ReTER, Santa Maria, v.2, n.3. ISSN:2675-9950 Melhores artigos SENID 2021

EDUCAÇÃO 5.0: REFLEXÕES E PERSPECTIVAS PARA SUA IMPLEMENTAÇÃO

 

Carla Denize Ott Felcher

Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pelotas, RScarfelcher@gmail.com

Vanderlei Folmer

Universidade Federal do Pampa, Bagé, RS vandfolmer@gmail.com

 

Resumo: O presente artigo tem por objetivo apontar reflexões sobre a Educação 5.0, bem como perspectivas iniciais para sua implementação. A Educação 5.0 é uma abordagem educacional, que tem como características a formação integral, o aluno ativo e a essência humana. Foi realizada uma pesquisa qualitativa, em que, os dados foram identificados por meio de um levantamento bibliográfico. Os resultados apontam que ainda estamos longe de uma efetiva Educação 5.0, pois, a Educação 1.0 ainda é muito presente nas salas de aulas, visto que, o professor dono do saber toma as decisões referente ao processo educacional, cabendo ao estudante, de modo passivo, receber os ensinamentos. Como perspectiva para sua implementação, salienta-se a necessidade da formação de professores, de modo que haja articulação do currículo, metodologias de ensino e tecnologias digitais, com ênfase a sala de aula invertida. Por fim, destaca-se a importância da Educação 5.0 no sentido de contribuir para uma sociedade mais inclusiva, ética, produtiva, onde todos tenham seus direitos garantidos e sua humanidade respeitada.

Palavras-chave: Educação 5.0; Educação 4.0; Sala de aula invertida.

 

EDUCATION 5.0: REFLECTIONS AND PERSPECTIVES FOR ITS IMPLEMENTATION

 

Abstract: This article aims to point out reflections on Education 5.0, as well as initial perspectives for its implementation. Education 5.0 is an educational approach, which features integral training, the active student and the human essence. A qualitative research was carried out, where the data on what identified through a bibliographic survey. The results show that we are still far from an effective Education 5.0, as Education 1.0 is still very present in classrooms, since, the teacher who owns the knowledge makes the decisions regarding the educational process, and the student is responsible for passively receiving the teachings. As a perspective for its implementation, the need for teacher training is highlighted, so that there is articulation of the curriculum, teaching methodologies and digital technologies, with emphasis on the inverted classroom. Finally, the importance of Education 5.0 is highlighted, in the sense of contributing to a more inclusive, ethical, productive society, where everyone has their rights guaranteed and their humanity respected.

Keywords: Education 5.0; Education 4.0; Flipped classroom.

 

Introdução

O modelo de educação vigente em muitas escolas é o tradicional, bancário, onde o professor, dono do saber, transmite informações aos estudantes, os quais devem memorizá-las para reproduzir nas avaliações (VALENTE, 2018). Esse modelo, segundo o autor, é ineficaz sob o ponto de vista da aprendizagem. Corroborando com a discussão, Lacerda e Melo (2017), concordam com a ineficiência e citam que não faz sentido no mundo atual utilizar esse modelo de ensino, pois pouco contribui para a formação de crianças, jovens e adultos.

Porém, há também um misto de consenso e de expectativas por um grupo de teóricos e da sociedade, sobre o quanto a educação pode ser transformadora e importante para tornar o mundo um lugar melhor (ROCHA, 2018). Nessa vertente, a importância da educação é inegável, bem como é evidente a necessidade de efetivas modificações nos modelos educacionais de ensino que perpassam por reflexões sobre o tipo de estudante que se pretende formar. Essa reflexão torna-se ainda mais relevante quando se sabe que as profissões que muitos dos alunos irão escolher, ainda nem existem, assim como as tecnologias que eles terão que utilizar e os problemas que terão de resolver (OECD, 2018).

