ReTER, Santa Maria, v.2, n.1. ISSN:2675-9950 Submissão: 28/07/2021 Aprovação: 29/09/2021 Publicação: 16/11/2021

O PROFUNCIONÁRIO COMO POLÍTICA DE FORMAÇÃO: O CASO DOS TAES DE UM MUNICÍPIO DO MT

 

Silvia Regina de Oliveira

Mestranda em Educação pelo Programa de Pós-graduação em Educação na Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – Campus de Frederico Westphalen - RSsilviajna@gmail.com

 

Resumo: O presente artigo analisa a oferta dos cursos do Programa de Formação Inicial em Serviço dos Profissionais da Educação Básica dos Sistemas de Ensino Público (PROFUNCIONÁRIO), mais especificamente do Curso Técnico em Secretaria Escolar, apreendendo que tais ações integram as políticas públicas educacionais no Brasil. O período pesquisado foi entre 2012 e 2015, englobando os Profissionais Não Docentes (PNDs) lotados nas secretarias das Escolas Públicas Estaduais de Juína/MT. Realizou-se um resgate histórico, demostrando o percurso das instituições ofertantes da profissionalização/habilitação específica direcionada ao PNDs que estão atuando nas instituições de ensino estaduais, além de analisar as principais políticas educacionais que contribuíram para que esse histórico fosse possível. Abordou-se os registros do enfrentamento desses servidores das instituições de ensino na busca pelo reconhecimento e valorização profissional, as dificuldades enfrentadas, os resultados obtidos, o caminho percorrido pelas legislações e o olhar do gestor escolar, além de dar voz aos técnicos administrativos educacionais (TAEs) de secretaria escolar profissionalizados pelo Programa durante o período delimitado.

Palavras-chave: Educação; Políticas Públicas Educacionais; Profissionalização em Serviço; Programa PROFUNCIONÁRIO.

 

THE PROFUNCIONÁRIO AS A TRAINING POLICY: THE CASE OF TAES IN A MUNICIPALITY OF MT

 

Abstract: This dissertation analyzes the offer of the courses of the Initial Training Program in Service of the Basic Education Professionals of the Public Education Systems (PROFUNCIONÁRIO), more specifically of the Technical Course in School Secretariat, apprehending that such actions integrate the public educational policies in Brazil. The period surveyed was from 2012 to 2015, encompassing Non-Teaching Professionals (PNDs) based in the secretariats of the State Public Schools of Juína/ MT. We carried out a historical review, demonstrating the path taken by institutions offering specific professionalization/qualification aimed at PNDs who are working in state educational institutions, in addition to analyzing the main educational policies that contributed to making this history possible. We approach the records of the confrontation of these employees of educational institutions, in the search for professional recognition and appreciation; the difficulties faced, the results obtained, the path taken by the legislation and the view of the school manager, in addition to giving a voice to the educational administrative technicians (TAEs) of school secretaries professionalized by the Program during the defined period.

Keywords: Education; Educational Public Policies; Professionalization in Service; PROFUNCIONÁRIO Program.

 

 

Introdução

Este estudo se propõe a realizar uma análise da profissionalização e da formação em serviço dos profissionais não docentes (PNDs) lotados nas Escolas Públicas de Juína/MT, bem como, suas perspectivas, avanços e desafios da/na profissionalização, tendo como viés a trajetória que se apresentou com a oferta dos cursos do Programa de Formação Inicial em Serviço dos Profissionais da Educação Básica dos Sistemas de Ensino Público (PROFUNCIONÁRIO), tais ações integram as políticas públicas educacionais no Brasil.

Foram investigadas as perspectivas e os caminhos percorridos pelos PNDs da educação pública estadual de Juína/MT, desde a matrícula até a conclusão do curso técnico profissionalizante em secretaria escolar, ofertado pela Rede E-tec Brasil, do Ministério da Educação, através do Programa PROFUNCIONÁRIO, bem como os resultados, as avaliações institucionais e os sujeitos envolvidos nos referidos cursos.

Entre 2012 e 2015, os cursos do programa foram ofertados através de parcerias entre os Institutos Federais, Secretarias de Estado de Educação e Prefeituras, na modalidade semipresencial, com 80% da carga horária ofertada na modalidade EaD/Online, via Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), através do software livre Moodle (Modular Object - Oriented Dynamic Learning Environment), envolvendo tutores presenciais, coordenadores de polo, professores orientadores e conteudistas à distância, sendo 20% da carga horária presencial, por meio de atendimentos individualizados e seminários integradores. Nesses encontros presenciais, foram utilizados vários recursos tecnológicos, como por exemplo, projetor multimídia, computador, televisor e DVD player (BESSA, 2016).

Assim, traçaram-se alguns objetivos que auxiliaram no desenvolvimento da pesquisa. Sendo o objetivo geral: analisar a oferta da profissionalização técnico-pedagógica aos profissionais não docentes lotados nas secretarias da Escolas de Juína/MT, a fim de avaliar seus avanços, perspectivas e desafios. Quanto aos objetivos específicos, são os seguintes: pesquisar se, na análise das instituições de ensino em que atuam os servidores profissionalizados e nas avaliações das instituições ofertantes (Secretaria Estadual de Educação de Mato Grosso , Secretarias Municipais de Educação e Cultura, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso) houve expansão das aprendizagens assimiladas, incorrendo em alterações da prática profissional e no papel de educador desse grupo; apreender se ocorreram e quais são as principais conquistas e perspectivas obtidas pós-profissionalização pelos PNDs profissionalizados, qual a visão dos resultados obtidos segundo as instituições ofertantes; investigar se o perfil esperado da profissionalização sofreu influências internas e externas, que marcam e/ou marcaram a forma de gerir os serviços públicos educacionais.

