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Universidade Federal de Santa Maria
Econ. e Desenv., Santa Maria, v. 36, e83316, 2024
DOI: 10.5902/1414650983316
ISSN 2595-833X
Submiss�o: 26/02/2024 � Aprova��o: 17/09/2024 � Publica��o: 13/11/2024
2 SEMICONDUTORES: O QUE S�O E COMO S�O PRODUZIDOS
3 A EVOLU��O DA IND�STRIA DE SEMICONDUTORES
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Artigos
The chips and science act: uma an�lise da nova pol�tica industrial dos Estados Unidos voltada para a ind�stria de semicondutores
The chips and science act: an analysis of the new USA industrial policy targeting the semiconductor industry
Jos� Gabriel Pereira da Silva I
IUniversidade Federal do Cear�, Fortaleza, CE, Brasil
IIUniversidade Federal de Alagoas , Macei�, AL, Brasil
RESUMO
A ind�stria de semicondutores � um dos setores mais importantes da economia global, com implica��es no desenvolvimento tecnol�gico, econ�mico, na pol�tica e seguran�a nacional. O surgimento dessa ind�stria nos Estados Unidos na d�cada de 1950 permitiu a revolu��o da Computa��o e Eletr�nica, que transformaram definitivamente o curso da hist�ria humana. Como criador dos semicondutores e com a atua��o direta do poder p�blico, os Estados Unidos t�m se mantido no topo da cadeia global de semicondutores e lan�ado m�o de pol�ticas p�blicas visando preservar sua lideran�a no setor e assegurar as vantagens advindas desta posi��o. Este trabalho tem por objetivo analisar a nova pol�tica industrial dos Estados Unidos para a ind�stria de semicondutores com a aprova��o do Chips and Science Act, aprovado pelo Congresso Americano e sancionado pelo presidente Joe Biden. Os resultados mostraram que, o Chips and Science Act constitui-se como uma das pol�ticas industriais mais importantes voltadas para o setor de semicondutores americano, e que com essa Lei os Estados Unidos visam assegurar sua posi��o em um dos segmentos que consideram vital para sua lideran�a econ�mica, tecnol�gica, pol�tica e b�lica, direcionando investimentos para amplia��o da capacidade produtiva de semicondutores nacionalmente e investindo na ci�ncia aplicada ao setor de semicondutores, ao mesmo tempo em que buscam conter o avan�o chin�s nesse segmento.
Palavras-chave: Semicondutores; Estados Unidos; Chips Act; Pol�tica industrial
ABSTRACT
Keywords: Semiconductors; United States; Chips Act; Industrial policy
A ind�stria de semicondutores � um dos setores mais estrat�gicos da economia global, com implica��es significativas para a inova��o e o desenvolvimento tecnol�gico, al�m de ter um papel fundamental em �reas como a pol�tica e a seguran�a nacional. A cria��o e o desenvolvimento dessa ind�stria nos Estados Unidos, a partir da d�cada de 1950, permitiram avan�os tecnol�gicos em uma escala at� ent�o in�dita na hist�ria humana, que em grande parte ajudam a entender a hegemonia norte-americana at� os dias atuais.
Os semicondutores s�o a espinha dorsal do desenvolvimento tecnol�gico, com aplica��es que v�o desde dispositivos eletr�nicos at� sistemas de defesa e intelig�ncia artificial (Varas et al., 2021). � dif�cil conceber o est�gio atual da sociedade sem a internet e algumas das grandes empresas de tecnologia como Apple, Google, Meta (antes Facebook), Microsoft e as disrup��es que estas companhias foram respons�veis nas �ltimas quatro d�cadas (Miller, 2022a).
O l�der na produ��o de semicondutores tem vantagens significativas em termos econ�micos, tecnol�gicos, b�licos e geopol�ticos, al�m de exercer influ�ncia social e cultural. Isso porque os semicondutores s�o essenciais para a cria��o de produtos e servi�os de alta tecnologia, e a falta de acesso a eles pode colocar um pa�s em desvantagem competitiva em rela��o aos seus pares. Al�m disso, os circuitos integrados s�o a base tecnol�gica que possibilitar� que as tecnologias do futuro como a internet das coisas, o machine learning, os ve�culos aut�nomos e a intelig�ncia artificial se tornem realidade, o que torna os semicondutores ainda mais cr�ticos para os Estados Unidos, que s�o os l�deres mundiais nesse setor (Varas et al., 2020).