Segundo Rahim (2021), a missão da educação mudou, pois com um clique é possível pesquisar a resposta certa no Google, o que requer a necessidade urgente de redefinir os objetivos educacionais. Visando contribuir com a construção de um novo cenário educacional, foi elaborada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento normativo que orienta a elaboração dos currículos escolares. Esse documento traz as dez competências gerais como um fio condutor para a formação integral do estudante, priorizando além do cognitivo, os aspectos socioemocionais do estudante. Ainda, define um conjunto de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas da Educação Básica, ressaltando a necessidade do aluno protagonista neste processo.

A discussão sobre formação integral e o protagonismo do estudante, é um grande desafio que se apresenta a educação e relaciona-se com a Educação 5.0. Embora essa abordagem ainda esteja em debate por especialistas, seu ponto forte é a essência humana, segundo Loiola (2020), justificando a necessidade de (re)pensar a escola, bem como as características e as necessidades do século que se vive.  Desse modo, o objetivo deste artigo é apontar reflexões sobre a Educação 5.0, bem como perspectivas iniciais para sua implementação.

 

Educação 5.0

Para compreender a Educação 5.0, serão abordadas de maneira breve a Educação 1.0, 2.0, 3.0 e 4.0. Assim, na Educação 1.0 o ensino era baseado estritamente na educação cristã, sendo o educador a figura mais importante do processo e os estudantes, numa atitude de submissão, recebiam passivamente os ensinamentos. Ou seja, o professor detentor do conhecimento decidi o que o aluno deve estudar (RAHIM, 2021), e o aluno, passivamente espera para adquirir e reproduzir o saber apresentado por esse profissional.

Já a Educação 2.0, tinha como objetivo preparar as pessoas para trabalharem na indústria, através de tarefas repetitivas, mecânicas e individuais (MELLO; NETO; PETRILLO, 2021). Nessa abordagem educacional, a memorização, a leitura e a repetição são fundamentais, e o erro deve ser evitado (RAHIM, 2021). Ainda, segundo o autor, essa abordagem está alinhada com a revolução industrial 2.0, a qual exigia que os funcionários fossem competentes no trabalho de produção em massa.

A Educação 3.0 caracteriza-se, segundo Vilela Júnior (2020), pelo crescimento exponencial de conhecimento. Também, por uma nova concepção de ensinar, onde o professor precisa saber utilizar as tecnologias como potencial pedagógico, promovendo a participação, a autonomia e a criatividade dos estudantes (MELLO: NETO; PETRILLO, 2021). Nessa abordagem, o professor ainda é a figura central do processo, mas a comunicação ganha espaço (RAHIM, 2021). E, diferente da Educação 2.0, o erro deve ser considerado como parte do processo de ensino e aprendizagem.

Por fim, a Educação 4.0 é uma evolução da Educação 3.0, e é essencial na perspectiva da Educação 5.0, além de estar ligada a Indústria 4.0, ou quarta revolução industrial. Segundo Schwab (2016), a quarta revolução industrial exige o uso produtivo das tecnologias digitais, desencadeando a substituição do trabalho mental humano por inteligência artificial e outras inovações digitais.  Desse modo, a Educação 4.0 vem atender as exigências da Industria 4.0, porém, é preciso oportunizar aos estudantes habilidades técnicas, cognitivas, sociais e emocionais necessárias para o aprendizado do século XXI (UNESCO, 2015). E, é de extrema importância oportunizar habilidades tecnológicas, afinal, muitos trabalhadores estão sendo substituídos por robôs e perdendo espaço no mercado de trabalho.

Essa abordagem educacional, denominada 4.0, baseia-se na alta tecnologia, como os robôs, machinelearning, inteligência artificial, big data, impressão 3D, realidade aumentada, cloud computing, Internet das Coisas (IoT), (CONSOLO, 2020), exigindo uma verdadeira transformação nas escolas. Esta transformação vai além do uso pelo uso da tecnologia, mas sim, para modificar processos e costumes, de acordo com as características do estudante. Nesse sentido, a transformação digital envolve repensar os processos de ensino e aprendizagem para os nativos digitais, considerando a incorporação de habilidades, mentalidade e atitudes (OLIVEIRA; SOUZA, 2020).