O primeiro objetivo nos direciona para a constatação ou não, mediante a análise das respostas dadas pelos Gestores, documentação oficial e as produções acadêmicas, se os egressos do curso técnico em secretaria escolar apresentaram mudanças quanto sua prática profissional e no papel de educador, após a profissionalização específica. Seguindo a dinâmica do primeiro objetivo, que analisa as respostas, documentos e produções, no segundo objetivo se pretende apreender se ocorreram ou não conquistas, e se as perspectivas dos sujeitos (TAEs) foram contempladas após a profissionalização e, ainda, se o processo foi o esperado, sob a ótica das instituições que ofertaram a habilitação específica.

Além disso, busca-se investigar se no percurso e na construção da profissionalização, houveram influências internas e externas que interferiram no perfil esperado dos egressos e se essa interferência tem impactado na gestão dos serviços públicos educacionais. Assim, no decorrer desse documento, essas informações, delimitadas por esses três objetivos, serão confirmadas ou não. Nesse viés, o Estado de Mato Grosso passou a exigir a profissionalização específica para enquadramento definitivo dos servidores efetivos de carreira, e também para equiparação salarial aos docentes a partir de 1998, por força do que estava descrito no item I do artigo 8ª da Lei n. 050/1998, e posteriormente reforçado com o item III do artigo primeiro da Lei n. 12.014/2009.

Com base nos objetivos elencados, o desafio aqui proposto é investigar se os objetivos alvitrados pelo Programa PROFUNCIONÁRIO, e pelos cursos ofertados aos profissionais em Juína/MT entre 2011 e 2015 foram atingidos, e se não foram atingidos quais as causas ou motivos. Essa proposta se justifica, também, na possibilidade que a pesquisa tem de auxiliar na compreensão do processo de profissionalização EaD/online dos servidores não docentes, lotados nas secretarias das escolas estaduais de Juína, investigando o construto e os resultados, tanto do ponto de vista das instituições ofertantes dos cursos, quanto do ponto de vistas dos profissionalizados e das unidades de ensino em que estes exercem suas funções.

 

Estado do Conhecimento

O estudo apurou o conhecimento já produzido, já que o Estado de conhecimento exige do pesquisador comprometimento científico. Ao pesquisar, apresenta-se um novo olhar que pode interferir, ou não, nos modos de vida dos pesquisados, nas instituições, nas práticas, teorias e etc. No entendimento de Morosini e Fernandes (2014), o estado de conhecimento é a identificação, registro e categorização que levem à reflexão e síntese sobre a produção científica de uma determinada área, em um determinado espaço de tempo, congregando periódicos, teses, dissertações e livros sobre uma temática específica.

Ao analisar alguns descritores do conhecimento no banco de dados da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), podemos verificar que inúmeros trabalhos trataram da importância da profissionalização em todas as áreas profissionais, como saúde, educação, meio ambiente e etc., no entanto, com a especificidade dessa proposta, não são muitos estudos diretamente vinculados. Após primeira tentativa, reduziu-se o número de trabalhos para seis com maior diálogo com essa temática. Entre as obras e produções científicas pesquisadas no catálogo de teses e dissertações da CAPES, realizou-se uma seleção de algumas teses e dissertações por encontrar nessas, aspectos relevantes para a pesquisa em tela.

A autora Lopes (2014) trouxe a experiência do Programa PROFUNCIONÁRIO no Estado do Maranhão e suas reflexões sobre identidade profissional, percurso de formação e sentido da formação para os profissionais não docentes inseridos na educação. Oliveira (2017) pesquisou os profissionais docentes no Estado do Paraná, fazendo um resgaste histórico dos PNDs, efetivando sua análise sobre a Escola no contexto neoliberal, o processo de sindicalização e a construção do plano de carreira no Paraná.

Scapini (2014) descreve a origem do trabalho desses PNDs das escolas públicas, suas dificuldades quanto ao reconhecimento profissional, plano de carreira e ação educativa desenvolvida por esses profissionais dentro das instituições de ensino. Vieira (2017) aponta o contexto educativo no Brasil após os anos de 1990, tais como, novas concepções da política educacional no Brasil, avaliação de larga escala, descentralização das ações educativas, novo gerencialismo e gestão democrática.

Sanches (2014) trata dos paradoxos entre a administração pública e gestão educacional, percebendo as características do chamado gerente educacional e o papel do diretor escolar. Vargas (2015) remete às concepções sobre o trabalho realizado pelos profissionais não docentes, valorização, formação e escolarização, políticas de formação dos servidores não docentes, entre outras. De posse dessas evidências, entende-se que o propósito em relação a esse estudo aborda um ângulo distinto dos trabalhos pesquisados.