O presente trabalho busca analisar a nova pol�tica industrial dos Estados Unidos para a ind�stria de semicondutores oficializada com a aprova��o do Chips and Science Act, aprovado pelo Congresso norte-americano e sancionado pelo ent�o presidente Joe Biden (Partido Democrata) em 2022. Para isso, ser�o abordados aspectos como o surgimento do setor de semicondutores nos Estados Unidos na d�cada de 1950; a evolu��o desse segmento a partir dos anos 1960 com a entrada dos pa�ses asi�ticos na cadeia, que ajudaram a transformar e redefinir o mapa dos circuitos integrados; a atual posi��o dos Estados Unidos na produ��o global de chips; e por �ltimo a renova��o do interesse norte-americano em definir os circuitos integrados como prioridade nacional com a aprova��o de uma das mais ambiciosas pol�ticas industriais voltadas para o setor.
2 SEMICONDUTORES: O QUE S�O E COMO S�O PRODUZIDOS
Semicondutores s�o elementos intermedi�rios entre condutores (que possibilitam a passagem de eletricidade, calor ou radia��o eletromagn�tica como o cobre, o ouro, a prata e o alum�nio) e isolantes (elementos que resistem ao fluxo de eletricidade, calor ou radia��o eletromagn�tica como o silicone, a borracha, o vidro e a cer�mica). Circuitos integrados, tamb�m conhecidos como semicondutores, chips ou microchips, s�o o tipo mais comum de semicondutores por estarem presentes em todos os dispositivos eletr�nicos utilizados atualmente, abarcando as mais diversas �reas como comunica��o, sa�de, transportes e defesa nacional (SIA, 2018; OCDE, 2019).
A cria��o do primeiro semicondutor � atribu�da a Jack Kilby, engenheiro da Texas Instruments, e Bob Noyce, f�sico e cofundador da Fairchild Semiconductor, que, de maneira independente e usando m�todos distintos, criaram em 1958 o primeiro circuito integrado. O chip criado por Kilby consistia em um bloco de germ�nio com capacitores e resistores conectados por fios min�sculos, enquanto o processo desenvolvido por Noyce era mais simples e usava sil�cio ao inv�s de germ�nio, simplificando a fabrica��o (Miller, 2022a).
Os chips s�o constru�dos a partir de um substrato de silicone, chamado wafer. Em um processo conhecido como doping, s�o depositadas camadas finas de materiais semicondutores como o sil�cio, alterando o fluxo de corrente el�trica no circuito. Os transistores, que s�o os elementos b�sicos do circuito integrado, s�o criados atrav�s de processos de litografia e deposi��o de camadas de produtos qu�micos que permitem a constru��o de padr�es de dimens�es nanom�tricas (OCDE, 2019).
Cada microchip pode conter centenas de milh�es de transistores, que s�o os respons�veis por controlar a passagem de corrente el�trica atrav�s do circuito criando os 0s e 1s que s�o a base da computa��o moderna, permitindo a realiza��o de opera��es l�gicas complexas. A capacidade l�gica de um chip � diretamente relacionada ao n�mero de transistores que ele cont�m, o que determina sua capacidade de processamento e velocidade (l�gica), e de armazenamento de dados (mem�ria), (Brown; Linden, 2009).
Devido � constante necessidade do aumento do poder computacional, isto �, velocidade de processamento e c�lculo e de armazenamento, a ind�stria de semicondutores tem trabalhado no desenvolvimento de transistores com dimens�es cada vez menores, na ordem de alguns nan�metros. Isso tem permitido a constru��o de microchips ainda mais poderosos, capazes de processar grandes quantidades de dados em fra��es de segundo. Atualmente, as fabricantes mais avan�adas � Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC), Samsung e Intel � j� produzem chips com 3 nan�metros de espessura. Para efeitos comparativos, um fio de cabelo humano tem 100 mil nan�metros de espessura (King; Leung; Pogkas, 2021).
