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Universidade Federal de Santa Maria
Geografia Ensino e Pesquisa, Santa Maria, v. 27, n. 1, e69198, 2024
DOI: 10.5902/2236499469198
ISSN 2236-4994
Submissão: 03/02/2022 • Aprovação: 23/11/2022 • Publicação: 29/12/2023
3.1 Geodiversidade e Geoconservação
3.3 Concepções acerca do turismo de aventura
4.1 Sistematização do Turismo de Aventura em Quixadá - CE.
Meio Ambiente, Paisagem e Qualidade Ambiental
Turismo de aventura e geoconservação em Quixadá/CE: aprofundando discussões sobre a projeção da proposta do Geoparque Sertão Monumental
Adventure tourism and geoconservation in Quixadá, Brazil: deep discussions on the projection of the Sertão Monumental Geopark proposal
Turismo de aventura y geoconservación em Quixadá/CE: profundizando discusiones sobre la proyección de la propuesta del Geoparque Monumental del Sertão
Iana Barbara Oliveira Viana LimaI
I Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil
II Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, Fortaleza, CE, Brasil
RESUMO
O município de Quixadá, localizado no Sertão Central do Ceará, é conhecido como a “Terra dos Monólitos” em virtude de sua expressiva geodiversidade, com destaque aos campos de inselbergues. A combinação de elementos ambientais faz de Quixadá uma área de grande interesse ao desenvolvimento do turismo de aventura, atraindo público nacional e internacional. A pesquisa apresenta um breve panorama do desenvolvimento do turismo de aventura no município, tendo como objetivo aprofundar o debate acerca do turismo de aventura local e a geoconservação, visando alcançar maiores subsídios para a discussão sobre a implantação do Geoparque Sertão Monumental. A metodologia se consistiu em: levantamento bibliográfico; trabalhos de campo; interpretação e sistematização dos resultados. Os resultados demonstraram que o turismo de aventura estabelece uma estreita relação com a geodiversidade local e o seu desenvolvimento se concentra em seis núcleos, inseridos em áreas de relevante expressividade geológica. Foram identificados problemas acerca do turismo de aventura, intensificando a necessidade de um planejamento baseado na geoconservação. Conclui-se que o turismo de aventura no município tem os seus principais núcleos de desenvolvimento na área que compreende a proposta de geoparque, podendo ser um potencializador do turismo, mediante um planejamento turístico comprometido com a geoconservação.
Palavras-chave: Geopatrimônio; Inselbergues; Relevo residual; Geodiversidade; Geoturismo
ABSTRACT
The municipality of Quixadá, located in the Central Sertão of Ceará, is known as the "Land of Monoliths" due to its expressive geodiversity, especially the inselbergs fields. The combination of environmental elements makes Quixadá an area of great interest to the development of adventure tourism, attracting national and international public. The research presents a brief overview of the development of adventure tourism in the city, aiming to deepen the debate about the local adventure tourism and geoconservation, to achieve greater subsidies for the discussion about the implementation of Geopark Sertão Monumental. The methodology consisted in: bibliographical survey; field work; interpretation and systematization of the results. The results showed that adventure tourism establishes a close relationship with the local geodiversity and its development is concentrated in six nuclei, inserted in areas of relevant geological expressivity. Problems about adventure tourism were identified, intensifying the need for planning based on geoconservation. It is concluded that adventure tourism in the municipality has its main centres of development in the area that includes the geopark.
Keywords: Geoheritage; Inselbergs; Residual relief; Geodiversity; Geotourism
RESUMEN
El municipio de Quixadá, situado en el Sertão Central de Ceará, es conocido como la "Tierra de los Monolitos" debido a su expresiva geodiversidad, especialmente los campos de inselbergs. La combinación de elementos ambientales hace de Quixadá una zona de gran interés para el desarrollo del turismo de aventura, atrayendo público nacional e internacional. La investigación presenta un breve panorama del desarrollo del turismo de aventura en la ciudad, con el objetivo de profundizar el debate sobre el turismo de aventura local y la geoconservación, para lograr mayores subsidios para la discusión sobre la implementación del Geopark Sertão Monumental. La metodología consistió en: estudio bibliográfico; trabajo de campo; interpretación y sistematización de los resultados. Los resultados mostraron que el turismo de aventura establece una estrecha relación con la geodiversidad local y su desarrollo se concentra en seis núcleos, insertados en zonas de relevante expresividad geológica. Se identificaron problemas sobre el turismo de aventura, intensificando la necesidad de una planificación basada en la geoconservación. Se concluye que el turismo de aventura en el municipio tiene sus principales focos de desarrollo en la zona que comprende la propuesta de geoparque, y puede ser un potencializador del turismo, a través de una planificación turística comprometida con la geoconservación.
Palabras-clave: Geopatrimonio; Inselbergs; Relieve residual; Geodiversidad; Geoturismo
O fator de destaque deve-se, sobretudo, ao campo de inselbergues existente no território (Figura 2). É essa morfologia que traz relevância não apenas paisagística, mas científica, ambiental, educacional, turística e cultural (Olímpio et al., 2021). Essas formações configuram-se como relevos isolados ou agrupados, compostos por rochas mais resistentes aos processos intempéricos e erosivos, que se destacam em grandes superfícies planas (Bétard; Peulvast; Claudino-Sales, 2008). Essas superfícies aplainadas, como destaca Claudino-Sales (2016), truncam as rochas cristalinas do embasamento ao longo do estado do Ceará (CE).
Figura 1 – Mapa de localização e acesso ao município de Quixadá
Fonte: IPECE(2019), IBGE (2017), COGERH (2021); Organizado pelos autores (2021)
Os inselbergues existentes em Quixadá não se caracterizam apenas como relevos isolados, pois assim classificam-se diversas formações geomorfológicas, mas campos de inselbergues graníticos que de acordo com Maia, Bastos e Nascimento (2018, p. 27) “estão associados a um embasamento ígneo, resultante de intrusões graníticas que afetaram a Província Borborema a partir de várias orogêneses que ocorreram no Pré-Cambriano”.
Esses relevos residuais (inselbergues ou agrupamento deles), como é o caso de Quixadá, resistiram aos velhos processos denudacionais responsáveis pelas superfícies aplainadas dos sertões (AB’ SÁBER, 2003), e ocorrem em grande parte em dois corpos plutônicos: o batólito Quixadá e o Quixeramobim (Maia et al., 2015).
