Geog Ens Pesq, Santa Maria, v.24, e31, 2020

Universidade Federal de Santa Maria, RS, Brasil

ISSN 2236-4994

DOI: https://www.doi.org/10.5902/2236499442398

Submissão: 05/02/2020 | Aprovação: 09/03/2020|  Publicação: 08/10/2020

 

 

 

Ensino e Geografia

 

Experiências do programa residência pedagógica na formação de professores de geografia no norte do Tocantins

Experiences of the programa residência pedagógica in the formation of geography teachers in the north of Brazil

 

Antonia Márcia Queiroz

 

Universidade Federal do Tocantins - https://orcid.org/0000-0003-2074-2928- amdqueiroz@yahoo.com.br

 

 

RESUMO

Este trabalho apresenta as experiências do Projeto Residência Pedagógica do núcleo de Geografia da Universidade Federal do Tocantins na cidade de Araguaína - TO. Esse recorte espacial está localizado no Norte do Tocantins, na região amazônica. O objetivo é refletir sobre os entraves e as possibilidades oriundos das ações do subprojeto Residência Pedagógica, do Núcleo do curso de Geografia/UFT. Em específico, busca-se dialogar com os resultados para além das concepções teóricas, numa perspectiva prática, vivenciada por todos os participantes desse núcleo. A metodologia qualitativa foi utilizada a partir de análise documental, com base nos relatórios produzidos por todos os envolvidos nesse núcleo. Apesar de algumas dificuldades conceituais e práticas durante todo o processo e execução do subprojeto, podemos afirmar que os residentes visualizaram, nas unidades escolares, a mediação entre a universidade e a educação básica no sentido de imersão teórico/prática, de pesquisa e da apropriação de conteúdos e técnicas para a docência, à luz da realidade socioeconômica regional desses estudantes.

Palavras-Chave: Educação; Ensino; Docência; Região

 

 

ABSTRACT

This work presents the experiences of the Projeto Residência pedagógica of the Geography center of the Universidade Federal do Tocantins in the city of Araguaína - TO. This spatial cutout is located in northern Tocantins, in the Amazon region. The objective is to reflect on the obstacles and possibilities derived from the actions of the Projeto Residência pedagógica subproject, from the Center of the Geography/UFT course. In particular, we seek to dialogue with the results beyond the theoretical conceptions, from a practical perspective, experienced by all participants of this nucleus.The qualitative methodology was used based on documentary analysis, based on the reports produced by all those involved in this nucleus. Despite some conceptual and practical difficulties throughout the process and execution of the subproject, we can affirm that residents visualized, in school units, the mediation between the university and basic education in the sense of theoretical/practical immersion, research and appropriation of contents and techniques for teaching, in the light of the regional socioeconomic reality of these students.

Keywords: Education; Teaching; Teaching; Region

 

 

1 INTRODUÇÃO

De acordo com o Ministério da Educação, Notas Estatísticas, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP (2017) ­–, os problemas de infraestrutura em escolas de educação básica, referentes à biblioteca e/ou sala de leitura em 2017, da região da Amazônia e do Nordeste, se comparados aos problemas da região Centro-Sul, são bem maiores. Consequentemente, obstaculiza a qualidade da educação em ensino e aprendizagem na região Norte do país. Essa análise mostra informações importantes que nos permitem afirmar que as escolas da região Norte possuem infraestrutura mais deficiente do que as escolas situadas em outras regiões do país.

Os indicadores do IDH e os números da educação brasileira estão relacionados ao desenvolvimento de cada estado. Tanto no contexto da educação, quanto no econômico, a região Norte apresenta defasagem. Os dados educacionais do Pará, do Tocantins, do Maranhão, da Bahia e da Paraíba são os menores no âmbito nacional.

Partindo da Geografia regional como meio de interpretar a realidade espaço-temporal no território, é possível concordar com Gomes (2007) quando assevera que, no Brasil, há uma diferenciação de áreas desiguais, como na Amazônia, devido às correntes migratórias, à história do homem e a forças produtivas de diferenciação e integração pelos modos de produção capitalista, pela ação do Estado, pela ideologia e pelo meio de comunicação entre as regiões desigualmente desenvolvidas, mas articuladas no desenvolvimento desigual e combinado. A Amazônia teve processos de regionalização diferentes em alguns aspectos, porém combinados no cenário político-econômico mundial em espaço e tempo diferenciados.

Nos processos combinados no cenário político-econômico mundial, na diferenciação de área natural, em um período temporal mais recente, a gestão se realizava pelo Estado brasileiro, contudo o poder político-econômico está influenciado pela escala, ou seja, pela demanda geopolítica econômica mundial, especialmente voltada para a utilização dos recursos naturais.

No contexto dialético de escalas, sob a perspectiva de Haesbaert (1999), a Amazônia se articula no local/global por meio da ação sindical ou pelas campanhas mundiais ambientais de preservação do planeta. No local/global, manifesta o interesse turístico educacional e regional, além de importante centro de pesquisa geo-histórica sobre o passado dos povos e a formação da sociedade brasileira.

Com base nessa afirmação, percebemos o olhar do mundo sobre os recursos e as riquezas naturais amazônicas, coexistindo com uma expressiva ausência de visibilidade sobre condições socioeconômicas e, principalmente, quanto à necessidade de acesso a uma formação educacional adequada e de qualidade das populações locais. Assim, falta uma apropriação do conhecimento necessário à defesa do patrimônio natural e cultural das comunidades regionais.

A cidade de Araguaína está situada no Norte do Brasil, na área de transição amazônica do Norte do Tocantins. A população tocantinense é de aproximadamente 1.383.445 habitantes, distribuídos em 139 municípios, com densidade demográfica de 4,98 habitantes por km², possuindo ainda uma imensa área não antropizada. Existe uma população estimada de 5.275 indígenas distribuídos entre sete grupos, que ocupam área de 2.171.028 ha.

Para Morais (2014), o processo de estruturação de Araguaína, dentro da rede urbana do Norte do estado do Tocantins, está pautado na formação socioeconômica da região em que se insere. Desse modo, o entendimento do método de dinamização da cidade de Araguaína remete à necessidade de levar em consideração as políticas públicas de planejamento, como aspecto fundamental para seu desenvolvimento urbano e regional.

Faz-se importante destacar que algumas dinâmicas se estabeleceram no processo de consolidação econômica e intensificação da urbanização do Tocantins e na constituição da economia regional da cidade de Araguaína, com destaque para a participação e a dinamicidade de várias empresas ligadas ao setor agropecuário.

Nessa seara, a cidade em tela possui alguns tipos de problemas encontrados nos grandes centros do país. Por exemplo, sua função como prestadora de serviços educacionais de nível superior e, especificamente, de serviços ligados à área médico-hospitalar extrapola as fronteiras estaduais.