A produ��o de circuitos integrados � um processo moroso e extremamente caro desde a fase de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), design e fabrica��o (Eurasia Group, 2020). A instala��o de uma f�brica para produzir os chips mais avan�ados, aqueles abaixo de 10 nan�metros, pode custar 20 bilh�es de d�lares, dos quais os equipamentos de �ltima gera��o representam 20% do custo total e rapidamente se tornam obsoletos (para estar dentro da fronteira tecnol�gica), devido � constante evolu��o e demanda por semicondutores cada vez mais potentes e capazes de sustentar o progresso tecnol�gico. Feita de maneira cir�rgica e com precis�o nanom�trica, a fabrica��o pode demorar tr�s meses e envolve centenas de processos, com microchips contendo mais de uma centena de camadas interconectadas por padr�es de silicone e fios de cobre (Whalen, 2021).
As salas onde os chips s�o produzidos devem ser livres de poeira, com qualidade do ar e temperatura extremamente regulados. O transporte das placas de silicone � feito de uma m�quina a outra por rob�s para minimizar o risco de acidentes e desperd�cio de tempo e milh�es de d�lares caso haja falha na execu��o de alguma das etapas.
�Um dos processos mais caros da produ��o � a litografia ou fotolitografia, um processo que consiste em desenhar complexos padr�es de transistores em uma m�scara fotogr�fica que, ap�s ser posicionada sobre a placa de silicone, recebe disparos de luz ultravioleta �imprimindo� os modelos de transistores repetidas vezes nas centenas de camadas. A m�quina de litografia pode ter um custo superior a 100 milh�es de d�lares. Al�m disso, a velocidade em que as f�bricas se tornam obsoletas requer uma produ��o ininterrupta enquanto a tecnologia de ponta usada �ainda� seja avan�ada (King; Leung; Pogkas, 2021).
Os circuitos integrados s�o amplamente utilizados em diversos aparelhos eletr�nicos e s�o classificados em tr�s categorias principais de acordo com sua finalidade e aplica��o.
A primeira categoria compreende os circuitos integrados l�gicos, que s�o considerados os mais importantes por serem a base da computa��o e respons�veis pelos c�lculos complexos dos c�digos bin�rios 0 e 1. Os microprocessadores s�o uma subcategoria dos circuitos integrados l�gicos e se dividem em duas unidades principais: Central Processing Unit (CPU) e Graphical Processing Units (GPU). As CPUs s�o respons�veis por tarefas gerais em aparelhos eletr�nicos, como a abertura de p�ginas na internet ou aplicativos em smartphones. Em contrapartida, as GPUs s�o especializadas em processar elementos visuais, como a convers�o de imagens, e s�o mais potentes do que as CPUs, uma vez que conseguem realizar c�lculos complexos simultaneamente. Por essa raz�o, as GPUs s�o amplamente utilizadas em �reas como machine learning e intelig�ncia artificial. Os microprocessadores s�o empregados em diversos aparelhos eletr�nicos, como smartphones, computadores pessoais e servidores (Varas et al., 2021).
A segunda categoria � composta pelos chips de mem�ria, que s�o respons�veis pelo armazenamento de informa��es em aparelhos eletr�nicos. As informa��es armazenadas s�o utilizadas para auxiliar os circuitos integrados de l�gica nas opera��es que est�o por tr�s das funcionalidades dos aparelhos eletr�nicos. Os principais tipos de microchips de mem�ria s�o Dynamic Random Access Memory (DRAM) e NAND. Os DRAMs s�o semicondutores de mem�ria vol�teis, pois precisam de eletricidade para realizar opera��es e armazenam dados temporariamente. Em contraste, os chips NAND s�o n�o vol�teis, pois armazenam informa��es mesmo quando os eletr�nicos s�o desligados (Varas et al., 2021).
Por fim, a terceira categoria dos circuitos integrados � composta pelos Discretos, Anal�gicos e Outros (DAO), que s�o respons�veis por atividades b�sicas, como a regula��o de temperatura e o sinal de rede. Em compara��o aos chips de mem�ria e l�gica, os DAOs s�o menos avan�ados em termos de tecnologia e aplica��o. Esses tr�s tipos de circuitos integrados s�o utilizados em conjunto justamente por suprirem necessidades diferentes no funcionamento dos produtos eletr�nicos (Varas et al., 2021).
