Universidade Federal de Santa Maria
Revista Monografias Ambientais, v.19, e12, 2020
DOI: https://doi.org/10.5902/2236130843592
ISSN: 2236-1308
Recebido: 16/04/2020 Aceito: 06/05/2020 Publicado: 06/05/2020
Problemas ambientais
Incentivos financeiros municipais visando a proteção ambiental: análise da experiência em Ouro Preto, MG
Municipal financial incentives visiting environmental protection: analysis of the experience in Ouro Preto, MG
Amanda Aparecida Gomes I
José Francisco do Prado Filho II
I Graduada em Engenharia Ambiental. Departamento de Engenharia Ambiental, Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: amandaapdgomes@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0570-4042.
II Doutor em Ciências da Engenharia Ambiental. Departamento de Engenharia Ambiental, Universidade de São Paulo. E-mail: jfprado@ufop.edu.br. ORCID: http://orcid.org/0000-0002-1163-5189.
RESUMO
Um importante instrumento de gestão ambiental, na categoria de instrumentos econômicos, se concretiza nos denominados incentivos financeiros municipais. Eles objetivam estimular a população a reduzir o consumo dos recursos naturais e energia, visando minimizar os impactos ambientais locais, concedendo, dentre outros benefícios, descontos no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para proprietários de imóveis que adotam ações de sustentabilidade ambiental. Neste contexto, este estudo avaliou a participação da população no programa “Quem preserva paga menos”, estabelecido pela Lei Complementar Nº 113, de 27 de dezembro de 2011, do município de Ouro Preto – MG. O trabalho avaliou por meio de entrevistas semi-estruturadas o conhecimento de tal incentivo pela população ouropretana. Para tanto, foram aplicados 200 questionários e estudados requerimentos de solicitação para participação no Programa arquivados na Secretaria Municipal de Meio Ambiente da Prefeitura (SEMMA-OP). Os resultados da pesquisa mostraram que, apesar do programa já ter mais de sete anos de funcionamento, cerca de 69% dos entrevistados não conhecem esse tipo de incentivo financeiro-ambiental local, enquanto que, da parcela que conhece o instrumento (31%), apenas 27% participam. Os dados revelam falta de conhecimento do programa principalmente devido as fragilidades de divulgação do mesmo no âmbito da população de Ouro Preto.
Palavras-chave: Gestão ambiental; Incentivo financeiro ambiental; Instrumento de gestão ambiental.
ABSTRACT
An important instrument of environmental management in the category of economic instruments is embodied in the so called municipal financial incentives. They aim to stimulate the population to reduce the consumption of natural resources and energy, aiming to minimize local environmental impacts, granting, among other benefits, discounts on the Urban Property Tax (IPTU) for property owners who adopt sustainability actions. environmental. In this context, this study evaluated the participation of the population in the program “Quem Preserva Paga Menos”, established by Complementary Law Nº 113, 27 of December, 2011 in the municipality of Ouro Preto - MG. The work consisted in evaluating through semi-structured interviews the knowledge of such economic-environmental incentive by the Ouropretana population and the participation of local property owners in the interest and use of the municipal environmental incentive. To this end, 200 questionnaires were applied and applications for participation in the Program filed with the Municipal Secretariat of Environment of the Ouro Preto City. (SEMMA-OP) were studied. The survey results showed that although the program has been in operation for more than seven years, about 69% of respondents do not know this type of local financial-environmental incentive, while of the portion that knows the instrument (31%), only 27% participate in the program, seeking to achieve discounts on property tax by adopting sustainable measures involving rainwater harvesting, solar heating systems and photovoltaic power generation and participation in the selective collection of domestic solid waste. The data reveal lack of knowledge of the program because there are mainly weaknesses regarding its dissemination within the population of Ouro Preto.
Keywords: Environmental management; Environmental financial incentive; Environmental management tool.
1 INTRODUÇÃO
A gestão ambiental consiste, entre outras, na definição de diretrizes e atividades administrativas e operacionais, tais como planejamento, direção, controle e alocação de recursos, realizadas com o objetivo de obter efeitos positivos sobre o meio ambiente, quer reduzindo ou eliminando os danos ou problemas causados pelas ações humanas, quer evitando que eles surjam (BARBIERI, 2007). Trata-se de um termo de uso corrente com significado amplo, objetivando num extenso leque de ações, seja na prevenção de problemas ou impactos ambientais, na recuperação e reabilitação de ambientes degradados, na remediação de contaminantes ambientais diversos e na definição de mecanismos para minimizar impactos no meio ambiente, visando a sustentabilidade ambiental.
Para atingir os objetivos de uma determinada política pública utilizam-se recursos práticos ou normas que são denominados instrumentos de gestão. Esses instrumentos são os meios utilizados para atingir os objetivos propostos pela gestão ambiental e podem ser classificados em instrumentos de comando e controle, os econômicos e os da categoria diversos.
Os instrumentos de gestão ambiental denominados de comando e controle (CC) são aqueles utilizados como forma de garantir, por meio de leis, a preservação ambiental e minimizar os impactos causados por diversas atividades. Nessa modalidade, o poder público atua por meio do estabelecimento de regulamentações, na definição de padrões de qualidade ambiental e em restrições ambientais diversas, e na aplicação de penalidades pelo não cumprimento de legislações e das normas ambientais existentes. Devido a essas características, este tipo de instrumento também pode ser denominado de regulatório. Os instrumentos de CC mais usuais são os estudos de impactos ambientais (EIA), o licenciamento, o zoneamento ambiental/ecológico, os padrões de emissão ou lançamento, a compensação ambiental, os padrões de qualidade ambiental, a recuperação ambiental dentre outros.
Os instrumentos de gestão ambiental da categoria diversos abrangem os instrumentos de persuasão, que são certos incentivos que levam as pessoas e as empresas a adotarem medidas ou iniciativas para proteger o meio ambiente ou inibir em determinado grau a degradação ambiental. A difusão de informações de cunho ambiental para as diferentes camadas sociais e a educação ambiental também são exemplos desta categoria de instrumento.
