhos constituem apenas uma das formas mais simples de jogo entre os animais. Existem outras formas muito mais complexas, verdadeiras competições, belas representações destinadas a um público. (HUIZINGA, 2019, p 16)

 

Kevin Werbach e Dan Hunter (2015; 2020) em seus dois livros sobre gamificação descrevem a diversão como fator primordial na implementação de seu famoso processo gamificado denominado 6D, onde batizou o quinto passo de DONT forget the fun! (Não esqueça a diversão), onde explicam que antes de finalizar o processo, os participantes devem se perguntar e analisar se a atividade está realmente sendo divertida. Para que o sistema seja validado, ele deve ser atrativo para todos os envolvidos, é importante destacar ser fundamental conhecer o aluno para que essa diversão seja alcançada. Nicole Lazzaro (2004) , em seu artigo why we play games apresenta quatro categorias de pessoas descobertas em seus estudos quanto às formas em que elas se divertem: The Player, Hard Fun, Easy Fun e Other Players. Assim como no trabalho de Richard A. Bartle, essas categorias procuram entender o ser humano e como os jogos os motivam.

Na Jogabilização, mais importante do que o processo, está a diversão. Apesar de se tratar de uma metodologia de ensino, a diversão é uma condição necessária à sua existência. Não há método se não há a quem aplicar. Acompanhando o universo em que os Nativos Digitais estão inseridos e considerando o poder que o relacionamento pode causar, chegamos ao jogo. Segundo Jane McGonigal (p. 30, 2012) Quando as diferenças de gênero e as complexidades tecnológicas são colocadas à parte, todos os jogos compartilham quatro características que os definem: meta, regras, sistema de feedback e participação voluntária”.

O jogo MI conecta o universo dos Nativos Digitais ao do ensino-aprendizado, apresentando diferentes níveis e tipos de diversão, para as diferentes categorias de pessoas. Vigotski fala que em um ambiente de diversão se cria uma zona de desenvolvimento proximal para a criança que passa a se comportar além da sua idade média e aprimora seu aprendizado (LEFRANÇOIS, 2016).

 

União

 

Jogos cooperativos e competitivos necessitam de interatividade entre dois ou mais jogadores, utilizar a cooperatividade para trocar informações no esforço por uma resolução em comum torna o ambiente rico em aprendizado para todos os envolvidos assim como no enfrentamento de jogos competitivos, onde quem perdeu poderá aprender algo novo com quem o venceu e o vencedor poderá melhorar algo com as novas possibilidades impostas em sua última vitória. Em todos esses casos citados, a união e engajamento de todos pelo esforço em comum de um objetivo propiciará ao aprendizado. Os jogos e atividades cooperativas trabalham todas as seis dimensões do conhecimento apresentadas por Bloom (1956), revisionadas por Lorin W. Anderson (2001) e que serão de suma importância para o desenvolvimento de habilidades e competências para os empregos do futuro.

Para entender o conceito de jogo, é importante entender cada uma das quatro características que o define.

1) A meta é o que dará um senso de propósito ao aluno/jogador, fortalecendo o relacionamento e a união entre os envolvidos. Além disso, ela os mantém focados em uma mesma trajetória e objetivo (quando o jogo for cooperativo) e com potencial para colocar sua atenção e perícia em estágioximo, quando há competição. Muitas vezes, levando os participantes ao estado de flow (CSIKSZENTMIHALYI, 2020): estado de imersão intensa, ao ponto de alterar a percepção de fome, cansaço e transcurso do tempo.

2) As regras limitam as possibilidades de ações e interações entre jogadores e com a atividade proposta, possibilitando inúmeras perspectivas para resolução de um mesmo problema. Trabalhar com regras diferentes para cada atividade é importante para existirem novos caminhos e interação entre os envolvidos, oportunizando ainda a exploração das dimensões do conhecimento factual, conceitual, processual e metacognitivo. Isso, em conjunto com as dimensões do processo cognitivo: relembrar, entender, aplicar, analisar, avaliar e criar (1). Dessa forma, o aluno/jogador estará encarando problemas adversos e desenvolvendo resoluções com a união de várias categorias de conhecimentos e diferentes inteligências, o que possibilitará uma maior adaptação aos problemas futuros.

Como cada situação é única, o indivíduo deve conseguir reconhecer quais características essenciais da nova situação estão relacionadas às situações que ele já encontrou; então ele deve aplicar o conhecimento e método corretos com as modificações apropriadas. Obviamente, é impossível dar ao indivíduo todo o conhecimento de que ele precisará para cada nova situação que encontrará. É possível, no entanto, ajudá-lo a adquirir aquele conhecimento considerado mais útil no passado e ajudá-lo a desenvolver aquelas habilidades e aptidões intelectuais que o habilitarão a adaptar esse conhecimento às novas situações. (BLOOM, 1956. pág 41 - tradução nossa)

 

3) O sistema de feedback orienta os alunos/jogadores a identificar a aproximação de sua meta. Se feito em tempo real, os mantém motivados e conscientes do quão próximo os seus adversários estão dele ou do objetivo em comum. O sistema de feedback deve ser quantificável e pode assumir a forma de ponto, nível, placar, barra de progresso, ou em sua forma mais simples ganha quem primeiro…”.

