Universidade Federal de Santa Maria

Geografia, Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 26, e3, 2022

DOI: 10.5902/2236499465327

ISSN 2236-4994

Submissão: 18/04/2021 Aprovação: 31/01/2022 Publicação: 14/06/2022

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.. 3

2 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS MOTIVADA PELAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS DE ACESSO AO ENSINO SUPERIOR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES. 10

3 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS NA AMÉRICA LATINA: UM PERFIL DO MOVIMENTO.. 19

4 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS PARA O ESTUDO DE MEDICINA EM ROSÁRIO: O QUE MOSTRAM SUAS EXPERIÊNCIAS?  28

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 38

REFERÊNCIAS. 40

CONTRIBUIÇÕES DE AUTORIA.. 42

COMO CITAR ESTE ARTIGO.. 42

Ensino e Geografia

Considerações acerca do papel das políticas educacionais de acesso ao ensino superior na migração internacional de brasileiros

Considerations about the role of educational policies on the access to higher education in the international migration of brazilians

Ariel Pereira da Silva OliveiraI Ícone

Descrição gerada automaticamente

Ideni Terezinha AntonelloII Ícone

Descrição gerada automaticamente

IUniversidad Nacional de La Plata, Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación, La Plata, Argentina

IIUniversidade Estadual de Londrina, Departamento de Geociências, Londrina, Paraná, Brasil

RESUMO

A migração de brasileiros, que deixam seu país à procura de melhores condições de vida, vem mostrando que a necessidade de inserção no mundo do trabalho não é o único fator que influencia essa tomada de decisão. Nos últimos anos passou-se a vislumbrar com maior nitidez casos onde a motivação foi a forma como as políticas educacionais foram historicamente estruturadas no Brasil e é com o intuito de contribuir para com esse debate que apresentamos o presente artigo, que tem como objetivo principal discutir a migração de brasileiros, para nações latino-americanas, por conta da das políticas educacionais de acesso à universidade que atuam como fator de expulsão. Este trabalho foi construído a partir da leitura de referencial bibliográfico referente à temática e entrevistas com brasileiros que imigraram para Rosário, na província argentina de Santa Fé para estudar medicina na Universidade Nacional de Rosário. Os resultados da pesquisa demonstraram que a forma como as políticas educacionais estão organizadas no Brasil contribui para a manutenção da desigualdade social e elitização das universidades e que a migração foi para os entrevistados a única forma de ter acesso a um ensino de qualidade em uma universidade pública, de forma gratuita e sem processos seletivos excludentes já que na Argentina a educação, desde o nível básico até o superior, é tratado como um direito humano inerente a todos, inclusive estrangeiros.

Palavras-chave: Migração internacional; Migração de estudantes; Políticas educacionais

ABSTRACT

The migration of Brazilians, who leave their country in search of better living conditions, has been showing that the need for insertion in the world of work is not the only factor that influences this decision making. In recent years, it became clearer that cases where the motivation was the way in which educational policies were historically structured in Brazil and it is in order to contribute to this debate that we present this article, whose main objective is to discuss the migration of Brazilians, to Latin-American nations, due to the educational policies of access to the university that act as an expulsion factor. This work was built from the reading of bibliographic references referring to the theme and interviews with Brazilians who immigrated to Rosario, in the Argentine province of Santa Fé, to study medicine at the National University of Rosario (Universidad Nacional de Rosario). The results of the research showed that the way educational policies are organized in Brazil contributes to the maintenance of social inequality and the elite of universities and that migration was the only way for the interviewees to have access to an education of quality at a public university, free of charges and without exclusionary selective processes, since in Argentina education, from the basic level to the superior, is treated as a human right inherent to all, including foreigners.

Keywords: International migration; Student migration; Educational policies

1 introdução

Pode-se dizer que a migração é um fenômeno social que acompanhou o seres humanos desde os primórdios da civilização, como resposta a diferentes situações às quais eles eram submetidos. Dentre tais situações, pode-se citar a busca pela subsistência, a ocorrência de guerras ou até mesmo a busca por melhores condições de vida frente a questões de raiz racial, de gênero, sexualidade, religião, entre outras.

Com o passar do tempo, o Modo de Produção Capitalista (MPC) disseminou-se pelo mundo, ocasionando o desenvolvimento de novas relações sociais de produção pautadas na exploração do trabalho por parte dos que detém a propriedade dos meios de produção. Assim, a categoria trabalho ganha destaque nas análises que envolvem a dinâmica migratória, pois, como afirma Gaudemar (1977), a mobilidade do trabalhador passa a ser mais uma forma pela qual se manifesta sua submissão, o que reforça a ideia de que a migração reflete o contexto socioeconômico, político e cultural de determinado recorte espaço-temporal.

Com o desenvolvimento de uma novas técnicas que fazem do meio técnico científico também um meio informacional, novas variáveis passaram a interferir no fenômeno migratório, como o desenvolvimento de meios de transportes e de tecnologias da informação ligando diferentes partes do mundo e as desigualdades de lugares e populações que gozam ou não das benesses de um mundo globalizado.

Desta forma, mesmo que haja pontos de convergência entre os mais diversos fluxos populacionais por conta da lógica inerente ao MPC, há especificidades que precisam ser mapeadas e compreendidas de modo a entender como elas se ligam aos aspectos mais gerais do fenômeno, como a questão das políticas educacionais, em destaque no presente artigo. Nesse sentido, é importante refletir sobre a relação entre a educação e a Geografia a partir de outra perspectiva, não apenas do ensino, mas como as políticas educacionais adotadas em determinado território interferem na sua organização a tal ponto que fomentam a saída populacional.

Conforme se observará no decorrer do trabalho, serão apresentados dados à experiência de brasileiros em diferentes instituições de ensino da América Latina, os quais foram levantados pelos consulados e sistematizados a partir um relatório do Ministério das Relações Exteriores, bem como os resultados de uma pesquisa que trouxe como estudo de caso a realidade dos brasileiros que migraram para a cidade de Rosário, na província Santa Fé, na Argentina, para dar continuidade a sua formação na carreira de medicina na Universidade Nacional de Rosário (UNR).

A escolha da UNR para a obtenção do material empírico não se deu por acaso. A cidade de Rosário, que se localiza a 300 km da capital nacional Buenos Aires e 170 km da sua capital provincial, Santa Fé (figura 1), é considerada uma cidade universitária, possui diversas instituições de ensino superior públicas e privadas, dentre as quais pode-se citar a Universidade Nacional de Rosário (UNR), o Instituto Universitario Italiano de Rosario (IUNIR) e a Universidad Abierta Interamericana (UAI).

Essas instituições atraem estudantes de outras partes da Argentina e da América Latina, mas foi na UNR onde, nos últimos cinco anos, notou-se um aumento substancial de brasileiros a procura principalmente do curso de medicina, que no Brasil, caracteriza-se por ser concorrido e elitizado. Além disso, um dos motivos de a UNR ser bastante procurada por imigrantes brasileiros - o que motiva seu recorte para o estudo empírico - é o fato de estar localizada em uma cidade do interior, apresentando, segundo os estudantes, vantagens como o custo de vida mais barato, quando comparado a Buenos Aires.

Figura 1 Localização de Rosário

Fonte: Organizado pelos autores (2020)

No que tange à metodologia utilizada, este trabalho foi construído a partir da leitura de referencial bibliográfico referente à temática e entrevistas com imigrantes para compreender, a partir de suas experiências, as dinâmicas que envolvem a emigração e imigração. Para isso, realizou-se entre 19 e 21 fevereiro de 2020 um trabalho de campo e entrevistas[1] com 12 imigrantes oriundos de diferentes partes do Brasil (figura 2). O contato inicial com os entrevistados se deu por meio de um grupo no Facebook chamado “Fala Rosário”, composto por aproximadamente 20.000 pessoas, algumas das quais já haviam passado por essa experiência e outras que estão se preparando para estudar na Argentina, nos próximos anos.

Figura 2 Origem dos entrevistados

Fonte: Organizado pelos autores (2020)

Após a realização de uma postagem no referido grupo explicando a pesquisa e solicitando a concessão de entrevista, alguns imigrantes demonstraram o interesse em participar de forma livre e espontânea. Foi-lhes apresentado o parecer do comitê de ética, bem como o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)[2] e a entrevista foi marcada. Foi dada a opção de os participantes escolherem onde queriam ser entrevistados; todos optaram por receber o entrevistador em suas casas.

As entrevistas foram semiestruturadas e gravadas, realizadas tanto individualmente, quanto se utilizando a técnica de Grupo Focal (GF). Vale a pensa lembrar que os relatos individuais foram provenientes daqueles que vivem sozinhos em Rosário, enquanto os dados das entrevistas coletivas foram obtidos daqueles que dividem o apartamento e as despesas mensais com outros estudantes.

Os formulários eram compostos por questões abertas, o que possibilitava uma exploração mais profunda de determinados relatos. Por exemplo, a influência das opressões de gênero no processo de reterritorialização ficaram mais nítidas em entrevistas com mulheres, já a influência das redes sociais ficou mais evidentes na entrevista com um dos grupos focais, constituído por pessoas que professam a mesma fé e encontraram apoio na igreja que frequentavam. Desta maneira, fica evidente que, caso houvesse sido utilizado um questionário com questões fechadas, essas sutilezas não teriam aparecido.

