Inter-relações entre Filosofia, Ciência e Arte: proposta didática para o ensino de filosofia no ensino médio integrado

 

Interrelationships between Philosophy, Science and Art: didactic proposal for the teaching philosophy in integrated high school

 

Angélica Antonechen Colombo

Professora doutora no Instituto Federal do Paraná, Campo Largo, PR, Brasil.

angelica.colombo@ifpr.edu.br - https://orcid.org/0000-0002-6949-5385

 

Recebido em 13 de maio de 2022

Aprovado em 11 de setembro de 2022

Publicado em 07 de novembro de 2022

 

RESUMO: Durante os séculos XVI e XVII a filosofia, a ciência e a arte começam a se separar, principalmente por conta da consolidação da ciência e de sua produção de conhecimento racional, baseada em princípios lógicos e matemáticos, buscando compreender e dominar a natureza de modo objetivo, enquanto a arte irá se ocupar da sensibilidade, utilizando de discursos e meios subjetivos de levantar questionamentos, tendo como base as faculdades do juízo e, por fim, a filosofia irá promover uma reflexão mais profunda e uma análise mais precisa das produções de conhecimento das duas áreas, não se separando, mas partindo delas. Assim sendo, o presente trabalho buscou oferecer uma proposa didática e interdisciplinar para o ensino médio normal ou integrado, a fim de abarcar os conhecimentos produzidos pela ciência, arte e filosofia, tendo como aporte teórico as discussões desenvolvidas pela Teoria Crítica. Para tanto, apresentou uma discussão teórica a respeito das inter-relações existentes entre as grandes áreas; e para o desenvolvimento da proposta didática trabalhou com diferentes materiais didáticos como a filosofia da Escola de Frankfurt, as obras do artista Ai Weiwei, entre outros. Como resultados, pretende-se ilustrar as possibilidades de trabalhar com diferentes saberes de forma interdisciplinar e integradora.

Palavras-chave: Filosofia; Ciência; Arte; Escola de Frankfurt; Ensino Médio Integrado.

 

ABSTRACT: During the 16 and 17th century’s philosophy, science and art started to separate, mainly because of science consolidation and its rational knowledge production, based on mathematics and logical principles, search understanding, and dominating objectively nature. While the art going to take of sensitivity, using discourse and subjective means to make questions, based on judgment faculties and, finally, the philosophy going to promote deeper reflection and more accurate analysis of knowledge productions both areas, not separating, but starting from them. Consequently, this paper sought to offer didactics and interdisciplinary proposals for normal and integrated high school, in order to cover pieces of knowledge produced by science, art, and philosophy, having critical theory as a theoretical contribution. Therefore, showed theoretical discussion about the inter-relations existing between those great areas. And, for didactics proposal development works with different teaching materials such as the Philosophy of Frankfurt School, the work of art of Ai Weiwei. As a result, intends to illustrate the possibilities to work in an interdisciplinary and inclusive way with different knowledge.

Keywords: Philosophy; Science; Art; Frankfurt school; Integrated high school.

 

Inter-relações entre Filosofia, Ciência e Arte

A filosofia, a ciência e a arte possuem em suas estruturas características de produção de conhecimento que se diferenciam, mas que também se relacionam intimamente. Atualmente essas três áreas do conhecimento são tratadas cada uma a seu modo, separadamente e independentes umas das outras, mas nem sempre elas estiveram assim tão fragmentadas e distantes e até mesmo isoladas umas das outras. 

Durante a Idade Média, por exemplo, ao observar o sistema das artes liberais e a organização do ensino, percebe-se que a primeira parte do programa educacional era constituída pelas três disciplinas do trivium, ou seja, a gramática latina, a lógica e a retórica, seguidas pelas disciplinas do quadrivium: a aritmética, a geometria, a música e a astronomia. Desse modo, a produção de conhecimento científico e artístico se fundiam. Com o advento da Modernidade, arte e ciência começaram a se afastar e a assumir características, linguagens, métodos, processos cognitivos e vinculações epistemológicas independentes e diferenciadas.

A filosofia clássica ocidental, desde seu surgimento na Grécia antiga, manteve em seu arcabouço todas as áreas de conhecimento de modo homogêneo; separou-se, principalmente da ciência, a partir do desenvolvimento dos métodos experimentais surgidos durante a Modernidade, quando alguns pensadores passaram a discriminar as questões metafísicas que eram levantadas pela filosofia no âmbito das pesquisas científicas. Até então, artistas, filósofos e cientistas dedicavam-se à busca de conhecimentos que não tinham fronteiras. Todas as ciências eram inter-relacionadas e faziam parte de uma ampla filosofia que abarcava todos os aspectos de funcionamento do mundo.

Será durante os séculos XVI e XVII que filosofia, ciência e arte começam a se separar, principalmente por conta da consolidação da ciência e de sua produção de conhecimento puramente racional, baseada em princípios lógicos e matemáticos, buscando compreender e dominar a natureza de modo objetivo, enquanto a arte irá se ocupar da sensibilidade, utilizando de discursos e meios subjetivos de levantar questionamentos, tendo como base as faculdades do juízo. Por fim, a filosofia irá promover uma reflexão mais profunda e uma análise mais precisa das produções de conhecimento das duas áreas, não se separando, mas partindo delas. Enquanto ciência e arte reforçam suas características e linguagens próprias, a filosofia irá perguntar qual é a significação do que está sendo proposto por cada área de conhecimento; que motivações estão presentes em cada estrutura de pensamento; qual formação discursiva está sendo produzida; qual é o sentido, o significado, a utilidade, o valor, a intenção e a finalidade do que está sendo pensado, dito e feito. 

O filósofo Gilles Deleuze entende a arte, a filosofia e a ciência como as três dimensões do conhecimento, como se fossem três formas independentes de criação, cada uma operando a partir de suas características, porém, nenhuma é mais importante que a outra, elas se complementam. Elas produzem, juntas, formas criativas de compreensão da realidade que potencializam umas às outras (DELEUZE, 2000).

 

Filosofia, ciência e arte são planos irredutíveis, mas podem ser explorados segundo uma mesma estratégia; às três instâncias da instauração filosófica, corresponderão instâncias simétricas da instauração artística e científica: “plano de imanência da filosofia, plano de composição da arte, plano de referência ou de coordenação da ciência; forma do conceito, força da sensação, função de conhecimento; conceitos e personagens conceituais, sensações e figuras estéticas, funções e observadores parciais” (DELEUZE, 2000, p. 277).