Já os instrumentos econômicos de gestão ambiental (IEs) são aqueles baseados na valoração ou precificação dos recursos da natureza, podendo ter o controle de uso pelo mercado. Aliados ao princípio poluidor-pagador, também dessa categoria, eles desempenham papel importante nas políticas públicas ambientais. Estes instrumentos influenciam na conduta das organizações e no comportamento dos cidadãos, visto que concilia o valor ambiental dos recursos ao processo de produção, estabelecendo custos para a utilização de recursos naturais e/ou incentivando as pessoas e as organizações a preservá-los. Existem alguns grupos que compõem os IEs sendo eles: o sistema de cobrança (impostos, multas e taxas ambientais), subsídios, seguros ambientais, licenças negociáveis, depósitos reembolsáveis e pagamentos por serviços ambientais diversos.
Levando em consideração a gestão ambiental no nível municipal é necessário, segundo Leme (2016), existir estrutura administrativa, pessoal, espaço de negociação política (conselho ambiental), programas e ações de proteção ambiental, articulação institucional, legislação específica e, sobretudo, recursos financeiros para as diferentes iniciativas e necessidades específicas.
Um exemplo de instrumentos legais municipais de gestão, consiste na existência dos incentivos financeiros para a proteção ambiental que serão o foco principal desse estudo. Tais instrumentos visam a redução da degradação ambiental como estímulo ao contribuinte a participar e colaborar nesse viés. Segundo Pereira (s d), “as isenções fiscais (lê-se também tributárias) eximem o possível contribuinte de recolher aos cofres públicos determinada quantia prevista em lei, conforme base de cálculo e alíquota, tendo necessidade de norma vigente e vigorante, para que seja aplicada no ordenamento jurídico”.
Esses tipos de incentivos municipais de proteção e conservação ambiental recebem várias nomeações nos municípios brasileiros, tais como: IPTU ecológico (Betim, MG), Município Verde Azul (Estado de SP), IPTU verde (São Carlos, SP), Pagamento por serviços ambientais (Campinas, SP), Quem preserva paga menos (Ouro Preto, MG), dentre inúmeros outros.
O benefício fiscal em questão consiste em uma iniciativa pública municipal que estimula os proprietários de imóveis (pessoas físicas ou jurídicas) a investirem em ações e práticas ambientalmente sustentáveis nas suas residências, construções ou comércio. Essas medidas abrangem diversidade de iniciativas, tais como a instalação de sistemas de captação de água de chuva, captação de energia solar para aquecimento da água e para a geração de energia elétrica, manutenção de cobertura vegetal e destinação de áreas plantadas com frutíferas no terreno urbano, existência de áreas permeáveis na propriedade da cidade, plantio de árvores nas residências e nas calçadas, participação em programas ambientais locais, etc. Como forma incentivadora ou compensatória àquele que contribui com essas práticas normalmente são concedidos descontos variáveis e importantes no valor anual do Imposto Predial e Território Urbano (IPTU).
A criação de instrumentos e desenvolvimento de políticas de incentivos fiscais para ações sustentáveis têm possibilidades de crescimento no Brasil. A Alemanha, por exemplo, remunera o excedente de energia produzida nas residências por placas fotovoltaicas. Essa e outras ações promovidas pelo governo alemão elevaram a participação de fontes renováveis na matriz de energia do país de 3,1%, em 1991, para 16,1% em 2009, com estimativa de alcançar 47% em 2020 (AECweb, 2019).
Vários municípios brasileiros, principalmente a partir dos anos 2000, vêm adotando esses incentivos de forma a melhorar a qualidade de vida da população, o desenvolvimento econômico e ambiental e a preservação do meio ambiente urbano e daquele que oferece o benefício. A redução dos impactos ambientais relacionados ao consumo de matéria e energia e a redução da geração de resíduos também fazem parte do conjunto de benefícios obtidos por tais iniciativas.
Em Vila Velha (ES), por exemplo, a lei que apresenta o incentivo municipal entrou em vigor em 2009. A legislação aborda que os proprietários de imóveis localizados na zona urbana poderão obter uma redução de até 50% no valor do imposto se requerido, e atendidos cumulativamente certos requisitos. Para os proprietários que cuidarem adequadamente das calçadas ou construírem as mesmas adotando o projeto padrão “Calçada cidadã” do município, o desconto concedido é de 10%. O mesmo desconto é oferecido para aqueles que possuírem ou plantarem uma árvore com altura mínima de 1,50m em frente a seus imóveis. Para os proprietários que possuírem duas árvores com altura mínima de 1,50m o desconto é de 12% e se o número de árvores for três a redução é de 18%. Um grande problema da legislação ambiental em Vila Velha, refere-se ao “IPTU Verde” ser aplicado somente a propriedades territoriais, ou seja, as propriedades que possuem edificações não são contempladas com o desconto (GOMES, 2018).
De um modo geral, o “IPTU Verde” é definido por leis municipais que concedem descontos sobre o valor do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para incorporadoras e proprietários que adotam medidas sustentáveis em seus imóveis e os descontos variam de 0,3%, em São Vicente (SP), até 100% em Curitiba (PR). São 22 os municípios pelo país que já promulgaram o IPTU Verde, entre eles estão as capitais Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), Manaus (AM), Goiânia (GO) e Florianópolis (SC). Em São Paulo, a prefeitura apresentou, em outubro de 2015, projeto de lei para criação do IPTU Verde que concederá desconto de 4%, 8% ou 12%, conforme o nível de certificação ambiental obtido por edificações novas ou já existentes (AECweb, 2019).
Outro município que se destaca pela aplicação do incentivo ambiental é Caraguatatuba (SP). Previsto na Lei Complementar Municipal nº 48, de 10 de setembro de 2013, o incentivo possibilita uma isenção de 100% no IPTU em terrenos com restrições ambientais que impeçam o direito de construir, ou seja, àqueles que incluem Área de Preservação Permanente (APP), Reserva Legal e Unidades de Conservação. Além disso, o município possui amplas campanhas de divulgação dos benefícios que o incentivo fiscal apresenta. Devido a isso o número de aderentes tem elevado expressivamente com o passar dos anos (GOMES, 2018).