Quanto à técnica do GF, é pertinente elucidar que a partir dela é possível obter informações qualitativas e em profundidade de determinado grupo de tamanho reduzido, constituído por pessoas que partilham algum traço em comum, neste caso o imigrante (GOMES, BARBOSA, 1999). Além disso, conforme apontam Nyumba, Wilson, Derrick e Mukherjee (2018), nessa técnica o pesquisador assume uma posição de facilitador ou moderador, fomentando a discussão entre participantes e não se direciona questões a alguém em específico, afim de obter uma resposta tal qual ocorre em uma entrevista individual. Para o presente trabalho, assumir essa postura foi muito importante, pois nenhuma das questões ficou sem resposta e elas sempre partiam de uma espécie de acordo entre os membros do GF.

No entanto, vale lembrar que ao se aplicar tal técnica, nem sempre haverá consenso entre os membros do grupo, tendo em vista que a própria dinâmica e o mapeamento de conflito e divergências de opiniões entre os membros podem revelar dados importantes ao pesquisador.

O uso dos GF envolveu dois grupos; o primeiro composto por três imigrantes; e o segundo por cinco. Assim, a experiência se desenvolveu em grupos pequenos e o número reduzido foi um aspecto positivo, sobretudo, porque o pesquisador realizou as entrevistas sozinho, sem o auxílio de assistente. Para registrar a entrevista, optou-se pela gravação, enquanto o pesquisador realizava anotações e indagações pertinentes, de acordo com os rumos que a entrevista tomava. Além disso, o número reduzido permitiu que todos se expressassem de forma mais participativa.

Como visto no referencial, com autores como Cruz Neto, Moreira e Sucena (2002), recomenda-se que a técnica seja realizada com apoio de colegas de trabalho, porém eles reconhecem as dificuldades, sobretudo de pós-graduandos, para constituir uma equipe de trabalho. No presente caso, o qual envolveu um trabalho de campo em outro país, os custos inviabilizaram a participação de outras pessoas. Logo, se por um lado foi possível realizar todo o processo individualmente, por outro é preciso reconhecer que foi um trabalho árduo, pois foram coletadas muitas informações (tanto na abordagem individual, quanto no GF), já que, a título de exemplificação, uma das entrevistas individuais durou cerca de duas horas e 30 minutos. Já as entrevistas com os GF tiveram em média uma hora e 20 minutos.

Ainda com relação a essa técnica Cruz Neto, Moreira e Sucena (2002) compreendem que há, pelo menos, duas maneiras de empreender a investigação usando essa técnica; na primeira, mantêm-se os participantes, mas se eles são reunidos mais de uma vez, com intuito de debater outros temas ou de se aprofundar o que já fora discutido; na segunda opção, mantêm-se o tema, mas os participantes são trocados do GF. Para a realização do trabalho, por conta dos limites impostos por um trabalho de campo fora do Brasil, houve apenas um encontro, contudo, o mesmo tema foi debatido com dois grupos diferentes.

A partir das experiências desses sujeitos, foi possível compreender as especificidades de uma migração entre países sul-americanos e que não tem como objetivo principal a inserção no mercado de trabalho. O trabalho de campo foi um procedimento importante não só para entrevistar presencialmente os imigrantes, mas para conhecer Rosário e experienciar o espaço em que esses sujeitos estão inseridos, o qual é palco de diferentes processos que influenciam sua permanência.

Este artigo foi dividido em três eixos: no primeiro, apresentar-se-á um panorama sobre as políticas educacionais brasileiras de acesso ao ensino superior, tendo em vista como foram estruturadas e o que as transformam em um fator de expulsão para uma parte da população brasileira; na segunda parte, apresentar-se-ão dados oriundos de um relatório do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, o qual revela o perfil desta migração em três países latino-americanos (Argentina, Bolívia e Paraguai); e por fim, serão trazidos os relatos de experiência de imigrantes brasileiros que estudam medicina na UNR.

2 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS MOTIVADA PELAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS DE ACESSO AO ENSINO SUPERIOR: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

De acordo com Godoy e Polon (2017), as políticas educacionais são ações planejadas e implementadas pelo Estado, que estipulam metas a serem atingidas a curto, médio e longo prazo, a fim de organizar, direcionar, fomentar e ampliar o acesso à educação. Essas políticas orientam profissionais da educação, como professores e gestores das instituições de ensino. Nas palavras dos autores:

Resumindo, a política educacional que orienta as ações e metas na educação é proposta pelo grupo que assume o controle do Estado, município e país. Desse modo, retrata as intenções que os grupos defendem. Contudo, elas não são meras imposições, pois atendem interesses diversos em alguns momentos por pressões populares. Assim, a política educacional determina e é determinada segundo o contexto em vigor (GODOY; POLON, 2017, p. 8).

As políticas educacionais podem ser analisadas a partir de diferentes recortes, assim, o presente artigo focou nas políticas de ingresso ao ensino superior no Brasil e na forma como foram historicamente estruturadas, uma vez que contribuem para a manutenção dos privilégios das classes dominantes, tornando a universidade um espaço inatingível para a maior parte da população, algo que, inclusive. promove a migração. Portanto:

[...] é preciso reconhecer que o acesso à educação superior no Brasil sempre foi um tema polêmico, especialmente porque confronta, de um lado, perspectivas mais elitistas de contenção do acesso visando, em grande parte, à manutenção do prestígio dos diplomas e o status dos profissionais no mercado de trabalho e, de outro, perspectivas mais populares de ampliação do acesso, o que representa aspirações de largas camadas da sociedade, objetivando inserção profissional que garanta melhoria nas condições de vida e de ascensão social (OLIVEIRA et al. 2008, p. 80).

Segundo Carmo, Chagas, Rocha e Figueiredo Filho (2015), desde a primeira década do século XXI, as discussões acerca do acesso ao ensino superior passaram a atrair a atenção da sociedade brasileira, sobretudo quando a pressão do mercado por profissionais qualificados em cursos superiores aumentou e o acesso restrito à universidade pública limitou ainda mais a oferta de vagas. No entanto, pode-se dizer que esse debate é mais antigo e as polêmicas remontam ao início do século XX, período em que o vestibular foi instituído.

De acordo com Oliveira et al. (2008), o vestibular foi um sistema criado em 1911, em um momento no qual a demanda pelo ingresso no ensino superior aumentava, mas sem vagas suficientes, por isso, a prova foi pensada como medida para restringir o acesso aos cursos de nível superior. A questão da demanda frente ao número limitado de vagas justificou a permanência deste tipo de seleção por mais de 100 anos e, mesmo os que consideram o sistema injusto, toleram-no por considerá-lo uma espécie de “mal necessário”. Assim, para os autores, não há consenso sobre os processos seletivos:

Por isso, há uma corrente que entende que o vestibular, ou melhor, o processo seletivo (conforme a atual LDB) apenas seleciona para as vagas existentes nas IES e, por esta razão, não pode ser responsabilizado pela seletividade social. O vestibular ou processo seletivo estaria apenas reproduzindo a seletividade já existente na sociedade e na escola básica. Outra concepção, por sua vez, preconiza o fim do vestibular ou seu equivalente por entender que ele intensifica a discriminação social e produz efeitos danosos sobre as escolas e sobre os sistemas de ensino. Esse tem sido um impasse nos debates educacionais nas últimas décadas (OLIVEIRA, et al., 2008, p. 81).

Já Mendes (2012), respaldada por Ghiraldelli Júnior (2006), explica que um momento importante nessa discussão se deu no período da ditadura[3], quando o país ainda adotava um sistema de vestibular de caráter eliminatório, ou seja, os candidatos aprovados eram os que atingissem uma nota predeterminada. Esse método de seleção culminou em um número de aprovados superior ao de vagas, gerando a crise conhecida como “problema dos excedentes”.

A solução encontrada pelo governo militar foi adotar o critério classificatório, onde os primeiros colocados tinham acesso às vagas. Esse novo sistema possibilitou um número maior de candidatos eliminados, dos quais, muitos foram absorvidos pelas instituições de ensino superior privadas que passaram a ser incentivadas.

Esse contexto trouxe consequências ao ensino superior brasileiros, das quais Mendes (2012) destaca duas: a primeira consiste no fato de o foco das instituições privadas ser o ensino, enquanto as públicas ofertam ao aluno, além do ensino, a inserção na pesquisa. Já a segunda está relacionada às características dos alunos, porque o sistema de ingresso adotado pelas universidades públicas privilegia aqueles que tiveram acesso à educação privada na formação básica, enquanto os alunos de escola pública que insistem em dar continuidade a formação, acabam indo para as instituições particulares.

Quando observamos dados do ensino superior brasileiro, como os que estão presente na tabela 1, que foram mapeados e disseminados por órgão oficiais como o INEP ligado ao Ministério da Educação, é possível notar que em números absolutos há mais instituições de ensino superior privadas do que públicas, sendo que, em 2019, cerca de 88,4% (n. 2.306) das instituições brasileiras eram privadas, enquanto só 11,6% (n. 302) eram públicas.

Pode-se inferir que o setor privado vem se fortalecendo e ampliando às custas deste sistema limitado e excludente.

Tabela 1 Número de instituições de educação superior, por organização acadêmica e categoria administrativa no Brasil (2009 - 2019)

Ano

Total

Universidade

Centro Universitário

Faculdade

If e Cefet

Pública

Privada

Pública

Privada

Pública

Privada

Pública

Privada

2009

2.314

100

86

7

120

103

1.863

35

N.A.[4]

2010

2.378

101

89

119

133

1.892

37

2011

2.365

102

88

124

135

1.869

40

2012

2.416

108

85

10

129

146

1.898

2013

2.391

111

84

130

140

1.876

2014

2.368

11

136

136

1.850

2015

2.364

107

88

9

140

139

1.841

2016

2.407

108

89

10

156

138

1.866

2017

2.448

106

93

8

181

142

1.878

2018

2.537

107

92

13

217

139

1.929

2019

2.608

108

90

11

283

143

1.933

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) (2019). Organizado pelos autores (2020)

Além disso, quando se observam os dados da tabela 2, percebe -se que, desde 2009, as instituições particulares concentram mais de 73% das matrículas na graduação. Dados mais recentes do INEP (2019) mostram que, em 2009, 75,8% (n. 6.523.678) das matrículas eram em universidade particulares, enquanto cerca de 24,2% (n.2.080.146) eram de instituição pública, sendo 2019 o ano com menor percentual de matrículas em universidades públicas nos últimos 10 anos.