 

Para Deleuze, o mais importante é saber como acontece o pensamento e como ele é produzido nessas três grandes áreas do conhecimento. O autor argumenta que não só os filósofos, mas também os cientistas e artistas são, antes de tudo, pensadores, criadores de ideias e essas ideias podem se manifestar em diferentes produções, como, por exemplo, em uma pintura, em uma escultura, na produção de um conceito filosófico, na criação de uma teoria científica ou de um artefato tecnológico, ou seja, para Deleuze, o que importa é como se dá o exercício do pensamento. Roberto Machado salienta que, para Deleuze, o que interessa são “[...] as relações entre arte, ciência e filosofia. Não há nenhum privilégio de uma destas disciplinas em relação às outras. Cada uma delas é criadora [...]” (MACHADO, 1990, p. 4). Nas palavras de Deleuze:

 

O que define o pensamento, as três grandes formas do pensamento, a Arte, a Ciência e a Filosofia, é sempre enfrentar o caos, traçar um plano, esboçar um plano sobre o caos. Mas a filosofia quer salvar o infinito, dando-lhe consistência: ela traça um plano de imanência, que leva até o infinito acontecimentos ou conceitos consistentes, sob a ação de personagens conceituais. A Ciência, ao contrário, renuncia ao infinito para ganhar a referência: ela traça um plano de coordenadas somente indefinidas, que define sempre estados de coisas, funções ou proposições referenciais, sob a ação de observadores parciais. A Arte quer criar um finito que restitua o infinito: traça um plano de composição que carrega por sua vez monumentos ou sensações compostas, sob a ação de figuras estéticas. As três vias são específicas, tão diretas umas como as outras, e se distinguem pela natureza do plano e daquilo que o ocupa (DELEUZE, 2000, p. 252).

 

Filosofia, ciência e arte buscaram seus espaços na produção do conhecimento. Sabe-se que boa parte dos principais elementos que compõem o imaginário científico contemporâneo tem suas raízes ainda na Revolução Científica e principalmente no Iluminismo. O pensamento científico moderno consolidou-se com a explicação das leis da mecânica de Isaac Newton, que moldaram a imagem do cientista no seio cultural da sociedade da época. Londres, por exemplo, caracterizou-se como berço das obras literárias e artísticas que retratavam muito bem o desenvolvimento da ciência nos laboratórios (ROSSI, 2001).

Obras como Fausto (1808/1948), de Goethe, e Experimento com um Pássaro numa Bomba de Ar (1768), de Joseph Wright (de Derby), ilustram a racionalidade iluminista da época, ou seja, a dominação da natureza pelo homem, levando às pessoas a ideia de que a ciência e a busca pelo conhecimento dariam ao homem o controle pleno da realidade. No século XIX e na virada do século XX, ideais científico-tecnológicos tornam-se um tema presente nas obras literárias e posteriormente cinematográficas (GOMBRICH, 2008). 

O filósofo e historiador da ciência Thomas Kuhn publicou, em 1969, um ensaio chamado Comentários sobre a relação entre ciência e arte (1977), no qual levanta algumas relações que existem entre o trabalho do artista e o do cientista. Para o filósofo, tanto um quanto o outro produzem bens que serão aproveitados pelo público, e ambos se utilizam de sua percepção do mundo para orientar seu trabalho, logo, a diferença entre eles é que, para o cientista, a estética é um instrumento para a resolução de problemas técnicos (como o uso de imagens para estudo das partículas, por exemplo) e, para o artista, a estética é o objetivo final de seu trabalho. O poeta Paul Valéry (1871-1945) complementa: as ciências e as artes diferem principalmente nisto, que as primeiras devem visar a resultados certos ou enormemente prováveis; as segundas podem esperar apenas resultados de probabilidades desconhecidas” (VALÉRY, P, 1991, p. 140).

Émile Zola, em O romance experimental e o naturalismo no teatro, também aproxima a ciência e a arte nesta declaração:

 

Não somos nem químicos, nem físicos, nem fisiólogos; somos simplesmente romancistas que nos apoiamos nas ciências. [...] o romancista experimentador nada mais é senão um cientista especial que emprega o instrumento dos outros cientistas, a observação e a análise. [...]. O artista parte do mesmo ponto que o cientista; ele se coloca diante da natureza, tem uma ideia a priori e trabalha segundo esta ideia. Ele só se separa do cientista se levar sua ideia até o fim, sem verificar a sua exatidão pela observação e experiência (ZOLA, 1982, p. 61-62).

 

Durante o período que se convencionou chamar de Revolução Científica, abriram-se possibilidades de pensar uma nova estrutura de mundo. Artistas, fascinados por novos ideais científicos, reproduziram em suas obras a imensidão do cosmos descortinada pela ciência, assim como aconteceu no Barroco com a ideia de infinito, vistas nas dobras das obras de arte, decorrentes da invenção do cálculo infinitesimal leibniziano, como declara Eco (1991, p. 157):

 

[...] a poética do Barroco reage a uma nova visão do cosmo introduzida pela revolução copernicana, sugerida quase em termos figurativos pela descoberta da elipsidade das órbitas planetárias por Kepler – descoberta que põe em crise a posição privilegiada do círculo como símbolo de perfeição cósmica. Assim como a pluriperspectiva da construção barroca se ressente desta concepção – não mais geocêntrica e, portanto, não mais antropocêntrica – de um universo ampliado rumo ao infinito [...].

 

Em cada época marcada por transformações na história, a construção de um imaginário científico se alicerçava com o auxílio das produções literárias, artísticas, cinematográficas e até midiáticas. Aproximar a ciência da arte não é algo tão simples e poucos autores se atreveram a propor essa empreitada, pois áreas tão diversas parecem estar muito distantes umas das outras, porém, como visto em exemplos citados no decorrer deste texto, elas não estão assim tão longe e certamente influenciam uma à outra. 

O ano de 1818, bem antes das reviravoltas científicas da virada do século XX, com a Teoria da Relatividade de Einstein, pode ser visto como um marco, no seio da literatura, para o aparecimento de um novo gênero de produção literária, o romantismo gótico. A produção de Mary Shelley, Frankenstein - ou o moderno Prometeu, publicado naquele ano, inaugurou o chamado gênero da ficção científica na literatura do século XIX. Júlio Verne, outro nome importante da ficção científica, lançava, em 1864, a obra Viagem ao Centro da Terra (1964), em 1870, Vinte Mil Léguas Submarinas (1972) e, em 1873, A Volta ao Mundo em 80 dias (2006), clássicos da ficção científica.

Com a sociedade vivendo grandes transformações decorrentes da Segunda Revolução Industrial iniciada nos meados do século XIX e adaptando-se a uma forma de vida mais frenética, os questionamentos, fundados em novas bases científicas, a respeito da vida, da realidade e dos caminhos pelos quais a humanidade poderia avançar, tornaram-se temas presentes nas obras literárias desse e do século seguinte; afinal, como definiu Isaac Asimov, a ficção científica é o "ramo da literatura que trata das respostas do homem às mudanças ocorridas ao nível da ciência e da tecnologia" (ASIMOV, 1984, p. 46).