 

Metodologia

Toda pesquisa exige embasamento do conhecimento científico pelo pesquisador, que resulta em ampliação do conhecimento, levando em conta os procedimentos metodológicos reconhecidos pelo meio acadêmico. A metodologia e o percurso do pesquisador são os instrumentos que vão delinear seus estudos a partir de sua criatividade e sensibilidade. Para Deslandes, Gomes e Minayo (2007, p. 14)

 

Metodologia é caminho do pensamento e a prática exercida na abordagem da realidade ou seja, a metodologia inclui simultaneamente a teoria da abordagem (o método), os instrumentos de operacionalização do conhecimento (as técnicas) e a criatividade do pesquisador (sua experiência, sua capacidade pessoal e sua sensibilidade).

 

Essa investigação percorre os caminhos da pesquisa qualitativa, análise documental e bibliográfica e questionários semiestruturados. Vamos a algumas reflexões sobre essa metodologia. No artigo escrito por Maria Teresa de Assunção Freitas (2002), intitulado “A abordagem sócio histórica como orientadora da pesquisa qualitativa”, encontra-se a seguinte citação de Bakhtin:

 

Não é possível compreender o homem, sua vida, seu trabalho, suas lutas, senão por meio de textos signos criados ou por criar. Nesse sentido o homem não pode ser estudado como um fenômeno da natureza, como coisa. A ação física do homem precisa ser compreendida como um ato, porém, este ato não pode ser compreendido fora de sua expressão ‘significa’ que é por nós recriada (BAKHTIN, 1985 apud FREITAS, 2002, p. 24).

 

Sobre a utilização da pesquisa bibliográfica como metodologia de pesquisa, Oliveira e Lima (2009) afirmam que a pesquisa bibliográfica aprofunda suas reflexões sobre as considerações dos autores estudados, porém é necessário estar atento para que não se faça apenas um resumo do material pesquisado.

Gil (2008) afirma que a principal vantagem da pesquisa bibliográfica, reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente. O autor explica ainda, que a pesquisa documental é realizada a partir de análise de documentos autênticos de pessoas, instituições, organização e etc., sendo utilizada amplamente em investigações históricas, para que sejam realizadas descrições e comparações de fatos sociais ocorridos.

Minayo (2000), ao falar sobre a pesquisa qualitativa, assinala que essa pesquisa se ocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado, atua no universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. Deslandes, Gomes e Minayo (2007), também destacam a importância do pesquisador realizar questionamentos, pois eles permitem que o pesquisador ultrapasse a simples descoberta para, através da criatividade, produzir conhecimentos. Assim, para a autora, o trabalho de campo deve ter ligação com a vontade e a identificação com o tema a ser abordado, o que permitirá ao pesquisador uma melhor realização da pesquisa proposta. O estudo se vale também do instrumento de coleta de dados.

Marconi e Lakatos (2003) esclarecem que, o questionário é um instrumento de coleta de dados que se utiliza de uma série ordenada de perguntas que devem ser respondidas por escrito, e sem a presença do entrevistador. Os questionários que foram utilizados na pesquisa são de autoria própria, sendo criados com vistas ao atendimento das questões da pesquisa, bem como, os objetivos gerais e específicos do trabalho. Foram pesquisadas Escolas Estaduais localizadas no município de Juína/MT, sendo aplicado questionário semiabertos aos técnicos administrativos profissionalizados em secretaria escolar entre 2012 a 2015, que atuam nessas instituições até a data da efetivação da pesquisa.

 

Os sujeitos da pesquisa

No polo sede de Juína/MT, a turma de 2012 a 2015 teve matrícula de 35 alunos. Desses, 27 pertenciam ao município de Juína/MT, 5 a Brasnorte/MT e 3 de Castanheira/MT.  Dos 20 (vinte) aprovados que são do município de Juína/MT, 02 (dois) não atuam mais na educação, pois foram aprovados em concursos de outros setores; 02 (dois) cursistas estão atuando em laboratório de pesquisa ou informática, e 1 (um) cursista pertence ao quadro de recursos humanos da rede municipal de Juína/MT. Portanto, foram pesquisados os cursistas egressos e que obtiveram êxito/aprovação na profissionalização do Programa PROFUNCIONÁRIO nas turmas de 2012 a 2015, que estão lotados nas Escolas Estaduais de Juína/MT, somando um total de 15 servidores.

Tendo em vista a temática de pesquisa e sua relevância, conforme já referido, o desenho metodológico dessa investigação teve enfoque documental, bem como, da pesquisa de campo, por meio da utilização de questionários estruturados e/ou semiestruturados, que foram aplicados via questionários online, utilizando a ferramenta Google Forms, devido a ocorrência da pandemia de COVID-19.

O uso dessas metodologias de pesquisa tem o objetivo de reunir as informações e dados que servirão de base para a construção da investigação proposta no projeto. Ainda tem enfoque descritivo e qualitativo. Entende-se como pesquisa descritiva e qualitativa, o estudo para compreensão de um conjunto de diversas técnicas interpretativas que objetivam conhecer, compreender, descrever e decodificar os componentes de um sistema complexo de significados.

 

Análise de dados

A análise de dados se deu através da leitura flutuante e da análise documental, algumas obras e documentos institucionais, leituras em plataformas e sítios institucionais que sejam intrínsecos aos apontamentos feitos nos objetivos específicos, sobretudo os que tratam da construção histórica, identidade profissional e profissionalização específica dos PNDs, bem como, da gestão e políticas educacionais.