Nos jogos de videogame, o sistema de feedback é uma das ferramentas mais importante e utilizadas para manter o jogador engajado e em estado de flow. Jogos como Tetris permanecem "vivos" até hoje porque são exemplos da síntese do feedback. Tudo o que acontece no jogo gera uma pontuação e mostra ao jogador um resultado imediato e uma reação imediata, seja a pontuação, a aceleração do jogo ou os blocos sumindo. Em projetos gamificados, o feedback é importante para manter o aluno/jogador engajado e consciente do seu desenvolvimento a cada meta cumprida. Nas atividades de sala de aula, o feedback torna o aprendizado mais dinâmico e orientador.

4) Participação voluntária, os alunos/jogadores precisam aceitar e querer participar do jogo voluntariamente, assim, irão respeitar as regras, verdadeiramente buscar a meta e o feedback causará seu potencial máximo motivacional. Todas, características necessárias para que se constitua uma atividade de aprendizado profundo, divertido e engajador. Seguindo o primeiro passo e se relacionando com os alunos, o educador criará um ambiente na sala de aula em que haja a pré disposição para ouvir as propostas das atividades. Caso a proposta seja percebida como divertida para todos, haverá interesse em conhecer os objetivos e as regras, com isso, o feedback encontrará um ambiente favorável para cumprir seu papel de fechar o que Werbach chama loop de engajamento. No loop de engajamento, o aluno receberá uma meta e seguirá regras para cumpri-la, ao realizar uma ação, ele receberá o feedback correspondente, o que poderá proporcionar motivação, para realizar uma nova ação. Os jogos de videogame tradicionais surgiram com esse intuito, entreter e gerar um loop de engajamento para que o jogador permanecesse nele por horas ou revisitando-o por dias, meses e até mesmo anos.

O jogo MI apresenta metas cooperativas para a aquisição e coleção de todas as cartas, metas competitivas com a aplicação de estratégias para alcançar a melhor combinação entre os personagens. Regras claras, simples e objetivas nas mecânicas e dinâmicas do jogo. Possui feedback acadêmico e de entretenimento e possui em seu Loop de engajamento a função metodológica de aprendizagem sobre cada personagem.

 

Competência

 

Assim como o relacionamento, a competência ou excelência é uma das três necessidades básicas para alcançar o bem-estar segundo a teoria do autodesenvolvimento. Para ser possível alcançar a maestria de maneira em que não haja desmotivação, é necessário um design de aprendizagem gradativa e em que quase todo o tempo possa haver sucesso em sua realização. Os jogos de videogame seguem essa receita há muitos anos e por esse motivo conseguem atrair cada vez mais pessoas para esse mundo. Estudos divulgados em agosto de 2021 pela DFC Intelligence apontam que 3,1 Bilhões de pessoas no globo terrestre, cerca de 40% da população mundial, são jogadores. Este mapeamento foi realizado com dados capturados até a metade do mesmo ano para analisar os impactos da pandemia no mercado dos jogos. Os jogos entregam aos seus usuários feedbacks instantâneos, quantitativa e qualitativamente, construindo caminhos que se equilibram entre sua dificuldade de resolução e habilidade do jogador, o que os mantêm em constante estado de Flow. É importante destacar que os feedbacks devem ser informativos, ela não deve controlar ou conduzir as atividades, elas também devem focar no desafio proposto sem evocar comparações, isso acabará com a autonomia do aluno e o desmotivará. As relações bem construídas também vão se destacar e ajudarão a internalizar todo feedback, gerando um aprendizado profundo.

O jogo MI possui um Loop de progressão que permite qualquer pessoa jogá-lo sem a necessidade de conhecimentos avançados ou longo tempo de jogo para haver evolução. O seu design é familiar e sua dificuldade estratégica é gradativa e proporcional ao interesse de envolvimento do aluno. Seu Feedback instantâneo e informativo ajuda a alcançar a maestria.

 

Autonomia

 

Os passos anteriores possuem o objetivo de tornar o processo da aprendizagem prazeroso e profundo, o MI insere o universo dos jogos, criando o círculo mágico (HUIZINGA, 2019), um ambiente livre de julgamentos, que transforma erros em diversão e que servirão como aprendizado, valorizando os conhecimentos prévios e as inteligências de cada um, compartilhado, multiplicado e possibilitando o desenvolvimento de novas habilidades e competências. Todos os passos anteriores foram construídos tendo a autonomia como base necessária. O relacionamento precisa ser mútuo; está entre as características dos jogos a participação voluntária; a união por um objetivo só acontecerá pelo desejo de ajudar o próximo; a competência será atingida quando houver o que se deseja alcançar. Todos esses passos estão ao alcance do professor e do aluno em qualquer ambiente escolar e o jogo MI constrói uma ponte que facilita essa jornada.