Um interessante incentivo municipal foi constatado em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (MG). Desde 1982, a prefeitura possibilita descontos no Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) para pessoas que tiverem pés de jabuticaba em seu imóvel comercial ou residencial. Para adquirir o desconto é necessário que o caule do pé de jabuticaba possua no mínimo cinco centímetros de diâmetro. O abatimento é de 5% por cada pé e cada pessoa pode apresentar no máximo cinco pés. Com isso, o desconto mínimo é de 5% e o máximo, de 25%. O contribuinte que quiser obter o desconto deve solicitar à prefeitura e, então, é verificada a quantidade de pés de jabuticabas existentes no imóvel. A aplicação do incentivo no município é de fundamental importância para o mesmo visto que a cidade tem por tradição realizar o Festival da Jabuticaba, há 31 anos. No festival, produtores vendem a fruta in natura e produtos derivados, como licor, vinho, geleia e molhos, além de pratos que têm a jabuticaba como ingrediente (GOMES, 2018).
Infelizmente ainda são muito poucos os trabalhos publicados no Brasil nessa direção e considera-se que a falta de divulgação dos incentivos existentes impede um maior oferecimento dessas oportunidades sustentáveis e uma maior aderência da população nas práticas ambientais. Além disso, pode-se verificar que apenas em Betim (MG) e em Belo Horizonte o incentivo ambiental explorado é semelhante ao que se encontra em vigor em Ouro Preto (MG), com a ressalva que em Belo Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, o Projeto de Lei 179/ 2017 ainda está em apreciação em plenário da câmara municipal (CÂMARA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE, 2019).
Sendo assim, o presente estudo visou analisar a eficácia e a participação no programa "Quem preserva paga menos", conforme definido pela Lei Complementar Nº 113, de 27 de dezembro de 2011, do município de Ouro Preto- MG, através da verificação do conhecimento e participação dos proprietários de imóveis urbanos ouro-pretanos ao Programa. Segundo define a Lei Municipal, o mesmo possibilita descontos no IPTU para os proprietários que possuem sistema de captação de energia solar (5%), sistema de captação de água de chuva (5%) e participantes da coleta seletiva (10%), sendo os descontos cumulativos.
2 Metodologia
2.1 Área de estudo - alguns aspectos de Ouro Preto
2.2.1 Breve histórico
A origem de Ouro Preto está no arraial do Padre Faria, fundado pelo bandeirante Antônio Dias de Oliveira, pelo Padre João de Faria Fialho e pelo Coronel Tomás Lopes de Camargo e um irmão, por volta de 1698. Segundo Ouro Preto (2019), a partir da junção desses vários arraiais, além de tornar-se sede do conselho, foi elevada à categoria de vila em 1711, com o nome de Vila Rica, que em 1720 foi escolhida capital da nova capitania de Minas Gerais. Após a proclamação da Independência do Brasil Vila Rica recebeu o título de Imperial Cidade, conferido por D. Pedro I do Brasil, tornando-se oficialmente capital da então província das Minas Gerais e passando a ser designada como Imperial Cidade de Ouro Preto.
A Imperial Cidade de Ouro Preto foi sede do movimento revolucionário conhecido como Inconfidência Mineira sendo a capital da província e mais tarde do Estado, até 1897. A antiga capital de Minas conservou grande parte de seus monumentos coloniais e em 1933 foi elevada a Patrimônio Nacional, sendo, cinco anos depois, tombada pela instituição que hoje é o Instituto do Patrimônio Histórico e Natural (IPHAN). Em 5 de setembro de 1980, na quarta sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da UNESCO, realizada em Paris, Ouro Preto foi declarada pela United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) como Patrimônio Cultural da Humanidade. Nenhum outro município brasileiro acumulou tantos fatos históricos relevantes à construção da memória nacional (OURO PRETO, 2019).
Destacam-se, como marcos importantes da história brasileira (última década do século XVII e princípio do XVIII)
- Apogeu das explorações paulistas, sendo descoberto o chamado ouro preto';
- 1708 - Guerra dos Emboabas; os atritos entre paulistas e 'forasteiros' atinge o ponto alto no distrito de Cachoeira do Campo;
- 1720 - Revolta liderada por Filipe dos Santos; motins contra o Quinto da Coroa Portuguesa;
- 1789 - Inconfidência Mineira; confabulação entre determinados segmentos da sociedade mineradora de então para tornar Minas livre do jugo português (OURO PRETO, 2019).
Em 1897 Ouro Preto perde o status de capital mineira, especialmente por não apresentar alternativas viáveis ao desenvolvimento físico e urbano, sendo a sede transferida para o antigo Curral Del’Rey (onde uma nova cidade, Belo Horizonte, planejada e espaçosa, estava sendo construída). A Figura 1 apresenta uma vista da cidade de Ouro Preto, Minas Gerais.
Figura 1 – Vista geral de Ouro Preto
Fonte: PIMENTEL, 2019.
2.2.2 Localização
Ouro Preto, com altitude média de 1150 metros, é o município brasileiro localizado no Estado de Minas Gerais, região sudeste do Brasil. Situa-se na Serra do Espinhaço, Zona Metalúrgica de Minas Gerais (região denominada Quadrilátero Ferrífero) estando o município situado na latitude sul 20º 23’ 28” e longitude oeste 43º 30’ 20”.
De acordo com a divisão regional vigente pelo IBGE, o município pertence às Regiões Geográficas Intermediária de Belo Horizonte e Imediata de Santa Bárbara-Ouro Preto. Em 2018, a área de unidade territorial do município era de 1.245,865 km² (IBGE, 2018).
Na Figura 2 a seguir está apresentado a localização de Ouro Preto no contexto geográfico de Minas Gerais, sobretudo em relação a capital de Belo Horizonte.
Figura 2 – Localização de Ouro Preto em Minas Gerais
Fonte: TEIXEIRA, 2017.
2.2.3 População, economia e meio ambiente
O município de Ouro Preto-MG está localizado na região central do estado de Minas Gerais, cerca de 90 km da capital Belo Horizonte, na serra do Espinhaço, considerada a zona metalúrgica de Minas Gerais. De acordo com o IBGE (2018), a população do município é estimada em 74.659 pessoas, e a densidade demográfica em 56,41 hab/km2.
As principais atividades econômicas do município estão voltadas na atualidade às indústrias de explotação e transformação de minerais como ferro, bauxita e manganês, ao turismo e sendo outra fonte importante de recursos os oriundos do orçamento da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), do Instituto Federal de Minas Gerais (IFMG) e da população estudantil universitária (com mais de 12.000 estudantes) que contribuem significativamente para a o desenvolvimento da economia local.