 

Mapa 1: Cidade de Araguaína- Norte do estado do Tocantins

 

Fonte: Morais,I. A. (Dissertação de Mestrado ) – Universidade de Brasília- UNB, 2014)

 

Araguaína apresenta dinâmicas diferenciadas das demais cidades do Tocantins, fazendo com que se configure como cidade-polo de uma grande região e, também, se apresenta como uma cidade média no contexto regional. A cidade se destaca em oferta de educação básica e superior público e privado com grande área de influência regional no Norte do estado.

A Universidade Federal do Tocantins, de acordo com o PDI (2016 - 2020), é a mais importante instituição pública de ensino superior do Estado, em termos de dimensão e desempenho acadêmico. Atualmente, a instituição oferece 61 cursos de graduação presenciais oferecidos nos sete campi. Na modalidade a distância, são mais 26 cursos entre graduação, especialização e extensão, além de 17 programas de mestrado acadêmico, 9 mestrados profissionais e 6 de doutorados, reconhecidos pela Capes, e ainda vários cursos de especialização lato sensu presenciais. No total, são 982 docentes e 18.881 alunos. A UFT está distribuída em sete cidades do Tocantins, abrangendo geograficamente todos os pontos do estado.

Notamos, a partir de dados do IDEB (2017), que, nos últimos anos, os índices de qualidade da educação básica no Brasil têm melhorado, porém de forma tímida. Na região Norte do Brasil, em 2015, era de 4,7, subiu para 4,9 em 2017. Se voltarmos essa análise para o nível estadual, o Tocantins teve um aumento significativo se comparado aos índices regionais, pois em 2015 contava com 5,1; em 2017, subiu para 5,6.

Entretanto, confrontando dados da região Norte com os de outras regiões, por exemplo, do Sudeste do país, que em 2015 era de 6,1; em 2017, subiu para 6,4, verificamos números bastante preocupantes na qualidade da educação básica no Norte, os quais nos remetem às discrepâncias socioeconômicas regionais, indicativas de poucas políticas públicas para suprir ausências  de recursos físicos e humanos.

Por fim, com base em dados socioeconômicos do Brasil disponíveis no censo (2010), o Norte conta com inúmeros adultos que sequer concluíram o ensino fundamental básico. Portanto, são imprescindíveis políticas educacionais efetivas, voltadas para iniciativas contundentes na estrutura escolar da região como um todo, física e humana, para contribuir para a redução nas taxas de evasão escolar e melhorar o desempenho educacional qualitativamente.

Nesse contexto, torna-se importante apresentar as ações do subprojeto Residência Pedagógica do Núcleo de Geografia/UFT do campus Araguaína. O objetivo é dialogar com os resultados, a partir dos desafios na realização dos trabalhos nas escolas-campo na cidade de Araguaína – TO –­, além das concepções didático-pedagógicas que foram vivenciadas por todos os integrantes desse núcleo.

O texto está dividido em três partes. A primeira seção apresenta as especificidades do recorte espacial das escolas-campo e a etapa de formação de todos os participantes na instituição superior UFT. A segunda mostra a imersão dos residentes nas escolas-campo e retrata os projetos de intervenção didático-pedagógica, no sentido de dialogar com as dificuldades e os resultados nas distintas realidades das escolas-campo locais. A terceira e última seção se dedica às considerações finais, lançando mão de inferências e mobilizando esforços na interpretação dos resultados como incentivo para novo planejamento estratégico de intervenção na qualidade da educação no Norte do Brasil, voltado para ações específicas nesses espaços escolares, que se mostram desafiadores em meio aos dados da educação nessa região do país.

 

 

2. DELIMITAÇÃO ESPACIAL E AÇÕES INICIAIS DE FORMAÇÃO NO SUBPROJETO RESIDÊNCIA PEDAGÓGICA DO NÚCLEO DE GEOGRAFIA/ARAGUAÍNA

O projeto institucional Residência Pedagógica na UFT tem por objetivo geral promover uma formação em licenciatura que articule os diversos saberes dos licenciandos com os conhecimentos historicamente produzidos sobre a formação, a profissionalização e o trabalho docente, bem como com as exigências cotidianas do ofício manifestadas no contexto das redes públicas do estado do Tocantins.

Entre os objetivos específicos, estão possibilitar ao licenciando maior ambientação com a escola-campo e seus contextos, suas vivências, possibilitando a pesquisa como um dos caminhos metodológicos; desenvolver e fortalecer ações de natureza formativa e integradora que envolvem as dimensões da docência nas diversas licenciaturas, primando pela interlocução entre os projetos pedagógicos dos cursos e os projetos pedagógicos das escolas, na elaboração de um conhecimento multidisciplinar/interdisciplinar proposto pelos diferentes subprojetos; promover o debate acadêmico-científico com a UFT e as redes de educação do Tocantins sobre formação de professor, os impactos e as contribuições da residência pedagógica na educação básica, considerando os debates e temas atuais, como as diretrizes de formação, currículo e a BNCC; procurar debate e adequação dos currículos e as propostas pedagógicas dos cursos de Licenciaturas da UFT, levando em consideração as políticas de educação, formação de professor, o PNE e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC); refletir acerca da reformulação dos estágios obrigatórios.

No Subprojeto Núcleo Geografia-Campus/Araguaína, realizamos as atividades de forma interdisciplinar com o curso de Biologia, em parceria com as escolas Estaduais: Colégio Professora Silvandira Sousa Lima, Colégio Estadual Jardim Paulista e Centro de Ensino Médio Benjamim Jose de Almeida. Os professores preceptores são os da rede básica de ensino. A título de esclarecimento, as três escolas-campo selecionadas atendem um público diversificado e estão localizadas em setores periféricos da cidade.

O Colégio Professora Silvandira Sousa Lima localiza-se na Rua 10, Setor Vila Couto Magalhães, S/N, na Cidade de Araguaína/TO. Essa unidade escolar foi construída em 1985, por ocasião de projetos e mutirão das 1000 salas de aulas, conforme descrito no Projeto Político Pedagógico (PPP). A atual diretora é a professora Viviane Marques da Silva Mendes. Quanto ao perfil socioeconômico dos educandos, em sua maioria, são pobres e muitos têm problemas na estrutura familiar. A escola possui alunos com deficiência. A qualificação e atualização dos professores se dão de forma anual, além de contarem com reuniões pedagógicas frequentes, possibilitando a interação do corpo docente. O conselho de classe acontece em todos os bimestres. Sobre o Ideb (2017), o Colégio Estadual Professora Silvandira Sousa Lima, nos anos finais da rede estadual, atingiu a meta e cresceu, mas não alcançou 6,0. No item Aprendizado, conseguiu 5,25; o item Fluxo, 0,95. O valor maior para a aprovação é 5,0, sendo que a meta é de 4,6.