3 A EVOLU��O DA IND�STRIA DE SEMICONDUTORES
Nesta se��o, ser� abordada a evolu��o da ind�stria de semicondutores. A primeira subse��o apresenta a primeira evolu��o do setor de semicondutores, que foi sua transi��o do mercado militar para o civil nos EUA. A segunda subse��o apresenta a entrada de outros pa�ses na cadeia produtiva de chips. A �ltima subse��o trata da cadeia de valor.
De acordo com Miller (2022a), o surgimento da ind�stria de circuitos integrados esteve diretamente ligado aos objetivos militares do governo americano, atrav�s do Departamento de Defesa, devido � aplica��o dos chips em armamentos na corrida armamentista entre Estados Unidos e Uni�o das Rep�blicas Socialistas Sovi�ticas (URSS), durante a Guerra Fria, e principalmente ligado � corrida espacial entre as duas na��es. Nos primeiros anos do setor, as empresas de circuitos integrados concentravam grande parte do processo produtivo, pois muitas das tecnologias necess�rias para a produ��o de chips tiveram que ser desenvolvidas internamente ou adaptadas a partir de alternativas criadas nos laborat�rios de universidades americanas, como � o caso da litografia (Miller, 2022a).
Segundo Miller (2022a), na primeira d�cada da ind�stria de chips, o Pent�gono e a NASA foram os principais clientes da IBM, Fairchild Semiconductor e Texas Instruments, devido ao elevado custo de produ��o, o que tornava o uso de microchips proibitivo para o mercado civil. O Departamento de Defesa americano, ao contr�rio do setor civil, n�o tinha restri��es or�ament�rias n�o somente para desenvolver e comprar armamentos, como tamb�m para financiar o desenvolvimento de tecnologias por meio do seu bra�o de pesquisa, a Defense Advanced Research Projects Agency (Darpa), em conjunto com as empresas privadas.
A Fairchild e a Texas Instruments seguiram caminhos diferentes. Enquanto a �ltima preferiu manter-se aliada ao governo americano e ter o Pent�gono como principal cliente, os fundadores da Fairchild utilizaram sua proximidade com o Departamento de Defesa para obter recursos financeiros para desenvolver chips destinados ao consumo de massa.
A postura mais voltada para o mercado civil da Fairchild foi um dos fatores que ajudou na transi��o do uso de semicondutores do campo militar para o civil. Gordon Moore, um dos fundadores da empresa em 1957 e, posteriormente, da Intel em 1968, compreendeu que a aplica��o de chips em equipamentos eletr�nicos destinados ao consumo de massa seria ainda mais vantajosa para a ind�stria de semicondutores pois as possibilidades de uso e funcionalidades e o tamanho do mercado privado eram infinitamente maiores do que a aplica��o de chips na �rea militar (Miller, 2022a).
A redu��o de custos de produ��o que beneficiou o progresso do processo produtivo de semicondutores, impactando no desenvolvimento tecnol�gico de forma geral, foi poss�vel n�o somente com o uso de chips em produtos eletr�nicos, mas tamb�m com a expans�o da manufatura para regi�es geogr�ficas al�m dos Estados Unidos. A entrada da �sia na cadeia produtiva de circuitos integrados trouxe profundas transforma��es para o setor de microchips e ajuda a entender a fase atual. Mais do que reduzir custos com a m�o-de-obra asi�tica barata, a entrada de pa�ses como Coreia do Sul, Taiwan e Jap�o ajudaram a transformar a ind�stria de semicondutores e a distribui��o de tecnologia entre essas na��es com os Estados Unidos (Brown; Linden, 2009).
Para entender a motiva��o do Chips Act, � necess�rio identificar os caminhos que levaram at� esse momento. Ainda na d�cada de 1960, enquanto a ind�stria de semicondutores estava em sua fase inicial, o continente asi�tico foi inserido na cadeia de produ��o de microchips. Miller (2022a) aponta duas raz�es fundamentais para isso.
A primeira foi a necessidade de redu��o de custos produtivos. O custo da m�o-de-obra asi�tica nos anos 1960 era significativamente mais barato do que seu equivalente nos Estados Unidos. Ainda naquela �poca, a montagem dos semicondutores era feita a m�o. Com o aumento da demanda de microchips, era necess�ria uma quantidade cada vez maior de trabalhadores para suprir a oferta no mercado. O sal�rio-m�nimo nos Estados Unidos variou de 1,15 d�lares por hora para 2,90 d�lares por hora do in�cio da d�cada de 1960 ao final dos anos 1970 (United States, 2023). No mesmo per�odo, no sudeste asi�tico a m�o de obra custava em centavos de d�lares, o que tornou atrativo a abertura de f�bricas de semicondutores na regi�o (Miller, 2022a).