Considerou-se como positivo o retorno das respostas via Google Forms, trazendo aqui alguns dados quantitativos: 80% (oitenta e sete por cento) dos gestores e 70% (setenta por cento) dos TAEs profissionalizados responderam aos questionários semiestruturados. Os dados foram sistematizados e extraídos dos questionários direcionados aos gestores e aos PNDs que estão atuando nas secretarias das escolas estaduais de Juína/MT. Segundo Marconi e Lakatos (2003), à medida que o pesquisador tem em mãos as fontes de referência, deve transcrever os dados em fichas, com o máximo de exatidão e cuidado.

Foram analisadas as documentações disponíveis sobre o passado e o presente dos profissionais não docentes das escolas públicas estaduais do município de Juína/MT, através de instrumentos metodológicos voltados à investigação sócio-histórica e antropológica, além de seguir os caminhos da pesquisa bibliográfica, documental e da análise das respostas provindas dos questionários semiestruturados aplicados aos técnicos administrativos profissionalizados em exercício nas secretarias e aos gestores lotados nas instituições a que esses atuam.

Durante a análise documental e pesquisa bibliográfica, o estudo se valeu de documentos oficiais sobre o Programa PROFUNCIONÁRIO, bem como das legislações que amparam o direito e o dever da profissionalização dos não docentes do Estado de Mato Grosso, como por exemplo a Lei Complementar 050/1998, que trata do plano de carreira dos profissionais do Estado; o Parecer 016/2005 do Conselho Nacional de Educação e Câmara da Educação Básica, que trata da proposta de diretrizes curriculares nacionais para a área profissional de serviços de apoio escolar; e da Resolução 05/2010 do mesmo Conselho, que fixa as diretrizes nacionais para os planos de carreira e remuneração dos funcionários da educação básica pública.

É relevante destacar aqui, que a pesquisa foi realizada por amostragem em oito Escolas Estaduais do Município de Juína/MT, com vistas a aprender as percepções e desafios dos pesquisados e das instituições em que eles atuam. Os dados e informações recorrentes ou não recorrentes, foram analisados e comparados aos dados que estão descritos em documentos oficiais e institucionais inerentes a profissionalização específica, e ao Programa PROFUNCIONÁRIO.

Esses são os critérios de exclusão do pesquisados: não foram pesquisados cursistas que evadiram e que foram considerados reprovados, bem como os que pertenceram a mesma turma de profissionalização, porém são lotados e atuam em Escolas de outro município.

 

Resultados e Discussões

A história dos funcionários não docentes das escolas públicas acompanha a história da educação mundial, sendo que seus elementos foram construídos por mudanças impostas pela sociedade de cada época, e segundo suas necessidades.

Segundo Moll et al. (2010), novas perspectivas são trazidas à profissionalização com publicação do Decreto n. 5.154/2004, que altera o parágrafo 2º do art. 36 e os artigos 39 a 41 da Lei n. 9.394/1996 e regulamenta a educação propedêutica e profissional. Sendo assim, a possibilidade da integração entre tais áreas, sob os pilares da politecnia, trouxe expectativas de rompimento com a histórica separação curricular. Em outras palavras, a novidade introduzida pode e deve permitir a formação de técnicos que, além de suas atribuições laborais específicas, conheçam as bases científicas e históricas que norteiam sua atividade produtiva (MOLL et al., 2010).

No Brasil, a história dos funcionários das escolas públicas, bem como a construção de sua identidade, se iniciou bem antes da LDBEN, Lei n. 9394/1996 ou da Lei n. 12.014/2009 que altera o artigo 61 da LDBEN, de autoria da ex-senadora Fátima Cleide (PT/RO), da LOPEB n. 050/1998 e etc. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), determina que a formação dos profissionais, a que se refere o inciso III do art. 61, será por meio de cursos de conteúdo técnico-pedagógico, em nível médio ou superior, incluindo habilitações tecnológicas (BRASIL, 1996).

Bessa (2016) considera que a carreira profissional, como a que os profissionais não docentes lutam para conquistar, está condicionada por diversos aspectos, que vão das políticas de gestão democrática da educação às condições de trabalho na escola, passando pela regulamentação, pelo financiamento, pela avaliação, pelo plano de cargos e salários e pela oferta de formação.

Segundo evidenciam as autoras Sudbrack e Giehl (2014), nas Políticas Educacionais os novos modos de regulação, com critérios de eficiência, produtividade, excelência e na maioria das vezes guiados por padrões internacionais, têm influência na gestão escolar. Acreditam que a gestão escolar e a concepção democrático-participativa, podem tirar a sociedade brasileira da marginalidade com a forma coletiva de tomada de decisões, na qual cada membro da equipe assume sua parte no trabalho

Evidencia-se que o processo de gestão democrática tem contribuído para que os profissionais não docentes tenham uma maior participação nos processos decisórios nas instituições que atuam. As políticas de educação se concretizam na escola. Para o autor Dermeval Saviani (1994), existe um paradoxo que enreda a escola, no sentido de que a história chega a colocar a educação escolar como forma dominante da educação, e vai além, afirmando que a contradição entre as classes marca a questão educacional e o papel da escola. O autor enfatiza que:

 

[...] as origens da educação são concomitantemente à origem do próprio homem. Essa origem era inicialmente comum, coletiva. A humanidade se divide em classes. A história da escola começa com a divisão dos homens em classes. (SAVIANI, 1994, p. 8).