O Colégio Jardim Paulista está localizado na Avenida dos Engenheiros, 377, Jardim Paulista, CEP: 77808-320, na cidade de Araguaína – TO. Conta com uma média de 850 alunos nos turnos matutino e vespertino, ensino fundamental e médio. Está situada em uma área periférica da cidade. Atende a uma clientela com níveis socioeconômicos considerados baixos. O colégio tem uma Sala de Atendimento Educacional Especializado – AEE – para atender alunos com deficiência, Programa Federal do Ensino Médio Inovador – ProEMI –, Novo Mais Educação, ambos para complemento da jornada escolar, e o Programa Esporte na Escola para práticas esportivas no contraturno escolar. Possui, em seu quadro humano, uma professora especializada em libras. Segundo o Projeto Político Pedagógico - PPP (TOCANTINS, 2017), desde o início de funcionamento, ocupa apenas parte de um prédio que era destinado a atender apenas o Ensino Médio e a outra parte do prédio foi ocupada pela Delegacia Regional de Ensino e ainda por uma Escola Técnica de Enfermagem. O Ideb (2017) não atingiu a meta e não alcançou 6,0. Tem o desafio de garantir mais alunos aprendendo e com um fluxo escolar adequado. O item Aprendizado apresenta 4,78, fluxo 0,83; a escola, 4,0, sendo que a meta era de 4,9.

O Centro de Ensino Médio – CEM – Benjamim José de Almeida está situado na Rua Comercial, Quadra 02, S/N, Setor Urbanístico, em Araguaína - TO. É uma das 12 (doze) escolas do Tocantins selecionadas pelo MEC para implementação do “Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral”, que ocorre no período de 2017 a 2020. Segundo dados do Censo/2018, apresenta, em suas dependências, 15 salas de aula e 62 funcionários. Com 158 participantes na prova do ENEM/2015, a média da escola foi de 70,89% na taxa de participação; 525,54 na Redação; 501,95 em Linguagens e Códigos; 563,44 em Ciências Humanas; 449,96 em Matemática; e 468,67 em Ciências da Natureza.

Ao observarmos os índices das escolas nas avaliações nacionais (2017), percebemos que a qualidade no ensino-aprendizagem não teve alterações significativas. Os resultados das avaliações, nas três escolas em análise, corroboram os números da educação nacional, visto que a qualidade da educação nessas escolas, de modo geral, obteve alguns avanços, conforme as médias nacionais no ano de 2017, porém não produziu avanços efetivos nos números das metas definidas.

Cumpre esclarecer que tais informações foram consideradas nas etapas de formação dos residentes e preceptores e no planejamento das ações, tendo em vista que as avaliações supracitadas são importantes, e confiáveis, instrumentos para mensurar o desempenho escolar dos discentes.

As atividades do Projeto Residência Pedagógica, realizadas na UFT, na etapa de formação de preceptores e preparação dos residentes tiveram início no mês de agosto de 2018, com a realização de Seminário Integrado de Formação em todos os campi que possuem os subprojetos.

No mês de setembro, dedicamo-nos às atividades específicas do subprojeto por intermédio de oficinas de formação de residentes e preceptores, oficinas sobre a Base Nacional Comum Curricular – BNCC – e Grupo de Estudos. Realizamos seminários temáticos sobre a Base Nacional Comum Curricular, reuniões semanais com os residentes e preceptores, grupos de estudo e discussão.

Nessa etapa, a ênfase foi nas leituras de material bibliográfico utilizado e sua relação com as atividades que seriam planejadas e relacionadas ao cotidiano das escolas. A Base Nacional Comum Curricular foi o material bibliográfico escolhido. Por se tratar de um documento recente, tornou-se importante realizar estudos detalhados para compreensão do conteúdo e sua aplicabilidade nas escolas-campo.

O intuito foi tecer reflexões sobre as orientações descritas no documento e fazer uma análise específica para conhecer as competências e habilidades disponíveis, a fim de desenvolver as atividades nas disciplinas de Geografia e Biologia nas escolas-campo, de maneira interdisciplinar.

De acordo com Pontuschka (2009, p. 113), a disciplina escolar Geografia mantém vínculos com a respectiva ciência por meio dos conceitos, dos métodos e das teorias geográficas. Os conteúdos disciplinares são organizados com vistas a atender a concepções hegemônicas da própria ciência e correspondem a um tempo e espaço específicos, articulados às concepções pedagógicas de organização do currículo e do ensino.

Nesse momento, identificamos entraves ao planejamento teórico e prático, os quais vieram à tona à medida que identificamos a falta de conhecimento das escolas sobre o programa e a nossa falta de experiência em trabalhar de forma interdisciplinar com os dois cursos, Geografia e Biologia.

A princípio, buscamos o entendimento conceitual sobre o trabalho interdisciplinar e, posteriormente, foi necessário nos reunir com os representantes das escolas-campo, diretores e preceptores, para, em conjunto, pensarmos o planejamento das atividades a serem realizadas pelo projeto.

Via de regra, a finalidade da interdisciplinaridade é ampliar uma ligação entre o momento identificador de cada disciplina de conhecimento e o necessário corte diferenciador. Não se trata de uma simples deslocação de conceitos e metodologias, mas de uma recriação conceitual e teórica (PAVIANI, p. 41, 2008).

Santos (2005) afirma que a distinção dicotômica entre ciências naturais e ciências sociais deixou de ter sentido e utilidade. Essa distinção assenta numa concepção mecanicista da matéria e da natureza a que contrapõem, com pressuposta evidência, os conceitos de ser humano, cultura e sociedade. Nesse sentido, a Geografia estuda a relação entre o homem e o meio ambiente, além da superfície e da distribuição espacial de fenômenos significativos na paisagem. Também pode ser definida como uma prática humana de conhecer o meio onde se vive a fim de compreender e planejar o espaço.

Fazer a Geografia se tornar interessante aos alunos é um dos fundamentos das propostas do ensino, estimulando os questionamentos, a busca por respostas, as pesquisas, motivando-os a aprender e estudar a geografia de maneira que a compreendam, por fazer parte do seu cotidiano.

Para além disso, a Geografia depende de outras áreas de conhecimento para obtenção de informações básicas, como a Química, Geologia, Matemática, História, Física, Astronomia, Biologia e outras. Viagens, leituras e estudo de estatísticas são ferramentas importantes para os geógrafos. O estudo da Geografia é o desenvolvimento do sentido de direção, da capacidade de ler mapas, da compreensão das relações espaciais e do conhecimento do tempo, do clima e dos recursos naturais.

Assim, a partir da perspectiva geográfica, traçamos estratégias que envolvessem temas comuns à Geografia e à Biologia para orientarmos as ações. Diante disso, selecionamos o tema "Espaço, ambiente e sociedade" mediante as habilidades e competências descritas na BNCC (2018) de ambas as disciplinas.

 

2.1 Desafios e perspectivas na etapa de ambientação dos residentes nas escolas-campo

   No mês de outubro de 2018, teve início a segunda etapa das atividades, de imersão dos residentes nas escolas-campo com atividades realizadas a partir de cronograma prévio, planejamento, conhecimento da equipe, formação, leitura da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e apresentação de seminários sobre as competências e habilidades para o ensino de Geografia.

