ReTER, Santa Maria, v.2, n.2. ISSN:2675-9950 Dossiê Práticas de Ensino Remoto nas Áreas de Educação, Letras e Interdisciplinar

JOGOS DIGITAIS NA ALFABETIZAÇÃO: EMERGÊNCIAS DO ENSINO REMOTO

 

Doris Pires Vargas Bolzan

Professora Titular do Departamento de Metodologia do Ensino da Universidade Federal de Santa Mariadbolzan19@gmail.com

Jordana Rex Braun

Mestre em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria jordanabraun@hotmail.com

Mariana Jardim de Moraes

Acadêmica do curso Pedagogia da Universidade Federal de Santa Mariamarianajmoraes@gmail.com

Marina Ceretta

Acadêmica do curso Pedagogia da Universidade Federal de Santa Mariamarinaceretta@gmail.com

  

Resumo: Este artigo apresenta discussões resultantes do trabalho realizado a partir do projeto de ensino “Cultura escrita: práticas alfabetizadoras na escola”, promovido pelo Grupo de Pesquisa e Formação: Práticas Educativas na Educação Básica e Superior. Teve-se como objetivo desenvolver propostas didático-pedagógicas, de modo a qualificar as práticas de leitura e de escrita na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Considerando o contexto do ensino remoto, o grupo sentiu a necessidade de pensar em propostas que pudessem ser realizadas no ensino remoto, pautando-se no uso das tecnologias digitais disponíveis. Por isso, a pesquisa teve como foco o desenvolvimento de jogos, a fim de possibilitar a utilização dessa ferramenta no contexto educativo. Eles foram utilizados em escolas da rede pública em diferentes municípios. Pautamos nossas reflexões em Bolzan (2007), Bolzan, Santos e Powaczuk (2013), Horn et al. (2014), Kenski (2003) e outros autores que discorrem acerca das práticas lúdicas para a construção da lectoescrita e do uso da tecnologia como ferramenta imprescindível durante o ensino remoto. Também apresentamos relatos das professoras que utilizaram os jogos em seus planejamentos. Evidenciamos que pensar e desenvolver práticas pedagógicas por meio de jogos digitais é fundamental, visto que os alunos têm a oportunidade de brincarem e aprenderem ao mesmo tempo. Além disso, por meio dos jogos, eles têm o contato com diferentes tipos de texto, desenvolvendo a autonomia frente ao uso das tecnologias e tendo a possibilidade de construir conhecimentos de modo significativo e divertido acerca da leitura e da escrita.

Palavras-chave: Jogos digitais; Ensino remoto; Leitura e escrita.

 

DIGITAL GAMES IN THE READING ACQUISITION: EMERGENCIES OF REMOTE TEACHING

 

Abstract: This research paper presents resulting discussions related to the work developed by the teaching project “Written culture: reading acquisition practices in the school”, promoted by the Group of Researches and Formation: Educational Practices in Basic and Higher Education. The objective was to develop didactic-pedagogical proposals in order to qualify reading and writing practices in Early Childhood Education and in the first years of Elementary School. Considering the remote teaching context, the group felt the need to think about proposals that could be developed in the remote teaching scenario, based on the use of digital technologies which were available. Therefore, the focus of this research is to develop digital games in order to enable their use in the educational context. They were used in public schools from different cities of the state of Rio Grande do Sul. We used as basis of our reflections Bolzan (2007), Bolzan, Santos and Powaczuk (2013), Horn et al. (2014), Kenski (2003) and other authors who discuss ludic practices for the construction of reading and writing abilities as well as the use of technology as an essential tool during the remote teaching process. We also presented accounts of the teachers who used the games in their planning.  We showed that to think and to develop pedagogical practices through digital games is essential, since the students have the opportunity to play and learn at the same time. Furthermore, through these games, they have contact with different types of text, developing their autonomy in face of the use of technologies and having the possibility of constructing knowledge in a funny and meaningful way about the reading and writing practices.

Keywords: Digital games; Remote teaching; Reading and writing abilities.

 

Introdução

Este artigo tem o objetivo de refletir acerca das possibilidades de ensino e de aprendizagem da leitura e da escrita em meio ao ensino remoto, instaurado nas escolas de educação básica desde o ano de 2020, em decorrência da pandemia do COVID-19. O trabalho abarca caminhos metodológicos possíveis para se pensar a alfabetização em meio ao uso de tecnologias digitais, que se tornaram latentes e necessárias para que o ensino remoto emergencial pudesse acontecer. Desta forma, este artigo tem o intuito de enfatizar a relevância dos jogos, também digitais, no campo da alfabetização, conectando o desenvolvimento do trabalho pedagógico do professor com as emergências da sociedade em tempos de pandemia e do ensino remoto emergencial. Os jogos foram desenvolvidos com o objetivo de pensar em estratégias capazes de contribuir para o ensino em turmas do ciclo de alfabetização e pré-escola e construir materiais didático-pedagógicos a serem utilizados nesse contexto (BOLZAN, 2021).

Para isso, apresentamos um dos projetos desenvolvidos pelo Grupo de Pesquisa Formação de professores e práticas educativas: educação básica e superior – GPFOPE, entre os anos de 2020 e de 2021. O projeto intitulado “Cultura escrita: práticas alfabetizadoras na escola” em como objetivo desenvolver propostas didático-pedagógicas, de modo a qualificar as práticas de leitura e de escrita na Educação Infantil e nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Aliando ao contexto do ensino remoto, o grupo sentiu a necessidade de pensar em propostas que pudessem ser realizadas no ensino remoto emergencial, pautando-se no uso das tecnologias digitais disponíveis.