 

Saviani (1994, p. 10), prossegue:

 

A formação dos trabalhadores se dava com o concomitante exercício das respectivas funções. Mesmo no caso em que se atingiu alto grau de especialização, como no artesanato medieval, o sistema de aprendizado de longa duração exigido ficava a cargo das próprias corporações de ofícios: o aprendiz adquiria o domínio do ofício exercendo-o juntamente com os oficiais, sob a orientação do mestre, por isso mesmo chamado de “mestre-de-ofícios”

 

Seguindo as reflexões do autor, toda essa simplificação do trabalho viria a ser colocada em xeque com a chamada Revolução Industrial, Informática e da Automação, que transferem as funções manuais para as máquinas, inclusive as próprias operações intelectuais. Não obstante, o criador desse processo continua sendo o homem, continua sendo um trabalhador, demonstrando que o trabalho foi e continuará sendo princípio educativo do sistema de ensino em seu conjunto (SAVIANI, 1994).

Tais ocupações profissionais passam a estar presentes na gestão pública. O Brasil, assim como muitos outros países, sofre influências das ações dos organismos internacionais, que vem direcionando as políticas educacionais do Brasil. A reforma do Estado, proposta na década de 1990, vai delinear as políticas educacionais no Brasil, na medida em que propõe a avaliação externa como mecanismo de controle e regulação do Estado. A avaliação, além de induzir políticas públicas, é uma indutora de ações das escolas e dos sistemas de ensino para efetivação da qualidade. Trata-se de um indicador de resultado e não de qualidade, mas é a partir da divulgação dos seus resultados que se pode mover ações para qualificar o ensino (VARGAS, 2015). Para Sudbrack e Giehl (2014), a escola é mediadora e nela transitam políticas educacionais, nacionais, regionais e locais, conforme segue:

 

[...] o ângulo de análise que toma a escola como mediadora reflete que a mesma não é apenas um espaço de reprodução política, nem reflexo de estruturas sociais, mas reveste-se de um aparato de organização social, com envolvimento de pessoas que agem e se organizam. Assim, enquanto mediação, a escola intervém na relação entre meios e fins, que é afinal a tarefa substantiva da administração escolar. A mediação também se revela nos confrontos entre as políticas educacionais nacionais, regionais ou locais e as políticas organizacionais. A instituição escolar supõe mediação analítica na dinâmica das categorias, tal como a organização e organização em ação (SUDBRACK; GIEHL, 2014, p. 54).

 

Para além das qualificações específicas, era necessário preparar mentes, proporcionando ao formado um preparo intelectual específico, que impulsionou o ensino profissionalizante por meio de cursos que deveriam atender as necessidades do mercado e qualificar o processo produtivo, não sendo percebida nas formas de organizações desses cursos, nenhuma preocupação com formação cidadã ou omnilateral dos sujeitos. Sabe-se que a formação omnilateral se preocupa com a formação humana, preparação para o exercício da cidadania e atuação política dos sujeitos, em detrimento ao trabalho alienado, posição apolítica, individualismo, entre outras manifestações, causada pela formação unilateral (SAVIANI, 1994).

O autor Scapini (2014), afirma que os servidores não docentes precisam ser reconhecidos como educadores, pois para o autor a educação passa por todos os espaços escolares e pela relação entre as pessoas. Esses ideais vêm a corroborar com os descritos nas Diretrizes Nacionais para os Planos de Carreira e Remuneração dos Profissionais da Educação Escolar Pública Básica, que defende que o ato de educar não está restrito a produzir e transmitir conhecimentos, mas faz parte do processo civilizatório, pois altera a forma de como os alunos veem o mundo e como compreendem a realidade e a transforma.

O Programa PROFUNCIONÁRIO surgiu da necessidade de profissionalizar os PNDs lotados nas Escola Públicas do país, tendo como objetivo principal a qualificação da prática profissional. O referido programa, oferece um plano pedagógico para cada curso ofertado, bem como, um perfil de saída dos cursistas, sendo relevante pesquisar se esses planos tiveram êxito (MATO GROSSO, 1998). Segundo Bessa (2016), o trabalho dos profissionais não docentes sempre foi tratado como um serviço auxiliar, trata-se de um trabalho marginalizado, pouco valorizado desde de seus primórdios, ou seja:

 

Nunca é demais lembrar que a valorização profissional dos funcionários da educação é um direito que se situa historicamente em um processo de luta, uma vez que, do ponto de vista histórico, a categoria, [...] foi levada à invisibilidade social, à subalternidade política, à marginalização pedagógica, à subvalorizarão profissional e à indefinição funcional. (BESSA, 2016, p. 206).

 

Conforme assegura Bessa (2009), esse Programa não se restringe a propiciar a esses funcionários não docentes a aquisição de competências técnicas específicas, mas também proporcionar a construção e o desenvolvimento de competências em consonância com a parte pedagógica do processo de ensino e aprendizagem, de modo a atuarem como educadores, gestores e como cidadãos na comunidade escolar.