   A ambientação dos residentes na escola e na sala de aula se deu por intermédio do diagnóstico da escola-campo, da observação e da identificação das necessidades de aprendizagem, de grupo de estudos, de planejamento de atividades em conjunto, da leitura e do conhecimento do Projeto Político Pedagógico (PPP) da escola e sua realidade local (vide figura 1).

 

Figura 1 Primeiro contato dos residentes com as escolas-campo


Fonte: Acervo particular dos autores (outubro de 2018)

 

Durante esse período na escola, foi observado o comportamento dos alunos, desde sua organização na fila da entrada, como se portam em sala de aula, no lanche, no recreio até a saída da escola. A observação foi bastante significativa para verificar a diversidade dos alunos e comportamento diferentes, uma visualização discreta e bastante construtiva para todos os residentes.

O cotidiano da escola emerge desafios que integram a prática docente na sala de aula com inúmeras dificuldades. Segundo os residentes, os desafios giram em torno da falta de estímulo para ministrar as aulas, ao encontrarem os alunos desinteressados e indispostos a participar. A profissão requer muita dedicação, renovação, criatividade e estudo.

Desse modo, é necessária a constante atualização por meio de pesquisas e leituras. Na rede pública de ensino, há bastantes fatores que dificultam o trabalho dos professores, por exemplo o grande número de alunos para uma sala pequena, a falta de material didático, a falta de recursos tecnológicos que ajudam a dinamizar as aulas e outros. Tais reflexões possibilitam compreender a concepção de educação e formação docente.

Os residentes participaram de oficinas, com a temática do Sistema de Gerenciamento Escolar (SGE), para elaborar conteúdos a serem ministrados na semana e entender a frequência e horários. Ou seja, conheceram o sistema de controle da gestão escolar para os professores, os coordenadores, o diretor e a Diretoria Regional de Ensino de Araguaína.

A participação em feira de ciências permitiu também a visualização de como os alunos se disponibilizam para organizar esse evento, na produção de maquetes e projetos que seriam expostos a todos da comunidade escolar.

O debate teórico se fez presente na escola, através da análise de artigo sobre o tema que trata de como a escola é o principal agente em formar um aluno cidadão, não só ministrar aulas, conteúdos, mas também auxiliar na formação integral do aprendiz. Por fim, foram iniciadas pelos preceptores e residentes as discussões acerca dos possíveis projetos de intervenção pedagógica a serem realizados no primeiro semestre de 2019.

As dificuldades significativas dessa etapa giram em torno da dificuldade docente e discente do trabalho interdisciplinar entre Geografia e Biologia, na compreensão e interpretação do edital de seleção e das normas pré-estabelecidas para o desenvolvimento do projeto. Além disso, há a falta de adesão efetiva das escolas na disponibilização dos preceptores para participarem em todos os momentos de desenvolvimento do projeto, que aconteceram na UFT e na escola, tais como participação em seminários e oficinas e o acompanhamento integral ao residente, tanto nas atividades realizadas na UFT, quanto nas escolas-campo.

Apesar disso, a integração dos residentes na unidade escolar foi de fundamental importância para a formação profissional e acadêmica dos estudantes durante a formação inicial nas licenciaturas. Os licenciandos podem, de fato, acompanhar o dia a dia escolar. Assim, podem refletir para a busca de estratégias em torno da qualidade da educação, por meio de ações complementares, direcionadas aos saberes coletivos, capazes de impulsionar a criação de novos mecanismos de aprendizagens.

Essas ações permitiram reflexões que culminaram na efetiva participação de todos os integrantes do projeto na VII semana de Geografia “Reformas Educacionais e os Desafios do Ensino de Geografia” em outubro de 2018 na UFT, onde houve uma mesa redonda sobre o Programa Residência Pedagógica e Estágios do curso de Geografia, com a participação de um dos professores preceptores da rede de educação básica de Araguaína, e relatos de experiência de residentes, os quais, de forma voluntária, em duplas, apresentaram as experiências oriundas do projeto e expectativas para o desenvolvimento das futuras ações.

Houve também a participação dos residentes, através de apresentação de trabalho, no III Seminário Integrado de Ensino, Pesquisa, Extensão e Cultura, sobre o tema “Aportes Iniciais sobre a Experiência Interdisciplinar no Projeto Residência Pedagógica em Geografia/Biologia na cidade de Araguaína -TO -” e “Relatos de experiências Iniciais do Projeto Residência Pedagógica à luz da Geografia”.

O momento foi valoroso na consolidação do projeto no curso de Geografia, promovendo, ainda, a troca de experiências entre os acadêmicos residentes e acadêmicos do PIBID.

Entendemos que a abordagem direcionada ao desenvolvimento do projeto Residência Pedagógica remete ao ensino, à pesquisa e à extensão. Ao ensino, na medida em que se insere na formação de professores de Geografia; à pesquisa, porque realiza análise teórico atrelada à BNCC e ao diagnóstico das escolas-campo; e à extensão, pois emerge ativamente por intermédio das ações e inserção acadêmica junto às unidades escolares e à comunidade de modo geral.

No concernente ao ensino, de acordo com Cavalcanti (2010):

No Brasil e no mundo, a atual política educacional, traduzida nas normativas, nas referências oficiais de conteúdos escolares e nas reformas de sistemas, encaminhar a questão da formação do professor e de sua prática com base na concepção de profissional reflexivo de formação contínua de formação na escola, de valorização dos saberes prático do professor (CAVALCANTI, 2010, p. 2).

Segundo Cavalcanti (2010), as pesquisas na linha do ensino de Geografia no Brasil têm sido produzidas com o intuito de compreender a dinâmica desse processo e de indicar caminhos e abordagens que melhores resultados produzem (ou podem reproduzir) na aprendizagem e na formação do cidadão.

Seguindo nessa linha de raciocínio, a extensão serve de base ao objetivo de imersão maior do estudante no espaço escolar, favorecendo maior vivência do estudante na comunidade escolar, para além das atuais experiências realizadas durante a graduação no período do estágio supervisionado.

Consoante Saviani (1991), a extensão significaria essa articulação da universidade com a sociedade, de tal modo que aquilo que ela produz em termos de novos conhecimentos e aquilo que ela difunde, por meio do ensino, não ficassem restritos àqueles elementos que conseguem ser aprovados no vestibular e que integram determinado curso, objetivando formar uma determinada profissão.

Podemos perceber que a extensão permite adequar ensino e interação ao saber que a comunidade já possui, ao contribuir para melhorar o nível de vidas das pessoas em geral, fundamental para as iniciativas das universidades na produção de sugestões que permitam a transformação social em prol de melhores condições de vida. De mais a mais, ir além das fronteiras físicas da universidade, trabalhar em função de regiões menos favorecidas significam um avanço na organização da população em torno de seus interesses.