Com base em diversas pesquisas que o grupo vem desenvolvendo, enfocamos as práticas alfabetizadoras em Circuitos de Atividades Diversificadas, que consistem em um itinerário de atividades elaboradas para o uso compartilhado entre os alunos nas escolas. Esse conjunto de atividades baseia-se em quatro eixos: escrita espontânea, que permite ao sujeito a experimentação da escrita; consciência fonológica, que possibilita a reflexão sobre as partes sonoras da língua; a produção textual, que desenvolve diferentes discursos da escrita; e usos e funções da escrita, eixo que permite aos sujeitos a reflexão de diferentes formas, gêneros e usos da escrita (BOLZAN, SANTOS E POWACZUK, 2013). De modo colaborativo e compartilhado, em grupos, as crianças têm a possibilidade de transitar entre os jogos de todos os eixos, refletindo sobre a leitura e a escrita de diferentes modos.

Destacamos que, neste texto, buscamos fomentar ideias e reflexões acerca das possibilidades de trabalho com a leitura e a escrita no ensino remoto, enfatizando o uso de jogos a partir dos eixos propostos no Circuito de Atividades Diversificadas. Por meio deles, as crianças têm a possibilidade de [re]significar os usos e as funções da escrita, bem como de construir e de elaborar conhecimentos em diferentes campos de saberes.

Para isso, utilizamos referenciais teóricos que discorrem acerca do trabalho pedagógico organizado a partir de jogos, interligando com a emergência do ensino remoto, o uso de tecnologias digitais, mas focando, principalmente, na aprendizagem da leitura e da escrita por meio de jogos digitais. Podemos destacar alguns autores, tais como: Bolzan (2007), Bolzan, Santos e Powaczuk (2013), Horn et al. (2014) e Kenski, (2003), entre outros estudos e pesquisas que dialogam sobre a temática.

Na sequência, detalharemos o caminho metodológico do trabalho desenvolvido, bem como a construção dos jogos e a relevância disso para os saberes e aprendizagens na área da alfabetização.

 

Metodologia

A idealização e a construção dos jogos digitais foram realizadas pelo GPFOPE[1], no ano de 2020, por meio de encontros síncronos entre os participantes na plataforma Google Meet. O projeto do desenvolvimento de jogos em plataformas digitais surgiu a partir da demanda proveniente do contexto de ensino remoto emergencial nas escolas de educação básica.

Os jogos foram desenvolvidos na ferramenta Google Formulários e tiveram como objetivo priorizar os quatro eixos de jogos desenvolvidos no Circuito de Atividades Diversificadas: usos e funções da leitura e da escrita, consciência fonológica, escrita espontânea e produção textual (BOLZAN, 2007). É importante ressaltarmos que o objetivo dos jogos não é que haja um vencedor e um perdedor, mas que os jogadores possam interagir com plataformas digitais e aprender de modo lúdico sobre a leitura e a escrita. As práticas dos jogos dos circuitos foram repensadas e readequadas ao contexto emergencial. Além disso, foi desenvolvido um jogo que visa retomar e enfatizar os cuidados básicos e essenciais para prevenção da propagação do COVID-19. Os jogos foram pensados na perspectiva de contemplar a multimodalidade, aliando textos escritos e imagens, com o intuito de ilustrar e apresentar diversos modos de leitura, uma vez que as imagens e recursos visuais coloridos e de diferentes formas estão presentes e são latentes na sociedade.

A primeira etapa do cronograma de trabalho dos integrantes do GPFOPE foi uma reunião para discussões acerca dos objetivos de cada jogo, pensados a partir das demandas existentes no trabalho das professoras da educação básica. Com os objetivos definidos, o próximo passo consistiu na elaboração do roteiro do jogo. Este roteiro contém todos os aspectos referentes ao jogo, como os personagens, a sequência de imagens e textos. Após essa etapa, a construção dos personagens foi realizada no aplicativo Bitmoji, que possibilita a criação de uma figura humana com diversas expressões faciais e corporais. Os participantes também selecionaram imagens de fundo para as montagens, que, algumas vezes, eram elaboradas por eles mesmos. Outras imagens foram escolhidas em plataformas que as disponibilizassem livres de direitos autorais na internet.

 O próximo passo consistiu na manipulação da imagem, que compreende a montagem do fundo com os personagens e balões de falas na ferramenta Paint 3D. Depois de elaboradas, as imagens foram organizadas no Formulário do Google, na sequência do roteiro previamente elaborado.

Um aspecto importante levado em consideração na escolha para o Formulário do Google como ferramenta para a criação dos jogos foi a possibilidade de redirecionamento, conforme a alternativa marcada pelo jogador, ou seja, a sessão do jogo para a qual o jogador será direcionado dependerá da resposta enviada. Por exemplo, em um jogo em que existe uma resposta correta e uma resposta incorreta: se o jogador marcou a correta, irá para uma sessão, mas, se marcou a incorreta, vai para outra que contém esclarecimentos sobre o assunto. Outro aspecto importante na escolha da plataforma foi o retorno que ela possibilita em relação à interação dos jogadores, pois o Formulário do Google apresenta gráficos e agrupamento das respostas selecionadas. Além disso, é uma plataforma de fácil acesso, em língua portuguesa, que não exige grande banda de internet para acessar em um celular ou computador. Ainda, é de fácil compreensão para seu uso e a construção dos jogos, podendo ser feitos pelos próprios professores da educação básica, que, muitas vezes, não tem a fluência tecnológica desenvolvida para a programação de jogos.