Seguindo uma tendência nacional, foi implementado em Mato Grosso, ao final da década de 1990, o Projeto Piloto Arara Azul, que foi criado tendo como objetivo primordial profissionalizar os profissionais não docentes que compunham o quadro efetivo das escolas públicas municipais e estaduais do Estado de Mato Grosso. Esse projeto profissionalizou uma turma em Juína/MT, com cerca de 20 (vinte) profissionais que atuavam em diferentes espaços das escolas municipais e estaduais (ANDRADE; SANTOS, 2009).

O projeto Arara Azul é considerado o precursor do programa PROFUNCIONÁRIO no país. Em Mato Grosso e em Juína/MT, os cursos profissionalizantes do Programa PROFUNCIONÁRIO, foram ofertados em meados da década de 2010, através da parceria do Governo Federal, Secretaria de Estado de Mato Grosso, por meio do CEFAPRO (Centro de Formação e Atualização dos Profissionais de Educação) e das Prefeituras Municipais da região (ANDRADE; SANTOS, 2009).

Em 2013, inicia-se uma nova parceria, integrando a esse grupo de instituições ofertantes o Instituto Federal de Educação Ciências e Tecnologia de Mato Grosso (IFMT), que assumiu os cursos do Programa como cursos do Ensino Médio subsequentes já ofertados pelo Instituto. A profissionalização em serviço se torna uma grande aliada da Escola, no sentido de melhorar a qualidade do atendimento a comunidade escolar. Não obstante, a formação que era ofertada aos servidores, as Práticas Profissionais Supervisionadas (PPSs) que eram desenvolvidas pelos cursistas no chão das Escolas Públicas, como parte integrante da matriz curricular, efetiva-se como uma espécie de estágio em que se colocava em prática a teoria dos componentes curriculares dos cursos ofertados pelo programa (ANDRADE; SANTOS, 2009).

Conforme Oliveira et al. (2019), os cursos que fazem parte do Programa PROFUNCIONÁRIO, estão distribuídos em quatro dimensões: Alimentação Escolar, Multimeios Didáticos, Secretaria Escolar e Infraestrutura Escolar, em conformidade com o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, fazendo parte do Eixo Tecnológico de Desenvolvimento Educacional e Social, pertencentes à Agenda 21 da Formação Técnica Profissional.

Todos os cursos apresentavam um Projeto Político do Curso (PPC), que era seguido por tutores e coordenadores presencias e a distância do programa. Monlevade (2013) enfatiza que os cursos ofertados pelo Programa PROFUNCIONÁRIO precisam se revestir de melhor qualidade, pois:

 

Sobre a identidade, a carreira e a jornada dos funcionários nos levam a concluir que os quatro cursos do PROFUNCIONÁRIO (aos quais se pretendem adicionar o de técnico em transporte de escolares, o de acompanhamento e orientação escolar e o de desenvolvimento infantil) precisam se revestir da melhor qualidade. (MONLEVADE, 2013, p. 96).

 

Percebe-se acima, que há perspectivas de abertura de novos cursos, sendo eles técnico em transporte escolares (para condutores de transportes escolares), técnico em acompanhamento e orientação escolar, e técnico em desenvolvimento infantil (para auxiliarem de sala dos centros de educação infantis e creches), bem como que há uma preocupação com a qualificação dos cursos, que devem observar a preparação para o exercício da cidadania e para o mundo do trabalho.

A formação ofertada deve descartar uma formação meramente técnica, e deve fornecer ao cursista condições para que esse tenha desenvoltura para resolução de problemas, que saiba agir coletivamente, conviver em grupo e possuir inciativa para intervir no seu ambiente de trabalho e politicamente, capacidade de comunicar-se, como descrito no PPC:

 

[...] o mercado de trabalho também reclama profissionais dinâmicos e atuantes capazes de driblar situações inusitadas, dispensa o profissional meramente técnico e requer profissionais com capacidade de comunicação, trabalho coletivo, capacidade de conviver em grupo, capacidade de iniciativa e intervenção, um profissional que saiba atuar politicamente (MATO GROSSO, 2013, p. 8).

 

Os cursos tinham duas formas de participação dos alunos nas aulas, uma de forma síncrona e outra assíncrona. Além das suas cargas horárias serem distribuídas com o atendimento presencial via plantões com tutores presenciais, ofertava-se também encontros presenciais coletivos realizados quinzenalmente, sendo aproximadamente 80% da carga horária total dos cursos ofertados via plataforma Moodle.

Para compreender como se deu a expansiva aprendizagem e o papel educativo dos servidores nas instituições de ensino, entrevistamos os gestores das escolas estaduais de Juína/MT, nas quais atuam a maioria dos técnicos em secretaria escolar profissionalizados, entre 2012 e 2015, por meio do PROFUNCIONÁRIO. Assim, no Programa PROFUNCIONÁRIO, as competências listadas para a formação do perfil profissional de cada uma das habilitações requerem conhecimentos relativos à escola, o que exige a problematização dela e a reflexão quanto sua função social e papel na comunidade, seu trabalho educativo, sobre a produção de cultura e identidade, o projeto político-pedagógico, entre outros elementos. Desta forma, ao estudar a escola, os temas são perpassados uns pelos outros e exigem conhecimentos técnico-científicos que possam subsidiar a compreensão (BRASIL, 2014).