 

 

3. DIAGNÓSTICO, PROJETO DE INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA E REGÊNCIA NAS ESCOLAS-CAMPO

A intervenção na realidade do estudante, no intuito de obter um ensino-aprendizagem mais coeso, necessita de conhecimento prévio da comunidade escolar e de comprometimento do professor para com o aprendiz, ou seja, oferecer à formação inicial do estudante estruturas para executar suas próprias ações, voltadas à atualidade e à construção profissional. Isso, por sua vez, gerará condições de, com autonomia, criar futuras estratégias para a docência. Outrossim, quando professores desenvolvem suporte para a capacidade de aprender dos estudantes, estabelecem a oportunidade da troca de conhecimentos afetivos e sociais.

Demo (1985) endossa o valor do esforço em relacionar, na formação de professores, a pesquisa sobre a comunidade escolar ao teórico e ao empírico:

 

E, se atribuímos à universidade um compromisso com a comunidade em que está inserida, para que não fique apenas na teoria, mas consiga descer à pratica, isto se consegue da melhor maneira possível, se a intervenção na realidade estiver baseada em pesquisa prévia, porque não se pode influenciar o que não se conhece. E, em nosso caso, referimo-nos especialmente à pesquisa teórico-empírica, ou seja, àquela produção científica que busca conhecer a realidade, incluindo neste ato um trabalho teórico e um trabalho empírico (DEMO, 1985. p. 7).

 

De acordo com Freire (1993), atualmente, professores têm a difícil tarefa de apropriar do saber sistematizado, da sua utilização como instrumento de intervenção social e, também, de estabelecer uma relação horizontal com seus alunos, mormente porque professores e alunos são, hoje, vulneráveis a uma “sociedade autoritária e castradora” da liberdade de se expor. Por isso, professores e alunos devem ser postos numa situação de igualdade nas relações pedagógicas, trocando saberes e experiências.

Segundo Freire (1993), a mediação da linguagem e o uso de instrumentos pedagógicos fazem com que o professor, através de um bom ensino, desafie o nível em que o sujeito aluno está, respeitando seus conhecimentos e experiências de vida com uma visão para o futuro no desenvolvimento das capacidades sociais, culturais, acionado as “zonas de desenvolvimento proximal” do sujeito.

Seguindo nessa perspectiva, no primeiro semestre de 2019, na segunda etapa de atividades do projeto, a imersão do residente na escola-campo foi realizada por meio de planejamentos didático- pedagógicos de atividades curriculares, baseando-se no projeto educativo de ensino e na efetiva execução de regência.

Reconhecendo a importância de os projetos educativos de ensino atenderem individualmente as necessidades das escolas, direcionando para contemplar as orientações previstas no seu Plano Político Pedagógico, os projetos de intervenção foram desenvolvidos a partir do diagnóstico sobre a comunidade escolar.

As temáticas foram, antes, discutidas em reuniões na UFT, de maneira interdisciplinar. Utilizamos as habilidades e competências descritas na BNCC (2018) dos anos finais do ensino fundamental, das áreas temáticas das ciências humanas e das ciências da natureza, articulando as temáticas da Geografia às da Biologia.

Dessa forma, valemo-nos das competências da BNCC (2018, p. 359) um e dois relativas à Geografia, descritas nas áreas humanas e sociais aplicadas. Elas propõem utilizar os conhecimentos geográficos para entender a interação sociedade/natureza e exercitar o interesse e o espírito de investigação e de resolução de problemas. Ademais, estabelecer conexões entre diferentes temas do conhecimento geográfico, reconhecendo a importância dos objetos técnicos para a compreensão das formas como os seres humanos fazem uso dos recursos da natureza ao longo da história.

As competências direcionadas à Biologia, na BNCC (2018, p. 324), descritas na área das Ciências da Natureza um e dois, direcionam o olhar para compreender as Ciências da Natureza como empreendimento humano, e o conhecimento científico como provisório, cultural e histórico; compreender conceitos fundamentais e estruturas explicativas das Ciências da Natureza, bem como dominar processos, práticas e procedimentos da investigação científica, de modo a sentir segurança no debate de questões científicas, tecnológicas, socioambientais e do mundo do trabalho, colaborando para a construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva.

O projeto da Escola professora Silvandira, "Produção de material Didático: Contribuição para o ensino de Geografia física na escola Professora Silvandira Sousa Lima", assentou-se no objetivo de realizar produção de material didático para contribuir para o ensino de Geologia. A temática está voltada para a área da geografia física, mais especificamente a estrutura da terra e as classificações das rochas. A metodologia seguiu por meio de debate, analisando os recursos didáticos disponíveis na biblioteca da escola e as pesquisas bibliográficas na área de conhecimento da geologia. Em seguida, dividiu-se em três momentos: (1) coletas de rochas encontradas na região, aquisição de algumas amostras, cedidas pelo laboratório de multiuso de geologia, solo e hidrografia (LABGESOLO) do curso de geografia da Universidade Federal do Tocantins; (2) confecção do material didático, maquetes com material de baixo custo; (3) Abordagem do conteúdo através de uma exposição oral, exposição das rochas aos discentes, demonstrações e exemplo de como são utilizadas no dia a dia.

Por fim, foi realizada a avaliação da ação do projeto e a doação das rochas e da maquete à escola-campo como recursos didáticos para docentes utilizarem no ensino de Geografia (vide figura 2).

 

Figura 2 Projeto de intervenção pedagógica - Colégio Estadual Professora Silvandira

Fonte: Acervo particular dos autores (maio de 2019)

 

O projeto "Importância da leitura na educação básica: 'geografizando no espaço da biblioteca'” parte do incentivo à leitura, voltada à Geografia, de forma interdisciplinar, com obras literárias. O intuito é desenvolver no estudante habilidades que permitam o reconhecimento da leitura como fonte de pesquisa e conhecimento de mundo (vide figura 3).

 

Figura 3 Projeto de intervenção pedagógica - Colégio Estadual Professora Silvandira

IMG_20190523_084858201

Fonte; Acervo particular dos autores (maio de 2019)

           

Apresentando o espaço da Geografia na biblioteca de forma atrativa, a metodologia se divide nas seguintes etapas: a primeira é a separação de todos os livros direcionados à Geografia; depois, arrumam-se as prateleiras nas quais os livros estão organizados. E, semanalmente, ocorre a realização de rodas de leituras com temas específicos, nas áreas da Geografia, atrelados à literatura de cordel, a poemas, a letras de músicas.

No Colégio Jardim Paulista, foi desenvolvido o projeto "Caminhos para a universidade", com o escopo de apresentar as diversas formas de acesso ao ensino superior público a estudantes do ensino médio da rede básica de ensino, criando uma proximidade entre estes e a universidade.    

A metodologia consiste em palestra sobre educação superior e o seu funcionamento, bem como sobre os cursos oferecidos na universidade e visita técnica às dependências da Universidade Federal do Tocantins. O intuito é que o estudante, após a conclusão da educação básica, desperte para as possibilidades de continuidade de seus estudos, no sentido de minimizar as deficiências educacionais presentes no contexto regional.