Também, a Educação 4.0 baseia-se no conceito de learning by doing, que segundo Antunes (2017), significa aprender fazendo. Segundo a autora, todos aprenderão coisas diferentes e de maneiras diferentes por meio de experiências, projetos, testes e muita ‘mão na massa’. Nesse contexto, os fablabs ganham destaque, pois são laboratórios de fabricação digital, um espaço pensado para que o estudante possa estimular a sua criatividade e o seu conhecimento, ou seja, colocar a ‘mão na massa’ e aprender.

As denominações Educação 1.0, 2.0, 3.0 e 4.0 estão relacionadas aos acontecimentos que marcaram e marcam a sociedade ao longo dos anos, tais como: as revoluções industriais, a introdução e desenvolvimento das tecnologias, o surgimento da Internet, a incorporação das tecnologias na pedagogia, a pulverização e massificação dos dispositivos móvel nas sociedades, entre outros. No cenário educacional, as características e as propostas de aprendizagem ganham enfoque distintos de acordo com tais denominações, conforme Quadro 1.

Quadro 1 - características dos processos de aprendizagem

EDUCAÇÃO 1.0

EDUCAÇÃO 2.0

EDUCAÇÃO 3.0

EDUCAÇÃO 4.0

Aulas nas igrejas e mosteiros

 

Aulas nas salas de aulas para turmas homogêneas

 

Aulas presenciais e a distância (ensino híbrido) ou exclusivamente EaD

Aulas presenciais e a distância (ensino híbrido) ou exclusivamente EaD

Formação de eclesiástico

 

Foco na memorização

 

Pensamento crítico

 

Pensamento crítico com foco em problemas complexos

Metodologias passivas

Metodologias passivas

Metodologias ativas

Metodologias ativas

Fonte: Adaptado de Mello, Neto e Petrillo (2021)

 

As propostas de aprendizagem foram evoluindo a partir das tecnologias digitais, chegando à Educação 4.0. Nessa concepção de Educação, metodologias e tecnologias são empregadas com foco em problemas complexos. Destaca-se, nesse contexto, as metodologias ativas, pois, segundo Moran (2018), elas dão ênfase ao papel do aluno protagonista, o envolvimento direto, participativo e reflexivo em todas as partes do processo, experimentando, criando e discutindo, com a orientação do professor.

E a Educação 5.0? É uma evolução da Educação 4.0 e relaciona-se com a Sociedade 5.0, um conceito oriundo do Japão e que promete uma revolução positiva na vida das pessoas, de maneira que a tecnologia esteja a favor do ser humano. Nesse sentido, a Educação 5.0 privilegia a concepção de que os conhecimentos digitais e tecnológicos são importantes, mas é preciso considerar também, as competências socioemocionais. São essas competências que capacitam o indivíduo para usar a tecnologia de forma saudável e produtiva, criando soluções relevantes para si e para a sociedade em geral. A Educação 5.0 considera que se é feito com sabedoria, é necessariamente humanista, contribuindo assim para uma vida mais plena e respeitosa (VILELA JÚNIOR et al., 2020).

Um conceito muito importante atrelado a Educação 5.0 é a soft skills, um pilar do desenvolvimento humano. O termo soft skills se refere às competências socioemocionais, comportamentais e pessoais do indivíduo, que tem como essência a capacidade de comunicação, de resolução de problemas, o gerenciamento das emoções, o trabalho em equipe, a diversidade, a empatia e a ética. Ou seja, é aquilo que é específico de cada indivíduo, que não pode ser quantificado nem registrado no currículo, mas que faz toda a diferença na vida pessoal e profissional de qualquer pessoa. Importante mencionar, segundo Moraes (2020), que as soft skills têm sido mais valorizadas no ambiente de trabalho do que as hard skills.