Tabela 2 Matrículas nas Instituições de Ensino Superior públicas e privadas no Brasil no período entre 2009 e 2019

Ano

Total

Privadas

Públicas

n.

%

n.

%

2009

5.954.021

4.430.157

74,4

1.523.864

25,6

2010

6.379.299

4.736.001

74,2

1.643.298

25,8

2011

6.739.689

4.966.374

73,6

1.773.315

24,6

2012

7.037.688

5.140.312

76,3

1.897.376

23,7

2013

7.305.977

5.373.450

73,5

1.932.527

26,5

2014

7.828.013

5.867.011

74,9

1.961.002

25,1

2015

8.027.297

6.075.152

75,6

1.952.145

24,4

2016

8.048.701

6.058.623

75,2

1.990.078

24,8

2017

8.286.663

6.241.307

75,3

2.045.356

24,7

2018

8.450.755

6.373.274

75,4

2.077.481

24,6

2019

8.603.824

6.523.678

75,8

2.080.146

24,2

Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) (2019). Organizado pelos autores (2020)

Segundo Carmo, Chagas, Rocha e Figueiredo Filho (2015), as políticas em prol da ampliação e democratização do ensino superior, sobretudo no Governo Lula[5], foram importantes. Em 2010, destaca-se o Programa Universidade para Todos (PROUNI), no qual o estudante, a partir da nota do ENEM, podia obter bolsas em universidades privadas, e o Sistema de Seleção Unificada (SISU), destinado ao ingresso em universidades públicas.

Algumas universidades públicas também passaram a utilizar a nota do ENEM para o preenchimento de suas vagas, em substituição do tradicional vestibular. “[...] Em 2005, para termos uma ideia do crescimento do programa, o Enem registrou três milhões de inscritos. Anualmente, este número mostra-se sempre em ascendência. Na edição de 2012, já foram 5.791.290 inscritos e 73,4% desses frequentaram o ensino médio regular” (CARMO; CHAGAS; ROCHA; FIGUEIREDO FILHO, 2015, p. 19).

Quanto ao ENEM, é importante destacar que desde sua criação, em 1998, ele passou a integrar os debates acerca das políticas educacionais para o ensino superior adotadas no Brasil, dentre eles, a possibilidade de extinção do vestibular. De acordo com Mendes (2012), o ENEM possibilita uma alteração no “[...] formato, finalidade, volume de candidatos e implicações na escola básica e educação superior” (MENDES, 2012, p. 2). No entanto, não foram observadas mudanças significativas quanto a democratização da universidade pública para populações economicamente desfavorecidas, pessoas negras, população travesti e transexual, dentre outros.

Além disso, no caso do PROUNI houve o fortalecimento do setor privado, assim, uma hipótese para ser explorada em pesquisas futuras é que mesmo que a privatização das universidades públicas não tenha ocorrido no Brasil, ainda assim o setor privado lucra com políticas excludentes e que intensificam as desigualdades sociais no país, a qual se manifesta de muitas formas, inclusive na educação ensino superior, público, gratuito e de qualidade, que permite os alunos acessarem não só o ensino, mas a iniciação a pesquisa.

Rubem Alves (2011), em uma entrevista para Eduardo Simões, da revista Cult, afirma que considera processos seletivos como uma aberração e a forma como o ENEM vinha sendo estruturado para o ingresso em universidades públicas e privadas estava seguindo e o mesmo caminho. Para ele, esses métodos não avaliam de fato o conhecimento do aluno, porque: “[...] gastei muito tempo da minha vida lutando para acabar com o vestibular. Veja bem: se eu fizer vestibular ou Enem, serei reprovado. Todos os reitores das universidades seriam reprovados” (ALVES, 2011, n.p.).

Conforme observado, o ingresso no ensino superior brasileiro se dá mediante processos seletivos que, em tese, colocam os candidatos em pé de igualdade, mas, quando analisados mais atentamente, fica evidente que não são processos justos , pois avaliam da mesma forma candidatos com histórias de vida, contextos socioeconômicos e oportunidades diferentes.Logo, aqueles que apresentam os melhores resultados e ingressam nas carreiras mais concorridas são os indivíduos que tiveram, durante a maior parte da vida, acesso à educação particular e a todos os insumos necessários para o desenvolvimento intelectual. São pessoas oriundas de classes mais abastadas, cuja única obrigação, na vida, foi a dedicação e preparação para o vestibular.

Assim, as dificuldades de ingresso e permanência ao ensino superior público, enfrentadas por populações oriundas da classe camponesa e trabalhadora que não gozam de privilégios sociais, ficam mais evidentes nos cursos mais concorridos como o de Direito, Engenharias e, principalmente, Medicina.

Essas afirmações são sustentadas por autores como Djamila Ribeiro (2019), que completa: “Geralmente, quem passa em vestibulares concorridos para os principais cursos nas melhores universidades públicas são pessoas que estudaram em escolas de elite, falam outros idiomas e fizeram intercâmbios” (RIBEIRO, 2019, p. 43). Assim, conforme sustenta a autora, não se trata de capacidade e sim de oportunidades.

De acordo com Rego et al. (2018) o estudante de medicina brasileiro possui um perfil bem característico: sexo masculino, oriundo de classes mais elevadas e de grandes centros urbanos. Os autores ressaltam que esse perfil vem pouco a pouco mudando, sobretudo graças a ações afirmativas, como políticas de cotas para negros e estudantes de escolas públicas.

Apesar de defenderem o empreendimento de mais pesquisas que possam revelar as alterações nesse perfil, os autores, ao entrevistarem 154 alunos do curso de Medicina da Universidade Federal do Pará (UFPA), não abordaram questões referentes à cor/raça, o tipo de instituições em que realizaram o ensino fundamental e médio, nem se realizaram cursos preparatórios pré-vestibulares. No entanto, a pesquisa revelou que mais de 94% não trabalham e que quase 40% têm renda familiar superior a seis salários-mínimos.

O estudo de Cardoso Filho, Magalhães, Silva e Pereira (2015), realizado com estudantes da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), mostrou que predominam estudantes cujo pai e a mãe têm ensino superior (respectivamente 25,0% e 23,6%) e a maioria (87,5%) são sustentados pela família. Nesse estudo, observou-se que a maioria dos indivíduos (61,1%) fizeram o ensino médio somente em escolas públicas, e essa diferença de perfil é analisada pelos autores como impacto direto do sistema de reserva de vagas implantado na universidade, em 2004.

A pesquisa de Almeida e Silva (2017), realizada na Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT), mostra que 56% dos alunos de Medicina entrevistados realizaram o estudo médio integralmente em instituições privadas, e estes, se somados aos que estudaram a maior parte do ensino médio em instituições privadas, representam 64%. Além disso, 88% frequentaram cursos preparatórios para o vestibular e o ENEM. Com relação aos que estudaram integralmente em escolas públicas, o número chega a 34%, no entanto, o trabalho das autoras revela que há uma relação direta com a política de cotas adotada pela UNEMAT que, desde 2013, reserva 35% das vagas para alunos oriundos de escolas públicas.

É importante considerar, portanto, que os defensores da meritocracia, segundo a qual aqueles que não passaram no vestibular, não se esforçaram o suficiente, desconsideram o lugar de onde cada sujeito parte, bem como os privilégios sociais de que cada um usufrui.

Nesse cenário, Ribeiro (2019, p. 48) defende que “A cultura do mérito, aliada a uma política que desvaloriza a educação pública, é capaz de produzir catástrofes. Hoje, em vez de combater a violência estrutural na academia, a orientação de muitos chefes do Executivo brasileiro é uniformizar as desigualdades, cortando políticas públicas universitárias, como bolsas de estudo e cotas raciais e sociais”.

A realização do sonho das pessoas das camadas sociais mais baixas de ingressarem na universidade e darem continuidade aos estudos é prejudicado sobretudo quando a carreira eleita é a de medicina, o curso mais concorrido no Brasil. A fim de exemplificar a realidade anunciada, é possível acompanhar dados de uma universidade pública brasileira que representa esta realidade, que demonstram concorrência na prova de ingresso entre os candidatos do curso de medicina. Na tabela 3, observa-se que no ano de 2018, cada vaga chegou a ser concorrida por cerca de 144 estudantes, aumentando para 170,5, em 2020.

Chama atenção que, nas cotas destinadas para alunos de escola pública e negros, a concorrência é reduzida, demonstrando a dificuldade de acesso à universidade desta parcela da população, inclusive para a realização do vestibular.

Tabela 3 Concorrência do vestibular de medicina na Universidade Estadual de Londrina

Ano

Seleção Universal

Seleção via sistema de cotas (escola pública)

Seleção via sistema de cotas (negros)

Vagas

(n)

Candidatos

(n)

Candid/

vaga

Vagas

(n)

Candid.

(n)

Candid/

vaga

Vagas

(n)

Candid.