Além disso, elaborou-se o projeto "Horta no espaço escolar: alimentação saudável e conservação ambiental". O objetivo é despertar nos estudantes o interesse de revitalizar a horta da escola, colocando em prática a conservação ambiental e a alimentação saudável (vide figura 4).

 

Figura 4 Projeto de intervenção pedagógica - Colégio Jardim Paulista

IMG-20190530-WA0061

Fonte: Acervo particular dos autores (junho de 2019)

 

A intenção é o aproveitamento dos alimentos de produção orgânica sem a utilização de agrotóxicos. Por sua vez, fazer uso de fertilizante natural de substâncias e controle de pragas e adubação. A horta sustentável acaba por sensibilizar os discentes para a plantação e hábitos saudáveis de consumo de alimentos. A metodologia consiste no replantio de sementes na horta e palestras, na escola Jardim Paulista, sobre alimentação saudável e aproveitamento de alimentos típicos da região e a compostagem de restos de alimentos da merenda escolar para produção de adubo orgânico. Além disso, incentivar os estudantes a colher e levar para casa os excedentes de produção da horta escolar.

Na escola CEM Benjamin José de Almeida, foi elaborado o projeto "Jogos como recurso didático-pedagógico para o ensino de Biologia no CEM Benjamim José de Almeida (vide figura 5).

 

Figura 5 Projeto de intervenção pedagógica - CEM Benjamin José de Almeida

IMG-20190515-WA0108

Fonte: Acervo particular dos autores (junho de 2019)

           

O projeto em questão buscou utilizar jogos como recurso didático de forma lúdica, visando aprimorar os conhecimentos dos estudantes do ensino médio na disciplina de Biologia. A metodologia é realizada por intermédio da confecção de jogos a partir do tema Reinos da Biologia e Vírus, trabalhados no 2° ano do Ensino Médio.

A aplicação das dinâmicas com os jogos é realizada após as aulas teóricas acerca dos temas, de forma que já existe algum entendimento do conteúdo por parte dos estudantes.

Também foi trabalhado o projeto "Alimentos à mesa: experimentos para uma alimentação saudável", com o objetivo de contribuir para a mudança de hábitos alimentares dos discentes, promovendo uma reeducação alimentar saudável (vide figura 6).

 

Figura 6 Projeto de intervenção pedagógica - CEM Benjamin José de Almeida

IMG-20190529-WA0049

Fonte: Acervo particular dos autores (junho de 2019)

           

A metodologia se desenvolve, inicialmente, pela seleção das turmas, de 1º e 2º ano. A princípio, realizamos a coleta dos dados do cardápio escolar e hábitos alimentares dos estudantes da escola. Na sequência, apresentamos aulas teóricas com vídeos educativos e lúdicos sobre o tema, como forma de incentivo ao consumo de uma alimentação saudável e experimentos para conhecimentos de nutrientes em determinados alimentos. Em seguida, com toda a escola convidada a participar, aconteceu uma palestra com profissionais da área de nutrição, enfatizando a importância de se desenvolver um padrão alimentar variado e nutritivo.

Para finalizar, os estudantes apresentaram, através de uma exposição oral, a degustação de produtos, o que entendem por alimentação saudável e o que aprenderam sobre os nutrientes contidos nos alimentos que consomem em seu dia a dia. Além disso, confeccionaram uma tabela nutricional com base no cardápio exposto na área de alimentação da escola. Por último, a avaliação dos resultados se deu através dos depoimentos e das respostas do questionário realizado com os estudantes.

O projeto "Horta no espaço escolar: alimentação saudável e conservação ambiental" segue o mesmo objetivo do projeto de mesmo tema, despertar nos estudantes o interesse de revitalizar a horta da escola, no sentido de conservação ambiental, alimentação saudável e produção de um recipiente de materiais reciclados para realizar a compostagem dos restos de alimentos da merenda escolar (vide figura 7).

 

Figura 7 Projeto de intervenção pedagógica - CEM Benjamin José de Almeida

IMG-20190601-WA0079

Fonte: Acervo particular dos autores (junho de 2019)

 

A intenção é o aproveitamento dos alimentos de produção orgânica sem a utilização de agrotóxicos, além de fazer uso de fertilizante natural de substâncias e controle de pragas e adubação. A horta sustentável tem a finalidade de sensibilizar os estudantes para a plantação e hábitos saudáveis de consumo de alimentos.

Os projetos supracitados de revitalização da horta, alimentação saudável, construção e desenvolvimento de jogos didático-pedagógicos e material didático surgiram, respectivamente, das demandas de educação ambiental no espaço escolar e da necessidade de melhoria na aquisição de conhecimentos pelos estudantes por meio das metodologias ativas ou do modelo de sala de aula invertida. Essa metodologia consiste na inversão do papel do professor, tornando-se um mediador no processo de ensino. Os estudantes são protagonistas do processo de busca do conhecimento. Com o conteúdo prévio que foi repassado pelo professor, o estudante se utiliza da autonomia de pesquisa e da tentativa de resolver exercícios e identificar suas dúvidas.

A metodologia ativa parte do princípio de que os estudantes precisam ter o primeiro contato com o conteúdo antes de chegarem à escola e, só após esse contato, poderão ser auxiliados pelo professor, ou seja, a partir das dúvidas que surgirem mediante a resolução dos exercícios.

Cabe enfatizar que esse contato com a prática de projetos serviu de base essencial na preparação e no planejamento destinado ao período de regência de aulas.

A etapa de regência de aulas nas escolas-campo teve início no mês de agosto de 2019, com a realização do planejamento didático-pedagógico, a continuidade na execução de intervenção pedagógica e o acompanhamento das atividades realizadas anteriormente.

No período de abril a novembro de 2019, os residentes passaram a ministrar as aulas obrigatórias, de carga horária total de 100h de regência. No período, parte das aulas foi planejada nas dependências da escola por meio de metodologias diversificadas por todos os envolvidos no projeto,

Os residentes trabalharam com livros didáticos, experimentos de baixo custo, metodologia ativa, sequências didáticas, jogos, aulas interdisciplinares, aulas temáticas, vídeos, mapas conceituais, letramento científico e simuladores virtuais. Realizaram atividades educacionais em sala e em outros ambientes da escola.

Sobre a experiência vivenciada pelos preceptores durante o projeto, destacamos a descrição do professor preceptor Barbosa, G.M.J. ( Relatório RP final, 2020) de que foram trabalhos em diferentes frentes na unidade escolar, abarcando campos como a cartografia, geologia, paisagem. Mapas temáticos foram produzidos pelos alunos, textos geográficos foram lidos e debatidos e uma amostra geológica permanente foi recolhida como material didático da escola. Colocou-se a ciência geográfica em evidência na biblioteca para estimular a leitura. Elaboraram-se projetos ambiciosos que tiveram que ser adaptados, mas os resultados foram satisfatórios.