Segundo Loiola (2020), a Educação 5.0 também busca entender o impacto da tecnologia no cérebro humano e, consequentemente, a forma como se aprende. Desse modo, essa abordagem educacional faz uma ponte entre a neurociência e as habilidades socioemocionais do educando, ocasionando diversas transformações na forma de enxergar, tanto as questões comportamentais do indivíduo, como também na melhoria da qualidade de ensino (SANTOS; OLIVEIRA; CARVALHO, 2019). Ou seja, a Educação 5.0 traz uma importante ferramenta para potencializar a aprendizagem, que é a neurociência.

Para sistematizar as características da Educação 5.0, apresenta-se a Figura 1, a qual faz uma analogia com a situação dos tripulantes de um navio que se deparam com um iceberg no meio do mar. Nesse caso, a parte visível do iceberg refere-se as metodologias ativas e as tecnologias digitais. Porém, há uma parte invisível, mas de extrema importância que compreende: aluno e professor protagonista, formação integral e neurociência. Os elementos visíveis e os não visíveis são fundamentais para uma efetiva educação 5.0.

Figura 1 – Educação 5.0 e seus elementos

Fonte: Autores

Metodologia

Este trabalho apresenta uma contribuição teórica, de caráter qualitativo, a qual visa compreender certos fenômenos através dos dados produzidos (BAUER; GASKELL, 2017). Esses dados foram identificados por meio de um levantamento bibliográfico, com base em material já publicado sobre o assunto (GIL, 2012). A escolha por esse mecanismo de pesquisa, leva em consideração a literatura abrangente e confiável que nele se encontra.

O levantamento bibliográfico foi realizado no Google Acadêmico ou Google Scholar, na versão em inglês, com os descritores “Educação 5.0” e “Education 5.0”. Essa busca resultou em 07 artigos, conforme quadro 2. Importante mencionar que esses artigos foram selecionados por tratarem especificamente da Educação 5.0, já apresentando o descritor no título do artigo.

Quadro 2 – Artigos sobre Educação 5.0

TÍTULO

AUTOR(ES)

ANO DE PUBLICAÇÃO

Educação 5.0: uma nova abordagem de ensino-aprendizagem no contexto educacional

Amarildo Enes dos Santos

Carlos Antonio de Oliveira

Elma Nunes de Carvalho

2019

Você está preparado para a Educação 5.0?

Guanis de Barros Vilela Júnior et al.

2020

Education 5.0, openness and the future of education

Elena Railean

2017

Sustainable Professional Development of Primary School Mathematics Teachers in Zimbabwe Through Philosophy of Education 5.0: Challenges and Prospects

S. Chirume

2020

Perception of Educators towards the Adoption of Education 5.0: A Case of a State University in Zimbabwe

Dumisani Rumbidzai Muzira, e Beatrice MaupaBondai

2020

Post-Pandemic of Covid-19 and the Need for Transforming Education 5.0 in Afghanistan Higher Education

Mohammad Naim Rahim

2021

The role of Education 5.0 in accelerating the implementation of SDGs and challenges encountered at the University of Zimbabwe

Muchaiteyi Togo e Crecentia Pamidzai Gandidzanwa

2021

  Fonte: Autores (2021)

 

Reflexões e perspectivas

As transformações pelas quais a sociedade tem passado são inúmeras e intensas. Atualmente, o consumo, o acesso à informação e a comunicação, podem ser feitos por meio de aplicativos, por exemplo, o uso de aplicativo para solicitar o prato preferido. Esse cenário não combina com as práticas de repetição, de reprodução, de cálculos mecânicos e da exclusão dos sentimentos. Ao contrário, o século XXI requer uma Escola, também, do século XXI, que privilegia o aluno ativo, protagonista, que busca aprender e que usa a tecnologia para o bem da humanidade. Ou seja, Educação 5.0 é fundamental na concepção de Escola do Século XXI.