Na sequência, apresentaremos reflexões teóricas que embasam os jogos desenvolvidos. No entanto, para sustentar este artigo e apresentar a relevância do trabalho com jogos digitais realizado em escolas de educação básica da rede pública dos municípios de Santa Maria/RS e de Teutônia/RS, este estudo também apresenta algumas narrativas das professoras participantes do projeto e que atuam em turmas de alfabetização, nos anos iniciais. As narrativas clarificam a relevância e importância de utilização desse tipo de material para o desenvolvimento e construção da leitura e da escrita em tempos de ensino remoto.

Não serão utilizados os nomes das professoras, por isso, os pseudônimos utilizados são os seguintes: Professora 01, atuante em uma turma de 2º ano, e Professora 02, estagiária em uma turma de 1º ano. Os jogos foram aplicados nos anos de 2020 e de 2021. Para isso, o link de acesso aos jogos foi enviado no planejamento semanal das turmas. Este, que foi enviado pelos grupos de WhatsApp das turmas, continha o hiperlink de acesso. No entanto, visando o fácil acesso, os links dos jogos também foram enviados diretamente nos grupos, podendo ser acessados pelas famílias e pelos estudantes.

 

Caminhos possíveis: pensando os jogos digitais na alfabetização

A pandemia do Coronavírus interviu no funcionamento de diversos setores da sociedade, trazendo desafios de ordem pessoal e profissional para a população mundial, em decorrência da necessidade de distanciamento físico. Diversos segmentos da área econômica, por exemplo, sofreram diretamente o impacto do isolamento social. Para além disso, no campo educacional os impactos foram ainda maiores e mais visíveis a curto prazo. As atividades, no ensino superior, precisaram ser readequadas. O desenvolvimento dos trabalhos realizados na Universidade Federal de Santa Maria/RS, no que tange tanto o ensino quanto a pesquisa e extensão, foi adaptado ao Regime de Exercícios Domiciliares Especiais (REDE), que proporcionou informação, conhecimento e interação na organização do ensino remoto (UFSM, 2020).

Além disso, a educação básica também sofreu as consequências do isolamento social e do ensino remoto, uma vez que as escolas, principalmente as públicas, não estavam - e ainda não estão - preparadas e equipadas para desenvolverem aulas de forma remota. Em Santa Maria/RS e Teutônia/RS, as escolas públicas também tiveram seus trabalhos reorganizados, de modo a atender as características do ensino remoto emergencial. Assim sendo, as interações e os aspectos de construção do conhecimento possibilitados pelo ensino presencial precisaram ser repensados e adaptados aos diferentes contextos e realidades.

Dessa forma, com a impossibilidade do desenvolvimento de aulas presenciais e a emergência do ensino remoto, as tecnologias digitais tornaram-se uma importante ferramenta para os trabalhos dos educadores, desde a educação infantil até o ensino superior. Elas vêm emergindo nas práticas e nas atividades em salas de aulas, nos espaços institucionais e no desenvolvimento do trabalho pedagógico, uma vez que se traduzem em uma exigência cotidiana na era da informação e da comunicação que configura o século XXI.

Além disso, é importante considerar que a Base Nacional Comum Curricular - BNCC, com o objetivo de assegurar o direito de aprendizagem e desenvolvimento a todos os alunos da Educação Básica, propõe que as atividades escolares levem em conta o uso dos multiletramentos (BRASIL, 2017). De acordo com esse documento, os estudantes não devem apenas ser usuários das novas tecnologias, ao que afirma o seguinte:

 

Essa consideração dos novos e multiletramentos; e das práticas da cultura digital no currículo não contribui somente para que uma participação mais efetiva e crítica nas práticas contemporâneas de linguagem por parte dos estudantes possa ter lugar, mas permite também que se possa ter em mente mais do que um 'usuário da língua/das linguagens', na direção do que alguns autores vão denominar de designer: alguém que toma algo que já existe (inclusive textos escritos), mescla, remixa, transforma, redistribui, produzindo novos sentidos, processo que alguns autores associam à criatividade. (BRASIL, 2017, p. 68).

 

No entanto, a utilização das tecnologias digitais ainda é de domínio restrito para uma grande parcela de educadores, que não se sentem preparados para pensar e desenvolver atividades de cunho digital, isto é, propostas pedagógicas nas quais as crianças possam participar e intervir nas ideias e construções. Por mais que atividades desse tipo sejam introduzidas no espaço formativo e de atuação, o excesso de inovações tecnológicas não implica, necessariamente, em um avanço na sua utilização. Sem o devido conhecimento e aprofundamento sobre os suportes digitais que podem ser usados em novas maneiras de aprender, passam a ser manuseados de forma superficial. 

Isso fica evidente na narrativa da professora 01, que menciona o desafio de pensar em jogos digitais levando em consideração os instrumentos tecnológicos. Vejamos:

 

No início, quando surgiu a proposta de pensar em jogos digitais, foi muito desafiador, porque eu nunca tinha pensado em construir um jogo em alguma plataforma digital. Sempre tive o receio de pensar em algo dessa natureza, porque são muitas as possibilidades tecnológicas e não temos o domínio de todas as ferramentas e nem dos melhores elementos para desenvolver um jogo digital. (Professora 01).