(n)

Candid/

vaga

2010

66

3582

54,06

12

594

49,33

2

69

34,5

2011

62

3191

51,18

15

692

45,93

3

87

29

2012

67

6098

90,82

11

945

85,73

2

132

66

2013

48

3504

72,33

16

751

45,94

16

88

5,5

2014

48

4748

98,25

16

1171

72,19

16

204

12,75

2015

48

4819

99,73

16

1213

74,81

16

238

14,88

2016

48

5935

122,98

16

1447

89,44

16

275

17,19

2017

48

6032

125

16

1401

86,56

16

245

15,31

2018

44

6387

144,34

16

1572

97,25

16

298

18,63

2019

44

5408

122,09

16

1425

88,06

16

294

18,38

2020

44

7538

170,5

16

1812

112,25

16

336

21

Fonte: Universidade Estadual de Londrina, 2010 – 2020

Frente a essa realidade, muitos dos que almejam seguir carreiras como a de médico se veem obrigados a desistir desse sonho e/ou vocação. Como se não bastasse o acesso restrito às universidades públicas que privilegiam determinada camada social, o acesso à rede privada se torna impossível por conta do alto custo. Por exemplo, o curso de Medicina, em uma universidade particular de Londrina-PR, chega a custar mensalmente quase sete vezes o valor do salário mínimo (1.100 reais, em janeiro de 2021) e o valor tende a subir conforme o curso progride.

Assim, o ensino superior, tanto público, quanto privado, é moldado para que os cursos elitizados permaneçam elitizados, reforçando a tese de que o acesso à educação é também uma questão passível de ser analisada a partir da perspectiva de classe. A universidade mantém os status quo inviabilizando aos filhos da classe trabalhadora, camponeses, negros e residentes das zonais mais periféricas dos municípios brasileiros, a possibilidade de ascensão social, desenvolvimento pessoal e a possibilidade de consumir e produzir ciência.

3 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS NA AMÉRICA LATINA: UM PERFIL DO MOVIMENTO

Em setembro de 2019, uma matéria especial do Estadão, escrita por Fabiana Cambricoli (2019), trouxe números até então inéditos, oriundos de um relatório de 2018 do Ministério das Relações Exteriores, que afirma que havia cerca de 65 mil brasileiros estudando em três países sul-americanos (Argentina, Bolívia e Paraguai). Assim, o presente trabalho apresentará tais resultados serão apresentados.

As informações do relatório (BRASIL, 2018) foram levantadas junto às instituições de ensino superior que se encontram no território de jurisdição de cada consulado. Ao lê-lo, observa-se que cada consulado utilizou uma metodologia, não havendo homogeneidade quanto às variáveis levantadas. É mister ressaltar que os números foram subestimados, porque o Relatório afirma, por exemplo, que, em 2018, havia cerca de 2700 estudantes em Rosário, enquanto dados oficiais da UNR afirmam que havia, neste período, cerca de 2734 brasileiros com matrícula ativa só no curso de medicina, sem considerar os que faziam outros cursos de graduação e pós-graduação. Além disso, convém lembrar que na cidade há instituições particulares que também são frequentadas por brasileiros.

As informações referentes à Bolívia foram construídas a partir das respostas de quatro (4) consulados: Cobija; Cochabamba; Puerto Quijarro e Santa Cruz de la Sierra. O número de estudantes e faculdades de medicina em cada jurisdição podem ser observados na tabela 4.

Tabela 4 – Universidades e números de estudantes Brasileiros na Bolívia

 

Nº (aprox.) de estudantes

Faculdades de Medicina com brasileiros

Cojiba

1.300

2

Cochabamba

5.000

8

Puerto Quijarro

200

1

Santa Cruz de la Sierra

20.000

4

Fonte: BRASIL (2018); Organizado pelos autores (2020)

No território sob jurisdição do consulado em Cobija, há duas universidades que oferecem o curso de medicina: a Universidad Amazônica de Pando e a Universidad Técnica Privada Cosmos. Na primeira, há 601 estudantes brasileiros matriculados, enquanto na segunda há um total de 707, contabilizando juntas um total de 1308.

Já no território sob jurisdição do consulado em Cochabamba, funcionam sete Instituições de Educação Superior que oferecem a carreira de medicina, as quais, juntas, possuem a matrícula de aproximadamente cinco mil brasileiros. Os dados apresentados por esse consulado aparentemente não seguiram uma metodologia satisfatória de coleta, pois não fica claro, por exemplo se, dentre os 250 estudantes da Universidade Adventista, há estudantes de medicina. Por conseguinte, é possível ter uma visão ampla dos migrantes que frequentam essas instituições (tabela 5).

Tabela 5 Universidades com brasileiros na jurisdição do consulado em Cochabamba

Universidade

Alunos brasileiros (n.)

Universidad de Aquino – Bolivia (UDABOL)

162 estudantes no geral e 140 no curso de medicina

Universidad Central (UNICEN)

360 alunos de medicina

Universidad Técnica Privada Cosmos (UNITEPC)

800 alunos[6]

Universidad Del Valle (UNIVALLE)

362 estudantes no geral e 353 alunos de medicina

Universidad Adventista da Bolivia

250 alunos[7]

Universidad Privada Abierta Latinoamericana (UPAL)

2100 estudantes no geral e 1470 no curso de medicina

Universidad Privada Franz Tamayo (UNIFRANZ)

800 alunos nos cursos de medicina, odontologia e bioquímica[8]

Universidad de San Simón

Ainda não havia sido visitada para obter informações acerca dos estudantes brasileiros.

Fonte: BRASIL (2018); Organizado pelos autores (2020)

O relatório explica que as universidades supracitadas oferecem o curso de medicina que dura em média cinco anos e incluem, ao final, um estágio obrigatório de aproximadamente três meses denominado “internato”, voltado para a medicina preventiva e realizado na zona rural. No caso dos brasileiros, eles preferem realizar esse estágio no Brasil.

Dentre os motivos para a escolha dessas universidades está o custo mais baixo, quando comparado com as universidades brasileiras. A UNIVALLE, por exemplo, custava cerca de 300,00 dólares ao mês, enquanto a mensalidade da UNICEN está em torno de 150,00 dólares. Assim, mesmo com essas mensalidades sofrendo incremento conforme se avança no curso e, mesmo que esses estudantes tenham que arcar com demais despesas como aluguel, transporte, alimentação, entre outros, o investimento na carreira de medicina na Bolívia é menor que no Brasil.

Ainda, com relação aos motivos da escolha dessas universidades se destacam: (1) a proximidade geográfica, pois a maior parte dos estudantes são oriundos de Estados da região Norte e Centro-Oeste, com predominância do Acre (AC), Rondônia (RO) e Mato Grosso do Sul (MS); (2) a possibilidade de ingresso sem vestibular; (3) a esperança de exercer a profissão no Brasil, via ingresso no programa “mais médicos”[9].

O relatório traz ainda que no território de jurisdição deste consulado, há a Universidad De San Simón, a única pública e que é considerada de boa qualidade, porém ainda não haviam sido feitas visitas para se obter informações sobre os estudantes brasileiros, portanto, o número de aproximadamente cinco mil estudantes brasileiros na Bolívia pode ser ainda maior, uma vez que não foram contabilizados os da rede pública.

Apesar de o representante desse consulado não ter ido até a Universidade San Simón, foi possível a obtenção de algumas informações (sem se revelar a fonte), como a de que nela haveria cerca de 90 brasileiros, sendo que 80 deles possuem dupla nacionalidade (brasileira e boliviana). Com relação às carreiras, é possível observar uma diversidade maior: Arquitetura (4); Ciência agrícola e pecuária (4); Economia (21); Ciências Jurídicas e Políticas (17); Ciências Sociais (2); Ciências Veterinárias (1); Ciência e Tecnologia (22); Ciências Farmacêuticas e Bioquímicas (2); Pedagogia (7); Medicina (8); Odontologia (1); e Politécnica (1).

O consulado em Cochabamba trouxe ainda informações referentes às dificuldades acadêmicas e de integração dos brasileiros, dentre elas é possível destacar: (1) aproveitamento insatisfatório do curso por conta das dificuldades impostas pelo idioma; (2) dificuldades econômicas que leva muitos buscar trabalho paralelo e informal; (3) pouca interação com a sociedade local, já que as relações interpessoais ficam restritas aos compatriotas; (4) carência afetiva; (5) inexistência de assistência médica gratuita, mesmo em situações de emergência; entre outros.

Na jurisdição de Puerto Quijarro, há apenas uma universidade que oferece o curso de medicina, filial da UNITEPC, cuja sede se localiza em Cochabamba. Nessa universidade, há aproximadamente 200 estudantes brasileiros. A maior dificuldade apontada pelos os estudantes desta universidade foi a questão burocrática relacionada à regularização de documentos e as limitações, sobretudo, de infraestrutura. Contudo, eles afirmaram que a universidade está tentando corrigir tais falhas. Além disso, houve relatos de que já houve demissão de alguns professores envolvidos em casos de assédio sexual.

Apesar de à primeira vista parecer um número demasiadamente elevado, o Relatório afirma que na jurisdição de Santa Cruz de la Sierra há uma comunidade brasileira grande, estimada entre 25.000 e 30.000 pessoas. Desses, cerca de 20.000 estão matriculados em algum curso de nível superior de medicina e enfermagem e a maioria se encontra em cidades como Santa Cruz de La Sierra e outras grandes cidades como: Warnes; Montero ou La Guardia.

No território deste consulado, há ao menos sete Universidades particulares, quatro delas concentram quase o número total desses estudantes. São elas: (1) Universidad de Aquino Bolivia (UDABOL), com cerca de 12.000 alunos; (2) Universidad Cristiana de Bolivia (UCEBOL), com cerca de 3.000 alunos; (3) Universidad Católica de Bolívia (UCB), com cerca de 3.000 alunos e a (4) Universidad Nacional Ecológica (UNE), com cerca de 2.000 alunos.