Figura 2 – Mapa de localização e acesso ao município de Quixadá
Fonte: Acervo particular dos autores (2020)
De acordo com os autores supracitados, na área ocorrem exposições em formas de lajedos, maciços e inselbergues e a geologia caracteriza-se pela ocorrência de um corpo intrusivo granítico circundado pelo embasamento encaixante do complexo gnaisse-migmatítico.
A área proposta para o Geoparque Sertão Monumental, possui ainda, uma diversidade de ordens pedológicas devido, entre outros fatores, às diferentes litologias do embasamento cristalino (Maia et al., 2015). Os solos, conforme apresentados em Ceará (2021) para a área, são em geral pouco profundos e não apresentam muitos horizontes, são férteis e por serem rasos, caracterizam-se pela pedregosidade em muitas partes, como é o caso dos neossolos litólicos.
Em toda a área é predominante a vegetação caatinga, sendo também denominada de Savana estépica (Brasil, 2012). No período de estiagem, os solos passam pela escassez hídrica, limitando o desenvolvimento da vegetação e das atividades agrícolas. As atividades socioeconômicas predominantes são a pecuária e a agricultura de subsistência.
Em relação ao turismo local, embora não assuma a mesma relevância das atividades já mencionadas, os segmentos que assumem maior destaque são o turismo religioso, tendo como principal núcleo de desenvolvimento o Santuário de Nossa Senhora Rainha do Sertão, localizado na Serra Urucum e o turismo de aventura, tendo suas atividades concentradas em seis núcleos no município.
A paisagem, que já se tornou a principal referência do município, aliada a condições ideais para o voo livre e escarpas e formações propícias para a escalada, por exemplo, faz com que o local seja conhecido como a “Terra dos Esportes Radicais” (Ceará, 2019). Confere, ainda, um potencial para o uso sustentável, sobretudo, por meio do geoturismo e turismo de aventura (Freitas et al., 2019).
Ainda se faz menção ao desenvolvimento do esporte de aventura, outro segmento turístico presente no município e onde ocorrem diversos campeonatos, como o Sertão Esporte Aventura (2009), Quixadá Xtreme (2015), Campeonato Cearense de Parapente e Asa Delta da rampa do Santuário Nossa Senhora Imaculada Rainha do Sertão (2021).
As condições ambientais de clima tropical quente semiárido, apresentando tipo climático Aw conforme a classificação de Köppen (1918), aliada aos aspectos geomorfológicos e geológicos, dão características a um conjunto paisagístico diferenciado. A variação de altitude, a temperatura, a condição rochosa, a dinâmica dos ventos, a paisagem cênica, os fatores culturais, entre outros (Aguiar et al., 2002).
Em virtude de seu potencial geomorfológico, raridade, singularidade e beleza cênica, no local são identificados uma série de geossítios, constando, inclusive, inscrição como região de geossítios no SIGEP - Comissão Brasileira de Sítios Geológicos e Paleobiológicos, tendo como autores da proposta a profa. Vanda Claudino Sales e o prof. Jean-Pierre Peulvast (Winge et al., 2013).
Conforme Brilha (2005), um geossítio pode ser considerado como uma área de:
Ocorrência de um ou mais elementos da geodiversidade (aflorantes quer em resultado da acção de processos naturais quer devido à intervenção humana), bem delimitado geograficamente e que apresente valor singular do ponto de vista científico, pedagógico, cultural, turístico ou outro (Brilha, 2005, p. 52).
Essas áreas de geossítios, além do potencial científico e educacional, são de considerável importância para o desenvolvimento turístico local, pois os inselbergues, também conhecidos como monólitos, e o seu entorno são palco para práticas turísticas, sobretudo de aventura, tendo como destaque a oferta de escalada, trilhas e o voo livre, este último ofertado nas modalidades parapente e asa delta.
Esse cenário, por sua relevância já citada, possui parte do território protegido como Unidade de Conservação (UC), intitulado “Monumento Natural dos Monólitos de Quixadá (MNMQ)”, uma área de proteção integral com 28.759,56 hectares, criada pelo Decreto N° 26.805, de 25 de outubro de 2002, (Sema, 2021). Ressalta-se que a poligonal não abrange todo o campo de inselbergues da região, pois o mesmo estende-se também para os municípios do entorno, em especial Quixeramobim. Para a criação do MNMQ, foram consideradas as seguintes justificativas:
CONSIDERANDO a raridade e beleza cênicas de grande valor ecológico e turístico dos campos de inselbergues existentes na região de Quixadá; CONSIDERANDO a riqueza natural que garante equilíbrio ecológico ao Sertão Central face às intervenções antrópicas e o desenvolvimento econômico na região (Ceará, 2002).
De acordo com a Lei nº 9.985 (Brasil, 2000), que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), o MNMQ confere a preservação da natureza ao campo de inselbergues, sendo permitido somente o uso indireto dos recursos naturais presentes, e preservação dos sítios naturais raros, singulares ou de grande beleza cênica.
Os Monólitos de Quixadá possuem relevância reconhecida a nível internacional, tendo sido incluído no ano de 2010 como integrante da Associação Mundial de Montanhas Famosas (World Famous Mountains Association – WFMA) (Freitas et al., 2019).
No ano de 2019, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) publicou a proposta do Geoparque Sertão Monumental, tendo como contexto a necessidade de preservação da geodiversidade do campo de inselbergues, trazendo uma identificação e descrição do patrimônio geológico local, a fim de fornecer subsídio técnico para futura proposição de um geoparque na região (idem).
Diante dos mecanismos de preservação já existentes na região, a projeção de um geoparque, diante de todos os benefícios que tal proposta carrega, propicia ao campo de inselbergues aqui tratado, a melhor e mais completa estratégia de proteção do geopatrimônio.
Tal observação resulta da análise da experiência do Geopark Araripe, localizado no Cariri Cearense e o primeiro geoparque do Brasil na Global Geoparks Network - GGN (Rede Global de Geoparks), junto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Nos últimos quinze anos, a sua implantação trouxe benefícios para os municípios que fazem parte do Geopark, sobretudo dando visibilidade ao potencial do geoturismo e propiciando a profissionalização do setor, além de exaltar a riqueza geológica e paleontológica (Ceará, 2019).