Porém, mesmo estabelecendo esse marco como o início da construção do gênero de ficção científica na literatura, pode-se considerar o filósofo inglês Francis Bacon como um dos primeiros escritores de ficção científica, com sua obra A Nova Atlântida, de 1627 (1999), na qual ele descreve uma ilha prodigiosa perdida no meio dos mares cujos habitantes dominavam as ciências e, por consequência, as tecnologias. Pouco mais de um século depois, em 1752, o filósofo francês Voltaire (pseudônimo de François-Marie Arouet), divulgador das ideias de Newton, publicou um livro no qual relata a viagem de um habitante do mundo da estrela Sirius até ao planeta Saturno. O livro intitulado Micromegas tem como subtítulo História Filosófica emesmo em se tratando de uma obra de ficção, a ciência e a filosofia se encontram particularmente presentes no texto. O livro conta a história do gigante Micromegas, que empreende viagens pelo espaço, contrastando os usos e costumes de cada canto do cosmos. 

Com o surgimento da fotografia e, posteriormente, do cinema, a ciência e a arte passaram a andar de mãos dadas. O cinema se estreitava com a ciência desde seus primórdios, pois a técnica de criar imagens em movimento, já no final do século XVIII, vinha se aprimorando. Os primeiros estudos sobre o registro do movimento em geral se deram em diferentes sentidos e intenções, fossem com a expectativa de verificar a trajetória de planetas, fossem com o desejo de observar, no mundo animado, detalhes da marcha de animais e do próprio ser humano.

Com materiais retirados das obras de ficção científica, que rapidamente se multiplicavam, e com as técnicas do cinema em desenvolvimento, o cineasta francês Georges Méliès (1861-1938) foi pioneiro na exploração das possibilidades cinematográficas, tendo inventado truques, movimentos de câmera e efeitos especiais, além do uso da luz artificial. Sua obra-prima Le voyage dans la lune (Viagem à Lua), de 1902, baseada nos livros de ficção científica Da Terra à Lua (Júlio Verne, 1865) e Os Primeiros Homens na Lua (H. G. Wells, 1901), é um dos primeiros registros cinematográficos em que aparecem representações de cientistas no cinema. Outro cineasta que inaugurou na história do cinema o gênero de filmes de ficção científica foi Fritz Lang, com o célebre Metrópolis, de 1927 (MASCARELLO, 2006). 

As narrativas de ficção científica dedicam-se a especular sobre a vida futura, imaginando os desdobramentos da ciência, construindo uma associação direta com a realidade científica. Ao lidar com esses dois mundos, a ficção científica abre o acesso a diferentes produções da ciência, as quais, com base em uma obra artística, oferecem oportunidades de contato com as transformações que o homem da ciência vem imprimindo ao mundo.

Aproximar-se das fronteiras entre a arte e a ciência é um tema de discussão mais complexo do que parece. Jacob Bronowski (1998), escrevendo sobre esse tema, defendeu tal aproximação, principalmente entre a ciência e a poesia: 

 

A imaginação nos atinge e nos penetra de formas diferentes na ciência e na poesia. Na ciência, ela organiza nossa experiência em leis, sobre as quais baseamos nossas ações futuras. A poesia, porém, é outro modo de conhecimento, em que comungamos com o poeta, penetrando diretamente na sua experiência e na totalidade da experiência humana (p. 20).

 

Ao se olhar para o passado, para a antiguidade greco-romana ou para a Renascença, por exemplo, observa-se que havia uma proximidade natural entre as produções artísticas e outras formas de produção de conhecimento, ou seja, essas produções não eram vistas como independentes uma da outra:

 

Para Pitágoras e seus seguidores, os números eram a chave para o universo e a música era inseparável dos números [...]. Cláudio Ptolomeu, o principal astrônomo da Antiguidade, era também notável compositor. Leis e proporções matemáticas eram consideradas a sustentação tanto dos intervalos musicais quanto dos corpos celestes e acreditava-se que certos planetas, a distância entre estes e seus movimentos correspondiam a certas notas, intervalos e escalas musicais (ENGLAND, 2009, apud, PINHEIRO, 2011, p. 5). 

 

O ato de imaginar não se encontra apenas no ato de criar cenários e mundos literários, lindas peças teatrais ou obras plásticas riquíssimas, mas a imaginação, como já mencionado, também é instrumento no qual o cientista se apoia para criar suas hipóteses e para testar suas teorias. Dessa forma, é preciso retomar esse interesse amplo que sempre existiu entre os sábios, ou seja, que a arte e a ciência são as formas de conhecimento que conseguem, cada uma a seu jeito, interpretar a realidade. Bronowski (1998) defende:

 

Muitas pessoas pensam que o raciocínio, e, portanto, a ciência, é uma atividade distinta da imaginação – uma falácia que devemos desprezar. [...]. Prejudicamos a educação das crianças quando as habituamos a separar a razão da imaginação, apenas pela conveniência do horário escolar. Porque a imaginação não se limita às explosões da fantasia, ela é sempre a manipulação mental do que está ausente dos sentidos, mediante o uso de imagens, palavras ou outros símbolos. A imaginação é sempre um processo experimental, seja com conceitos lógicos ou com a matéria-prima da arte (p. 38/39).

 

Grandes sábios da Antiguidade usaram da forte imaginação para pensar o cosmos. Demócrito (460-370 a.C.) fala do átomo antes mesmo de saber sua estrutura e de imaginar o tanto que se buscaria conhecê-lo ao longo da história. Kepler, em sua obra Harmonices Mundi (1619) imagina que o universo e os planetas possuem sons próprios que são responsáveis pela harmonia do mundo. Esses e muitos outros usaram da imaginação para criar uma interpretação racional para a realidade em que viviam, e uma criança e um jovem devem fazer o mesmo, não se pode subtrair deles esse direito. 

Por essas e outras razões já mencionadas, aproximar essas áreas do conhecimento não carece de grande esforço, haja vista que elas estão fortemente unidas, não por padrões lógicos ou metodológicos, mas pelo interesse em conhecer e interpretar a realidade pelo uso constante da imaginação e da criação, as quais devem estar sempre uma perto da outra.

As relações entre Filosofia, Ciência e Arte podem se estender para as diferentes produções artísticas, como a literatura, a música, a arquitetura, entre outras, mas no caso desta pesquisa ela se fixa principalmente no Cinema enquanto produção artística, e não somente no cinema de ficção científica, mas também no cinema biográfico e baseado em personagens históricos. 

 

Proposta didática para o ensino de filosofia no ensino médio integrado

A presente sequência didática será construída a partir de uma proposta interdisciplinar e buscará potencializar a integração entre os saberes, conforme orientação pedagógica do ensino médio integrado. Para tanto, a partir das inter-relações entre Filosofia, Ciência e Arte, buscará contemplar a prática filosófica da análise e da argumentação sob viés da Teoria Crítica, levando em consideração a realidade na qual os estudantes estão inseridos, buscando promover uma reflexão crítica sobre os temas propostos.