A respeito da experiência vivenciada durante a etapa de regência de aulas, o professor preceptor Barbosa, G.M.J. (2020, p. 2), acrescenta:

 

[...] “as dificuldades existiram e alguns acadêmicos no exercício da docência foram expostos a desafios que colocaram à prova sua resiliência. Alguns chegaram a falar em desistir da profissão mediante a realidade de algumas turmas de Fundamental II. Vontade de chorar, arrancar os cabelos, rouquidão, etc. Vários sentimentos e sensações se misturam. Aí vem a superação e o dia seguinte. Mal sabiam eles que estavam experimentando o turbilhão de emoções por que todo professor   passa. Acredito que todos perceberam que o poder das alegrias supera em muitos as frustrações e que elas tendem a se amenizar com o tempo. No mais, conversamos muito e trocamos ideias. Pela primeira vez, senti-me um velho professor desejoso de contar meus causos para esta juventude rica em vida”.

 

Para o professor preceptor Barbosa, “o projeto Residência Pedagógica foi a oportunidade e o instrumento utilizado para sair da minha zona de conforto e contribuir para a nova geração de acadêmicos da ciência que defendo há tantos anos” (Barbosa, G.M.J., 2020, p. 2).

A respeito da experiência vivenciada pela maioria dos residentes durante a etapa de regência de aulas a residente Fragoso, C.C. (Relatório RP final, 2020, p. 14) sintetiza:

 

“O programa Residência Pedagógica me possibilitou uma experiência única            pois pude presenciar diferentes escolas, pois o mesmo veio com intuito de           preparar futuros professores, essa etapa final me possibilitou ingressar no ambiente escolar como residentes regente em sala de aula, dando total liberdade para preparar nossas aulas para ministrá-las em sala. Com os projetos executados e após podendo ver que foi algo que acrescento na escola a campo e de suma importância para nos futuros professores”.

           

Na etapa de dezembro/2019 a janeiro/2020, foram realizados seminários com apresentação de resultados, socialização e a avaliação geral sobre as ações do projeto e eventos como “VIII SIEPE – Seminário de extensão, Cultura e Assuntos Comunitários da Universidade Federal do Tocantins”. Na oportunidade, todos apresentamos trabalho científico, por meio de resumo expandido.

Ocorreu, também, a “Semana Acadêmica de Geografia: Geografia e suas perspectivas do Norte do Tocantins e II Seminário Residência Pedagógica e PIBID: Experiências iniciais e Perspectivas geográficas na formação de professores para educação básica na cidade de Araguaína – TO”: Foi realizado pelo núcleo de Geografia e permitiu a apresentação de relatos de experiências e exposição de trabalhos realizados na escola-campo, por exemplo material didático-pedagógico, maquetes e mapas regionais.

Encerramos o projeto com o II Seminário Institucional Descentralização da Residência Pedagógica”, momento importante de troca de experiência, socialização e avaliação entre todos os envolvidos no projeto na UFT do campus de Araguaína. Concluímos os trabalhamos de maneira individual com a elaboração de relatórios finais, envio de resumo expandido a ser publicado em Dossiê na Revista Desafios/ UFT e produção em vídeo das imagens das ações disponível em YouTub.

É possível afirmar que o projeto Residência Pedagógica no curso de Geografia da UFT, câmpus Araguaína, trouxe possibilidades para melhoria da educação no Norte do Tocantins, através de projetos que auxiliaram no ensino e na aprendizagem e contribuíram efetivamente para a formação inicial de professores da região.

Em virtude de receber estudantes pertencentes à região Norte e Nordeste do Brasil, em sua maioria do Tocantins, Pará e Maranhão, o projeto conseguiu produzir intervenção na realidade escolar. Isso porque almejamos a perspectiva idealizada por Mendes (2006), em suas reflexões sobre a expansão do ensino superior no Brasil, que ajudam a compreender a relação entre a universidade e o desenvolvimento nacional.

Os postulados que consubstanciam a expansão universitária constituem-se um processo ambíguo de ruptura do status quo, que significaria um meio de desenvolvimento pela substituição de um equilíbrio social por outro. Nesse sentido, seria segundo a elevação de padrões de vida da comunidade, por meio dos serviços a serem desempenhados pelos novos quadros profissionais e sob a forma de interiorização geográfica do ensino superior. E seguiria até o ponto em que venha oferecer às populações do interior verdadeiras escolas superiores, em que as condições vigentes da escola permitam a absorção de profissionais bem formados.

 

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É importante aprofundar ações focadas em solucionar a problemática deficitária na educação brasileira, sobretudo, através da compreensão de como as desigualdades socioeconômicas regionais podem interferir diretamente nos dados de qualidade do processo de ensino-aprendizagem.

Destacamos que, apesar das disparidades regionais locais, confirmadas pelo Ministério da Educação, Notas Estatísticas (2017), as quais apontam indicadores do IDH menores no âmbito nacional, tanto no contexto da educação, quanto no socioeconômico, surgem possibilidades por meio de políticas públicas para formação docente. Estas necessitam visualizar as desigualdades, não conformando com elas, e fomentar cada vez mais recursos para a educação, de forma mais equitativa e levando em conta as especificidades regionais brasileiras.

É de nosso conhecimento que a educação é um direito de todos, contemplado na Constituição Federal de 1988, assegurando o dever do Estado de oferecer tal direito. Nessa seara, o projeto em tela vai ao encontro de uma educação universal e de qualidade a alunos que estão saindo do ensino médio. Dito de outro modo, atende aos preceitos da Carta Magna.

Nas palavras de alguns autores, a história do ensino público e, em particular, do ensino superior, é bastante penosa no Brasil, sobretudo por duas razões: de um lado, está associada ao ideal de democratização do acesso dos estudantes trabalhadores e, de outro, está relacionada às condições mais precárias de ensino e de aprendizagem, principalmente em IES privadas que oferecem, em geral, cursos considerados por muitas pessoas de melhor qualidade. Na verdade, houve a democratização da educação sem os meios de oferecer uma educação efetivamente de qualidade.

Além disso, a história retrata a luta dos trabalhadores por oportunidades de estudar, mesmo laborando oito horas diárias ou mais. Os estudantes precisam, assim, conciliar trabalho e estudo, na maioria das vezes, sem apoio financeiro do Estado, acreditando que o estudo poderá melhorar a sua condição de vida. Todavia, dado as condições objetivas, boa parte dos estudantes do ensino superior noturno, mormente o privado, acaba se tornando inadimplente, evadindo ou mesmo concluindo um curso em condições que não permitem agregar maior valor à formação e à qualificação para o mundo do trabalho, assim como para o desenvolvimento pessoal e preparo para o exercício da cidadania.

Para melhor explicar esse cenário, focalizamos algumas políticas públicas e suas ações de maior destaque, entre elas a ampliação de vagas públicas e a interiorização das IES, que têm ocorrido tanto no nível federal quanto no estadual; a ampliação do financiamento aos estudantes via novas políticas de financiamento; o estímulo à modalidade a distância; as políticas e os programas de inclusão e de ações afirmativas. Representam uma mola propulsora da elevação de padrões de vida da comunidade, por intermédio dos serviços a serem desempenhados pelos novos quadros profissionais e sob a forma de interiorização geográfica do ensino superior.