Diante do contexto delineado, o objetivo desta pesquisa é o de levantar um debate acerca do turismo de aventura que se desenvolve no município de Quixadá, apresentando suas potencialidades e fragilidades atinentes à geoconservação, considerando que é um segmento que pode ser inserido na dinâmica turística de geoparques.
O desenvolvimento da pesquisa se organizou em três etapas (Figura 3). A primeira etapa corresponde ao levantamento bibliográfico, levantamento de dados secundários e produção cartográfica. Na segunda etapa da pesquisa foram realizados os trabalhos de campo, divididos em dois blocos de visitas com objetivos diferentes. Na terceira etapa da pesquisa foi realizada a sistematização e interpretação dos resultados alcançados, culminando na elaboração de um mapa com os núcleos de turismo de aventura encontrados na área e o detalhamento de sua infraestrutura e serviços.
O levantamento bibliográfico (pesquisa de temas sobre geodiversidade, geoconservação, turismo, turismo de aventura e demais) e de dados secundários (sobre os aspectos históricos, sociais e ambientais da área da pesquisa) foram realizados em bancos de teses, dissertações, artigos científicos em sites como Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), Secretaria de Meio Ambiente (SEMA), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), Serviço Geológico do Brasil (CPRM), Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará (SRH), Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (COGERH) e demais. Nessa etapa foi confeccionado o mapa de localização do município para auxiliar na etapa posterior.
Figura 3 – Etapas metodológicas da pesquisa
Fonte: Os autores (2022)
Ainda na primeira etapa da pesquisa, foram definidos os parâmetros norteadores utilizados para identificar as atividades de turismo de aventura que são oferecidas no local. Para essa identificação, foi tomada como base a classificação disponibilizada pelo Ministério do Turismo do Brasil (2010), que organiza as atividades do segmento nas categorias terra, água e ar.
Na segunda etapa da pesquisa foram realizados os trabalhos de campo, divididos em dois blocos. O primeiro bloco teve como principal objetivo o reconhecimento da área e maior proximidade com a dinâmica turística local. Nele foi feito o reconhecimento da área de pesquisa, as visitas aos principais pontos turísticos do município, o registro fotográfico, a coleta de pontos cartográfico e a aplicação de entrevistas semiestruturada, direcionadas para o representante da secretaria de turismo local, o gestor da unidade ambiental, empresários e funcionários ligados ao setor turístico. A escolha dessa amostra se deu pela pesquisa exploratória de dados secundários e pela observação de campo. Todas as entrevistas foram realizadas de forma presencial no município da pesquisa. Nesse primeiro bloco foram feitas 2 visitas, realizadas em 2018.2 e 2019.1.
Finalizado o primeiro bloco dos trabalhos de campo, com os resultados obtidos nas entrevistas e nas observações, foi identificado que as atividades do turismo de aventura ocorrem de forma concentrada em seis núcleos no município. Como forma de auxiliar os campos futuros, foi elaborado parte do material cartográfico, como as cartas-imagem de cada núcleo do turismo de aventura, mapa geológico, geomorfológico e geoambiental. Para a elaboração desse material, se utilizou o software ArcGIS 10.4 e como base cartográfica, foram utilizadas informações dos sites do IBGE, CPRM, IPECE, COGERH.
O segundo bloco de trabalhos de campo, composto por três visitas realizadas no segundo semestre de 2019, teve como objetivo principal conhecer a dinâmica específica de cada núcleo de turismo de aventura identificado. As visitas foram direcionadas para cada um dos seis núcleos do turismo de aventura, tendo como principal objetivo, conhecer as particularidades da oferta (infraestrutura, sistematização do segmento, gestão, atividades ofertadas, histórico e outros segmentos atuantes no local) e da demanda (perfil do público consumidor do segmento, preferência de atividades e demais informações).
Foram aplicadas entrevistas semiestruturadas (Quadro 1) com pessoas envolvidas diretamente com o turismo de aventura (guias turísticos, instrutores de voo livres, proprietários de equipamentos que ofertam atividades do turismo de aventura e demais) que atuam em cada núcleo. A escolha dessa amostra se deu a partir dos resultados obtidos nas entrevistas e das observações do primeiro bloco de campo.
Quadro 1 – Entrevista aplicada aos gestores, guias e instrutores ligados ao turismo de aventura no município de Quixadá
Fonte: Os autores (2022)
Ainda nesse momento foi feita a identificação das atividades do segmento ofertadas nos núcleos, com base nas categorias da classificação do Ministério do Turismo do Brasil (2010). Todas as entrevistas aconteceram presencialmente.
Na terceira etapa da pesquisa, foi feita a interpretação e sistematização da estrutura do turismo de aventura no município, apontando os núcleos de concentração, as atividades que são ofertadas, as potencialidades, as limitações e os problemas acerca do desenvolvimento do segmento. A partir do software ArcGIS, versão 10.4, foi elaborado o mapa de localização dos seis núcleos.
3.1 Geodiversidade e Geoconservação
A geodiversidade pode ser entendida como a variedade de elementos geológicos que suportam a vida e funcionam como substrato para o desenvolvimento humano. Suplementa a noção corrente de biodiversidade como mais um elemento do meio natural a ser avaliado na caracterização de um dado território, seja para protegê-lo, seja para ordenar sua ocupação ou uso (Mansur, 2018).
Pode ainda ser definida simplesmente como a diversidade da geologia (rochas, minerais e fósseis), da geomorfologia (formas da Terra e processos físicos) e das características do solo (Gray, 2005).
De acordo com Gray (idem), esses elementos apresentam valor intrínseco cultural (folclórico, arqueológico, histórico, espiritual), estético (paisagem local, geoturismo, inspiração artística etc.), econômico (minerais industriais, minerais metálicos etc.), funcional (funções geossistêmicas e dos solos) e científico (pesquisas em geociências, monitoramento ambiental, etc.).
Tais elementos, representados pela geodiversidade, apresentam alto valor científico, pois são testemunhas do processo de formação e transformação do planeta. São uma herança produzida pelo tempo geológico. São patrimônio geológico, testemunhos da história da formação do planeta, ou segundo Rodrigues e Fonseca (2008): geopatrimônio (equivalente do termo em inglês a geoheritage), o qual pode ser entendido como o conjunto de valores que representa a geodiversidade do território, pois apresenta particular interesse científico e didático e esclarece a importância de forças endógenas nas etapas de evolução da história da Terra.