Dentre as dificuldades relatadas pelos estudantes brasileiros é possível destacar: condições insatisfatórias de infraestrutura das universidades em áreas importantes para a formação médica, como nos laboratórios; dificuldades na realização do internato, dado o alto contingente de estudantes; dificuldades de integração com a comunidade local, entre outros.

Quanto ao Paraguai, o consulado do Brasil em Assunção já deixa claro, logo no início das suas considerações, os motivos que levam os brasileiros a migrarem para estudar medicina: além da proximidade, o fator determinante para a tomada da decisão é o investimento ser menor que no Brasil, já que, enquanto as universidades nacionais cobram em média 8.000,00 pelo curso, com cerca de 1.500,00 é possível pagar as mensalidades e arcar com os demais custos de vida, como o alojamento compartilhado, no país vizinho.

Essa jurisdição calcula que há cerca de 4.600 brasileiros estudando medicina e outros cursos ligados à área da saúde. Para estudar no Paraguai, é necessário um visto específico expedido pela Dirección General de Migraciones (DGA), que possui só uma sede e fica na capital Assunção.

Porém, nos últimos anos, a demanda de brasileiros cresceu tanto que essa divisão vem fazendo mutirões, em média três vezes ao ano, em Pedro Juan Caballero e Ciudad del Este, para dar conta de expedir todos os vistos. Essa dinâmica vem fomentando o que o documento chama de proliferação de instituições, sobretudo na área das ciências da saúde.

No território do consulado em Ciudad del Este, há atualmente 15 universidades funcionando; dessas, seis (6) oferecem o curso de medicina. Com relação ao número de estudantes brasileiros, estima-se mais de 12 mil matriculados. Diferente do que se observa na Argentina, no Paraguai a procura é maior por instituições privadas. Na Universidad Nacional del Este, por exemplo, que é pública, há cerca de 20 brasileiros matriculados (sem especificação do curso), já a Universidad Internacional Tres Fronteras (UNINTER), que é privada, admitiu em 2017, cerca de 1.300 alunos, contabilizando um total de 4.000 matrículas de brasileiros, sendo que o valor da mensalidade está em torno de 500 dólares.

Esse consulado entrou em contato com a Dirección General de Migraciones e conseguiu informações que expressam melhor o perfil dos brasileiros dessa jurisdição. Tais informações podem ser contempladas no quadro 1. A diferença entre a estimativa de brasileiros matriculados em instituições de ensino superior nessa jurisdição e o número de pedidos de visto se deve, principalmente, à condição de fronteira desse território, o que faz com que muitos brasileiros estudem no Paraguai, mas residam no Brasil.

Quadro 1 Características dos brasileiros na jurisdição de Ciudad Del Este

Em 2017, aproximadamente 9.500 estudantes solicitaram visto na jurisdição do consulado de Ciudad Del Este

Os brasileiros estão localizados sobretudo em: Ciudad Del Este; Presidente Franco; Santa Rita e Itakyry

Cerca de 90% estudam medicina e os outros 10% se dividem em cursos ligados à área da saúde, como: enfermagem e odontologia. Há alguns que estudam administração e mestrado em Ciências da Educação.

Fonte: BRASIL (2018); Organizado pelos autores (2020)

No território da jurisdição de Pedro Juan Caballero há cerca de oito mil estudantes brasileiros, mas as autoridades paraguaias afirmam que esse número pode chegar a 13 mil, já que, cerca de 50% dos estudantes vivem em território brasileiro. A presença dessa população tem gerado uma dinâmica econômica importante para a cidade, que chega a faturar cerca de 700 milhões de dólares ao ano. Isso chamou, inclusive, a atenção do governador do departamento de Amambi, que deseja que futuramente Pedro Juan Caballero se transforme em uma cidade universitária.

Essa parte do documento traz ainda denúncias sobre o tratamento que alunos brasileiros recebem por essas instituições paraguaias. Chegou até o consulado denúncias de maus-tratos e inúmeras reclamações que vão desde provas que somem, notas alteradas, bullying e formas desonestas de lucrar. Por exemplo, há casos de alunos que têm que repetir matérias já concluídas e notas que desapareceram do sistema, além de professores que chegam atrasados e não cumprem a carga horária. Nas palavras do próprio documento “o aluno, infelizmente, não é visto como universitário, mas como cliente”.

Na jurisdição do Consulado em Salto de Guairá há apenas uma faculdade de medicina, a Universidad Sadamericana, com cerca de 744 alunos matriculados, sendo a maioria (60%) do sexo feminino. A comunidade de estudantes brasileiros é relativamente pequena quando comparado a outros locais, de maneira que cerca de 80% desses estudantes residem em Salto del Guairá e os demais vivem em cidades próximas, do lado brasileiro da fronteira, como Guaíra (PR) e Mundo Novo (MS). Apesar de o consulado considerar a comunidade pequena, ordeira e que não tem trazido preocupações ao consulado, foram localizados alguns conflitos com a instituição como: retenção de documentos, reclamações de critério de avaliação, entre outros.

Com relação à Argentina, vale ressaltar que processo de ingresso nos cursos de graduação na Argentina não segue um padrão, porque cada universidade possui critérios e processos de seleção próprios. Por exemplo, na Universidade de Buenos Aires, os aspirantes não passam por exames de admissão, mas exige-se que realizem o Ciclo Básico Comum (CBC), uma espécie de curso de nivelamento obrigatório. Assim, tal curso possui um sentido orientador, no qual os alunos podem conhecer melhor o curso e de fato saberem se se identificam com aquela área.

No CBC, cada curso exigirá o cumprimento de determinadas disciplinas no primeiro ano; no caso da medicina, as disciplinas são: (1) Introdução ao Pensamento Científico, (2) Introdução ao Conhecimento da Sociedade e Estado, (3) Matemática, (4) Química, (5) Física; Introdução à Biofísica; e (6) Biologia e Introdução à Biologia celular.

No caso da Universidade Nacional de Rosário (UNR), exige-se que os alunos passem por um curso de cerca de três meses, denominado Modulo de Inclusão Universitária (MIU), e realizem um estágio de observação junto a um médico. 

No MIU, um aluno de medicina que está prestes a se graduar assume o papel de professor e ministra aulas semanais de temas considerados importantes para a carreira como: Direitos Humanos, Sistemas de Saúde e Cidadania Universitária. No MIU se discute ainda questões como a função social da universidade na formação de profissionais qualificados e comprometidos, a importância da reforma universitária, bem como a relevância de se conceber a saúde como direito humano, superando a lógica mercadológica que muitos brasileiros internalizaram. Ainda, ocorrem debates e tarefas e trabalhos são designados aos ingressantes.

Ao final os alunos são submetidos a avaliações obrigatórias, mas não excludentes, já que elas visam saber o quão eficaz foram as aulas e se os estudantes têm condições de desenvolver uma opinião autônoma e crítica acerca dos temas estudados. Os aspirantes à carreira devem cumprir ao mínimo 75% de presença e, caso o aluno seja considerado não apto, este não é impedido de frequentar as aulas de medicina, por conseguinte terá que participar das atividades do MIU novamente.

A outra atividade obrigatória para o ingresso, o estágio de observação junto a um médico, recebe o nome de “experiência dirigida em terreno” e visa fazer com que os aspirantes à medicina tenham contato desde o início com os prazeres e frustrações do ofício. Além disso, por meio do estágio, que deve ter o mínimo de 16 horas de observação, o estudante produzirá dados, levantará questionamentos e fará observações que serão futuramente problematizadas e discutidas nas aulas MIU.

A experiência dirigida em terreno pode ocorrer tanto no Brasil, quanto na Argentina, e o contato com o médico é de responsabilidade de cada estudante, o qual deve documentar suas experiências através de diários, descrevendo desde o ambiente, até sua percepção quanto à maneira como o médico trata a equipe e os pacientes. É fundamental ressaltar que o estágio é somente de observação, de forma que o aluno não deve, em nenhum momento, intervir nas consultas e demais atividades médicas. No final da observação, o médico orientador escreve uma carta fazendo um breve relato da conduta do estudante.

Quanto à experiência argentina, o relatório do Ministério das Relações Exteriores (BRASIL, 2018) trouxe o levantamento realizado pelo consulado de Buenos Aires e de Córdoba. Em Buenos Aires, o consulado afirma que sob essa jurisdição estão em torno de 8.900 estudantes brasileiros, que se dividem entre as cidades de Rosário, La Plata e a capital Buenos Aires, em universidades públicas e privadas.

Além das instituições que se encontram nesta jurisdição, as quais tradicionalmente recebem brasileiros, como a Universidad Nacional de Rosario (UNR) e a Universidad de Buenos Aires (UBA), o documento ressalta que a Universidad Nacional del Litoral (UNL) viu o número de brasileiros crescer exponencialmente nos últimos dois anos, após mudança na política de ingresso, em 2015.

A procura pela instituição aumentou tanto, que as turmas passaram a ter mais de 1500 alunos nos primeiros anos, sendo cerca de 30% estrangeiros. No caso dos brasileiros, o aumento foi de 38 estudantes, em 2016, para 566 estudantes, em 2018. O relatório afirma que o aumento de brasileiros e demais estrangeiros tem trazido impactos negativos às instituições, como falta de espaço físico e de professores.

Outro desafio mapeado pelo consulado em Buenos Aires foram as dificuldades com relação ao idioma, pois muitos brasileiros migram sem saber falar espanhol. De acordo com o relatório, após 2018, a UNR viu o número de brasileiros cair, em decorrência da exigência do teste de proficiência em língua espanhola. Entrevistas realizadas com professores da instituição mostram que a exigência do teste acontece frente à alta taxa de reprovação de brasileiros, que chegava a 85% pelo pouco conhecimento de espanhol. Além disso, esses migrantes formavam grupos com outros brasileiros, gerando um autoisolamento inclusive dentro da sala de aula.