Conhecida mundialmente por ser Patrimônio da Humanidade da UNESCO e por possuir belíssimo conjunto arquitetônico barroco, Ouro Preto é, também, depositário de um importante patrimônio ecológico natural de rara beleza cênica, além abrigar as nascentes de rios de duas importantes bacias hidrográficas, a do Rio Doce e a do São Francisco (IGA, 1995). O seu ponto mais alto está situado na Serra do Itacolomi (a 1710 metros de altitude), e a fisionomia da região é caracterizada como uma área de transição entre os domínios de dois importantes biomas brasileiros: a Mata Atlântica e o Cerrado.
Segundo SOBREIRA e FONSECA (2001), a área urbana da sede apresenta problemas ambientais, relacionados ao meio físico, ligados à ocupação de antigas minerações auríferas. Esses problemas advêm da utilização do terreno de forma inadequada e manifesta-se através da implantação de cortes e taludes ousados, do despejo clandestino de material mobilizado, da interrupção de linhas de drenagem e da remoção e queima da vegetação natural, dentre outros.
Aliado a isso, ocorre a ocupação de terrenos declivosos, das linhas de drenagem e de estabilidade duvidosa. Também podem se destacar os problemas relacionados à geodinâmica superficial, como é o caso dos processos erosivos (naturais ou desencadeados pela ação humana), que encontram nos terrenos da cidade um ambiente propício para a sua atuação, devido às características morfológicas e geotécnicas desfavoráveis e que muitas vezes acabam por inviabilizar ou colocar em risco as áreas em seu entorno.
Em termos de saneamento ambiental, o município é pioneiro e foi contemplado no final do século XIX (1890) com a construção e operação de uma das primeiras estações de tratamento de esgoto (ETE) do País, e a primeira de Minas Gerais. Todo o esgotamento sanitário da sede municipal era conduzido por gravidade por grandes tubulações de ferro para os Tanques de Desinfecção na Barra construídos com materiais importados da Europa, vindos de trem do Rio de Janeiro (FONSECA e PRADO FILHO, 2010). Infelizmente as modernas estruturas da ETE da época foram se deteriorando ao longo do tempo e o baixo investimento em saneamento que se concretizou no município nas últimas décadas, chegando em 2018 à situação de que o praticamente todo o esgoto sanitário é despejado “in natura” nos corpos d´água locais, com exceção o esgoto do distrito de São Bartolomeu, que contabiliza apenas 0,4% de esgoto tratado em Ouro Preto, segundo o Plano Municipal de Saneamento Básico de 2013 (PMSB, 2013).
2.2.4 Levantamento de informações a respeito do incentivo
Para a realização deste trabalho, inicialmente foi necessário identificar na administração municipal de Ouro Preto (MG) a disponibilidade de informações e ter acesso aos dados a respeito do uso do incentivo ambiental existente no município definido pela Lei Complementar Nº 113, de 27 de dezembro de 2011. No município de Ouro Preto, os interessados em usufruir do benefício concedido pelo programa 'Quem preserva paga menos', precisam preencher anualmente um requerimento solicitando os descontos no IPTU e comprovar por meio de fotos anexadas ao requerimento as informações exigidas conforme a lei.
O controle desta documentação é feito pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SEMMA) e a Secretaria Municipal de Fazenda (SMF). Após conhecer a sistemática de funcionamento da implantação do incentivo, a SEMMA disponibilizou os dados arquivados a partir do ano de 2013, pois em 2012 o controle do número de beneficiados era feito apenas acondicionando os requerimentos em arquivos físicos e estes acabaram por se perder nas mudanças realizadas na secretaria. Posteriormente, os dados disponíveis foram analisados como forma de realizar o levantamento do número de imóveis/usuários participantes do programa por ano e qual era a ação utilizada.
Como forma de complementação do presente estudo, foi aplicado um questionário junto à população da sede do município de Ouro Preto (proprietários de imóveis) com a finalidade de avaliar a participação e aceitação ao programa pela comunidade local e verificar quais são os principais empecilhos e eventuais dificuldades que impedem as pessoas a não aderirem a este incentivo ambiental.
Para o cálculo do número de amostras necessárias para a aplicação dos questionários, utilizou-se a metodologia proposta por Gil (2006), a qual pode ser aplicada em populações estatisticamente finitas, ou seja, inferior a 100.000 habitantes. Os cálculos indicaram que deveriam ser aplicados 200 questionários para um nível de 95,5% de confiança. A equação pode ser verificada em (1).
(1)
Sendo:
𝜎2: o nível de confiança escolhido expresso em números de desvio padrão
p: porcentagem com que o fenômeno se verifica
q: complemento
N: tamanho da população
e: erro máximo permitido
A pesquisa, como dito, foi conduzida na sede do município de Ouro Preto e a distribuição dos questionários para serem respondidos foi realizada de acordo com os setores censitários do IBGE que em Ouro Preto somam 69, sendo 63 urbanos. A escolha dos setores onde foram aplicados os questionários se deu por sorteio sistemático com início aleatório, totalizando-se dez setores (0001, 0008, 0015, 0022, 0029, 0036, 0043, 0050, 0057 e 0065) contemplando os bairros Bauxita, Centro, Lajes, Morro São Sebastião, Barra, Lagoa e São Cristóvão. Já a seleção das residências em que seriam aplicados o instrumento de coleta de informações, fez-se optando aleatoriamente pela seleção de uma casa e saltando-se quatro, para que todo o setor censitário sorteado fosse plenamente contemplado. A abordagem para apresentação da pesquisa e a entrevista foram feitas como o proprietário de cada imóvel. Como forma de exemplificação as Figuras 3 e 4 apresentam a descrição de um dos setores selecionados e o mapa do mesmo, respetivamente.
O uso do Programa Excel permitiu a elaboração de tabelas e gráficos utilizados na disposição dos resultados obtidos.
Figura 3 – Descrição do setor censitário 0029 localizado no Bairro Bauxita
Fonte: IBGE, 2010.
Figura 4 – Mapa do setor censitário 0029 localizado no Bairro Bauxita
Fonte: IBGE, 2010.
3 Resultados
3.1 Análise dos requerimentos da SEMMA-OP
A partir da Tabela 1 é possível identificar o quantitativo de usuários de cada modalidade de ação sustentável participante no programa “Quem preserva paga menos” de Ouro Preto, MG. Por meio dos dados, constata-se que o número total de beneficiados com o desconto no IPTU aumentou ao longo dos sete anos de existência do Programa, passando de 52 em 2013 para 182 em 2018, ou seja, um aumento de 350%. Em contrapartida, denota-se que o número de participantes é considerado muito baixo, visto que Ouro Preto possui cadastrado 17.753 domicílios urbanos e 2.578 rurais, de acordo com o Censo Demográfico do IBGE em 2010.