Revisitando a Educação 1.0, percebe-se mudanças quanto ao currículo voltada as ideias cristãs, porém, essa concepção é ainda muito presente nos ambientes escolares. Visto que, não é rara a sala de aula em que o professor, dono do saber, despeja uma carga de conhecimento aos estudantes, que enfileirados escutam e tentam absorver para reproduzir nas provas. Os que conseguem são considerados inteligentes, enquanto os demais, muitos excluídos do sistema, são considerados como incapazes. A Educação 1.0 também predomina nas escolas e instituições de ensino superior do Afeganistão, conforme cita Rahim (2021).

A Educação 2.0 é marcada pela chegada dos computadores e da internet nas escolas (VILELA JÚNIOR, 2020), e esse fato merece atenção. Odorico et al. (2012), traz dados sobre o não uso dos laboratórios de informática nas escolas, devido à falta de planejamento e de conhecimento sobre sua importância pedagógica. Ainda, o estudo aponta para uma subutilização dos espaços físicos destinados aos laboratórios. Há de se considerar, portanto, que muitos dos laboratórios ficaram sucateados sem serem utilizados para fins pedagógicos, o que pode estar atrelado a inúmeras justificativas, que não entrará em detalhes.

Mas, ainda refletindo sobre a Educação 2.0, um dos motivos que pode estar atrelado ao não uso do laboratório de informática, é a falta de acesso à internet, uma realidade no Brasil. Em 2019, por meio do Ministério da Educação (MEC), o Governo Federal criou o Programa Educação Conectada, com o objetivo de disponibilizar para as escolas públicas acesso à internet, e garantir aos estudantes conexão com o mundo virtual (BRASIL, 2019). É enorme o desejo e a importância de escolas 100% conectadas à internet, para que os estudantes possam fazer uso por meio de seus smartphones.

Na Educação 3.0 o conceito de Big Data ganha destaque, pois, segundo Vilela Júnior et al.  (2020), é impossível um ser humano ler o grande volume de conhecimento científico produzido no mundo. Cabe questionar a importância e o impacto desta informação na Educação por meio de duas reflexões: a primeira delas é o quanto se está formando alunos pesquisadores em nossas escolas; e a segunda é discutida por Borba, Almeida e Gracias (2018), quando citam que as muitas pesquisas realizadas por si só não resolvem todos os problemas da educação, mas são fundamentais para melhorar a qualidade do ensino e da aprendizagem.

Em relação a Educação 4.0, Santos, Oliveira e Carvalho (2019), citam que essa abordagem já está implementada na sociedade atual. Porém, na visão de Oliveira (2019), em muitas escolas de países subdesenvolvidos e emergentes o aluno pouco faz, cria, experimenta e limita-se a absorver conteúdos, uma realidade bem distante daquilo que propõe a educação 4.0. Portanto, não é condizente com a Educação 4.0, que privilegia o estudante como protagonista e o capacita para tomar decisões quanto ao seu aprendizado. Assim, corroborando com a discussão e trazendo as dificuldades para sua implementação, Consolo destaca:

 

Na verdade, a educação 4.0 é ainda um ideal a ser perseguido no Brasil, pois, na prática, são muitas as dificuldades para sua implantação, que vêm de várias instâncias, desde as instituições educacionais, a família, os próprios alunos, até os professores e da sociedade de forma geral, pois todos estão acostumados a sistemas educacionais já sedimentados por muitos séculos (CONSOLO, 2020, p. 113).