A autora Vargas (2015), considera que houve uma significativa alteração do papel dos PNDs no interior das escolas, sobretudo sobre sua profissionalidade, conforme segue:

 

A nova importância dada ao papel dos/as trabalhadores/as não docentes, presentes nas instituições de ensino, elevou sua condição anterior, de mero apoio escolar, ao status de profissionais diretamente engajados nas atividades educacionais. [...] além de destacado sentido de categoria profissional própria (VARGAS, 2015, p. 38).

 

Nas respostas dos gestores quanto ao reconhecimento e a valorização desses profissionais, percebe-se que não há unanimidade nas respostas, demostrando, de certo modo, que os gestores reforçam a importância da atuação desse profissional nas instituições de ensino, porém, não vislumbram que os mesmos tenham um grau elevado de reconhecimento e valorização.

Perguntou-se aos gestores se consideram importante a atuação dos técnicos em secretaria escolar lotados na Escola que ele trabalha, a resposta foi unânime, ou seja, 100% (cem por cento) responderam que sim. E se eles conseguiam precisar se os técnicos em secretaria escolar profissionalizados estão atuando conforme a profissionalização específica que receberam, 71% (setenta e um por cento) disseram que “sim”, porém nas justificativas, alguns parecem desconhecer qual era o perfil de saída dessa profissionalização.

Segundo o Projeto Pedagógico do Curso Técnico em Secretaria Escolar (MATO GROSSO, 2013), o TAE profissionalizado deverá desenvolver várias competência e habilidades após a conclusão da sua profissionalização. As funções técnicas foram expressas na maioria das respostas dadas tanto pelos gestores, quanto pelos cursistas, quando foram indagados se tinham conhecimento de quais eram as atribuições inerentes a função de TAES.

Já quanto as demais competências, notamos que os sujeitos recebiam, mediante a participação no curso, um gama de conhecimentos voltados a gestão e administração escolar, formação cidadã e ética, além de conhecimentos sobre gestão democrática, ainda uma série de componentes que os deveriam conduzir ao bom desempenho de suas funções, consideradas tão importantes para obtenção de uma educação omnilateral, que preza pela formação humana e cidadã, conforme já citado nesse trabalho anteriormente. Porém, foram pouco mencionadas pelos respondentes, quando perguntados sobre as atribuições inerentes às funções.

Percebe-se que ao se profissionalizar, todos os TAEs egressos tinham menos de 10 (dez) anos de serviço, já que terminaram a profissionalização em meados de 2013. Todos iniciando sua carreira na educação e com pouca experiência na função. A linha do tempo se situa entre 5 (cinco) e 15 (quinze) anos. Esse fato, de ter pouca experiência na carreira na educação, pode ter contribuído para as respostas positivas quanto as expectativas desses servidores em relação à profissionalização, como registramos a seguir. Quando perguntados se a profissionalização atendeu as expectativas deles, a resposta foi unânime: 100% (cem por cento) deles responderam que atendeu.

Outra questão foi direcionada para as contribuições que a profissionalização representou na vida desses servidores, e mais uma vez a resposta foi unânime: 100% (cem por cento) responderam que mudou algo na sua vida profissional, social e econômica. Novamente, os sujeitos esclarecem que as mudanças foram bem diversificadas, tanto no exercício das funções, quanto socialmente e economicamente.

Sobre as mudanças ocorridas, a maioria dos TAES consideram positiva a profissionalização, perfazendo um percentual de 92% (noventa e dois por cento), justificando que tais mudanças positivas foram percebidas. Quando perguntados se a profissionalização atendeu as expectativas deles, a resposta foi unânime: 100% (cem por cento) deles responderam que atendeu. Quando perguntados se saberiam precisar quais atribuições que são inerentes as suas funções na instituição, 100% (cem por cento) dos entrevistados tem conhecimento sobre suas atribuições. Perguntamos também se estão realizando suas funções conforme profissionalização recebida, cerca de 83% (oitenta e três por cento) dizem que estão realizando. Outra questão é se há influências internas ou externas, que influenciam a atuação dos TAEs, o resultado foi que 92% (noventa e dois por cento) consideram que há influências.

Diante das análises explicitadas até aqui, algumas considerações prévias são necessárias: a profissionalização não proporcionou todo o conhecimento necessário para uma boa atuação profissional, pois essa deve ser refletida também pela prática profissional, por meio do currículo oculto.

 

Conclusões

O Estado Brasileiro e o Estado de Mato Grosso têm atuado, no decorrer dos últimos 20 (vinte) anos, para traçar um perfil e uma identidade profissional aos servidores não docentes que atuam nas escolas públicas brasileiras. Esse fato é percebido por meio de fomentos, de legislações e da implementação de políticas públicas educacionais, como por exemplo, as voltadas às formações iniciais e continuadas, e as profissionalizações.

Nota-se que com a alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), em 2009, houve também uma alteração quanto às perspectivas formativas dos PNDs, já que a Lei n. 12.014/2009 considera como profissionais de Educação os servidores não docentes, mediante a conclusão da habilitação específica. Esse fato tem exigido que muitos funcionários retomem seus estudos. Ao retornarem os estudos, esses profissionais não docentes descobriram que existiam outros sujeitos com a mesma história de vida, ou com histórias semelhantes, e que se podia fazer uma troca de experiências que refletiria na sua prática profissional e social.