 

Dessa forma, não podemos incorrer ao equívoco de acreditar que o simples conhecimento da existência de uma ferramenta tecnológica “já qualifica o professor para a utilização desses suportes de forma pedagogicamente eficiente em atividades educacionais” (KENSKI, 2003, p. 5), uma vez que aprender a utilizar essa ferramenta implica a conscientização da importância e da necessidade desses instrumentos para a qualificação do trabalho pedagógico em um movimento de reconhecer o aprender docente como essencial para o aperfeiçoamento das atividades.

A maneira como usamos os meios digitais, no nosso cotidiano, muda a forma como nos comunicamos. Segundo Rojo e Barbosa (2015), o digital acelera e intensifica o uso de outras linguagens e permite outras maneiras de ler e de produzir. Frente a isso, surgiram diversos questionamentos e dúvidas: como ensinar a ler e a escrever por meio do notebook? Como possibilitar o contato com a cultura escrita para além do digital? Como adequar as práticas de leitura e de escrita para o ensino remoto emergencial? Sendo assim, os jogos apresentaram-se como uma possibilidade de trabalho significativo com as crianças, favorecendo o contato com a tecnologia existente e a necessidade de readequação do trabalho pedagógico a ser proposto.

 

Os jogos nos processos de aprendizagem da leitura e da escrita

A ludicidade é um elemento que sempre perpassou as práticas pedagógicas em diversos níveis de ensino e é de extrema importância no desenvolvimento do trabalho do professor. No entanto, com o ensino sendo mediado pelas tecnologias, surgiu o desafio de como manter o aspecto lúdico no processo de alfabetização mediado pelas tecnologias, uma vez que o contato físico e os trabalhos colaborativos tiveram que ser reorganizados. Com isso, os jogos emergiram como uma possibilidade de também serem adequados, com o objetivo de atender às características do ensino remoto emergencial, sendo pensados e desenvolvidos de modo digital.

É preciso ter clareza que “a contribuição do jogo para a educação ultrapassa o ensino de conteúdos de forma lúdica, sem que os alunos nem percebam que estão aprendendo” (HORN et al., 2014, p. 30). Os jogos têm grande relação com o sistema cognitivo, atingindo a construção de um sistema de representação que pode beneficiar as mais diversas áreas do conhecimento. Isso também acontece no ambiente escolar, quando pensados e desenvolvidos com intencionalidade.

 

O mais prolífico efeito da atividade lúdica é indireto: desenvolve os mecanismos indispensáveis à aprendizagem em geral, inclusive de conteúdos. [...] é mais amplo do que ensinar conteúdos, com a vantagem de oportunizar o desenvolvimento intelectual e afetivo por meio da ação e da imaginação de modo a criticar, selecionar e mesmo construir os próprios conteúdos. (HORN et al., 2014, p. 31).

 

Os jogos pedagógicos podem desencadear processos de aprendizagem em torno de diversos conceitos, como o ensino da leitura e da escrita ou noções matemáticas, por exemplo. Há documentos nos quais a ludicidade é utilizada na construção de saberes e conhecimentos específicos, como forma de sondar, introduzir ou reforçar os conteúdos.

 

Existem inúmeras possibilidades de incorporar a ludicidade na aprendizagem, mas para que uma atividade pedagógica seja lúdica é importante que permita a fruição, a decisão, a escolha, as descobertas, as perguntas e as soluções por parte das crianças e dos adolescentes, do contrário, será compreendida apenas como mais um exercício. (BRASIL, 2017, p. 43).

 

O trabalho com jogos em turmas de alfabetização tem sido discutido em diversos programas de formação de professores, inclusive o Plano Nacional de Alfabetização na Idade Certa - PNAIC, sendo designado como uma ferramenta com um fim didático.

 

Os jogos de alfabetização podem favorecer tanto a compreensão da natureza e do funcionamento do Sistema de Escrita Alfabética quanto a consolidação do processo de alfabetização. No primeiro caso, eles contribuem para que, de maneira lúdica e prazerosa, os alunos compreendam o que a escrita representa – as partes sonoras das palavras – e como ela faz essa representação – por meio da notação das unidades sonoras mínimas da fala, os fonemas. No segundo caso, visam, principalmente, a consolidar o conhecimento das correspondências entre fonemas e grafemas, bem como o desenvolvimento da fluência de leitura e escrita. (BRASIL, 2015, p. 59).

 

Assim, os jogos possuem objetivos e conhecimentos a serem construídos, tendo em vista o público alvo, suas necessidades e contextos sociais. Embora possam ser adaptados, como no caso dos jogos digitais, eles precisam priorizar um ensino significativo aliado às realidades estudantis.

Trabalhar na perspectiva de jogos possibilita um espaço para o confronto de ideias e de hipóteses acerca da lectoescrita. É um momento de desafiar o educando, que tem oportunidades prazerosas e divertidas de compartilhar saberes sobre a leitura e a escrita, e também o educador. Esse último é desafiado a “refletir sobre novas alternativas pedagógicas que venham ao encontro dos interesses e necessidades das crianças” (BOLZAN, 2007, p. 71). A professora 01 enfatiza a importância do lúdico nos processos de construção de conhecimentos, principalmente na alfabetização.