 

Além dessas, há outras defasagens nas escolas, como a tecnológica, por exemplo, já citada. A realidade aumentada, a Internet das coisas, redes sociais, os jogos digitais, a computação em nuvem, os softwares educativos, a robótica, precisam permear as práticas pedagógicas, porém, esse é ainda um desafio, visto que, além de laboratórios de informática sucateados, não é incomum a proibição dos smartphones nos ambientes escolares. Essa discussão é reforçada por Pimentel e Feitoza (2017), os quais salientam que alguns estados brasileiros adotavam medidas para que estes aparelhos não entrassem no ambiente escolar, visando evitar a distração dos estudantes e os prejuízos na aprendizagem. Espera-se que com a experiência do ensino remoto, essas questões tenham sido superadas e os dispositivos móveis passem a ser percebidos como possíveis potencializadores dos processos de ensino e aprendizagem.

Diante de tantos desafios ainda a serem vencidos, idealizar a Educação 5.0 pode parecer uma utopia, mas, são essas utopias fundamentais para a conquista de uma educação mais dialógica, democrática, humana, tecnológica e empreendedora, características da Educação 5.0. E embora não haja receitas ou passo a passo para a implementação dessa abordagem, é imprescindível uma reestruturação nas escolas a partir de algumas perspectivas que merecem atenção, as quais relacionam-se diretamente, sem uma ordem de hierarquia, conforme apresentado na Figura 2.

Figura 2 – Perspectivas para a implementação da Educação 5.0

Fonte: Autores

A Educação 5.0 não combina com um currículo linear e inflexível com conteúdo trabalhado que tenha uma própria finalização e seja arquivado nas gavetinhas, mas ao contrário, visto que os conteúdos são essenciais na Educação, mas sabendo o porquê de cada um. Segundo Moran (2007), o currículo precisa estar ligado à vida, fazer sentido, ter significado, pois só assim o conhecimento acontece.  Ainda, é por meio dos conteúdos que se desenvolvem as competências e habilidades, conforme destaca a BNCC (BRASIL, 2018).

A partir do conteúdo, é preciso pensar a metodologia de ensino mais adequada, considerando a sua importância para os processos de ensino e aprendizagem.  Como já citado, a Educação 5.0 é uma evolução da Educação 4.0, sendo que o protagonismo do estudante é necessário. Para tal, é preciso romper com a “decoreba” e a reprodução, e investir em atividades de aprendizagem estruturadas com metodologias ativas e inovadoras, promovendo a teoria e a prática ao mesmo tempo (CONSOLO, 2020).

As metodologias ativas tem como pilar as tecnologias digitais, que possibilitam a personalização da aprendizagem. Um processo complexo, mas cada vez mais necessário, já que segundo Moran (2018), há diversos modelos de personalização os quais buscam descobrir as motivações de cada estudante, o que os mobiliza aprender os percursos e as tecnologias mais adequadas para cada situação. Ainda, segundo o autor, conhecer mais o aluno, mapear seu perfil, acolher com afetividade, estabelecer pontos, aproximar-se do universo deles, é uma iniciativa para ajudá-los a aceitar desafios criativos e empreendedores.

Em se tratando do uso da tecnologia, esse não pode ser “domesticado”, expressão empregada por Borba, Silva e Gadanidis (2015). Entende-se como uso domesticado, o uso que não altera as práticas educativas, ou seja, fazer com a tecnologia o que poderia ser feito sem ela. Nesse contexto, Consolo (2020) afirma que seja qual for a tecnologia usada, ela por si só não é fator decisivo na aprendizagem, visto que, seu uso proporcionará desenvolvimento de habilidades se houver direcionamento, projetos e encaminhamentos adequados.

As tecnologias digitais tornaram-se fundamentais para dar continuidade aos processos de ensino e aprendizagem durante a pandemia, visto que foram elas que viabilizaram o ensino remoto. Porém, espera-se mais em relação a esse uso. Espera-se que as mesmas sejam potencializadoras da aprendizagem, e não apenas para transportar o ensino tradicional até o estudante, conforme salienta Bacich (2020). Contudo, a Pandemia causada pelo Covid-19 acelerou os processos, principalmente em relação as tecnologias digitais, e assim, profissionais começaram a fazer o uso, alguns de modo mais intenso e outros menos. O ensino híbrido, considerado por Santos Oliveira e Carvalho (2019), como um dos pontos essenciais para a funcionalidade da Educação 5.0, ganhou evidência tanto nos debates, quanto nas salas de aulas, ao longo da pandemia.