Embora alguns documentos e legislações reconhecessem que será necessário repensar o papel do servidor não docente nas instituições, principalmente na sua qualificação para o trabalho, os PNDs devem cumprir critérios para serem considerados profissionais da educação. Mesmo aqueles servidores que já tinham um longo período de atuação na educação com outras formações em nível de ensino médio, e até de nível superior e pós-graduados, somente foram considerados profissionais da educação e educadores, aos olhos da Lei e aos olhos da maioria dos demais profissionais da educação, quando concluíram a chamada profissionalização específica.

Quando se olha para o aspecto social, tratando-se de avanços quanto a visibilidade, o reconhecimento profissional e a abertura para a participação desses sujeitos no processo educativo e quanto a sua definição funcional, não houve os resultados esperados. Quanto à indefinição profissional, podemos dizer que a mesma é utilizada de maneira deliberada, já que não definindo funções e atribuições, pode-se colocar o profissional a desempenhar toda a atividade que aparecer na instituição, contrariando os princípios da profissionalização ofertada, já que esse profissional, durante a formação, recebe conhecimentos que devem habilitá-lo, especificamente, para o exercício de uma determinada função.

A valorização salarial aparece como oportunidade, e não como um direito e/ou um processo inerente à obrigatoriedade da conclusão da profissionalização específica, e também como exigência das legislações existentes. Esse fato de a sociedade e os próprios cursistas egressos não perceberem que a formação e profissionalização é um direito que deve ser fomentado, e não uma oportunidade dada, nos faz perceber que há uma ausência do sentido de cidadania, o que torna mais relevante que esses sujeitos percorram os caminhos da emancipação e da educação omnilateral.

Os gestores reconhecem a importância da atuação dos TAEs profissionalizados nas instituições em que atuam. Em contrapartida, os TAEs profissionalizados reconhecem a importância de atuarem em parceria com os gestores e com seus pares para a mudança da educação. Há uma preocupação por partes dos servidores de que sua atuação no espaço escolar seja correspondente com os preceitos das legislações vigentes; eles valorizam a troca de experiência que obtiveram durante a profissionalização e após a conclusão dela, e também reconhecem que além de serem conduzidos por força da Lei, a profissionalização lhes proporcionou possibilidades e oportunidades, fazendo com que suas expectativas fossem correspondidas.

Com todos os problemas e falhas citados nos documentos oficiais, e pelas argumentações e afirmações de gestores e servidores profissionalizados que participaram da pesquisa, pode-se concluir que a experiência da profissionalização específica no país, Mato Grosso e Juína foi exitosa, na medida que mudou percursos de vida e ampliou o envolvimento profissional dos PNDs. As trajetórias profissionais e pessoais foram alteradas em decorrência da ampliação do nível de conhecimento e pela equiparação salarial, que tem garantido aos profissionalizados um grau de reconhecimento que antes não existia.

Também se pode concluir que as influências internas e externas que foram suscintamente citadas e exemplificadas pelos gestores e egressos, não impediram que as atribuições inerentes às suas funções fossem realizadas a contento. Parece que a Escola como um organismo vivo, adapta-se as situações que são impostas ao seu cotidiano. Deve-se esclarecer que, embora o estudo tenha sido realizado com rigor acadêmico, ainda há muito a ser pesquisado e registrado no que diz respeito a profissionalização em serviço dos PNDs. Esses sujeitos estão presentes entre os profissionais da educação e nas instituições de ensino, porém há poucos registros sobre seus percursos, conquistas, perspectivas e direitos.

Por isso, o estudo precisa ser ampliado, e é necessário dar sequência a pesquisas que pretendam contribuir para a visibilidade e emancipação dos profissionais não docentes que atuam nas instituições de ensino no Brasil. Lembrando que o olhar sobre os PNDs não se esgota nessas páginas do estudo, e que outros olhares podem, e devem, ser lançados sobre esses sujeitos.

São necessários alguns alertas sobre o futuro do Programa PROFUNCIONÁRIO que, infelizmente, segue o exemplo de outras políticas públicas e ações governamentais: atualmente não há indícios de que esse programa tão relevante aos profissionais não docentes tenha continuidade, embora exista uma demanda de profissionais da educação a espera pelo retorno de suas atividades e assim, que possam ter seus direitos de formação, profissionalização, reconhecimento e valorização profissional garantidos. Afinal não estamos tratando de formação continuada e profissionalização em serviço? Será que nos próximos estudos mudaremos nossas temáticas para “formação descontinuada e “desserviços profissionais”? Esperamos definitivamente que não!

Considerados como profissionais de educação, após profissionalizados, os TAEs da secretaria escolar da turma de 2012 a 2015 e as outras que virão, podem e devem contribuir para a mudança dos processos educacionais, colocando em prática sua formação técnico-pedagógica, para que esse sujeito tenha seu reconhecimento e valorização profissional. Espera-se que a relevância de sua atuação no espaço escolar seja reiterada, e que esse servidor público seja considerado verdadeiramente profissional da educação. Esse sim, é sem dúvida um grande avanço.

 

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