Dos dados é possível constatar que o tipo de ação sustentável que mais possui cadastros é o uso de sistemas de aquecimento solar de água, seguido pela coleta seletiva de resíduos sólidos recicláveis sendo que bem abaixo desses dois vem o uso de sistemas de implantação de captação de água de chuva.
Tabela 1 – Beneficiados pelo programa “Quem preserva paga menos” em Ouro Preto MG entre 2012 e setembro de 2018
Tipo de ação Sustentável |
2012 |
2013 |
2014 |
2015 |
2016 |
2017 |
2018 setembro |
Coleta Seletiva de Resíduos |
- |
47 |
65 |
37 |
65 |
16 |
119 |
Sistema de Captação de Água de Chuva |
- |
2 |
3 |
3 |
5 |
0 |
5 |
Sistema de Aquecimento Solar |
- |
16 |
28 |
30 |
43 |
61 |
141 |
Total de beneficiados |
- |
52 |
80 |
59 |
75 |
74 |
182 |
Fonte: GOMES, 2018.
Ao longo dos anos estudados não se percebeu uma tendência lógica no número de proprietários que buscaram os incentivos previstos em lei, observando altos e baixos nos casos de adoção das ações sustentáveis pela população de Ouro Preto, mas pode se dizer que entre 2014 e 2015 houve uma redução significativa no número de beneficiados na participação na coleta seletiva de resíduos. Essa variabilidade nos números está provavelmente associada à necessidade da renovação anual para participação do benefício, pois muitos dos participantes do Programa, por ser ainda ser considerado novidade em Ouro Preto, não tinham o conhecimento de que seria necessário renovar anualmente o requerimento para continuar participando no Programa, e continuar a obter os chamados incentivos ambientais. Vale lembrar também que o valor de descontos no IPTU para adoção de medidas ambientais, com exceção da participação na coleta seletiva de resíduos, exige investimentos consideráveis por parte dos proprietários o que acaba por inviabilizar a participação de um número maior deles no Programa.
Para a AWCweb (2019), se os valores do incentivo não forem maiores do que os custos de implantação, poucos cidadãos, condomínios e incorporadoras buscarão acessar essas vantagens, tornando a lei que define os descontos no IPTU letra morta, falhando, portanto, na capacidade de alcançar os objetivos desejados. Neste ponto entra uma questão importante que é a dificuldade dos municípios em abrir mão de parte da arrecadação do IPTU sem haver um fundo específico (fundo municipal de meio ambiente - FMMA) para compensar as perdas de arrecadação e incentivar a adoção de ações ambientalmente sustentáveis. Em Ouro Preto não há lei ou regramento que estabelece o FMMA.
Os fundos ambientais municipais geralmente são criados por leis que visam dar suporte financeiro à implantação da política ambiental municipal e às ações e programas de desenvolvimento sustentável locais tendo como fonte de recursos inúmeras possibilidades, tais como: doações específicas, repasses, taxas e cobranças ambientais, arrecadações de multas por atos lesivos ao meio ambiente em âmbito local, custos de análise e de licenças ambientais, compensações financeiras ambientais, dotação orçamentária municipal específica, repasses do ICMS ecológico ou ambiental, subvenções da união e do estado, parte dos royalties da mineração (MMA, 2006. IBGE, 2018). Segundo o IBGE (2018), em 2017, 2 803 (50,3%) municípios do País tinham FMMA, sendo maior a presença nas Regiões Centro-Oeste (72,4% dos municípios da região), e Sul (65,3%) vindo a seguir a Norte (59,8%); e menor nas Regiões Sudeste (49,4%) e Nordeste (33,1%). Os fundos estão presentes na maioria dos municípios com mais de 20 000 habitantes (71,4%), chegando a atingir 100,0% nos municípios com mais de 500 000 habitantes.
Entre os anos de 2016 e 2017 também houve importante redução de participantes na coleta seletiva de resíduos. Especula-se que nesse período, como houve mudança de governo, devido às eleições municipais para prefeito e vereadores, essa situação pode ter influenciado na redução de alguns participantes em ações ambientais, visto que em início de mandato sempre faz gerar uma instabilidade política com reflexos nas diferentes ações administrativas, principalmente, no que tange aos programas e incentivos municipais gestados na administração municipal anterior. Um outro fator que também deve ser considerado refere-se à crise financeira constatada nos últimos anos em que as prefeituras mineiras passaram por cortes em grande parte de seus projetos e ações, minimizando e desincentivando a divulgação e, por conseguinte, a concretização de ações de cunho ambiental. Em Ouro Preto, após o acidente com a barragem da Samarco, em Mariana, houve queda expressiva na arrecadação de impostos e royaties da mineração de ferro já que parte das jazidas da Samarco situam-se no município de Ouro Preto.
Por outro lado, em 2018, de maneira inexplicável, constata-se uma forte retomada por parte dos munícipes ouro-pretanos na busca dos incentivos oferecidos pela lei nos três tipos de iniciativas sustentáveis possíveis, sendo a adoção de sistemas de aquecimento solar o que se destaca. Isso se deve, provavelmente, à popularização e ao percebido atual barateamento dos custos de implantação e manutenção desses sistemas e ao alto custo da energia elétrica domiciliar, que é resultado das novas e recentes políticas de preço da energia por parte da Agência Nacional de Energia Elétrica. Em segundo lugar está a participação na coleta seletiva e em terceiro os investimentos em sistema de captação de água de chuva. Sobre esses resultados, é possível argumentar que a coleta seletiva de resíduos sólidos, por não estar implantada em toda a cidade, impede que número maior de munícipes se envolva com o programa, enquanto que o uso de sistemas da captação de água de chuva exige elevados investimentos do proprietário desincentivando o uso mais intenso dessa alternativa sustentável. Esses sistemas se tornam mais viáveis em novas, maiores e modernas construções civís que em Ouro Preto têm maiores dificuldades de implantação por conta das peculiaridades arquitetônicas de ser Patrimônio Cultural da Humanidade da UNESCO, e estabelecidas no Plano Diretor Municipal.