No caso das informações apresentadas pelo Consulado em Córdoba, elas não foram tão ricas quanto as apresentadas pelo de Buenos Aires. Isso se deve, talvez, em função do número menor de brasileiros. Segundo o documento, entre as sete províncias que compõem a jurisdição do referido consulado, na cidade de La Rioja encontram-se cerca de 700 estudantes brasileiros, distribuídos entre instituições públicas e privadas, sendo que cerca de 326 estudantes estão na Fundação Barceló (particular), e cerca de 350 alunos na Universidade Nacional de La Rioja (pública).

Entre os motivos que contribuíram para o interesse dos estudantes brasileiros em estudar em La Rioja destacam-se: (1) forte divulgação no Brasil pelas empresas de Assessoria; (2) possibilidade de ingresso sem exames como o vestibular; (3) facilidade de regularizar a situação migratória e, (4) no caso das particulares, a questão do custo, quando comparadas ao Brasil. Em relação à realidade dos imigrantes-estudantes brasileiros que cursam medicina em Rosário, o foco da pesquisa realizada, em 2020, esta será abordada no próximo tópico.

4 A MIGRAÇÃO DE BRASILEIROS PARA O ESTUDO DE MEDICINA EM ROSÁRIO: O QUE MOSTRAM SUAS EXPERIÊNCIAS?

As informações apresentadas nessa seção são oriundas de entrevistas realizadas com 12 brasileiros que estudam medicina na UNR. Eles possuem perfis diferentes quanto à idade, gênero, raça e história de vida. De início, é importante considerar que a migração constitui um fenômeno social passível de ser geograficamente analisado, porque tem íntima relação com o espaço, visto que os sujeitos que dão vida a esse fenômeno estão inseridos em um constante processo de desterritorialização e reterritorilização ao buscarem se estabelecer em determinada porção do espaço.

Observa-se então um processo dialético, dado o fato de que, da mesma forma que a migração é influenciada pelo território, as relações sociais que se originam e atuam a partir dessa dimensão espacial, também o transformam ao longo do tempo. Assim, sendo o espaço uma dimensão multifacetada, de onde se desenvolveram abstrações conceituais como a paisagem, o lugar, o território e a região para instrumentalizar análises de aspectos específicos, neste trabalho observou-se a pertinência da concepção de território, por respaldar a apreensão de diversas relações sociais permeadas por relações assimétricas de poder, onde experiencias de conflito e/ou cooperação permeiam o processo de (des/re) territorialização.

No caso dos imigrantes brasileiros que estudam na UNR, sua chegada em Rosário inicia o processo de reterritorialização, passível de ser observado tanto de forma concreta, quando se apropriam de determinada porção do espaço urbano para residir, quanto de forma simbólica, quando se beneficiam de uma política educacional cunhada em outro país.

A pesquisa mostrou que a saída do Brasil foi de fato motivada pela dificuldade de acesso à universidade pública no curso de medicina, mesma motivação encontrada em outros trabalhos, como o de Angelucci (2020), o qual identificou que:

Os brasileiros que vão estudar em Rosário, majoritariamente, afirmam fazê-lo por vontade própria, mas este sintagma deve ser enfaticamente matizado. Estas pessoas chegam compulsivamente pelas não garantias de estudos em seu país de origem. Esta afirmação vem de todos os brasileiros entrevistados que, por sua vez, compartilham esta visão com seus conhecidos: trata-se do sonho de ser médico/a. Apesar da força deste discurso na América Latina, é importante observar que parece estar amalgamado com uma busca de melhores conquistas financeiras. Há um aumento da migração estudantil no campo da formação em medicina no continente latino-americano que merece também estudos específicos (ANGELUCCI, 2020, p. 57).

No que tange à escolha de Rosário, esta foi motivada pela possibilidade de se graduar em uma universidade de excelência que também é pública e gratuita, localizada em uma cidade interiorana, com o custo de vida mais barato, quando comparado a Buenos Aires. De acordo com Angelucci e Pozzo (2020), até o ano de 2015, o maior número de estudantes estrangeiros da UNR era de peruanos, mas situação mudou nos anos seguintes, conforme se observa na tabela 6.

Tabela 6 Estudantes oriundos de países sul-americanos na UNR (2012 a 2017)

 

Brasil

Peru

Colômbia

Outros

2017

2577

653

334

384

2012

311

201

100

177

Fonte: ANGELUCCI; POZZO (2020, p. 813)

No caso do curso de medicina, o número de brasileiros com matrícula ativa cresce ano após ano, e chegou, em 2019, a 3.029 estudantes, o que representa mais de 71% do corpo discente, conforme se observa na tabela 7.

Tabela 7 - Comparação entre o número de alunos matriculados oriundos do Brasil e de outros lugares[10]

 

Alunos de medicina (n.)

Brasileiros na medicina (n.)

Brasileiros na medicina (%)

Alunos de outras nacionalidades (%)

2017

3.337

2.492

74,7%

25,3%

2018

3.841

2.734

71,2%

28,8%

2019

4.244

3.029

71,4%

28,6%

Fonte: UNR (2018, 2019, 2020). Organizado pelo próprio autor (2020)

As dificuldades de ingresso na universidade brasileira foram os fatores mais decisivos do que a facilidade de ingresso no sistema adotado na universidade argentina, nas palavras da participante do Grupo Focal 1: “Estudar aqui é uma grande oportunidade, um ensino de qualidade, público e a chance de vivenciar outra cultura, mas com certeza as dificuldades de acesso à universidade brasileiro foi o que motivou a vinda, se eu e a maioria das pessoas pudéssemos escolher teríamos continuado no Brasil” (Grupo Focal 1, fevereiro de 2020, Rosário – Santa Fé, Argentina).

Com relação à política de ingresso das universidades públicas brasileiras, no qual os candidatos são classificados por uma prova, as entrevistadas do Grupo Focal 1 afirmaram que esse método é contraditório, injusto e pode ser, inclusive, um gatilho para ansiedade, stress e desenvolvimento de problemas de saúde. Elas revelaram também serem comum casos em que os estudantes fazem uso de remédios controlados sem receita médica, apenas para se manterem focados nos estudos.

O sistema brasileiro foi considerado injusto e que favorece pessoas de classes abastadas, enquanto muitos que têm vocação para a medicina ficam de fora, logo, a questão da elitização da universidade pública também apareceu nas entrevistas realizadas. O que expressa que esta realidade já vem sendo notada há bastante tempo, sobretudo pelos candidatos a cursos concorridos. Um dos entrevistados afirmou ser contraditório o curso de medicina, o qual precisa formar profissionais que tenham empatia para exercerem o ofício de forma humanizada, ser tão elitizado no Brasil. Para ele, o ingresso de pessoas pobres deveria ser regra e não a exceção.

As interpretações teóricas e as vivências dos imigrantes entrevistados se encontram em um ponto de convergência, que ganha nitidez quando os entrevistados afirmam que a injustiça e desigualdade no sistema de ingresso brasileiro é um problema amplamente conhecido por quem planeja estudar em uma instituição pública, sendo forças que fomentam a migração. Frente a essa realidade, a Argentina se coloca como um país com políticas de ensino mais democráticas, que permitem o ingresso irrestrito de todos. Para eles, é injusto avaliar pessoas diferentes com um mesmo método, desta forma, na Argentina, o sistema configura-se de maneira mais justa, pois é dada a oportunidade de ingresso para todos, sem se ter que concorrer com ninguém, a não ser consigo mesmo.

 A desistência das pessoas, por exemplo, não se deve ao fato de terem perdido a vaga e sim por motivos externos, como dificuldade de adaptação. Desta maneira, na Argentina, independentemente de o indivíduo possuir ou não condições financeiras para estudar, ele tem o direito de acessar a universidade pública sem ter que competir com pessoas que estudaram em colégios particulares caros a vida toda.

Durante o trabalho de campo para a realização das entrevistas, o táxi foi um dos meios de transporte utilizados e em uma conversa com o motorista onde se falou sobre a pesquisa, ele relatou que de fato, havia muitos brasileiros estudando em Rosário. Ao saber a dinâmica desse movimento migratório e os motivos como as dificuldades de acesso encontradas nas universidades brasileiras, tais como o vestibular e o alto custo dos cursos de Medicina em universidades particulares, ele ficou visivelmente incomodado, não conseguia conceber a ideia de que a universidade pública brasileira, a qual é sustentada com os impostos, restringir o acesso da população a ela, sendo que somente uma pequena parcela tem a chance de frequentá-la.

Segundo ele, se essa situação acontecesse na Argentina, a população se mobilizaria e lutaria para que o acesso fosse possível para todos. De fato, a Argentina conseguiu construir um modelo universitário plural, democrático e inclusivo, mas nada se deu sem luta. A construção dessa universidade teve início na primeira metade do século XX, com um marco conhecido como Reforma Universitária de Córdoba que, apesar de ter iniciado antes, foi efetivado em 21 de junho de 1918, com a aprovação de um importante manifesto que Leher (2008, p. 53) define como:

O Manifesto é um texto vigoroso, ousado na defesa da insurreição estudantil e da luta heroica, dotado de pinceladas anti-imperialistas, contundente na crítica à imobilidade e ao autoritarismo da hierarquia fossilizada da universidade, ácido na crítica ao espírito de rotina e de submissão da grande maioria dos professores que concebia a ousadia intelectual como um anátema. É um texto enfático no anticlericalismo e luminoso na concepção latino-americanista.