 

Tema: Desenvolvimento tecnocientífico e barbárie.

Conteúdo Estruturante: Filosofia da Ciência; Filosofia Política; Estética.

Conteúdo básico: Ciência; Política; Arte.

Conteúdo específico: Teoria Crítica; Desenvolvimento Tecnocientífico; Vanguardas Artísticas.

Objetivos: Refletir sobre o desenvolvimento científico durante períodos de guerra, seus impactos na sociedade e as vanguardas artísticas decorrentes desse período.

Número estimado de aulas: 4

Público alvo: Estudantes do ensino médio (normal e integrado)

Materiais de apoio:

Livro 1984 de George Orwel;

Fragmentos do texto Educação após Auschiwtz; Palestra sobre Lírica e Sociedadede Theodor Adorno;

Tirinha do livro Maus de Art Spiegelman;

Intervenções artísticas de Ai Weiwei;

Música Rosa de Hiroshima da banda Secos e Molhados;

 

Contextualização:

O século XIX possui um princípio epistemológico mecanicista muito conhecido dos pensadores dessa época. Sendo esse um século influenciado pelo pensamento pós-kantiano, o princípio de que a metafísica seria uma impossibilidade para a ciência e para o conhecimento da realidade passa a ser internalizado por todas as filosofias decorrentes: apenas os dados apreendidos pela observação e pela racionalização podem ser válidos no âmbito científico. É nesse sentido que nasce de fato o que se denomina “conhecimento positivo”, ou seja: “observar os fatos, constatar suas relações, servir-se delas para a ciência aplicada” (LEFEBVRE apud FORACCHI e MARTINS, 1977, p. 31).

Na filosofia positivista do século XIX, a observação também é importante, assim como fora para Bacon e outros filósofos, mas há a necessidade ainda de promover abstrações e racionalizações a fim de se chegar a resultados concretos. Seu método, denominado método experimental, é ainda hoje uma forma de se falar de ciência. O método experimental do positivismo parte da observação dos fatos, da formulação de hipóteses, de experimentações e de estabelecimentos de regras e leis que só são consideradas científicas depois desse processo (BORGES, 2007, p. 36).

Durante o século XIX, século com forte herança pós-kantiana, a ciência não podia mais lidar com os princípios metafísicos para erguer seus edifícios em desenvolvimento. Para se chegar ao chamado “conhecimento positivo” os pensadores buscavam em suas pesquisas aplicar o método experimental. Durante todo o período iniciado com a Revolução Científica, até os fins do século XIX, os debates sobre curso da ciência geraram posições nem sempre concordantes sobre o problema de sua demarcação e da validação dos métodos e objetivos de suas pesquisas. No entanto, diante dos métodos empregados pelos países beligerantes e dos efeitos provocados pelas duas Grandes Guerras que sacudiram o mundo na primeira metade do século XX, pensadores passaram a se questionar se deveria haver um limite para a atuação da ciência na sociedade.

As condições sociais da atuação da ciência estão relacionadas ao processo global de industrialização científica, tanto no campo das pesquisas como no campo de suas aplicações, como é o caso, por exemplo, das bombas atômicas lançadas pelos norte-americanos, em agosto de 1945, sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki e, mais recentemente, com as inúmeras catástrofes ecológicas que vêm se abatendo pelo mundo e os constantes perigos de guerras nucleares.

O ponto de vista positivista-lógico levou a debates de grande relevância sobre a demarcação da ciência nas instituições e nos meios científicos. O Círculo de Viena simboliza um marco nas discussões a respeito dos modos como se concebe a ciência no século XX. Mas é somente após a Segunda Guerra Mundial, mais precisamente na década de 1960, que o debate ganha mais força.

O grupo de intelectuais, sociólogos, filósofos e cientistas políticos que se reunia em torno do Instituto de Pesquisas Sociais fundado em Frankfurt em 1924, e que ficou conhecido como Escola de Frankfurt, declarou que era "necessário desenvolver a razão emancipatória, com base na crítica da dominação e em nome da comunicação e do consenso entre indivíduos racionais e livres" (MARCONDES, 1998, p. 239). Não mais se tratava de buscar o Aufklärung Kantiano, como os modernos tanto queriam, agora era necessário compreender a lógica de dominação do capitalismo que, na visão dos frankfurtianos, influenciava a produção do conhecimento científico.

            O debate entre os frankfurtianos sobre a lógica da ciência, principalmente no que respeita às ciências sociais, faz parte da história da ciência do século XX como um dos momentos de destaque para crítica dos frankfurtianos ao positivismo e ao desenvolvimento tecnocientífico em vistas de acúmulo de capital frente à uma lógica capitalista que paira a ciência. As reflexões de Max Horkheimer e Theodor Adorno sobre o desenvolvimento científico, enquanto um instrumento da ideologia dominante de produção capitalista, se estendem para o campo da definição de “ciência” ou teoria científica, que tanto preocupávamos filósofos do Círculo de Viena a respeito da demarcação científica.

Para os Frankfurtianos, principalmente para Horkheimer, os empiristas do Círculo de Viena olhavam para a ciência a partir de sua verificação empírica e de seus enunciados lógicos baseados na observação direta, sem levar em conta todo o caráter histórico que a constitui, traduzindo desse modo, a natureza como tal, a fim de estabelecer explicações exatas dos fenômenos, configurando um afastamento do seu papel na própria história, tornando-se abstrata e apartada da realidade, apenas objetificando os interesses da ideologia capitalista (ADORNO, T. W; HORKHEIMER, M, 1985). 

As discussões no campo da filosofia durante a primeira metade do século XX pautaram-se em questionar os alicerces herdados do Iluminismo, como o ideário de progresso científico, totalmente apoiado pelos pressupostos positivistas e experienciado em realidade pela humanidade nos anos pelos quais os interesses ideológicos das grandes nações financiaram fortemente esse ideário, provendo um dos mais frutíferos desenvolvimentos tecnocientíficos da história da humanidade, infelizmente objetivando a instauração da barbárie por meio de batalhas sangrentas como as Grandes Guerras, a Guerra Fria e a Guerra do Vietnã. 

O Instituto de Pesquisas Sociais conhecido como Escola de Frankfurt, que surgiu em 1924 na Alemanha, cunharam o termo Teoria Crítica que integrava uma corrente de pensamento que tinha um interesse crítico em domínios importantes para a compreensão da sociedade, como a economia, a política e a cultura e do desenvolvimento tecnocientífico de seu tempo. Essa corrente de pensamento é conhecida por ter recebido influência marxista a respeito da cultura industrial nascente no século XIX e que cada vez mais se industrializava no século XX. O grupo de filósofos da Teoria Crítica é lembrado pelo seu conceito de Racionalidade Técnica e da Indústria Cultural que foram a chave para compreendermos o mundo em que vivemos, e como a cultura e a ciência se modificaram com os meios tecnológicos que surgiram. Esses conceitos são o ponto de partida dos filósofos da Escola de Frankfurt para efetuar uma crítica da sociedade.