Mas, apesar dos valores descritos, a geodiversidade é ameaçada pelas diversas atividades humanas: mineração, urbanização, turismo não planejado, entre outras. Nesse contexto, a geoconservação é uma ferramenta indispensável na preservação do geopatrimônio.
No início dos anos 1990 o termo geoconservação foi citado pela primeira vez na literatura alemã e inglesa. Sharples (1993) descreveu que a geoconservação tinha como propósito manter a diversidade de feições e sistemas da Terra propiciando sua contínua funcionalidade e evolução natural.
Já em meados dos anos 2000, o mesmo autor acrescenta que a geoconservação objetiva a preservação da geodiversidade relacionada aos processos e feições geológicas, geomorfológicas e de solo (Mansur, 2018). Brilha (idem) acrescentou ao conceito da Sharples (1993, 2002) a gestão do patrimônio geológico e dos processos naturais (idem).
A geoconservação deve ser conduzida a partir das necessidades de conservação da geodiversidade relacionadas ao valor e ameaças reais e potenciais a ela (Gray, 2005). O desenvolvimento deste artigo adota a geoconservação a partir do conceito aprofundado de Brilha (2005), pois considera que a conservação do campo de inselbergues de Quixadá deve promover a sustentabilidade das relações de uso existentes na região, sobretudo o turismo de aventura.
Brilha (2005) sugeriu que os passos para se alcançar a geoconservação podem ser divididos em seis etapas, sendo elas: a produção de inventário dos patrimônios natural, construído, material e imaterial; a quantificação do valor, ou seja, a relevância do patrimônio; a classificação, onde enquadram-se os geossítios, que de acordo com Brilha são áreas que apresentam relevante interesse geomorfológico de interesse de acordo com a legislação vigente; a conservação que visa a manutenção da integridade do geossítio; a valorização e divulgação visando demonstrar a importância do geossítio; e o monitoramento onde deve-se realizar acompanhamento da situação dos geossítios (Mansur, 2018).
Nesse sentido, os estudos levantados para a produção do Projeto Geoparques – Geoparque Sertão Monumental, de Freitas et al. (2019), apresentam importante levantamento, capaz de subsidiar a projeção do Geoparque em questão, que até o levantamento deste estudo, encontra-se na categoria de projeto. O documento subsidia uma parte das etapas propostas por Brilha (2016), sobretudo por seu caráter de inventário e classificação dos diversos patrimônios.
Freitas et al. (idem) fazem ainda uma classificação entre geossítios e sítios da geodiversidade. Apresenta, também, informações adicionais referentes aos potenciais de uso, como o turismo e os esportes de aventura, referindo-se ao município de Quixadá como “um dos melhores locais do mundo para a prática de voo livre, devido às térmicas da região” (Freitas et al., 2019, p. 63).
Dentro desse contexto, uma importante estratégia de geoconservação é a criação de geoparques, aliando a conservação do patrimônio geológico à sustentabilidade das ações desenvolvidas no território, conforme delineado no tópico a seguir.
3.2 Geoparques e Turismo
No Brasil, a geoconservação enquanto prioridade, não é um objetivo contemplado pelo SNUC, fazendo-se necessário uma estratégia específica. A única referência feita pelo documento ao conjunto dos aspectos abióticos está em seu Art. 4, que cita a proteção das “características relevantes de natureza geológica, geomorfológica, espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural”, como um de seus objetivos.
Tal necessidade vai ao encontro dos objetivos de um geoparque, pois o mesmo visa a geoconservação, promovendo o desenvolvimento econômico e cultural local, sobretudo por meio do turismo (Moreira; Vale, 2018).
Nesse contexto, os geoparques, de acordo com a Unesco (2021), consistem em:
Áreas geográficas únicas e unificadas, onde locais e paisagens de importância geológica internacional são gerenciados com um conceito holístico de proteção, educação e desenvolvimento sustentável. (Unesco, 2021, tradução nossa).
A criação de um geoparque representa um meio relevante para a concretização de desenvolvimento sustentável (Brilha, 2005). Nesse sentido, “um geoparque é uma área em que se conjuga a geoconservação e o desenvolvimento econômico sustentável das populações em que habitam" (idem, p. 119).
Além do geoparque constatar sua relevância geológica internacional, o mesmo deve ter o intuito de explorar, desenvolver e celebrar, as relações entre o patrimônio geológico e os fatores naturais, culturais e imateriais presentes na área (Unesco, 2021).
Em conformidade com os conceitos de geoparque apresentados pela Unesco, foi criado pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM, 2006), o projeto Geoparque, tendo papel fundamental na criação de geoparques no país (CPRM, 2021). O projeto tem como princípio básico a “identificação, levantamento, descrição, diagnóstico e ampla divulgação de áreas com potencial para futuros geoparques no território nacional, bem como o inventário e quantificação de geossítios” (Schobbenhaus; Silva, 2012, p.17).
Existem atualmente 177 geoparques mundiais da Unesco, em 46 países, sendo o Geopark Araripe (CE), o primeiro geoparque mundial do Brasil, seguido pelos Geoparques Seridó (RN) e Caminhos dos Cânions do Sul (SC e RS), estes dois últimos nomeados no ano de 2022 (Unesco, 2022). O Brasil apresenta um grande potencial para propostas de criação de geoparque, como salienta Schobbenhaus e Silva (2012), por possuir imensa extensão de território com rica geodiversidade e valor geológico, ecológico, arqueológico, histórico ou cultural.
Além do caráter educacional e científico, os geoparques possuem como um de seus pilares o turismo, assim destaca Gomes, Barros e Santos (2015, p. 1):
Os geoparques são uma marca atribuída a UNESCO em que trabalham um conceito holístico de educação, conservação e turismo. São territórios que enfatizam feições geológicas de singular valor, o que convém a deixar claro que um geoparque não é apenas geologia, mais a ligação e junção de elementos turísticos, científicos, culturais e arqueológicos que se somam e resultam em um atrativo turístico de forma diferenciada.
Conforme Moreira e Meléndez (2012), nas áreas de geoparques podem ser identificadas variadas potencialidades turísticas, possibilitando a articulação de segmentos que potencializam o desenvolvimento do turismo local. De acordo com a pesquisa realizada pelos autores em 37 representantes da GGN, instalados no Brasil (Geopark Araripe) e em mais 17 países, foram identificados os principais segmentos turísticos presentes nas áreas de geoparques analisadas. Na primeira posição do ranking, aparece o Ecoturismo (83%), seguido pelo turismo histórico (81%), turismo rural (75%), turismo culinário (64%) e turismo de aventura (61%).