Ainda em relação à coleta seletiva, observou-se uma variação muito grande do número de usuários ao longo do período de estudo. Esses valores podem ser explicados devido às deficiências tanto na execução do Programa Municipal de Coleta Seletiva, existente no município desde 2011 (Lei Municipal N° 684), quanto do próprio programa “Quem preserva paga menos”, já que o mesmo é pouco conhecido mesmo para os proprietários de imóveis que realizam/participam a coleta seletiva. Um outro problema que deve ser apontado, consiste na cobertura da coleta seletiva em Ouro Preto. Infelizmente a coleta seletiva de recicláveis abrangia em 2018 apenas14 bairros na cidade e o distrito de Lavras Novas, dos 103 bairros incluindo os doze distritos. Isso ocasiona obviamente em uma redução do número de potenciais participantes no Programa Quem Preserva Paga Menos de Ouro Preto.
No que se refere ao sistema de captação de água de chuva verificou-se que apesar do pequeno aumento constatado ao longo de vigência da lei que incentiva tais instalações, o número de usuários ainda é muito baixo, visto que se registrou a existência desses sistemas em apenas cinco domicílios em 2018. Uma explicação plausível para tal fato refere-se, também, e que não deve ser desconsiderado, a cobrança de uma taxa única irrisória das residências (R$ 14,95 em agosto de 2019) pelo consumo da água de abastecimento e afastamento de esgoto pela autarquia que administra a água e o esgoto em Ouro Preto (SEMAE). A ausência de hidrometração da água consumida nos imóveis e a cultura local de que em Ouro Preto possui muita água disponível (por possuir inúmeras nascentes e se assentar no divisor de águas de duas grandes bacias hidrográficas, a do rio Doce e do rio São Francisco) desestimula que as pessoas busquem minimizar o consumo e procurem soluções sustentáveis para esse recurso essencial às pessoas e a outras atividades do dia-dia. Dessa forma, por não enxergar o retorno financeiro, devido ao reduzido valor da tarifa de água e esgoto, poucos moradores são concretamente aderentes à esta modalidade de incentivo. Adicionalmente, é digno de registro, como já apontado anteriormente, que tais iniciativas em construções mais antigas exigem maiores investimentos e possui maiores dificuldades principalmente no setor tombado pelo Patrimônio Histórico (centro histórico). Outra questão a ser apontada, mas que não foi pesquisado é a ainda baixa preocupação das pessoas em geral para com o uso racional da água “quase gratuita” de Ouro Preto.
Diferentemente do sistema de captação de água de chuva, a captação de energia solar tem aumentado significativamente no município. A Lei Complementar nº 113, de 27 de dezembro de 2011, não especifica o tipo de sistema de captação de energia solar que contempla os benefícios. Sendo assim, inclui tanto sistema de aquecimento solar, quanto a captação de energia solar por placas fotovoltaicas. Os dados disponíveis na SEMMA referentes à captação de energia solar não distinguem qual tipo de sistema adotado pelos moradores que participam do programa. Por conta disso, acredita-se que o sistema de custo mais baixo seja o que é mais utilizado no munícipio.
Apesar do quantitativo de usuários ser considerado muito baixo, é possível verificar que em 2018 o aumento foi considerado relevante. Isso leva a concluir que os recentes convites e propagandas realizadas pela prefeitura tanto pelo website quanto pelas rádios locais de maior audiência têm influenciado a população na adoção de medidas ambientais sustentáveis e na busca pelo incentivo (desconto) no IPTU.
3.1 Avaliação da percepção da população a respeito do programa “Quem preserva paga menos”
As análises nesse tópico foram feitas a partir das respostas obtidas pela aplicação do questionário à população local. A primeira delas indagou os moradores ouro-pretanos a respeito sobre o conhecimento da existência de algum tipo de programa ambiental no município. Os resultados mostraram que somente 42% da população de Ouro Preto pertencente aos setores censitários avaliados conhecem algum tipo de programa do poder público local que tem como foco ações ambientais. Posteriormente, analisou-se a opinião das pessoas quanto a importância da criação de incentivos ambientais para que as mesmas participem de ações municipais neste sentido. Todos os proprietários entrevistados concordaram com a criação de incentivos ambientais no município de Ouro Preto e a justificativa apresentada pela maioria das pessoas foi concordante às constantes mudanças que o meio ambiente sofre e a importante necessidade de preservá-lo. Além disso, pontuaram que é essencial contribuir de alguma forma para se ter uma cidade mais limpa.
Já em relação ao Programa “Quem preserva paga menos”, inicialmente foi questionado o conhecimento dos habitantes locais no que diz respeito ao mesmo. Pôde-se constatar que quase 1/3 da população de Ouro Preto não conhece e nunca ouviu falar do incentivo ambiental existente no município por meio de uma lei de 2011. A maioria das pessoas demonstrou espanto ao saber que é possível obter um desconto no IPTU ao participar da coleta seletiva ou mesmo ter sistema de captação de água de chuva e/ou de energia solar. Verificou-se também que nem todas as pessoas que conhecem o programa, participam dele. Apenas 8% dos entrevistados relataram que ouvem propagandas com pequena frequência no rádio, mas que nunca receberam ou viram folhetos ou cartazes informativos, para que conhecessem melhor como o mesmo funciona. De forma geral, todos os respondentes reclamaram da ausência ou a pequena divulgação dos programas e projetos da prefeitura nesse foco.
Após saber quantas pessoas tinham conhecimento do instrumento ambiental em tela, foi levantado o número de habitantes que participam ou já participaram do mesmo. Os dados mostraram que do total de pessoas entrevistadas somente 8% participam do programa (Figura 5). Esse dado revela baixa abrangência/aderência ao incentivo ambiental no município de Ouro Preto, uma vez que o número de pessoas que estão inseridas no mesmo é bastante pequeno. Em alguns setores censitários de Ouro Preto selecionados para a aplicação do questionário verificou-se que ninguém participava do Programa enquanto em outros setores censitários onde 20 pessoas foram pesquisadas somente uma delas participa ou já tinha participado alguma vez. Um fato observado, é que algumas pessoas disseram ter algum tipo de projeto ou ação ambiental na residência que concretamente configuraria desconto no IPTU, mas que por não conhecerem os incentivos e benefícios do Programa Quem Preserva Paga Menos acabavam por não participar ou usar o incentivo.