 

Aula 1 – Desenvolvimento Tecnocientífico no período de guerra

Primeira etapa: leitura prévia do trecho selecionado da obra 1984 de George Orwell;

Segunda etapa: exposição pelo docente da contextualização do conteúdo supracitado (discussões no campo da Filosofia da Ciência).

Terceira etapa: Análise da obra literária sob o viés da Filosofia da Ciência. A partir dessa etapa o docente iniciará uma proposta de debate filosófico.

Quarta etapa: O docente irá fazer alguns questionamentos para iniciar o debate, e os alunos irão discutir sobre o tema. Ao fim da aula, será proposto aos alunos desenvolver uma análise sobre uma situação problema.

 

Trecho da obra 1984 (George Orwell)

O objetivo primário da guerra moderna (em consonância com os princípios do duplipensamento, esse objetivo é ao mesmo tempo reconhecido e não reconhecido pelos cérebros dirigentes do Núcleo do Partido) é usar os produtos da máquina sem elevar o padrão geral de vida. Desde o fim do século XIX, o problema de o que fazer com o excedente de produção de bens de consumo tem sido uma questão latente na sociedade industrial. Hoje, quando poucos seres humanos dispõem do suficiente até mesmo para se alimentar, esse problema, claro, não é premente, e talvez jamais tivesse se tornado premente mesmo sem a interferência de processos artificiais de destruição. O mundo atual é um lugar desolado, destruído, faminto se comparado ao mundo que existia antes de 1914, e ainda mais se comparado ao futuro imaginário para o qual as pessoas daquela época pensavam que estavam caminhando. No início do século XX, a visão de uma sociedade futura inacreditavelmente rica, ociosa, organizada e eficiente — um mundo antisséptico, cintilante, de vidro e aço e concreto branquíssimo — fazia parte da consciência de praticamente toda pessoa culta. A ciência e a tecnologia desenvolviam-se a uma velocidade estonteante, e parecia natural acreditar que continuariam se desenvolvendo. Isso não aconteceu, em parte devido ao empobrecimento provocado por uma série longa de guerras e revoluções, em parte porque o avanço científico e tecnológico dependia do hábito empírico do pensamento, que não pôde sobreviver numa sociedade regimentada de maneira estrita. O mundo hoje, como um todo, é mais primitivo do que há cinquenta anos. Algumas áreas atrasadas progrediram e vários dispositivos foram desenvolvidos, sempre de alguma maneira relacionados à guerra e à espionagem policial, mas a experimentação e a invenção praticamente deixaram de existir, e os estragos causados pela guerra atômica da década de 1950 jamais foram inteiramente reparados. Contudo os perigos inerentes à máquina continuam existindo. Assim que ela surgiu, ficou claro para todas as mentes pensantes que os homens já não seriam obrigados a trabalhar — e que, como consequência, em grande medida a desigualdade entre eles também desapareceria. Se a máquina fosse usada deliberadamente para esse fim, a fome, o trabalho duro, a sujeira, o analfabetismo e a doença desapareceriam em poucas gerações. E de fato, mesmo sem ser usada com tais objetivos, mas como uma espécie de processo automático — pelo fato de produzir riqueza que em certos casos era impossível deixar de distribuir —, a máquina elevou enormemente o padrão de vida do ser humano médio num período de cerca de cinquenta anos, entre o fim do século XIX e início do XX. Mas também ficou claro que o aumento global da riqueza talvez significasse a destruição — na verdade em certo sentido foi a destruição — da sociedade hierárquica. Num mundo no qual todos trabalhassem pouco, tivessem o alimento necessário, vivessem numa casa com banheiro e refrigerador e possuíssem carro ou até avião, a forma mais óbvia e talvez mais importante de desigualdade já teria desaparecido. Desde o momento em que se tornasse geral, a riqueza perderia seu caráter distintivo. Claro, era possível imaginar uma sociedade na qual a riqueza, no sentido de bens e luxos pessoais, fosse distribuída equitativamente, enquanto o poder permanecia nas mãos de uma pequena casta privilegiada. Na prática, porém, uma sociedade desse tipo não poderia permanecer estável por muito tempo. Porque se lazer e segurança fossem desfrutados por todos igualmente, a grande massa de seres humanos que costuma ser embrutecida pela pobreza se alfabetizaria e aprenderia a pensar por si; e depois que isso acontecesse, mais cedo ou mais tarde essa massa se daria conta de que a minoria privilegiada não tinha função nenhuma e acabaria com ela. A longo termo, uma sociedade hierárquica só era possível num mundo de pobreza e ignorância. Voltar ao passado agrícola, como sonhavam alguns pensadores do início do século XX, não era uma solução praticável, pois entrava em conflito com a tendência para a mecanização que se tornara praticamente instintiva quase no mundo inteiro, e mais: todo país que permanecesse industrialmente atrasado era indefeso do ponto de vista militar e com certeza seria dominado, direta ou indiretamente, por seus antagonistas mais desenvolvidos. Tampouco era satisfatória a solução de manter as massas em estado de pobreza restringindo a produção de bens. Isso aconteceu, em grande medida, durante a fase final do capitalismo, mais ou menos entre 1920 e 1940. Permitiu-se que a economia de muitos países estagnasse, abandonou-se a agricultura, não houve acréscimo de bens de capital e grandes parcelas da população, impedidas de trabalhar, foram mantidas em uma situação de semi-inanição pelos serviços de beneficência do Estado. Mas isso também provocava vulnerabilidade militar, e, visto que as privações infligidas eram obviamente desnecessárias, a oposição se tornava inevitável. O problema era: como manter as rodas da indústria em ação sem aumentar a riqueza real das pessoas? Era preciso produzir mercadorias, mas as mercadorias não podiam ser distribuídas. Na prática, a única maneira de conseguir isso foi com a guerra ininterrupta. O ato essencial da guerra é a destruição, não necessariamente de vidas humanas, mas dos produtos do trabalho humano. A guerra é uma forma de despedaçar, de projetar para a estratosfera ou de afundar nas profundezas domar materiais que, não fosse isso, poderiam ser usados para conferir conforto excessivo às massas e, em consequência, a longo prazo, torná-las inteligentes demais. Mesmo que armas de guerra não sejam efetivamente destruídas, sua fabricação continua sendo uma forma conveniente de utilizar uma mão de obra que não produza nada consumível. A construção de uma Fortaleza Flutuante, por exemplo, mobiliza uma força de trabalho que poderia construir várias centenas de navios cargueiros. Depois de algum tempo, ela é declarada obsoleta sem nunca ter proporcionado nenhum benefício material a ninguém, e, com enorme investimento de trabalho, outra Fortaleza Flutuante é construída. Em princípio, o esforço de guerra é sempre planejado de forma a consumir todo o possível excedente, depois de atendidas as necessidades básicas da população. Na prática, as necessidades da população são sempre subestimadas, verificando-se dessa maneira uma escassez crônica de metade dos artigos necessários à vida; isso, porém, é visto como uma vantagem. É política deliberada manter até mesmo os grupos favorecidos no limite da penúria, uma vez que um estado geral de escassez reforça a importância de pequenos privilégios e assim torna mais marcada a diferença entre um grupo e outro. De acordo com os padrões do início do século XX, mesmo um membro do Núcleo do Partido leva uma vida austera e laboriosa. Ainda assim, os poucos luxos de que usufrui — seu amplo apartamento bem equipado, a textura melhor de suas roupas, a melhor qualidade do que come, bebe e fuma, seus dois ou três empregados, seu carro ou helicóptero particular — colocam-no num mundo bem diferente daquele onde vivemos membros do Partido Exterior, e os membros do Partido Exterior ostentam vantagem similar em relação às massas indistintas a que chamamos “proletas”. A atmosfera social é a de uma cidade sitiada, onde aposse de um naco de carne de cavalo faz a diferença entre riqueza e pobreza. Ao mesmo tempo, a consciência de estar em guerra, e portanto em perigo,faz com que o comissionamento de todo poder a uma pequena casta seja visto como uma condição natural e inevitável de sobrevivência. A guerra, como veremos, não apenas efetua a necessária destruição como a efetua de uma forma psicologicamente aceitável. Em princípio, seria muito simples usar a força de trabalho excedente mundial para construir templos e pirâmides, cavar buracos e tornar a enchê-los, ou mesmo para produzir vastas quantidades de mercadorias e depois queimá-las. Só que isso ofereceria apenas a base econômica para uma sociedade hierárquica: ficaria faltando a base emocional. O que importa aqui não é a disposição das massas, cuja atitude não tem importância desde que elas se mantenham estáveis, trabalhando, mas a disposição do próprio Partido. Espera-se que mesmo o militante mais humilde mostre-se competente, laborioso e até inteligente dentro de certos limites, porém é necessário também que ele seja um fanático crédulo e ignorante e que nele predominem sentimentos como o medo, o ódio, a adulação e um triunfo orgiástico. Em outras palavras, é necessário que ele tenha a mentalidade adequada a um estado de guerra. Não interessa se a guerra está de fato ocorrendo e, visto ser impossível uma vitória decisiva, não importa se a guerra vai bem ou mal. A única coisa necessária é que exista um estado de guerra. A cisão da inteligência que o Partido exige de seus membros, e que se obtém mais facilmente numa atmosfera de guerra, é agora quase universal, mas quanto mais alto se chega na hierarquia, mais ela se acentua. Com efeito, é no Núcleo do Partido que a histeria guerreira e o ódio ao inimigo são mais fortes. Em sua qualidade de administrador, muitas vezes é necessário que um membro do Núcleo do Partido saiba que este ou aquele item do noticiário de guerra é fictício, e acontece com frequência estar ciente de que a guerra inteira é espúria e que ela ou não está acontecendo, ou está acontecendo por razões bem diferentes das declaradas: mas esse conhecimento é facilmente neutralizado pela técnica do duplipensamento. Ao mesmo tempo, nenhum membro do Núcleo do Partido vacila por um instante sequer em sua fé mística de que a guerra é real e de que ela está fadada a terminar coma vitória de Oceânia, que passará a senhora incontestável do mundo.