 

Os estudantes são crianças e eles estão atraídos pelo jogo e pela brincadeira. Em tempos de distanciamento social, possibilitar que os jogos façam parte da construção de conhecimentos e ajudem na consolidação da leitura e da escrita é muito importante, porque torna a aprendizagem mais leve e de uma forma divertida. (Professora 01).

 

Dessa forma, com o objetivo de tecermos reflexões acerca das possibilidades de desenvolvimento de estratégias pedagógicas em uma perspectiva integradora e interacionista no âmbito da alfabetização, o GPFOPE desenvolveu os jogos digitais pautados nas experiências com o circuito de atividades diversificadas de leitura e escrita, que “consiste no desenvolvimento de um conjunto de atividades pedagógicas que tem como finalidade explorar as concepções e hipóteses que os aprendizes elaboram a partir de seus conhecimentos prévios” (BOLZAN, SANTOS, POWACZUK, 2013, p. 109).

Adaptados ao ensino remoto, os jogos produzidos levaram em consideração os quatro eixos de atividades de leitura e de escrita, os quais orientam a organização e a realização dos jogos e atividades. São eles: a consciência fonológica, pela qual se entende a capacidade e habilidade de compor e decompor os sons da fala, além de compreender que a linguagem oral é dividida em unidades menores, ou seja, palavras em sílabas e sílabas em fonemas (BASSO, 2007); a escrita espontânea, que apresenta possibilidades de registro das hipóteses acerca da escrita de palavras, frases e textos, pela criança (BOLZAN et. al, 2013); a produção textual, que se refere à escrita organizacional da sequência de acontecimentos e fatos na construção de histórias (BOLZAN et. al, 2013); e os usos e funções da leitura e da escrita, eixo que diz respeito às atividades nas quais as crianças reconhecem as condições sociais de uso da leitura e da escrita e a compreensão acerca das funções dos diferentes portadores de textos (BOLZAN et. al, 2013). No entanto, neste momento, ainda não desenvolvemos um jogo para o eixo da consciência fonológica.

A maioria desses eixos foi problematizada por meio de atividades que colocam as crianças em situações de desafio, objetivando a superação e o avanço de suas hipóteses sobre a leitura e a escrita. Além disso, também foi organizado um jogo que relembra os cuidados básicos para a tentativa de prevenção do COVID-19.

 

Cartas, convites e receitas: reconhecendo os diversos usos e funções da leitura e da escrita

A idealização desse jogo partiu da perspectiva de que o processo de alfabetização precisa ser significativo para o aluno, pois a escrita é um elemento cotidianamente presente na sociedade na qual os sujeitos estão inseridos. Portanto, por meio do jogo que abarca o eixo dos usos e funções da língua, as crianças podem refletir acerca das diferentes formas, gêneros e usos da escrita, implicando a consideração dos suportes, formas de circulação e relações impressas com a escrita em uma sociedade grafocêntrica (BOLZAN e POWACZUK, 2018). Assim, o ensino por meio da contextualização de aspectos reais das vidas das crianças gera melhor compreensão e identificação com o objeto em estudo.

Nesse sentido, o objetivo do jogo construído para o eixo usos e funções da leitura e da escrita é possibilitar a identificação de lugares e objetos nos quais a língua escrita está presente, enfatizando o cotidiano das crianças; e o reconhecimento sobre quais são as funções da língua escrita no dia a dia. A Base Nacional Curricular comum traz como um dos objetivos de aprendizagem para alunos dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental: (EF15LP01) Identificar a função social de textos que circulam em campos da vida social dos quais participam cotidianamente (a casa, a rua, a comunidade, a escola) e nas mídias impressa, de massa e digital, reconhecendo para que foram produzidos, em que meios circulam, quem os produziu e a quem se destinam.

A dinâmica do jogo foi organizada a partir de perguntas com respostas de múltipla escolha, em que a criança tem a possibilidade de marcar a resposta que condiz com a representação do objeto na figura (exemplos: carta, receita, convite, lista, etc.). Por meio disso, a criança reorganiza-se constantemente, reconhecendo-se no processo a partir da análise dos seus saberes sobre a linguagem escrita, confrontando hipóteses e (re)construindo conhecimentos sobre a cultura escrita (BRISCHKE et. al, 2014, p. 3). Nesse sentido, a proposta do jogo é de ser um QUIZ de múltipla escolha, em que o aluno testará suas hipóteses sobre as funções da escrita e, quando a opção escolhida não for a correta, o aluno irá conhecer e aprender mais sobre essa cultura. Desse modo, não há uma intencionalidade de competição, mas o jogo configura-se como uma possibilidade de refletir sobre as concepções acerca da tecnologia, fundando-se em uma ferramenta pedagógica para construção de conhecimentos.

Este jogo tem duas modalidades: uma para crianças iniciantes no processo de alfabetização e outra para crianças com conhecimento um pouco mais avançado sobre a cultura escrita. A versão para iniciantes foca nos usos e funções dos objetos, como a função de um convite, de uma carta e de uma receita, com o intuito de que a criança perceba as suas diferenças e semelhanças. A versão mais avançada, por sua vez, tem como foco os aspectos que constituem o gênero, como as principais características que compõem determinado gênero. Vejamos uma imagem para ilustrar o jogo, apresentada na Figura 01:

Figura 1 - Jogo uso e funções da leitura e da escrita.