Assim, o currículo, as metodologias de ensino e as tecnologias digitais precisam estar entrelaçados em prol de objetivos maiores, que vão além do conhecimento cognitivo, mas também, do socioemocional, contribuindo para a formação e o fortalecimento dos soft skills. Desse modo, é importante destacar que: “Sozinhos, podemos aprender a avançar bastante; compartilhando, podemos conseguir chegar mais longe e, se contamos com a tutoria de pessoas mais experientes, podemos alcançar horizontes inimagináveis” (MORAN, 2018, p. 8). As palavras de Moran (2018) consideram a importância do aprender junto, do compartilhar conhecimento e do papel do professor como tutor/mediador no processo, características essenciais da Educação 5.0. 

O professor é importante em todas as denominações de Educação apresentadas neste texto, porém, o papel do profissional no contexto vem exigindo transformações. De um profissional dono do saber para um profissional que orienta, que instiga, que mostra caminhos em uma construção mais aberta, criativa e empreendedora, que usa a tecnologia como aliada, e é a favor da aprendizagem. Porém, para alcançar esse patamar, é fundamental (re)pensar a formação de professores, a qual aparece no centro da Figura 1. A formação, inicial e continuada, precisa trazer essas discussões para a pauta e intensificá-las de maneira teórica e prática considerando a Escola do Século XXI. 

A partir do exposto, considera-se a sala de aula invertida como uma metodologia alinhada à Educação 5.0. Essa metodologia, segundo os seus criadores Bergmann e Sams (2018), resume-se em fazer na sala de aula o que era feito em casa, e fazer em casa o que era feito na sala de aula. Essa inversão permite que o tempo em sala de aula seja utilizado para atividades diversificadas e potencializadoras dos processos de ensino e aprendizagem. Afinal, entende-se como inaceitável que em pleno século XXI a escola detenha-se apenas a transmitir informações.

A defesa pela sala de aula invertida vai além da configuração de uma modalidade sustentada de ensino híbrido. Considera-se que suas características agregam diferentes metodologias ativas, o uso potencializador das tecnologias digitais e a relação não linear com o currículo, aspectos citados anteriormente. Porém, aliado ao contexto é preciso atentar para a necessidade de formação de um cidadão mais humano, ético, criativo, que lute pelos seus ideais e também em prol de um mundo melhor para todos. Afinal, segundo Rahim, a Educação 5.0 não tem por objetivo apenas partilhar conhecimento, mas ajudar os alunos a se inspirar, explorar e descobrir novas ideias num mundo cheio de possibilidades.

 

Considerações finais

Ainda está longe de ser realidade a Educação 5.0, pois, em muitas das escolas, ainda predomina a Educação 1.0, acenando para uma longa, mas necessária caminhada. Nesse contexto, destaca-se a importância de equipar com recursos tecnológicos as escolas, mas também, proporcionar ao professor formações que contemplem essa abordagem educacional. Afinal, é preciso que o professor tenha acesso a tecnologia, saiba utilizá-la nos processos de ensino e aprendizagem de modo potencializador, e tenha suporte para inovar na sala de aula.

A Educação 5.0 é promessa de uma sociedade melhor, de um futuro melhor para se viver, por isso tem sua importância no século XXI. As escolas precisam se reinventar e formar cidadãos para o mundo do trabalho, o qual se modifica de modo intenso. Mas, a escola também precisa formar cidadãos para viver em harmonia na sociedade, sendo ético, responsável, utilizando as tecnologias com sabedoria e humanidade, e desse modo, contribuir para que se tenha uma sociedade mais inclusiva, ética, produtiva, onde todos tenham seus direitos garantidos e sua humanidade respeitada.

 

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