Assim, conforme Bernheim (2008) aponta, durante muito tempo, desde o período colonial até o século XX, a universidade só respondia aos interesses das classes dominantes que eram detentoras do poder político e econômico e que tinham grande influência na instituição.

A Reforma de Córdoba representou o primeiro questionamento sério a esse modelo na América Latina e trouxe várias demandas, dentre as quais Freitas Neto (2011) destaca: (1) coparticipação dos estudantes na estrutura administrativa; (2) participação livre nas aulas; (3) periodicidade definida e professorado livre das cátedras; (4) caráter público das sessões e instâncias administrativas; (5) extensão da Universidade para além dos seus limites e difusão da cultura universitária; (6) assistência social aos estudantes; (7) autonomia universitária e (8) universidade aberta ao povo. Foi a última demanda que tornou possível o ingresso dos migrantes e de todos aqueles que almejam o ingresso ao ensino superior público e gratuito.

O movimento estudantil foi maior do que pode parecer à primeira vista. De acordo com Leher (2008), após o lançamento do Manifesto, os estudantes conseguiram reunir em um ato cerca de 20 mil pessoas, incluindo membros da Federação Operária. Esse movimento trouxe à tona outros debates envolvendo a educação de nível superior, como a presença dos proletários, autonomia da universidade e as perspectivas latino-americanas e anti-imperialistas.

A própria criação da UNR foi influenciada por esse movimento, visto que a vida universitária em Rosário começou por volta de 1920, como resultado da criação da Universidad Nacional del Litoral. A partir da Reforma Universitária se observou o movimento de implementação de universidades em cidades interioranas em províncias como Santa Fé, Corrientes e Entre Ríos. A faculdade de Ciências Médicas da UNR que hoje engloba os cursos de Medicina, Enfermagem e Fonoaudiologia, começou a funcionar em maio de 1920, tem como norte, desde essa época, a defesa da saúde como direito humano.

As entrevistas revelaram que as benesses da reforma universitária se mantêm vivas e a dimensão democrática, pública, gratuita e plural da universidade Argentina é um bem que deve ser usufruído e preservado por todos. A visão da educação como um direito assegurado pelo Estado, pública e gratuita é vista como um direito humano e seu caráter é constantemente lembrado, com o intuito de que esse modelo seja defendido para que os direitos conquistados se mantenham. Essa questão é trabalhada no MIU por todos os ingressantes.

O direito do qual os imigrantes brasileiros usufruem, foi conquistado no passado, mas permanece vivo hoje, contribuindo para os rumos que a cidade de Rosário tomaria no futuro, bem como para a constituição de seu território pois, como lembra Saquet (2015), os processos de determinado território são/estão relacionados às temporalidades e territorialidades, no caso das temporalidades elas “[…] significam processualidades históricas que se encontram no presente. Vivemos temporalidades passadas, presentes/coexistentes e futuras” (SAQUET, 2015, p. 110).

Frente à realidade brasileira descrita, com o acesso ao ensino superior restrito e elitista, sobretudo na carreira de Medicina, muitos desistem do sonho ou, pelo menos, adiam-no para um futuro incerto, dedicando-se à outras carreiras. Considerando que dentre os imigrantes que participaram da pesquisa, a maioria já havia se graduado ou iniciando um curso de graduação no Brasil, observou-se que o desejo de ser médico permanecia latente e vez ou outra se manifestava com mais força. Assim, nessa busca permanente por oportunidades de ingresso na tão sonhada carreira, a Argentina apareceu como uma opção para reacender a esperança.

Os relatos dos entrevistados mostraram que a vida do imigrante é marcada por inúmeros desafios que aparecem antes mesmo da chegada no país vizinho, com a necessidade de convencer a família a respeitá-los e apoiá-los na decisão, tendo em vista que alguns já tinham iniciado ou concluído um curso superior no Brasil. Um dos entrevistados, que se graduou em veterinária, afirma que seus familiares leram essa decisão como um retrocesso. O convencimento da família é importante, pois a maioria depende do apoio financeiro para se sustentarem.

As entrevistas mostraram que o valor mensal que muitos recebem das famílias é fundamental para o processo de reterritorialização, porque o valor de R$1.000,00 por mês é suficiente para viver em Rosário, contudo, muitos vivem com menos que isso. Um dos entrevistados, por exemplo, vive com R$ 800,00 ao mês. Com esse valor, os imigrantes têm que arcar com todo o custo de vida, como aluguel, água, luz, alimentação, dentre outros. De qualquer forma, tanto os estudantes que gastam mais, como os que gastam menos que este valor, concordam com o fato de que é muito mais barato do que a mensalidade de um curso de medicina no Brasil.

A questão econômica constitui um desafio, já que o custo inicial é relativamente caro, ocorre em função dos os gastos com assessoria, que corresponde às empresas especializadas nos trâmites burocráticos referentes à legalização de documentos. Logo, a maioria dos entrevistados cuidaram dos trâmites sozinhos, por considerarem abusivos os preços cobrados.

Ao tomar a decisão de partir o migrante poderia lograr não só o ingresso na carreira tão sonhada, mas também o acesso a um ensino de qualidade, contato com professores e pesquisadores renomados, uma experiência internacional, o aprendizado e aperfeiçoamento de outra língua e a possibilidade de exercer a Medicina, tanto na Argentina, quanto no Brasil (após a revalidação do diploma).

Outro atrativo das universidades argentinas que apareceu nas entrevistas foi o tempo poupado em sua formação, que no Brasil envolveria, provavelmente, anos de estudo em cursinhos, enquanto na Argentina, o acesso é direto e em universidades de boa qualidade. Além desta, um dos entrevistados afirma que o estudo na Argentina tem muitas vantagens, mas a principal é o acesso democrático, em que todos, independentemente da raça, religião, gênero, classe podem ter acesso à educação superior de qualidade. “Aqui [na Argentina] não importa de quem você é filho, seu sobrenome, se você for um morador de rua e quiser estudar você pode” (Entrevista, fevereiro de 2020, Rosário – Santa Fé, Argentina).

Para ele, a universidade na Argentina tem uma função social muito bonita, que não se restringe ao território argentino, mas a toda a América Latina, pois muitos chilenos que têm o acesso à universidade restrito por conta das privatizações ou os haitianos que têm poucas universidades, quando comparado a outros países, encontram na Argentina a possibilidade de estudar, se graduar e voltar para seus países para servirem à população como médicos, “o acesso democrático faz com que a medicina Argentina chegue a outros países que carecem de médicos” (Entrevista, Fevereiro de 2020, Rosário – Santa Fé, Argentina).

Quando questionado se acha que seria viável uma reforma universitária no Brasil, nos moldes do que aconteceu na Argentina, que tornasse o ensino superior mais democrático, ele afirma que não sabe responder, mas acredita que não, pois para ele uma das caraterísticas da universidade brasileira, sobretudo em cursos como Medicina, é a presença de estudantes economicamente privilegiados.

Segundo tal estudante, a entrada e formação de poucos médicos é benéfico para a classe, pois quanto menos médico, mais a demanda por esse profissional aumenta, assim eles podem escolher onde trabalhar e têm sua remuneração mais valorizada. Isso faz com que a sociedade brasileira arque com os estudos desse profissional que se concentram nas cidades da região centro-sul, enquanto as populações mais distantes ficam sem acesso a esse profissional.

Dentre os que utilizaram assessorias, delinearam-se dois perfis: a) aqueles que tiveram problemas, como os que não receberam toda a assistência que havia sido prometida e b) os que tiveram suas necessidades atendidas. Em ambos os casos eles afirmaram que optaram por pagar os serviços por medo de não conseguir cuidar dos trâmites sozinhos e terem suas matrículas indeferidas.

A reterritorialização dos brasileiros é marcada por constantes relações de conflitos e cooperação entre os atores, o que forma um processo ora mais fácil, ora permeado por desafios. Entre as relações de cooperação que apareceram nas entrevistas, pode-se citar o caso de uma imigrante que, ao passar por dificuldades financeiras, resolveu trabalhar como empregada doméstica. Assim, ao anunciar seu serviço nos grupos de brasileiros nas redes sociais, recebeu muito apoio, sendo contrata para inúmeros trabalhos pagos por dia e, além da remuneração, recebeu doação de roupas e alimentos, o que contribuiu para sua permeância.

Tanto as entrevistas, quanto as observações realizadas em um grupo no Facebook composto por brasileiros mostraram que estes acabam desempenhando alguma atividade informal prestando serviços ou oferecendo produtos à própria comunidade para complementar a renda. A inserção no mercado formal é inviável, uma vez que muitos não dominam o idioma estrangeiro (problema relatado pelo Consulado de Buenos Aires) e o curso de medicina exige dedicação integral.

Quanto aos conflitos, eles ficaram mais explícitos na técnica com o GF,
porque, ao se abordar o tema , foi possível perceber que cada um tinha uma
experiência muito única acerca da questão. Um exemplo que pode
ser apresentado refere-se à questão da xenofobia. Enquanto os entrevistados do
gênero masculino diziam não sentir esse tipo de violência de forma recorrente, as
mulheres afirmaram ter experienciado situações constrangedoras frente a visão
estereotipada da brasileira no país vizinho.

Segundo relatos destas alunas, construiu-se no imaginário do argentino a visão de que a brasileira é uma mulher “fácil” e diversas imigrantes relataram experiências ruins, como serem questionadas sobre possível prostituição e qual o valor elas cobrariam pelo serviço. Uma das entrevistadas do Grupo Focal 2 disse:

Eu trabalho e estudo, sou casada e evangélica, nunca uso roupas curtas e mesmo assim passei por uma situação onde, pelo fato de ser brasileira, fui questionada se me prostituía. É engraçado o fato de que muitas argentinas andam com roupas mais curtas que eu, mas eles não fazem esse tipo de pergunta para elas, porque fazem para mim então? É só pelo fato de eu ser brasileira porque motivo para isso eu nunca dei. (entrevista com Grupo Focal 2, fevereiro de 2020, Rosario – Santa Fe – Argentina).