Disponível em:

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4118309/mod_resource/content/1/1984%20-%20George%20Orwell.pdf

Situação Problema – Aula 1

Como o desenvolvimento tecnocientifico se beneficia dos conflitos mundiais? Para desenvolver sua resposta, analise algum conflito que aconteceu ou ainda acontece ao redor do mundo.

 

 

Aula 2 – A crítica sobre o desenvolvimento tecnocientífico pela Escola de Fraknfurt

Etapa 1: Solicitar que os alunos compartilhem suas respostas sobre a situação problema da aula anterior.

Etapa 2: Fazer a leitura,em conjunto com a turma, de um fragmento do texto “Educação após Auschiwitz” de Theodor Adorno.

Etapa 3:  O docente irá compartilhar um trecho da obra “Maus” de Art Spiegelman e iniciar um debate sobre esses materiais a partir de uma situação problema.

Etapa 4: Feito isso, será proposto aos estudantes que eles tragam para a próxima aula uma obra de arte (visual, musical ou literária) que tenha relação com os temas trabalhados até o momento (nesse momento, a turma será dividida em grupos que permancerão juntos até a última aula sobre o tema).

Fragmento do texto “Educação após Auschwtz” Theodor Adorno

A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação. De tal modo ela precede quaisquer outras que creio não ser possível nem necessário justificá-la. Não consigo entender como até hoje mereceu tão pouca atenção. Justificá-la teria algo de monstruoso em vista de toda monstruosidade ocorrida. Mas a pouca consciência existente em relação a essa exigência e as questões que ela levanta provam que a monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma da persistência da possibilidade de que se repita no que depender do estado de consciência e de inconsciência das pessoas. Qualquer debate acerca de metas educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que Auschwitz não se repita. Ela foi a barbárie contra a qual se dirige toda a educação. Fala-se da ameaça de uma regressão à barbárie. Mas não se trata de uma ameaça, pois Auschwitz foi a regressão; a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que têm de fundamental às condições que geram esta regressão. E isto que apavora. Apesar da não-visibilidade atual dos infortúnios, a pressão social continua se impondo. Ela impele as pessoas em direção ao que é indescritível e que, nos termos da história mundial, culminaria em Auschwitz (Theodor Adorno, 1967).

 

Disponível em:

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5090779/mod_resource/content/1/Adorno-Educacao-apos-Auschwitz.pdf

 

Fragmento do texto - “Palestra sobre Lírica e Sociedade”

Só entende aquilo que o poema diz quem escuta, em sua solidão, a voz da humanidade; mais ainda, a própria solidão da palavra lírica é pré-traçada pela sociedade individualista e, em última análise, atomística, assim como, inversamente, sua capacidade de criar vínculos universais [allgemeine Verbindlichheit] vive da densidade de sua individuação.