Fonte: elaborado pelas autoras com base nos jogos desenvolvidos (2021).

Aqui, apresentamos a narrativa da Professora 02, que manifesta brevemente sua experiência aplicando esse jogo com uma turma de primeiro ano do ensino fundamental, enfatizando a necessidade de se ter um objetivo para determinado jogo, isto é, uma intencionalidade pedagógica:

 

Meu objetivo ao inserir esse jogo em meu planejamento era contextualizar a escrita no cotidiano das crianças, para que compreendessem a importância da escrita na nossa sociedade e, assim, isso servisse como um incentivo para o processo de alfabetização. Me surpreendi com o resultado visto por meio do formulário, pois as crianças apenas não conheciam um dos gêneros citados no jogo. (Professora 02).

 

Com a narrativa da professora 02, podemos evidenciar o quanto o jogo permite-nos reconhecer os conhecimentos prévios das crianças, servindo como subsídio para pensar em outras propostas e desenvolver um conteúdo a partir do que os estudantes já sabem, “propiciando o trânsito nos seus diferentes discursos, de forma a promover a inserção efetiva dos sujeitos na cultura escrita” (BOLZAN; POWACZUK, 2018, p. 11). Logo, cultivar atitudes favoráveis para o ler e o escrever, como os jogos, faz-se fundamental para que as crianças tornem-se usuários efetivos da escrita.

 

A princesa Bia e a mentira que cresceu: a literatura infantil nos jogos

O contato de crianças com a literatura, muitas vezes, acontece exclusivamente por meio da escola. Com a impossibilidade do ensino presencial, fez-se necessário pensar modos de proporcionar diferentes experiências literárias para as crianças, pois é inviável que todos alunos tenham acesso a livros físicos.

Nesse sentido, foi pensado e desenvolvido o jogo intitulado “A princesa Bia e a mentira que cresceu”. Ele foi inspirado no livro que leva o mesmo nome, escrito por Maryann Cocca-Leffler (2009) e idealizado para proporcionar o contato de crianças com a literatura infantil de modo interativo. O diferencial da narrativa deste jogo está no final interativo, em que o jogador, no caso a criança, tem a possibilidade de escolher entre dois desfechos da história. O jogo também foi pensado a partir das seguintes habilidades da BNCC para o Ensino Fundamental Anos Iniciais: “(EF15LP15) Reconhecer que os textos literários fazem parte do mundo do imaginário e apresentam uma dimensão lúdica, de encantamento, valorizando-os, em sua diversidade cultural, como patrimônio artístico da humanidade” e “(EF15LP14) Construir o sentido de histórias em quadrinhos e tirinhas, relacionando imagens e palavras e interpretando recursos gráficos (tipos de balões, de letras, onomatopeias)” (BRASIL, 2017, s/p).

Para a educação infantil, momento no qual as crianças ainda não estão em nível alfabético, há uma versão da história contada por meio de um vídeo, com narração oral do enredo e das falas dos personagens. Uma recorrência das demandas explicitadas pelos adultos responsáveis pelas crianças é a falta de tempo para ler e acompanhar as atividades pedagógicas dos alunos.  Assim, com o vídeo a criança não precisa do auxílio do adulto para conhecer a narrativa.

Este jogo tem outra versão adaptada para estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental. Nessa versão, a história é contada no formato de histórias em quadrinhos e permanece com o final interativo. Ele também pode ser utilizado como ferramenta para o trabalho com a produção textual, pois, após chegar ao fim do jogo, as crianças são orientadas a recontar a história em formato de texto, cumprindo a função do eixo referente à produção textual, com o objetivo de:

 

(EF12LP05) Planejar e produzir, em colaboração com os colegas e com a ajuda do professor, (re)contagens de histórias, poemas e outros textos versificados (letras de canção, quadrinhas, cordel), poemas visuais, tiras e histórias em quadrinhos, dentre outros gêneros do campo artístico-literário, considerando a situação comunicativa e a finalidade do texto. (BRASIL, 2017, s/p).

 

Vejamos, na sequência, duas imagens para ilustrar uma parte do jogo desenvolvido (Figuras 2 e 3).

Figura 2 - Jogo A princesa Bia e a mentira que cresceu: versão Educação Infantil

Fonte: elaborado pelas autoras com base nos jogos desenvolvidos (2021).

Figura 3 - Jogo A princesa Bia e a mentira que cresceu: versão Anos Iniciais

Fonte: elaborado pelas autoras com base nos jogos desenvolvidos (2021).

Assim, esse jogo foi pensado na perspectiva de que a produção de um texto consiste em diferentes formas de se expressar, de organizar uma sequência de ideias ou situações que pode ser escrita e lida pelo outro, tornando-se “um trabalho de reflexão individual e coletiva e não um ato mecânico e reprodutivo” (GERALDI e CITELLI, 1997, p. 43). Por meio dele, a criança tem a oportunidade de produzir um texto a partir do que já sabe, servindo como ponto de partida para que sejam abordados elementos necessários para a construção de um texto, como título, frases e parágrafos.