Moreira e Meléndez (2012) afirmam que os diversos segmentos turísticos existentes em uma área de geoparque podem se configurar de forma positiva, atribuindo diversidade ao produto turístico, uma vez que os recursos interpretativos geológicos podem ser utilizados por vários segmentos turísticos de áreas naturais.
A presente pesquisa tem como recorte o turismo de aventura por ser um dos principais segmentos identificados na área de pesquisa e por acreditar que ele pode fomentar o desenvolvimento turístico na proposta de geoparque.
3.3 Concepções acerca do turismo de aventura
As diversas motivações levam à um processo de especificidade na oferta de produtos turísticos, pois as transformações ocorridas ao longo do tempo, culminam no surgimento de novos interesses e demandas, refletindo no mercado turístico a necessidade de estratégias para atender os clientes que buscam por vivências diferentes das que são ofertadas no turismo convencional.
A partir da intensificação do debate acerca das formas insustentáveis do desenvolvimento turístico, no final do século XX, surgiu a necessidade de repensar estratégias contextualizadas para o setor, tendo como princípios norteadores: atender as necessidades dos turistas, satisfazer interesses econômico e considerar a importância da preservação ambiental, como tentativa de assegurar a qualidade de vida das gerações futuras (Swarbrooke, 2000).
Machado e Bazotti (2012) afirmam que paradigmas e interesses da sociedade contemporânea influenciaram o surgimento de novas formas de turismo que divergem da proposta do turismo de massa, fazendo com que, segundo Moraes (1999), o mercado percebesse a necessidade de diversificar a oferta para alcançar os interesses de um público consumidor que busca por produtos específicos.
A partir dessa perspectiva, nas últimas décadas surge uma série de segmentos que tem como principal atrativo o potencial geológico e geomorfológico: “com essa crescente segmentação, independentemente da motivação, o turismo utiliza em diversos dos seus segmentos atrativos geológicos e geomorfológicos, como praias, rios, cavernas, montanhas, lagoas, paredões rochosos, fontes termais, cachoeiras, vulcões, cânions, entre outros” (Moreira, 2014, p. 21).
O turismo de aventura é um desses segmentos e as suas bases de origem estão atreladas ao Ecoturismo, no entanto, o seu desenvolvimento ao longo dos anos o consolidou como um segmento específico do turismo, com oferta de atividades, perfil de público e motivações próprios que o diferenciam do ecoturismo (Machado; Bazotti, 2012).
Coriolano e Morais (2011) afirmam que a principal diferença entre os dois segmentos é a forma como o turista se relaciona com o meio visitado. No turismo de aventura, a interação ocorre através de atividades que envolvem risco e adrenalina.
Além do ecoturismo, o esporte de aventura é outro segmento frequentemente atrelado ao turismo de aventura, em virtude das similaridades das atividades ofertadas, cabendo uma breve explicação sobre as divergências entre ambos.
Conforme Brasil (2010), enquanto o turismo de aventura trata-se de um segmento mais relacionado às práticas na natureza e com atividades adaptadas para o entretenimento, sem o caráter competitivo, o esporte de aventura tem como algumas de suas características o caráter competitivo, sendo algumas vezes realizados em de forma campeonatos e torneios, podendo envolver premiações.
O turismo de aventura oferta atividades com certo nível de risco, que atrai um público com interesse em conhecer lugares exóticos e estabelecer contato direto com a natureza do destino visitado, oscilando entre a tranquilidade oferecida pelo meio ambiente e a adrenalina das atividades de aventura (Swarbrooke; Leckie; Beard, 2003).
Por se tratar de um segmento ainda recente, especialmente na literatura, o conceito do turismo de aventura ainda não se encontra totalmente consolidado, porém Vasconcelos, Silva e Costa (2012) afirmam que mesmo existindo variações, elas se complementam e compartilham como elementos comuns à ideia de sustentabilidade ambiental e à prática de atividades estimulantes em interação com a natureza.
Conforme Brasil (2010, p. 19), o “Turismo de Aventura compreende os movimentos turísticos decorrentes da prática de atividades de aventura de caráter recreativo e não competitivo”. As atividades do turismo de aventura estão organizadas nas categorias água, terra e ar.
O turismo de aventura encontra cenário promissor ao seu desenvolvimento no Brasil, principalmente em virtude da riqueza e diversidade paisagística, ambiental e cultural. Geralmente desenvolvido em ambientes naturais, o segmento é um dos fatores de atração para turistas nacionais e internacionais, principalmente em áreas diferenciadas, como os geoparques (Moreira; Meléndez, 2012; Moreira, 2014).
Além do turismo de aventura encontrar potencialidades férteis no país, possuir uma perspectiva sustentável em sua essência e ser um segmento em ascensão a nível global, pode ser uma alternativa para inserir em roteiros turísticos, localidades que possuem potencial, mas que não são contempladas pelo turismo convencional, como é o caso do município de Quixadá, área de estudo da presente pesquisa e inserido em um estado amplamente difundido pelo turismo de sol e praia.
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1 Sistematização do Turismo de Aventura em Quixadá - CE
Com a efetivação da pesquisa, foi identificado que o desenvolvimento do turismo de aventura no município ocorre de forma concentrada em seis principais núcleos. São eles: Sede Municipal; Fazenda Magé; Bacia do Cedro; Serra do Urucum; Juatama-Hotel Pedra dos Ventos e Conjunto de Serrotes; Serra do Estevão (Figura 4).
Figura 4 – Mapa de localização e acesso dos Núcleos de desenvolvimento do turismo de aventura no município de Quixadá
Fonte: Lima (2020)
Parte dos atrativos principais dos seis núcleos (Figura 5) estão inseridos em áreas de nítida expressão geológica no município e possuem potencial educacional, turístico, paisagístico, arquitetônico e científico que variam na escala de relevância regional, nacional e internacional (Olímpio et al., 2021). Cada núcleo possui suas especificidades em relação a infraestrutura, gestão, oferta de atividades, potencialidades, problemas e fragilidades, sendo geridos e estruturados de forma independente entre si.