O caráter linguístico da arte leva à reflexão sobre o que na arte fala; eis o seu verdadeiro sujeito, e não o que a produz ou a recebe. Esse fenômeno é mascarado pelo eu da lírica que, durante séculos, se impôs e provocou a aparência de evidência da subjetividade poética. Mas ela de nenhum modo é idêntica ao eu, que fala a partir do poema. Não só por causa do caráter de ficção poética da lírica e da música, em que a expressão subjetiva com dificuldade alguma vez coincide imediatamente com os estados do compositor.

Esse pensamento, porém, a interpretação social da lírica, como aliás de todas as obras de arte, não pode portanto ter em mira, sem mediação, a assim chamada posição social ou inserção social dos interesses das obras ou até de seus autores. Tem de estabelecer, em vez disso, como o todo de uma sociedade, em si mesma contraditória, aparece na obra de arte; mostrar em que a obra lhe obedece e em que a ultrapassa.

Disponível em:

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4102084/mod_resource/content/1/Theodor%20W.%20Adorno.%20Palestra%20sobre%20l%C3%ADrica%20e%20sociedade.pdf

 

Tirinha Maus – Art Spiegelman (Capítulo 2 – Parte II páginas 39-45, 2005)

Padrão (template) para submissão de trabalhos ao

 

Situação problema – Aula 2

“Escrever um poema após Auschwitz é um ato bárbaro, e isso corrói até mesmo o conhecimento de por que hoje se tornou impossível escrever poemas. (ADORNO, 1962, p. 29).”

A partir dessa citação de Theodor Adorno, desenvolva uma análise sobre a seguinte situação problema: A barbárie pode ser compreendia como o momento no qual, a sociedade estando em seu mais alto desenvolvimento tecnológico, ainda se encontra atrasada em relação ao próprio sentido de civilidade, agindo com ódio e agressividade primitiva. Dito isso, é possível pensar em uma alternativa – para essa atual situação – por meio da arte?

 

Aula 3 – Vanguardas Artísticas

Etapa 1: O docente iniciará a aula com a música “Rosa de Hiroshima” da Banda Secos e Molhados, e questionará os alunos a respeito da impressão deles sobre a música.
Etapa 2: Os grupos compartilharão com a turma as obras de arte escolhidas e debaterão sobre suas impressões sobre as mesmas.

Etapa 3: O docente iniciará a exposição sobre as vanguardas artísticas do pós-Guerra e apresentará o artista Ai Weiwei para a turma, expondo suas obras.

Etapa 4: Após a exposição o docente irá propor um trabalho para ser realizado pelos alunos e apresentado na próxima aula, tendo como direcionamento a afirmação de Weiwei: “Tudo é arte, tudo é política”

 

Rosa de Hiroshima (Secos e Molhados) –

https://www.youtube.com/watch?v=DwVc0G3IKU4

Biografia

Nascido em 28 de agosto de 1957 em Pequim, é um artista e ativista chinês contemporâneo. O sobrenome original de seu pai (Ai Qing) foi escrito por Jiang (). Ai colaborou com os arquitetos suíços Herzog & de Meuron como consultor artístico no Estádio Nacional de Pequim para os Jogos Olímpicos de 2008.  Como ativista político, ele criou forte e abertamente a postura do governo chinês sobre democracia e direitos humanos. Ele investigou a corrupção e o encobrimento do governo, em particular o escândalo de corrupção das escolas de Sichuan, após o colapso das chamadas "escolas de tofu-dreg" no terremoto de Sichuan de 2008. Em 2011, após sua prisão no aeroporto internacional de Beijing Capitalem 3 de abril, ele foi mantido por 81 dias sem que haja cobrança oficial; funcionários aludiram a suas alegações de "crimes econômicos".

 

Início da vida e do trabalho 

O pai de Ai era o poeta chinês Ai Qing,  que foi denunciado durante o Movimento Anti-Rightist. Em 1958, a família foi enviada para um campo de trabalho em Beidahuang, Heilongjiang, quando Ai tinha um ano de idade. Posteriormente, foram exilados para Shihezi, Xinjiang em 1961, onde viveram por 16 anos. Após a morte de Mao Zedong e o fim da Revolução Cultural, a família voltou a Pequim em 1976.  Em 1978, Ai se matriculou na Academia de Cinema de Pequim e estudou animação.  Em 1978, foi um dos fundadores do grupo de arte de vanguarda , as "Estrelas", juntamente com Ma Desheng, Wang Keping, Huang Rui, Li Shuang, Ah Cheng e Qu Leilei. O grupo se dissolveu em 1983,  ainda Ai participou de shows regulares do grupo Stars, The Stars: Ten Years, 1989 (Galeria Hanart, Hong Kong e Taipei) e uma exposição retrospectiva em Pequim em 2007: Ponto de Origem (Today Art Museum, Pequim). (Disponivel em: https://www.guiadasartes.com.br/ai-wei-wei/biografia).

Obras Ai Weiwei:

Disponível em:

https://www1.folha.uol.com.br/paywall/login.shtml?https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2017/03/1867180-obra-do-chines-ai-weiwei-reproduz-barco-com-258-refugiados-em-praga.shtml

Disponível em:

https://catracalivre.com.br/quem-inova/artista-chines-cria-exposicao-com-14-mil-coletes-de-refugiados-em-berlim/

Texto de apoio:

Disponível em:

http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062018000200007

Trabalho Criativo:

Partindo da premissa que o desenvolvimento tecnocientífico pode ser um dos causadores da barbárie que são as guerras, e tendo a arte de Ai Weiwei como inspiração. O grupo deve criar uma obra (visual, musical ou literária) a partir da afirmação de Weiwei “Tudo é arte, tudo é política” levando em consideração os debates sobre o desenvolvimento tecnocientífico e a barbárie desenvolvido durante as aulas.

 

Aula 4 – Tudo é Arte, tudo é política

Etapa 1: Neste momento, os estudantes irão compartilhar com a turma as obras artísticas que produziram.

Etapa 2: Após as apresentações, será solicitado a produção de uma síntese dos temas trabalhados.

Etapa 3: Sugere-se expor as produções dos alunos pela instituição. 

 

Algumas produções dos estudantes:

Link da poesia visual “O Prisioneiro”:

https://youtu.be/1FyJyjjAqOE

 

Poesia

A civilização leva à barbárie 

Desejos e paixões sentam no trono do esclarecimento

Governam e escravizam

Pessoas viram joguetes nas mãos dos instintos mais primitivos

 

A civilização leva à barbárie 

Carregados pela maré tecnocrata

As ondas quebram nos limites fisiológicos

No mar aberto sujeitos modernos enfrentam tempos fechados

 

A civilização leva à barbárie 

O monopólio da verdade e do poder e o ostracismo do caráter imaginário

O homem como parte da natureza subjugada

Sua humanidade não é considerada

A civilização leva à barbárie

 

(PAUSA)

 

Há tempos que não me permito tempo

Tempo de sentir aquilo que não há em meu peito

De sentir aquilo que não há… Seria o tempo? 