Nessa perspectiva, a Professora 02 comenta sobre o uso do jogo em seu planejamento:

 

Utilizei o jogo A princesa Bia e a mentira que cresceu para trabalhar a produção textual com crianças do primeiro ano do ensino fundamental. As crianças recém estavam começando a compreender o que constitui um texto, então pedi para que eles recontassem a história, para avaliar se já tinham consciência da estrutura de uma história, que contém um enredo, personagens, acontecimentos [...] os jogos foram importantes para identificar as percepções das crianças sobre a cultura escrita. (Professora 02).

 

Com isso, reconhecemos que a produção textual pode permitir, aos estudantes, a reflexão sobre a estruturação do discurso, de coesão, de argumentação, de organização das ideias e de escolha das palavras, do objetivo e do destinatário do texto (BOLZAN; POWACZUK, 2018, p. 12), mesmo de modo informal. Destacamos que utilizar jogos no eixo da produção textual vai muito além da produção escrita de histórias, também permite a argumentação e construção lógica também de forma oral, desenvolvendo o senso crítico e outras habilidades possíveis por meio do ato da fala.

 

Jogo das frutas: estimulando a escrita espontânea

O jogo das frutas foi desenvolvido para crianças na fase da alfabetização em turmas de anos iniciais. Ele tem o objetivo de auxiliá-las na construção da escrita espontânea, visto que, na estrutura do jogo, as personagens convidam o jogador a identificar qual é a fruta apresentada na imagem. Em um espaço abaixo, o jogador poderá escrever o nome da fruta, a letra inicial ou outras palavras que comecem com a mesma letra da fruta, possibilitando à criança espaço para a experimentação da escrita.

A Base Nacional Curricular Comum traz em suas habilidades a importância do desenvolvimento da habilidade de “(EF01LP02) Escrever, espontaneamente ou por ditado, palavras e frases de forma alfabética – usando letras/grafemas que representem fonemas” (BRASIL, 2017, s/p).

Vejamos uma proposta de jogo sobre esse eixo, apresentada na Figura 4.

Figura 4 - Jogo das frutas

Fonte: elaborado pelas autoras com base nos jogos desenvolvidos (2021).

Em função do período de férias das escolas nas quais os jogos foram aplicados, este jogo, em específico, não foi utilizado nos planejamentos, tendo em vista o pouco tempo disponível até o término do período letivo. No entanto, uma das professoras sentiu a necessidade de utilizar um material semelhante.

 

Durante meu trabalho no ensino remoto emergencial, senti a necessidade de utilizar ferramentas que me permitissem ter conhecimento sobre a escrita espontânea das crianças, pois a turma estava bastante heterogênea no que diz respeito às etapas da alfabetização. [...] Penso que os jogos são importantes, pois sempre são uma maneira mais leve e atrativa para as crianças. (Professora 02).

 

Com isso, como mencionado, estimula-se a escrita espontânea, eixo importante nos processos de consolidação da leitura e da escrita porque permite, segundo Ferreiro (2011, p. 98-99):

 

todas as crianças a liberdade de experimentar os sinais escritos, num ambiente rico em escritas diversas, ou seja: escutar alguém lendo em voz alta e ver os adultos escrevendo; tentar escrever (sem estar necessariamente copiando um modelo); tentar ler utilizando dados contextuais, assim como reconhecendo semelhanças e diferenças nas séries de letras; brincar com a linguagem para descobrir semelhanças e diferenças sonoras.

 

Isso porque a escrita espontânea permite que a criança tenha liberdade para manifestar-se e expressar sentimentos, vontades e desejos por meio da escrita livre. Reiteramos que este tipo de trabalho com a escrita espontânea é necessário e importante em diversos momentos da construção da leitura e da escrita, especialmente no início da alfabetização, mostrando e instigando que ler e escrever vai muito além da codificação e decodificação de sons e letras, pois a criança precisa apropriar-se de um sistema de representação alfabético.

 

Prevenção Coronavírus: jogando e relembrando cuidados essenciais

Pensando no contexto atual que estamos vivendo, a construção de um jogo com cuidados básicos de prevenção ao Coronavírus se fez necessária. O objetivo deste jogo consiste em divulgar informações sobre as medidas preventivas contra a propagação do Coronavírus para a comunidade escolar. Para deixar o jogo de fácil compreensão, selecionamos alguns aliados essenciais na tentativa de combater a propagação do Coronavírus, tais como: uso correto de máscara, uso de álcool gel e lavagem correta das mãos, bem como o distanciamento físico. Esses cuidados foram explorados em cinco questões de múltipla escolha, em que, se a opção escolhida não for a correta, o jogador é informado sobre o modo adequado para agir no combate a propagação do vírus. O jogo tem uma intencionalidade, ou seja, difundir informações importantes aos sujeitos, sendo a ludicidade como estratégia.

O jogo, além dos textos escritos, teve o objetivo de apresentar imagens ilustrativas, a fim de explorar o conteúdo por meio de textos multimodais. As imagens, além de estimularem aspectos audiovisuais, instigam a atenção e o reconhecimento, neste caso, da forma correta de colocar em prática os cuidados básicos contra o COVID-19.  Esse aspecto pode ser observado na narrativa da professora 01, que relata a importância da utilização de recursos para além dos textos escritos, uma vez que a cultura digital instaurada na sociedade apresenta novas maneiras de ler por meio de recursos multimidiáticos. Vejamos a narrativa:

 

é importante, porque as imagens estão cada vez mais presentes na sociedade, tornando a leitura imagética necessária também nas escolas. Isso foi muito importante neste jogo, pois ajudou as crianças que ainda não estavam com a leitura consolidada a nível alfabético a compreender o texto escrito. (Professora 01).