Figura 5 − Levantamento do percentual de pessoas que participam do programa “Quem preserva paga menos” de Ouro Preto
Fonte: GOMES, 2018.
Outro levantamento realizado com os participantes do Programa foi em relação a possibilidade de obter descontos no IPTU, apresentado na Figura 6. O objetivo aqui foi verificar se eles tinham conhecimento do abatimento no imposto. Os resultados mostraram que a maior parte dos integrantes do programa (71%) tem o conhecimento de que é possível obter os descontos. A porcentagem que não sabia dessa informação, relatou ter conhecimento da existência do programa e participar indiretamente dele. Isso ocorre, pois, há participantes que colaboram na coleta seletiva de resíduos que ocorre no bairro, mas não possuem ciência que poderiam solicitar o abatimento no IPTU, por participarem na separação de recicláveis em casa.
Figura 6 − Levantamento do número de participantes que tinham a informação do desconto no IPTU
Fonte: GOMES, 2018.
Para os participantes do Programa, também foi questionado qual a prática sustentável que eles realizam. O obtido nessa questão encontra-se na Figura 7.
Figura 7 − Levantamento de qual a prática sustentável que o participante realiza no domicílio
Fonte: GOMES, 2018.
A categoria de iniciativas de sustentabilidade ambiental que a maior parte dos ouro-pretanos participantes atua é na coleta seletiva. As explicações para esta adesão são devido a existência do programa de coleta seletiva no município e do baixo ou nulo investimento exigido para a sua participação. Apesar da coleta seletiva em Ouro Preto ainda encontrar-se em expansão e contemplar poucos bairros, o projeto Ouro Preto Recicla (voltado à coleta diferenciada de materiais) tem incentivado os habitantes a separar os materiais do lixo doméstico, contribuindo com ações que beneficiam o meio ambiente e, além disso, garantir a geração de emprego e renda principalmente nas três associações locais de reciclagem de materiais. Um questionamento geral das pessoas que foram entrevistadas refere-se ao custo dos sistemas incentivados pelo programa “Quem preserva paga menos”. Consideram que todos possuem um custo de instalação e manutenção elevados.
Posteriormente os moradores foram interrogados sobre quais os benefícios que este Programa trás para a sociedade e ao meio ambiente. Além disso, as pessoas que tiveram interesse puderam fazer outras considerações a respeito do incentivo e das melhorias ambientais em geral que o município de Ouro Preto necessita. As respostas encontram-se na Figura 8.
Figura 8 – Benefícios que o programa “Quem preserva paga menos” trouxe/traz para a sociedade e o meio ambiente
Fonte: GOMES, 2018.
Entrevistando as pessoas que conhecem e participam do Programa, as respostas que citam os benefícios trazidos foram bastante variadas, sendo as mais importantes a preservação do meio ambiente e a ajuda às associações de catadores de recicláveis que são três em Ouro Preto (Figura 8). Esses entrevistados julgaram ser de grande importância o auxílio aos catadores que utilizam os materiais recicláveis como fonte de renda para sustento de suas famílias. No que tange ao meio ambiente, 28% dos participantes declararam como principal benefício, a preservação do meio ambiente, uma vez que quando se destinam os resíduos produzidos à reciclagem, reduz-se a disposição de rejeitos em aterros e consequentemente intensifica às melhorias ambientais.
Já em relação ao segmento das considerações feitas pelos entrevistados (Figura 8), os pesquisados apresentaram reclamações em relação ao funcionamento da coleta seletiva (falta de cumprimento de horário da coleta, necessidade de maior divulgação, falta de incentivos e necessidade de melhor fiscalização por parte da prefeitura). Como forma geral, julgaram de fundamental importância ampliar a divulgação dos projetos e programas ambientais no município. Além disso, sugeriram buscar a incentivar a população e acompanhar os programas em andamento, a fim de verificar se os mesmos estão funcionando como esperado.
Para contemplar as pessoas que não conhecem o Programa, foi avaliado quais os motivos que as levam a não participar do mesmo, se haveria intenção de participar do Programa existente no município e outras considerações a fazer. A Figura 9 aborda as principais razões que fazem os entrevistados a não participarem do Programa.
Figura 9 − Principais razões por não fazer parte do programa “Quem preserva paga menos’’
Fonte: GOMES, 2018.
A partir da figura acima é notável perceber que o principal motivo pelo qual os ouro-pretanos não participam do Programa é a falta de conhecimento do funcionamento do mecanismo de incentivo (71% não conhecem). Assim, considera-se que o desconhecimento da maioria é fator que impede com que as mesmas usufruam do benefício previsto em Lei. Pode-se perceber também que uma pequena parcela (8%) da população já ouviu falar do incentivo da Lei, mas não compreende bem como funciona e onde e como faz para requerer os benefícios oferecido pelo Programa. Vale lembrar também que a ausência de um fundo ambiental municipal (FMMA) em Ouro Preto restringe uma maior participação por não haver orçamento específico para tal. Isso exige que a Lei seja revisada e atualizada apontado a fonte de recursos para ampliação do Programa.
Além desses motivos, o outro mais citado foi referente a falta de tempo. Esses entrevistados disseram trabalhar ou realizar outras atividades fora de casa, o que impede de participar de alguma das modalidades abrangentes no Programa Quem Preserva Paga Menos. Acredita-se que os mesmos associaram a falta de tempo para participação na modalidade coleta seletiva de resíduos, imaginando que separar os materiais recicláveis em casa pode demandar tempo e investimento em alguma infraestrutura doméstica. No caso dos sistemas de captação de energia solar e água de chuva, a ausência de tempo por parte dos entrevistados poderia estar associada ao monitoramento contínuo do funcionamento dos mesmos e não à implantação dos sistemas, mas não foi esse o argumento apontado.
Conhecendo os principais motivos relatados pelos entrevistados, procurou-se informar se eles teriam intenção em participar do programa futuramente e por quais motivos (Figura 10). Os dados obtidos revelaram que 86% das pessoas têm intenção de participar do programa futuramente. Os motivos apresentados foram vários e estes abrangem a preservação do meio ambiente, economia, benefícios à cidade. Além dos pontos positivos houve justificativas pelos quais não participariam do programa, sendo eles o desinteresse, a falta de tempo, reclamações referentes a atuação da prefeitura em relação à limpeza pública, dentre outros.