O jogo MI ainda permite que o aluno escolha e modifique a sua equipe, podendo alterá-lo nas regras de pontuação, de acordo com afinidade, interesse estratégico ou criatividade. A possibilidade de mudança propicia o desenvolvimento lógico-matemático, uma vez que exigem cálculos que mantém o equilíbrio do jogo, a descoberta de novas personalidades históricas, o entendimento e contextualização das Inteligências Múltiplas e suas interações, quanto maiores as possibilidades e interesse nas mudanças, maiores serão os aprendizados e avanços na aquisição de novas habilidades e competências.

 

Recursos

 

Os recursos podem ser lidos de várias maneiras, político, econômico, social, cultural, material entre outros, a disponibilidade de algum destes recursos possibilitará novas alternativas, mas jamais será fator determinante. Na Jogabilização, a mais poderosa geradora de recursos são as pessoas, a soma dos seus conhecimentos e inteligências. A soma desses conhecimentos diversos e inteligências múltiplas em sala de aula propiciará um ambiente criativo e rico para os processos de plasticidade neuropsicológica.

O jogo de cartas MI transporta professores e alunos para esse universo, unindo-os dentro de um círculo mágico promissor para o despertar de novos conhecimentos e favorável para o entendimento e compreensão entre as diferentes inteligências e suas potencialidades.

 

Conclusão

 

Álbuns de figurinhas colecionáveis durante toda a sua história se mostraram eficientes para o acúmulo e obtenção de informações. O Jogo de cartas colecionáveis Múltiplas Inteligências foi desenvolvido com base no processo EDUCAR, seguindo um percurso diferente dos tradicionais designers de jogos educativos e do game-based learning, onde o foco e objetivo primário é a transmissão do conteúdo. A função primária do MI é possuir várias categorias de diversão para poder ser utilizado enquanto jogo educacional, familiar, social e inclusivo, consciente de seu papel psicossocial cognitivo, despertando a curiosidade, aprimorando o raciocínio lógico-matemático e trazendo informações pertinentes ao universo acadêmico. Por se tratar de um jogo colecionável entre dois jogadores com montagem de equipes baseados em pontuações e com informações pertinentes e utilizadas em jogo sobre cada personagem, MI possibilita uma aprendizagem a partir da brincadeira. Para conhecer mais sobre o design estético do jogo, alguma das personalidades presentes e equipe envolvida no desenvolvimento do jogo, você pode entrar no link: <https://jogabilizacao.glideapp.io/> Acesso em: 05 de OUT. de 2021.

 

Referências

PRENSKY, Marc. Não me atrapalhe, mãeeu estou aprendendo!”. São Paulo: Phorte, 2010.

LUCKESI, Cipriano C. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. 22. ed. São Paulo: Cortez, 2018.

BLOOM, Benjamin S. Taxonomy of Educational Objectives: handbook 1 - Cognitive Domain. Nova Iorque: Longman, 1956.

ANDERSON, Lorin W. et. al. A taxonomy for learning, teaching and assessing: a revison of Bloom's Taxonomy of Educational Objectives. Nova York: Addison Wesley Longman, 2001.

GARDNER, Howard. Estruturas da mente: a Teoria das Inteligências Múltiplas. Tradução Sandra Costa. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

GARDNER, Howard. Inteligênciaum conceito reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.

GARDNER, Howard. Inteligências múltiplasa teoria na prática. Porto Alegre: Artes Médicas, 2019.

HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva, 2019.

WERBACH, Kevin; HUNTER, Dan. The gamification toolkit: Dynamics, Mechanics, and Components for the win. Philadelphia: Wharton School Press, 2015.

WERBACH, Kevin; HUNTER, Dan. For the win: the power of gamification. Update ed. Philadelphia: Wharton School Press, 2020.

McGONICAL, Jane. A realidade em jogo: por que os games nos tornam melhores e como eles podem mudar o mundo. Rio de Janeiro: Best Seller, 2012.

LEFRANÇOIS, Guy R. Teorias da aprendizagem: o que o professor disse. 2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2016.

CSIKSZENTMIHALYI, Mihaly . FLOW (Edição revisada e atualizada): a psicologia do alto desempenho e da felicidade. 2. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2020.

BARTLE, Richard A. Hearts, Clubs, Diamonds, Spades: Players Who Suit Muds. 1996. Google Scholar. Disponível em: <encurtador.com.br/eCLZ2> Acesso em: 5 Out. de 2021.

RYAN, R. M., DECI, E. L. Intrinsic and extrinsic motivation from a self- determination theory perspective: Definitions, theory, practices, and future directions. 2020. CSDT. Disponível em: <https://selfdeterminationtheory.org> Acesso em: 5 Out. de 2021.

LAZZARO, Nicole. Why We Play Games - Four Keys to More Emotion in Player Experiences. 2004. Xeo Design. Disponível em: <http://www.xeodesign.com/>. Acesso em: 5 Out. 2021.