Figura 5 – Núcleos de desenvolvimento do turismo de aventura em Quixadá
Fonte: Acervo particular dos autores (2021)
O primeiro núcleo em destaque foi nomeado de Sede Municipal, por abranger a sede de Quixadá e o seu entorno. Por sua localização, inserido no principal perímetro urbano do município, o núcleo em questão apresenta a maior concentração da oferta de equipamentos de apoio para o desenvolvimento turístico (meios de hospedagens, equipamentos de alimentação, agências bancárias e de turismo, entre outros).
Além da infraestrutura de suporte, o núcleo se destaca pelos afloramentos rochosos que são atrativos do turismo de aventura, como a Pedra do Cruzeiro (Figura 4-F) inserida em meio à dinâmica urbana do centro da sede e que, conforme Freitas et al. (2019), possui valor científico de relevância internacional e bom potencial para o uso didático. Além da Pedra do Cruzeiro, cita-se a Pedra do Barney, Pedra Cabeça da Bruxa, Gruta Psicose, Conjunto de Monólitos do Eurípedes, Vale Perdido, como atrativos que integram o principal roteiro de turismo de aventura oferecido pelas agências de turismo receptivo e guias de turismo locais.
Nesses locais acontecem a prática de caminhada e escalada que podem acontecer de forma guiada, com profissionais independentes ou vinculados à agências de turismo, e ainda podem ocorrer de forma autônoma, devido a facilidades de acesso de alguns pontos do núcleo Sede Municipal, dificultando o controle do número de visitas, público e possíveis impactos que podem ocorrer em função do turismo. Sendo assim, identifica-se nesse núcleo uma considerável fragilidade em relação a sua geoconservação, evidenciando-se a necessidade de maior acompanhamento.
O próximo núcleo identificado foi o Fazenda Magé, distando aproximadamente 2,5 km da sede do município. Embora se estabeleça nas proximidades do núcleo Sede Municipal, optou-se por uma classificação independente, pois no núcleo existem importantes atrativos turísticos, característicos da identidade do local, além de ser uma propriedade privada e delimitada.
A oferta de atividades turísticas na fazenda se iniciou em 1997, motivada pelo relevante potencial ambiental da propriedade. Atualmente as atividades do segmento identificadas nesse núcleo foram: caminhada; caminhada sem pernoite; cicloturismo; espeleoturismo; escalada; montanhismo. Em sua infraestrutura, o núcleo oferta o serviço de hospedagem com café da manhã e um restaurante que funciona mediante agendamento e, inclusive, é um dos atrativos turísticos locais por sua estrutura rochosa.
Ainda são pontuados como atrativos, a árvore do gênero Ceiba – da família Malvaceae, popularmente conhecida como “árvore barriguda” – e a Gruta do Magé. A Árvore Barriguda (Figura 4-C) é uma das principais referências turísticas do núcleo e onde se realiza a atividade de caminhada. De igual relevância turística local, a Gruta do Magé é outro atrativo do turismo de aventura, obtendo em 2018 o cadastro no Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (CECAV, 2018) – código: CE00021. De acordo com Freitas et al. (op. cit.), a Gruta do Magé possui valor científico de relevância nacional, além do significativo valor didático.
Diferente do núcleo anterior, por se tratar de uma propriedade privada e que possui fiscalização, o acesso e permanência do turista passam por maior controle, facilitando o monitoramento do número de visitantes, possibilitando repasse de instruções de geoconservação para os turistas, identificação de impactos ambientais oriundos das práticas turísticas e demais.
Em seguida, se identificou a Bacia do Cedro como outro núcleo do turismo de aventura. Sua distância em relação à sede do município é de aproximadamente 6,5 Km. A Bacia do Cedro se caracteriza como um relevante ponto, não apenas para o turismo de aventura, mas para o turismo de forma abrangente, pois nele está a paisagem referência de Quixadá, o afloramento rochoso conhecido como a Pedra da Galinha Choca (Figura 4-A).
O núcleo ainda tem considerável importância no segmento de turismo histórico/cultural, pois é cenário da primeira grande obra nacional para mitigação dos impactos da seca no Nordeste brasileiro, a barragem do Açude Cedro, entre os anos de 1877 e 1879 (Behr, 2007).
Em relação ao turismo de aventura, seus principais atrativos são a Pedra Faladeira, onde se realizam as atividades de escalada; a própria Pedra da Galinha Choca, com a prática de caminhadas, escaladas e, conforme Freitas et al. (op. cit.), com valor científico de relevância internacional e vasto potencial didático; a Pedra do Sapo, nas proximidades do Açude Cedro e onde se realizam trilhas.
Em sua infraestrutura, o núcleo disponibiliza serviços de alimentação, como restaurantes e quiosques, mas não oferta equipamentos de hospedagem. As atividades do segmento que foram identificadas em desenvolvimento no local foram escaladas e caminhadas.
Embora exista uma estação do Departamento Nacional de Obras Contra a Seca -DNOCS no local, o acesso e prática de atividades turísticas ocorrem de forma liberada, sem controle de visitas ou acompanhamento dos impactos que o turismo pode causar, fazendo do núcleo um local vulnerável a possíveis impactos como poluição e depredação do patrimônio.
O núcleo Serra do Urucum – Santuário encontra-se aproximadamente 11 km de distância da sede de Quixadá e representa um importante núcleo do turismo de aventura por ser referência na prática de voo livre (Figura 4-E), realizando voos de parapente e asa delta, além de ser a estação de rampas mais próxima a sede municipal, favorecendo o acesso. Ainda se faz importante destacar que o núcleo representa o marco inicial do desenvolvimento do turismo de aventura no município, palco para a realização do primeiro salto de voo livre na década de 1990.
Em relação a infraestrutura de apoio ao turismo, o núcleo disponibiliza um hotel com 65 leitos. No entanto, é importante mencionar que a demanda que frequenta o equipamento é formada, em sua maioria, por turistas que têm como principal motivação o turismo religioso, uma vez que o núcleo é também referência desse segmento (Lima, 2020). Há ainda no local um restaurante que atende os hóspedes do hotel.
Atualmente existem duas rampas de voo, que são ofertados na modalidade duplo (quando o turista é acompanhado por um instrutor) ou na modalidade individual (quando o turista, mediante comprovada a habilidade, realiza o voo sozinho, sob a preparação e supervisão do instrutor). Ainda como atrativo, há um mirante com vista panorâmica das feições geomorfológicas do município. Conforme Freitas et al. (op.cit.), o núcleo possui valor científico de relevância nacional e grande potencial educacional.