E quando somos introjetados no instantâneo?

Aí meu amigo, aí o tempo some e já não há mais tempo de escutar o eco no tempo

Divagamos infinitamente pra frente, pra trás!

Mas aquilo que morre está sempre no aqui, no agora!

Vivemos tempos confusos irmão, não há mais tempo de entender a informação

Não há tempo de diferenciar vivo ou morto, esquerda ou direita, certo ou errado

E assim ficamos terrivelmente desorientados.

 

Em meio ao caos da realidade que me violenta incessantemente, eu fico me perguntando… o que eu, sujeito exaurido que sou, poderia falar pra edificar um caminho?

 

            Daria conta eu de em meio aos prantos que me cercam, em meio à caótica realidade que me oprime, eu… logo eu que estou cercado por cabrestos… Não! não só cercado, tento também arrancar o meu próprio, crustaceado em minha pele, o qual tenho a impressão de que só sairá no dia que eu arrancar minha face juntamente… e não sei se tenho coragem de perder aquilo que me deixa comum àqueles ao meu redor.

 

            E eu brando novamente. Como é que EU poderia traçar as palavras que nos guiem em meio a escuridão…. Não, talvez a ideia de guiar para um caminho específico seja muito medíocre. Deixe-me refinar este meu desejo de grandeza.

 Como que eu poderia acender uma chama na escuridão?! Chama que não nos deixaria um caminho  certo a seguir, até porque a luminosidade abrange uma certa área, e sempre haverá uma imensidão de caminhos, de cavernas, de um subterrâneo inteiro a ser explorado… mas ao menos deixaríamos de tatear, deixaríamos de o ter perigo de cair em buracos profundos, fétidos com o odor forte da morte, do trabalho forçado, da dominação e objetivação do ser… ao menos, nesses buracos não cairíamos.

 

Lhes apresentei meus anseios megalomaníacos e utópicos. Deixe-me agora lhe  apresentar minha parte miserável!

            Minha ignorância é agigantada, anseio liderar, guiar, refletir, mas por vezes me pego aceitando minha menoridade.

            Tenho medo disso, de sair do instituto, parar de receber estímulos que me façam buscar conhecer… e acabar  me conformando, ou simplesmente reconhecer que esses meus anseios grandiosos… não eram pra mim.

                                    Seria eu neste momento infeliz?

            De fato minhas certezas são poucas, espero que um dia eu finalmente me sinta mais confortável com  a imensidão de dúvidas que assola o pensamento humano, do que com as frágeis respostas que como dunas, se formam mas estão terrivelmente fadadas a mudar.

Eu, do alto da minha ignorância, não tenho nada a lhes ensinar, mas posso evocar um ser iluminado, muito mais vivido que o moleque que vos fala:

            Drummond já dizia:

“O importante é não estar aqui ou ali, mas SER. 

E ser é uma ciência feita de pequenas e grandes observações do cotidiano dentro e fora da pessoa.

Quando não executamos essas observações, não chegamos a ser; apenas estamos desaparecendo”

 

Referências utilizadas na proposta didática:

ADORNO, T. Notas de Literatura I. Tradução e apresentação de Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, 2003.

 

ADORNO, W, T. Educação e emancipação. Tradução Wolfgang Leo Maar. 2ª edição revista. São Paulo: Paz e Terra, 2020.

 

ORWELL, G. 1984. Tradução de Alexandre Hubner e Heloisa Jahn. Companhia das Letras, 2019.

 

SPIEGELMAN, A. Maus. Tradução de Antonio de Macedo Soares. 1ª ed. Quadrinhos na Cia, 2005.

 

 

Considerações Finais:

As aproximações entre diferentes saberes, atualmente, tão demarcados pelas suas especialidades, possibilitam o desenvolvimento de uma compreensão mais abrangente a respeito dos conhecimentos produzidos. A compartimentação dos conteúdos em disciplinas ou áreas de conhecimentos impedem que estudantes, principalmente em formação básica, possam construir um panorama mais estruturado do que é apreendido nas instituições de ensino.

As propostas curriculares, em sua grande maioria, não promovem essa interdisciplinaridade entre os saberes. Fica sob a responsabilidade dos docentes desenvolverem atividades que consigam alcançar minimamente um diálogo entre diferentes conhecimentos. No caso das instituições que oferecem o ensino médio integrado, a integração dos conteúdos entre componentes curriculares é pré-requisito curricular, porém, muitas vezes a realização dessa integração também fica nas mãos dos professores.

Esse trabalho buscou propor atividades didáticas a fim de promover a integração entre diferentes saberes, possibilitando a discussão de temas que correspondam à realidade que o mundo enfrenta, e solicitando aos estudantes que desenvolvam uma produção artística que reflita tais temas, além de trabalhar com diferentes materiais didáticos. Por isso, espera-se que, com esse trabalho, mais propostas possam surgir com o intuito de desmistificar e desfragmentar os conteúdos trabalhados em instituições de educação básica, promovendo assim, a interdisciplinaridade e a integração.

     

Referências:

ADORNO, T. W; HORKHEIMER, M. Dialética do Esclarecimento. Tradução de Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1985.

ASIMOV, I. No mundo da ficção científica. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1984.

BORGES, R. M. R. Em Debate: Cientificidade e Educação em Ciências. 2. ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2007.

BRONOWSKI, J. O olho visionário: ensaios sobre arte, literatura e ciência. Brasília, DF: Editora UNB, 1998.

DELEUZE, G.; GUATTARI, F. O que é a filosofia? São Paulo: Editora 34, 2000.

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ENGLAND, Richard. Creative minds: the search for the reconciling principles of Science, the Humanities, Arts and Religion. Forum on Public Policy: a journal of Oxford Round Table, v. 2009, no. 2.

GOMBRICH, E. H. A História da Arte. Rio de Janeiro: LTC, 2008.

KUHN, T. S. Comentários sobre a relação entre Ciência e Arte. In: A tensão essencial: estudos selecionados sobre tradição e mudança científica. Trad.Marcelo Amaral Penna - Forte. São Paulo: UNESP, 2011.

LEFEBVRE, H. Estrutura social: a reprodução das relações sociais. In: FORACCHI, Marialice Mencarini; MARTINS, José de Souza. Sociologia e sociedade. Rio de Janeiro: LTC, 1977.

MACHADO, R. Deleuze e a filosofia. Rio de Janeiro: Graal, 1990.

MARCONDES, D. Iniciação à História da Filosofia: dos Pré-Socráticos a Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.

MASCARELLO, F. (Org.). História do cinema mundial. Campinas: Papirus, 2006.

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VALÉRY, P. Variedades. São Paulo: Iluminuras, 1991.

ZOLA, Emile. O romance experimental e o naturalismo no teatro. São Paulo: Editora Perspectiva, 1982.

 

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