 

Além disso, este jogo proporcionou a aproximação de famílias e de crianças, pois tanto os adultos quanto as crianças tiveram a possibilidade de brincar e de retomar cuidados essenciais de uma forma divertida, superando o caderno de aula e os materiais tradicionais. Sobre essa experiência, a mesma professora menciona que foram muitos os áudios dos alunos comentando sobre o jogo desenvolvido:

 

Foi muito legal, porque recebi áudios dos alunos falando sobre o jogo e comentando que toda a família jogou, principalmente os irmãos ou os amiguinhos com quem passam o tempo enquanto os responsáveis trabalham. Isso mostra que é possível interagir também por meio dos jogos digitais, trocando experiências e ideias sobre um assunto ou conteúdo. (Professora 01).

 

Esse depoimento demonstra o quanto é rico e potencializador pensar os jogos para construir diversos saberes, desafiando as crianças a expressarem suas hipóteses e ideias acerca de determinada área de conhecimento em estudo. Vejamos uma imagem para ilustrar como este jogo foi pensado e organizado (Figura 5):

Figura 5 - Jogo Prevenção Coronavírus

Fonte: elaborado pelas autoras com base nos jogos desenvolvidos (2021).

 

Dimensões Conclusivas

Este trabalho contribui para a reflexão sobre as possibilidades e estratégias de trabalho no contexto do ensino remoto emergencial, no que tange à construção da leitura e da escrita. Tal perspectiva foi organizada a partir da necessidade de (re)pensar as práticas desenvolvidas em sala de aula, adequando-as para o contexto atual. Desse modo, neste artigo, tivemos o objetivo de apresentar os jogos desenvolvidos pelo GPFOPE, no ano de 2020 e 2021, e as reflexões decorrentes das vivências pedagógicas das professoras que usaram as ferramentas didáticas produzidas, a fim de aliar a ludicidade e o ensino por meio das tecnologias, gerando inovações na organização do trabalho pedagógico voltado às crianças em processo de alfabetização.

Assim, evidenciamos que é possível pensar e desenvolver práticas pedagógicas significativas à construção da leitura e da escrita a partir de jogos. No entanto, para além de saber da existência de ferramentas e aparatos tecnológicos, é necessário saber usá-los, a fim de produzir atividades e desenvolver práticas que estabeleçam sentido e tenham objetivos e finalidades pedagógicas. Nesse sentido, o grupo de pesquisa e o projeto de ensino foram de suma relevância, uma vez que possibilitaram encontros de estudo, reflexão e ação para colocar em andamento atividades e propostas compatíveis com os interesses e necessidades dos grupos de crianças.

Destacamos, também, que embora os desafios e  as fragilidades frente ao uso da tecnologia fossem restritos e, muitas vezes, dificultados pelo difícil acesso aos recursos pelas crianças, ou, ainda, por não saberem como como usar elementos e ferramentas digitais, em meio às emergências do ensino remoto e da necessidade do distanciamento social, foi possível construir e colocar em práticas atividades em formatos digitais, que priorizassem e levassem em consideração as realidades e as possibilidades tecnológicas das escolas das redes públicas de ensino.

Contudo, enfatizamos que estas atividades serviram de ponto de partida para organização de outros acervos de atividades, uma vez que ainda estamos trabalhando na direção de construir outras propostas de trabalho capazes de mobilizar o interesse das crianças em aprender por meio de ferramentas digitais. Os jogos desenvolvidos continuarão a ser utilizados e aprimorados pelo grupo, pois é um conjunto de materiais pequeno e em construção, com potencial de continuidade. Inclusive, vale ressaltar a possibilidade de andamento na construção de um jogo para o eixo da consciência fonológica, que não foi construído nesta etapa de trabalho, e de novos/outros/diferentes jogos digitais para todos os eixos, considerando outras realidades educativas e possíveis contextos de aplicação.

Concluímos e reiteramos que problematizar e refletir sobre outras possibilidades didático-pedagógicas é fundamental para construir práticas significativas também no ensino presencial. Além disso, compartilhar as possibilidades é um momento rico para que outros contextos e professores possam inspirar-se, conhecer e buscar desenvolver práticas que envolvam os alunos e permitam o contato com outros modos de aprender e de ensinar. Por isso, o acervo de jogos aqui destacados é disponibilizado não apenas para os integrantes do GPFOPE utilizem-nos, mas para que outros docentes possam incluí-los em seus trabalhos pedagógicos. Além disso, os jogos não são restritos ao ensino remoto emergencial, podendo ser utilizados também no retorno ao ensino presencial, pois são ferramentas lúdicas idealizadas para potencializar o processo de alfabetização, mostrando-se atrativas para as crianças em diversos tempos e espaços de aprendizagem.

Referências

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[1] Colaboraram na confecção dos jogos as orientadoras: Doris Pires Vargas Bolzan e Giliane Bernardi; as bolsistas pelo PROLICEN: Sara Silveira Meus e Zeuta Perfeito Paz Righi; e demais participantes do grupo: Bibiana Passinato Piovesan, Maria Eduarda Xavier de Freitas, Mariana Jardim de Moraes, Marina Ceretta, Daniela Dal Ongaro, Carolina Corrêa Gressler Barbosa, Carla Lopes Markus, Jordana Rex Braun e Lisiane Pappis.