Por ser um núcleo predominantemente voltado para a prática do voo livre, considerando apenas as atividades do turismo de aventura, o acesso ao local é feito por turistas acompanhados de instrutores. No entanto, pela falta de controle, monitoramento e por ser usado por profissionais que atuam de forma independente entre si, há certa dificuldade em acompanhar o registro de visitas.
O núcleo Juatama – Hotel Pedra dos Ventos localiza-se a aproximadamente 17 km da sede municipal de Quixadá. Por ser a principal referência de turismo de aventura no distrito de Juatama, optou-se por incorporar ao nome do núcleo o hotel que dá nome ao mesmo. O empreendimento ainda se destaca como o principal equipamento turístico, oferecendo serviços de hospedagem, alimentação e entretenimento.
As atividades de turismo de aventura desenvolvidas atualmente nesse núcleo são: caminhada com pernoite (treking), caminhada sem pernoite (hiking), escalada, montanhismo e voo livre (parapente e asa delta). Demais atividades pertinentes ao segmento estão em fase de desenvolvimento, como o canionismo, o cicloturismo, a tirolesa e o arvorismo, e outras em fase de implementação, como o rafting.
Dentre as atividades ofertadas, o voo livre merece especial destaque, pois o hotel possui duas rampas para salto, uma delas é a única de grama sintética da região. No local já foram realizados encontros e eventos relacionados à prática da atividade. Ainda como atrativos turísticos, se aponta o mirante localizado no empreendimento e que permite uma vista privilegiada (Figura 4-F), com valor científico de relevância nacional e grande potencial de uso didático, sobretudo, com interesses geomorfológico, paisagístico, ígneo e ecológico (op. cit.).
Assim como o núcleo Fazenda Magé, o Juatama possui controle no acesso e na realização das atividades ofertadas, podendo auxiliar no monitoramento dos impactos do turismo no local.
O sexto núcleo em destaque é a Serra do Estevão, com aproximadamente 21 km de distância da sede municipal e por volta de 750 m de altitude. Considerado um local com vasto potencial turístico, o principal equipamento de hospedagem é a Casa de Repouso São José, com 150 leitos. Entre seus atrativos, destaca-se o mirante, com valor científico de relevância regional e potencial de uso didático (Figura 4-E).
As atividades do turismo de aventura que foram identificadas na área foram escaladas e caminhada sem pernoite, sendo a trilha dos macacos e a trilha do mosteiro as principais ofertadas. No núcleo existe um paredão rochoso que permite a prática de escalada, no entanto, a atividade no local acontece de forma esporádica em virtude da dificuldade de acesso. Mesmo com o potencial turístico, científico, educacional e da realização pontual de algumas atividades do turismo de aventura, o núcleo necessita de maior divulgação e de ações voltadas à valorização do potencial existente do local.
4.2 Fragilidades e Potencialidades: Contribuições do Turismo De Aventura Para A Geoconservação E Consolidação Das Ações Do Geoparque Sertão Monumental
Moreira (2014) afirma que o turismo de aventura é um segmento que estabelece intrínseca relação com a geodiversidade, visto que muitas de suas atividades são ofertadas utilizando-se do relevo. Em Quixadá, com a identificação dos seis núcleos de desenvolvimento do turismo de aventura, é evidente a ligação direta que há entre o segmento e os elementos da geodiversidade local (Figura 4).
A partir da análise do Mapa de desenvolvimento do turismo de aventura no Geoparque Sertão Monumental, observa-se que todos os núcleos estão inseridos em áreas com considerável expressão geomorfológica. Os núcleos Serra do Urucum - Santuário e Serra do Estevão se encontram em relevo de domínio serrano e os demais núcleos estão nos campos de inselbergues.
Parte das atividades do turismo de aventuras realizadas nos núcleos ocorrem nas feições rochosas: a atividade de escalada, por exemplo, na Pedra da Faladeira e na Pedra da Galinha Choca (núcleo Bacia do Cedro), no Vale Perdido (Sede Municipal), e na Pedra Riscadas (núcleo Juatama); as atividades de caminhadas (trilhas), destacando-se a Gruta do Magé (núcleo Fazenda Magé) e Pedra do Cruzeiro (núcleo Sede Municipal). Ainda se aponta a prática do voo livre, realizada no núcleo Serra do Urucum e Juatama – Hotel Pedra dos Ventos, com saltos realizados nas formações com grandes altitudes.
Embora o turismo de aventura esteja presente nos seis núcleos, as particularidades de cada um influenciam nas formas de uso e desenvolvimento turístico. O núcleo Fazenda Magé e o núcleo Juatama - Hotel Pedra dos Ventos, são propriedade privadas e o desenvolvimento das atividades turísticas é monitorado, necessitando de autorização e acompanhamento para serem realizadas. Essa dinâmica permite maior controle dos possíveis impactos e problemas.
Os demais núcleos em questão não se configuram como propriedade privada, não possuem algum monitoramento de órgãos locais e a grande maioria tem facilidade de acesso, fazendo com que turistas e moradores locais possam desenvolver atividades, especialmente trilhas, de forma autônoma, inviabilizando o controle de quem frequenta e dos possíveis impactos que essa visitação pode causar no local.
Entre os núcleos que apresentam essa fragilidade, a Sede Municipal merece um destaque especial em relação aos problemas relacionados com a geoconservação, pois a sua proximidade com o núcleo urbano e a facilidade de acesso aos pontos do turismo de aventura, facilitando a visitação do turista de forma autônoma, fazem com que o núcleo esteja amplamente exposto aos impactos provenientes dessa dinâmica. Migon e Maia (2020) apontam a Pedra do Cruzeiro, um dos principais atrativos do turismo de aventura nesse núcleo, como sendo um ponto de considerável vulnerabilidade às pressões urbanas.
Além da Pedra do Cruzeiro, o Vale Perdido, a Caverna Psicose, o Conjunto de Monólitos do Eurípides são alguns dos pontos de atividades do turismo de aventura que com debilidade ao que se refere o controle de acesso e que são locais de relevante interesse geomorfológico e educacional.