Figura 10 − Levantamento do percentual de pessoas que têm intenção de participar do programa futuramente
Fonte: GOMES, 2018.
Após analisar as justificativas apresentadas, deu-se a oportunidade para os entrevistados fazerem as considerações que julgassem relevantes. A Figura 11 relaciona esses dados.
Como pode ser observado a principal consideração feita pelos proprietários entrevistados foi a necessidade de realizar maior divulgação dos projetos e programas ambientais existentes. Essa análise está diretamente relacionada ao motivo pelo qual as pessoas não participam do programa, uma vez que 71% dos entrevistados deixaram claro não conhecerem o Programa.
Aliado à divulgação, as pessoas consultadas relataram que é indispensável procurar medidas para melhor desenvolver a educação ambiental no município já que, infelizmente, a consciência para a preservação do meio ambiente ainda não é prioritária para todos. Outras afirmações com relação ao Programa em estudo foram a sugestão de criação de postos de entregas voluntária de recicláveis, ampliação da coleta seletiva no município, melhor organização da prefeitura para o desenvolvimento das ações relacionadas ao programa, ampliação do programa para as escolas e maior divulgação do projeto, dentre outras. Tais respostas, porém, estão relacionadas principalmente às questões ambientais de maneira geral e não especificamente ao Programa estabelecido pela Lei Complementar Nº 113, de 27 de dezembro de 2011. Uma resposta que chamou a atenção foi apontar que o benefício oferecido é pouco para muito trabalho.
Figura 11 – Outras considerações feitas a respeito do programa
Fonte: GOMES, 2018.
4 Conclusões
O estudo sobre o Programa “Quem Preserva Paga Menos”, ditado pela Lei Municipal de Ouro Preto (Lei Complementar Nº 113/2011) revelou importantes informações e fragilidades na sua aplicação. Apesar de estar em funcionamento desde 2011, os resultados do Programa mostraram que o mesmo ainda não é conhecido pela população e foi considerado pouco difundido localmente e que o número de participantes é considerado muito baixo. A principal consideração feita pelos proprietários dos domicílios que foram entrevistados foi a necessidade de realizar maior divulgação dos projetos e programas ambientais da prefeitura.
Constatou-se que o tipo de ação sustentável que mais possui cadastros na Secretaria Municipal de Meio ambiente do município de Ouro Preto é o uso de sistemas de aquecimento solar de água, seguido pela coleta seletiva de resíduos sólidos recicláveis, sendo uso de sistemas de implantação de captação de água de chuva o que aparece por último.Com relação à coleta seletiva, os pesquisados apresentaram reclamações em relação ao funcionamento da como falta de cumprimento de horário da coleta e a necessidade de maior divulgação.
Percebeu-se que o valor de descontos no IPTU para adoção de medidas ambientais, com exceção da participação na coleta seletiva de resíduos, exige investimentos significativos por parte dos proprietários de imóveis, afastando-os da participação de um número maior deles no uso dos incentivos previstos no Programa. A necessidade da renovação anual para participação do benefício, considerado novidade em Ouro Preto, também é fator que pode fazer com que proprietários deixem de buscar os incentivos previstos na Lei. Em certas situações, indiretamente previstas na Lei, como a exigência de investimentos muito altos por parte dos proprietários (geração de energia elétrica e construção de sistemas de uso e armazenamento da água de chuva) sempre haverá baixa adesão na busca dos incentivos previstos.
Especula-se que os baixos resultados relativos ao sistema de captação de água de chuva e que não deve ser desconsiderado é a vigência de cobrança de uma taxa única e irrisória das residências (R$ 14,95) pelo consumo da água de abastecimento e afastamento de esgoto pela autarquia que administra a água e o esgoto em Ouro Preto. A ausência de hidrometração nos imóveis e a cultura local de que em Ouro Preto possui muita água também desestimula as pessoas a minimizar o consumo e a procurarem soluções sustentáveis para esse recurso.
Constatou-se que em Ouro Preto, não existe lei ou regramento de construção de um fundo específico (fundo municipal de meio ambiente - FMMA) para compensar as eventuais perdas de arrecadação do IPTU para se incentivar a adoção de ações ambientalmente sustentáveis, assim considera-se que o fôlego do Programa “Quem Preserva Paga Menos” é bastante curto impedindo a expansão do uso democrático desse importante instrumento de política pública local.
Com os resultados da pesquisa, viu-se a necessidade de propor algumas sugestões como forma de melhorar o desempenho do Programa Quem Preserva Paga Menos em Ouro Preto, tais como:
• Maior divulgação do incentivo previsto na Lei e dos benefícios oferecidos em programas de rádio, nas associações de bairros, nos coletivos e em pontos de grande movimentação no município, como supermercados, farmácias, praças entre outros;
• Levar o programa até as escolas estaduais e municipais, como forma de apresentar aos alunos e incentivá-los a contribuir juntamente com os professores e pais;
• Expandir o programa Ouro Preto Recicla no município, de forma a abranger grande parte dos bairros e aumentar o número de participantes da coleta seletiva. Para os locais de difícil acesso, implantar pontos de entrega voluntários de materiais recicláveis;
• Administrar melhor o programa de reciclagem de resíduos do município, ou seja, ajustar com a população os dias e horários em que a coleta acontecerá e passar s cumprir com o estabelecido;
• Estruturar programas de educação ambiental consistentes e duradouros como forma de incentivar a população melhor cuidar o meio ambiente e participar dos demais programas existentes no município;
• Embora o desenvolvimento do programa “Quem Preserva Paga Menos” venha ocorrendo de forma tímida ao longo dos últimos sete anos, os resultados mostram certo interesse na população local visando a colaborar em soluções que possam minimizar problemas de ordem ambiental com iniciativas locais.
• Estudar possibilidades de aumentar o desconto oferecido ao proprietário do imóvel, tendo em vista ser considerado muito baixo relação aos investimentos exigidos. Uma revisão da lei é considerada necessária buscando conhecer outras realidades brasileiras.
• Atualizar o arcabouço legal municipal visando a criação de um Fundo Municipal do Meio ambiente (FMMA) oferecendo maior fôlego financeiro ao programa “Quem Preserva Paga Menos” e outras propostas para a política ambiental de uma cidade que é Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO, desde 1981.
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