Sem dúvidas, há importantes iniciativas de políticas públicas, como o Programa Residência Pedagógica, que surge para ampliar e melhorar a formação inicial e continuada de professores, fundamental para a viabilização de uma educação regional de melhor qualidade e produzir mão de obra qualificada.

É imperativo dizer que a cidade de Araguaína, situada no Norte do Tocantins, emergiu como potência estratégica de abrangência na educação pública da região, sendo o núcleo principal de formação docente, apresentando muitos cursos de licenciaturas. Porém, os cursos necessitam incorporar, cada vez mais, novos aspectos relacionados à qualidade de ensino e aprendizagem.

À luz dessa realidade, o subprojeto do Núcleo de Geografia da UFT Araguaína configura como instrumento a serviço da formação docente contínua e de uma educação de qualidade, haja vista que está em consonância com os principais documentos acerca da educação e se guia pela interdisciplinaridade com o curso de Biologia. Desse modo, ao longo das atividades, notamos possibilidades várias de ações planejadas entre essas duas áreas de conhecimento.

Em conjunto, relacionamos temas afins entre essas duas disciplinas. Embasados no conteúdo específico de cada disciplina, desenvolvemos, a partir da temática espaço, ambiente e sociedade, projetos de intervenção didático-pedagógicas com ações nas três escolas-campo, tais como segurança alimentar envolvendo a revitalização do espaço da horta escolar, a composição e importância dos nutrientes dos alimentos consumidos na merenda escolar e no cotidiano dos estudantes.

De mais a mais, por causa da localização da cidade de Araguaína, na área de transição amazônica, na qual o bioma cerrado é predominante, podem ser encontrados frutos essenciais para a nutrição alimentar saudável. Portanto, são temas de grande relevância e objeto de estudos da Geografia e da Biologia, a serem trabalhados de forma interdisciplinar, até porque estão intimamente relacionados à preservação e conservação do ambiente como um todo.

Admitimos que a formação dos licenciandos se reveste de grande importância para promoção da qualidade da educação pública e para fortalecimento dos mecanismos de transformação dos futuros profissionais no mercado de trabalho. Certamente, o investimento institucional em projetos de imersão do acadêmico das licenciaturas no contexto escolar pode contribuir para o processo de construção e formação de agentes sociais, com leitura crítica do mundo, imbuídos de capacidade de intervenção e modificação da realidade.

Por outro lado, os professores preceptores relataram que, durante o desenvolvimento do projeto nas escolas, foram encontradas inúmeras dificuldades na sua prática docente. Muitos professores reclamaram da falta de paciência e, até mesmo, da falta de estímulo para ministrar as aulas, já que encontram os alunos desinteressados e indispostos a participar.

Os preceptores afirmaram que foi mais um desafio no labor de ministrar aulas na rede pública de ensino, pois convivem, ainda, com um grande número de alunos para salas pequenas, a falta de material didático, a carência de recursos tecnológicos que ajudam a dinamizar as aulas. Muitos só se dispõem do quadro branco como recurso. Se não bastasse, a realização das atividades da residência pedagógica na escola encontra uma grande barreira, no caso, a ausência de espaço adequado.

Pudemos avaliar, a partir das exposições dos preceptores, que as reflexões oportunizaram a expansão do conceito de treinamento ou capacitação para uma concepção mais ampla de educação e formação no trabalho, abrangendo o desenvolvimento humano e profissional. Ou melhor, “O compromisso consigo mesmo: autodesenvolvimento, autonomia, autoconhecimento, aprendizagem coletiva, reflexão sobre a profissão e o aprimoramento permanente da futura profissão” (Preceptora M.A.S. Vulcão, 2020).

Enfim, diante do exposto, a despeito dos entraves encontrados ao longo do desenvolvimento do projeto, despontaram inúmeras possibilidades qualitativas na formação de professores de Geografia na cidade de Araguaína. Com efeito, o projeto trouxe novo enfrentamento no cotidiano profissional, o qual requer muita dedicação, renovação, criatividade e estudo, bem como o cuidado com as relações que estavam sendo criadas entre os residentes participantes da residência pedagógica e os alunos. O projeto, de maneira sistematizada, tem buscado a excelência em educação, com o objetivo de oferecer condições de ensino e aprendizagem, necessárias ao desenvolvimento pessoal e profissional qualificado para a docência.

 

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. BNCC. Disponível em http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 05 out. 2018.

CAVALCANTI, Lana De Sousa. A geografia e a realidade escolar contemporânea: Avanços, Caminhos, Alternativas. Lana De Sousa Cavalcanti – Universidade Federal de Goiás – Anais Do | Seminário Nacional: Currículo em Movimento – perspectivas atuais – Belo Horizonte, novembro de 2010.

DEMO, Pedro.  Metodologia científica em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 1985. P.255.

FREIRE, Paulo. Professora Sim, Tia Não: Cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Editora Olho d’Água, 1993.

GOMES, P. C. da C. CORRÊA, R. L. (Org.) Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007.

HAESBAERT, R. Região, Diversidade Territorial e Globalização. GEOgraphia – Ano. 1 – n. 1. Niterói- UFF. 1999

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Sinopse Estatística da Educação Básica 2014. Brasília: INEP, 2013. http://inep.gov.br/sinopses-estatisticas-da-educacao-basica. Acesso em: 8 fev. 2019.

MENDES, Durmeval Trigueiro. Ensaios sobre educação e universidade. Organizadores Maria de Lourdes de Alburquerque Fávero, Jader de Medeiros Brito. Brasília: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, 2006. 

MORAIS, I. A. Araguaína (TO): enquanto Cidade Média no contexto regional. 2014. 130 f.: i l.; 30 cm. Dissertação (mestrado) – Universidade de Brasília; Instituto de Ciências Humanas; Departamento de Geografia; Programa de Pós-graduação em Geografia, 2014.

PAVIANI, Jayme. Interdisciplinaridade: conceitos e distinções. 2. ed. Caxias do Sul, RS: Educs, 2008.

PONTUSCHKA, N. N, PAGANELLI, T. e CACETE, N.H. Para ensinar e aprender Geografia. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2009.

www.portaleducação.com.br/interdisciplinaridade/praticapedagógica> Acesso em: 28 fev. 2020.

PNUD – Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento Humano. Altas do Desenvolvimento Humano do Brasil. Disponível em: <http://atlasbrasil.org.br/>. Acesso em: 26 abr. 2019.

PDI. UFT. Universidade Federal do Tocantins. Plano de Desenvolvimento Institucional 2016-2020. Palmas: Conselho Universitário (CONSUNI); UFT, 2017.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2005.

SAVIANI, Dermeval. (1944). Ensino público e algumas falas sobre universidade.  Dermeval Saviani. Ed. São Paulo; Cortez: Autores associados; 1991. (Coleção Polêmicas do nosso tempo; v.10).