Outra forma como a xenofobia manifestou-se nas relações sociais foi a partir do discurso de que os brasileiros se aproveitam das benesses no país vizinho sem darem um retorno equivalente. Assim, os que são contrários à presença de estrangeiros nas instituições, muitas vezes expressam seu descontentamento a partir de discursos preconceituosos. No entanto, a universidade tem disponibilizado meios para denunciar e coibir discursos de ódio.

A rede de apoio formada por brasileiros é uma das muitas redes que aparecem nas experiências desses migrantes multiterritorializados. Contudo há outras, tal qual o Grupo Focal 2, o qual, por exemplo, afirmou que sua permeância só foi efetivada pelo fato de frequentarem uma igreja evangélica local. Isso possibilitou que fortalecessem laços com argentinos evangélicos que lhes prestaram apoio, como na intermediação no processo de locação do apartamento em que vivem atualmente.

Ainda com relação ao idioma, dificuldade vista em campo e citada no relatório apresentado (BRASIL, 2018), esta variável aparece como um dos principais desafios para a permanência de brasileiros, muitos migram sem saber nada de espanhol o que acaba dificultando sua adaptação e fazendo com que tenham dificuldades de avançar no curso, ou até mesmo desistindo. Contudo, alguns dos entrevistados migraram sem ter o domínio do espanhol, mas conseguiram se adaptar com cursos de apoio ou se mudando antes do início das aulas para aprender a língua.

Com base nos pressupostos desta seção observou-se que a reterritorialização é complexa por estar condicionada a diferentes variáveis históricas e inerentes ao território, que podem tanto dificultar quanto facilitar esse processo. No caso das políticas educacionais vigentes nos países analisados, elas são as principais responsáveis por esse fluxo migratório.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retornando ao objetivo principal do artigo, que pretendia discutir a migração de brasileiros, motivada pelas políticas educacionais nacionais de acesso à universidade que atuam como fator de expulsão, ficou evidente que esse foi o principal motivo do crescimento da busca por oportunidades de continuação da formação em nível superior em outros países sul-americanos.

Esse crescimento foi tão expressivo que chamou atenção das autoridades brasileiras que, em um esforço conjunto com os consulados, buscou qualificar e quantificar o fenômeno. Essa categoria de migração guarda especificidades como, por exemplo, o fato de ocorrer em países latino-americanos, em um contexto sul – sul e com o objetivo principal de inserção enquanto imigrante estudante e não de imigrante trabalhador. O trabalho, nesse caso, aparece como variável secundária, sendo que o foco principal é o ingresso e conclusão do curso de medicina, considerado no Brasil altamente elitizado e concorrido.

O relatório do Ministério das Relações Exteriores foi construído como um quebra-cabeças, já que cada consulado realizou o diagnóstico utilizando uma metodologia diferente. Essas diferenças metodológicas ficaram evidentes sobretudo na inexistência de uniformidade na tabulação e apresentação dos dados. Houve assim diagnósticos bem completos, como o realizado no território da jurisdição do consulado de Cochabamba, mas outros deixaram a desejar, porque não apresentaram sequer uma explicação da metodologia utilizada e das fontes.

A falta de homogeneidade entre os dados dificultou até mesmo a representação gráfica por meio dos mapas temáticos e seria interessante, por exemplo, espacializar o fenômeno por meio de mapas que mostram a densidade no território ou informações referentes aos fluxos, mas não foi possível.

Quanto à técnica dos Grupos Focais, essa foi nossa primeira experiência, assim percebe-se a necessidade de se aprimorar o uso da técnica em trabalhos futuros. No entanto, ainda assim pode-se dizer que a técnica tem grande potencialidade em investigações geográficas de cunho qualitativo, sendo importante o desenvolvimento de mais pesquisas que a empreguem e ajudem apontar outras potencialidades e limites na Geografia.

Do que foi exposto, é possível concluir que a migração de brasileiros para o estudo em países da América Latina está longe de ser homogêneo. Enquanto na Bolívia e Paraguai os estudantes se concentram sobretudo em universidades particulares, na Argentina a preferência é pelas instituições públicas, consideradas de boa qualidade e com acesso irrestrito (sem vestibular). Além disso, no caso do Paraguai, boa parte dos estudantes estudam no país vizinho, mas residem no Brasil, delineando-se, portanto, um movimento pendular transfronteiriço.

Enquanto na Argentina a sociedade vem debatendo se seria justo arcar com os custos da formação de estrangeiro, visto que boa parte dos estudantes brasileiros estudam no sistema público, no Paraguai, as autoridades já enxergam os brasileiros como atores importantes no desenvolvimento econômico local e capital, por isso vem investindo em instituições de ensino nessas cidades, para explorar ao máximo esse mercado consumidor. O fato é que, em nenhuma dessas realidades, essa nova dinâmica pode ser desprezada.

Quanto ao caso específico de Rosário e da UNR, observou-se que a atração se dá por conta das seguintes variáveis: a localização no interior e o menor custo de vida quando comparado a Buenos Aires, a qualidade e gratuidade da universidade, bem como o fato de ser uma das está recebendo brasileiros a mais tempo e, portanto, é alvo de propagandas das empresas de assessoria, entre outros. Destarte, é mister ressaltar que essa dinâmica chamou atenção do capital e vem se tornando um mercado explorado sobretudo pelas empresas de assessoria universitária, responsáveis pela parte burocrática do processo.

Mesmo com todas as benesses oferecidas pela Universidade Nacional de Rosário, como a gratuidade, a qualidade elevada, o ingresso sem processos seletivos e a oportunidade de se formar como um profissional bilíngue, os imigrantes ainda prefeririam estudar no Brasil. A imigração é um reflexo direto das políticas educacionais excludentes vigentes no território brasileiro, que atuam como fatores de expulsão, fazendo com que populações jovens, em muitos casos já graduadas e com potencialidade de contribuir para o futuro da nação partam.

A pesquisa reforçou que o fenômeno migratório é um campo complexo, no qual diferentes variáveis influenciam e são influenciadas pelo processo. Neste caso, ficou mais nítido o papel das políticas educacionais de nível superior, ainda pouco exploradas, mas com potencialidade de ampliação.

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Contribuições de autoria

1 – Ariel Pereira da Silva Oliveira (Autor correspondente)

Graduado e mestre em Geografia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), Bolsista CAPES

https://orcid.org/0000-0001-8377-2919 • aripso543@gmail.com

Contribuição: Conceituação, Metodologia, Administração do projeto, Análise formal, Visualização dos dados, Escrita - primeira redação

2 – Ideni Terezinha Antonello

Professora associada do curso de Graduação e Pós-graduação em Geografia da UEL

https://orcid.org/0000-0002-6147-4731 • antonello.uel@gmail.com

Contribuição: Escrita - revisão e edição

Como citar este artigo

OLIVEIRA, A. P. da S; ANTONELLO, I. T. Considerações acerca do papel das políticas educacionais de acesso ao ensino superior na migração internacional de brasileiros. Geografia Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 26, e3, 2022. DOI 10.5902/2236499465327.



[1] É importante salientar que as entrevistas foram aprovadas pelo comitê de ética da Universidade Estadual de Londrina (UEL), recebendo o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) de nº 11499519.1.0000.5231.

[2] A pesquisa foi apresenta e aprovada pelo Comité de Ética da Universidade Estadual de Londrina. No TCLE, foram apresentado o objetivo da pesquisa e a maneira como os dados seriam armazenados, por meio de gravação. Esclareceu-se que os áudios gravados seriam transcritos e posteriormente destruído e que as informações seriam utilizadas tanto para a dissertação de mestrado, quanto futuras publicações em revistas. Os participantes foram informados que dados pessoais não seriam publicados e para cada um deles foi enviada uma cópia do documento por e-mail.

[3] O período da Ditadura militar brasileira iniciou em 1964, com um golpe militar contra o então presidente democraticamente eleito, João Goulart, e durou até 1985. A ditadura militar brasileira foi marcada por um caráter autoritário, nacionalista e de descumprimento dos direitos básicos do ser humano, como o de ir e vir, de protestar e inclusive o direito à vida, já que muitos presos políticos foram torturados e mortos. Nesse período também se observou ataques a instituições e classes específicas como a imprensa, professores, artistas e universidades.

[4] Não se aplica.

[5] O Governo Lula corresponde ao período iniciado com a posse do então 35º presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva. Seu primeiro mandato ocorreu entre os anos de 2003 e 2006, enquanto o segundo mandato (reeleição) se deu entre 2007 e 2010.

[6] Não traz demais especificações acerca dos cursos e/ou se há a carreira de medicina

[7] O relatório especifica que esses estudantes frequentam os cursos de enfermagem; teologia e fisioterapia, não traz à tona o curso de medicina.

[8] Não traz o número de estudantes subdividos em cada uma das carreiras

[9] Foi um programa do governo federal, da então presidente Dilma Rousseff, lançado em 2013, que tinha como objetivo suprir a carência de médicos nos municípios do interior e nas periferias das grandes cidades. O programa era voltado para médicos brasileiros formados no Brasil e no exterior, bem como médicos estrangeiros.

[10] Foram colocados os dados somente a partir de 2017, pois antes os dados cedidos pela universidade não discriminavam a carreira, agrupavam os números como “área da saúde”, sendo que a Faculdade de Ciências Medicas é composta pelos cursos de medicina, enfermagem e fonoaudiologia.