Ainda no decorrer da pesquisa foram identificados problemas e limitações nos núcleos destacados, entre eles: ausência ou deterioração de placas direcionais, que devem conter informações importantes para a locomoção do turista no destino (Guedes; Leão, 2007); ausência de placas interpretativas, que devem possuir informações pertinentes, levando ao turista maior conhecimento sobre o local visitado (idem); necessidade de maior manutenção de alguns núcleos, com enfoque para o Serra do Urucum, o Sede Municipal, o Bacia do Cedro; necessidade de estratégias que incluam as comunidade locais na dinâmica do turismo; incentivo a formação e manutenção de grupos de turismo de aventura; Investimento na formação e capacitação de guias turísticos.
Díaz-Carríon (2012) destaca que o grau de comprometimento do turismo de aventura com a sustentabilidade ambiental e social depende da forma como é planejado, existindo destinos que possuem um elevado grau de comprometimento, refletindo-se em impactos positivos para o meio ambiente e destinos que possuem um grau com menos comprometimento, priorizando majoritariamente a esfera econômica.
No entanto, embora o turismo de aventura esteja inserido em uma perspectiva mercadológica, influenciado pelo modismo e consumismo, quando se desenvolve a partir de um planejamento comprometido com a preservação ambiental e com a inclusão das comunidades locais, o segmento pode ser um caminho para um desenvolvimento turístico mais significativo, estimulando maior proximidade entre o turista, a comunidade local e o meio ambiente (Lavoura; Schwartz; Machado, 2008).
No caso de Quixadá, a interrelação que existe entre a geodiversidade e o turismo local requer maior atenção e a necessidade de um planejamento turístico com base na sustentabilidade ambiental, garantindo a qualidade ambiental e a própria manutenção das atividades de turismo.
Ainda se faz necessário reforçar o potencial educacional e científico dos núcleos analisados, se configurando como um cenário prolífero para difusão de conhecimento para os visitantes. Migón e Maia (2020) afirmam que diante do potencial encontrado, acredita-se que, através de estratégias de geointerpretação, a área deve ser amplamente apreciada e não apenas restrita ao meio geocientífico.
Conforme Moreira e Meléndez (2012), mesmo antes da implementação do geoparque, alguns lugares já têm a manifestação de segmentos turísticos, como o turismo de aventura, e esses podem ser viabilizados e contextualizados aos interesses do geoparque, articulando-se ao geoturismo.
Ainda se destaca que o turismo de aventura local necessita de uma perspectiva mais sustentável, comprometida com a geoconservação, que auxiliem na promoção e divulgação do geoconhecimento, o que pode ser alcançado com a inserção desse segmento como uma das possibilidades turísticas na proposta de geoparque.
Acredita-se que o turismo de aventura desenvolvido no município de Quixadá, considerado como segmento dentro de um planejamento turístico de geoparque, pode contribuir de forma positiva, posto que possui vasto potencial turístico, ecológico, educacional, científico, além de já existir a sistematização e projeção do segmento em nível regional, nacional e internacional.
Na presente pesquisa, foi apontado um panorama do desenvolvimento do turismo de aventura no município de Quixadá, destacando os principais núcleos do segmento, suas atividades, infraestrutura, potencialidades, problemas e limitações. Ao longo da pesquisa, se faz evidente a estreita relação estabelecida entre o turismo de aventura e a geodiversidade local, reforçando a necessidade de aprofundar o debate acerca do desenvolvimento turístico do município.
A proposta de implantação do Geoparque Sertão Monumental na área do município de Quixadá e Quixeramobim (CE), possui, dentre outros fatores, grande relevância para a valorização da geodiversidade local e para o desenvolvimento de políticas de conservação e preservação aos territórios dos inselbergues, através do geoparque que contempla 20 sítios de interesse geológico/geomorfológico identificados (FREITAS et al., 2019).
Apesar da referência feita no projeto da Proposta do Geoparque Sertão Monumental e mesmo carregando o importante título de “A capital cearense dos esportes radicais”, o município ainda carece de detalhamentos e aprofundado debate sobre como a atividade turística em destaque pode contribuir e ser desenvolvida no contexto do geoparque.
Ainda que o turismo de aventura seja desenvolvido no município, projetando seu reconhecimento em escala internacional, se percebe a necessidade de maior amadurecimento e de um planejamento que considere estratégias e ações voltadas para a geoconservação. Diante dos problemas e fragilidades apontados, repensar caminhos é fundamental para alinhar o desenvolvimento turístico local à proposta de geoparque, ampliando o grau de comprometimento do turismo de aventura com a sustentabilidade ambiental e social.
Como já mencionado, a área é um cenário promissor para a divulgação científica e educação ambiental através das práticas turísticas, proporcionando, além do próprio entretenimento que já é característico do turismo, uma oportunidade em adquirir conhecimentos sobre o destino visitado. Acredita-se que, a partir de experiências já implementadas em outros geoparques e mediante um planejamento comprometido, o turismo de aventura pode contribuir positivamente para o desenvolvimento turístico local.
A intenção desta pesquisa não era a de esgotar as discussões acerca de turismo de aventura em Quixadá, mas sim aprofundá-las, bem como elencar potencialidades e fragilidades, associando com a geoconservação, com vistas a trazer maiores subsídios para a implantação do Geoparque Sertão Monumental. Como o projeto do Geoparque Sertão Monumental abrange também a área do município de Quixeramobim, é de extrema relevância que um levantamento similar seja realizado naquele município.
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Contribuição de autoria
1 – Iana Barbara Oliveira Viana Lima
Pós-doutoranda em Geografia pela Universidade Federal do Ceará.
https://orcid.org/0000-0002-0351-7190 • iana.barbara0@gmail.com
Contribuição: Primeira redação/ escrita – revisão e edição; Conceituação; Investigação
2 – Caroline Domingos de Amorim
Mestranda em Geografia pela Universidade Federal do Ceará- UFC.
https://orcid.org/0000-0002-3245-1290 • carolinedomingosdeamorim@gmail.com
Contribuição: Primeira redação/ escrita – revisão e edição; Conceituação; Investigação
3 – Caroline Vitor Loureiro
Doutora em Geografia; Universidade Federal do Ceará – UFC
https://orcid.org/0000-0002-1870-6744 • caroline.loureiro@ifce.edu.br
Contribuição: Escrita – revisão e edição; Supervisão
4 – Carlos Henrique Sopchaki
Doutor em Geografia; Universidade Federal do Ceará – UFC
https://orcid.org/0000-0001-8127-4529 • csopchaki@gmail.com
Contribuição: Escrita – revisão e edição; Supervisão
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