Ainda de acordo com Miller (2022a), a segunda raz�o para entrada da �sia na cadeia foi a amea�a comunista no continente. O governo americano receava que o restante do continente ca�sse sob dom�nio da URSS e China. Al�m disso, em rela��o ao Jap�o, os Estados Unidos buscavam uma forma de evitar um desfecho parecido com da Segunda Guerra Mundial.
Dessa forma, a pol�tica externa americana buscou integrar o sudeste asi�tico � sua ind�stria de tecnologia, beneficiando as empresas americanas com uma abundante m�o de obra barata, contribuindo para a redu��o de custos produtivos e alinhando a regi�o aos Estados Unidos, garantindo a influ�ncia geopol�tica da Am�rica no continente.
Para pa�ses como Taiwan, Coreia do Sul, Mal�sia, Singapura e Jap�o, o alinhamento com os Estados Unidos foi ben�fico economicamente, desenvolvendo sua ind�stria de tecnologia e criando empregos como uma forma de impedir que sua popula��o aderisse aos ideais comunistas; e do ponto de vista de seguran�a nacional, com a prote��o b�lica e pol�tica americana (Miller, 2022a).
Miller (2022a) aponta que a rela��o entre os dois pa�ses nos semicondutores come�ou com os Estados Unidos como produtor e o Jap�o como comercializador, demandando circuitos integrados para uso em produtos eletr�nicos para serem vendidos ao p�blico em geral. A companhia japonesa Sony desempenhou um papel fundamental nesta rela��o devido � sua tradi��o em design de produtos, com�rcio e marketing, sendo um dos agentes que viabilizaram a transi��o do mercado militar para o civil atrav�s da comercializa��o em massa de eletr�nicos.
O governo japon�s percebeu o potencial de semicondutores e implementou uma pol�tica industrial focada neste segmento utilizando-se de mecanismos como subs�dios � P&D e a empresas privadas, est�mulo � colabora��o entre os conglomerados de eletr�nicos japoneses, transfer�ncia de tecnologia por meio da parceria entre companhias japonesas e americanas em troca de acesso ao mercado consumidor japon�s e tarifas de importa��es de chips americanos para proteger os produtores locais (Tomoshige, 2022).
A pol�tica industrial japonesa para a ind�stria de semicondutores surtiu efeito e, na d�cada de 1980, o Jap�o ultrapassou os Estados Unidos como maior produtor de chips de mem�ria, saltando de 25% no in�cio dos anos 1980 para 65% em 1986, enquanto os Estados Unidos ca�ram de 75% para 24% no mesmo per�odo (Brown; Linden, 2009).
Al�m do suporte do governo, o Jap�o ganhou mercado atrav�s da otimiza��o de processos produtivos, caracter�sticos da cultura empresarial japonesa, melhorando a qualidade dos semicondutores e, ao mesmo tempo, reduzindo gastos, superando os Estados Unidos em custos e qualidade. Al�m disso, as empresas privadas investiram massivamente em P&D e na capacidade produtiva, permitindo ganhos de economia de escala que eram essenciais para a viabilidade do neg�cio (Miller, 2022a).
As empresas japonesas possu�am, tamb�m, vantagem de financiamento em rela��o �s suas concorrentes americanas. Os produtores japoneses faziam parte de conglomerados de eletr�nicos, contando com a expertise adquirida em outros mercados como o de televisores. Al�m disso, os grupos japoneses tinham bancos pr�prios, facilitando o acesso a recursos financeiros de maneira r�pida e barata, enquanto as americanas n�o tinham esse privil�gio e enfrentavam taxas de juros alt�ssimas empregadas pela pol�tica monet�ria do Federal Reserve para conter a infla��o na d�cada de 1980 (Brown; Linden, 2009).
Nesse momento, foi observado a primeira pol�tica dos Estados Unidos em dire��o � defesa de sua ind�stria. As empresas americanas fundaram a Semiconductor Industry Association (SIA), para buscar o suporte do governo americano em pressionar o Jap�o em pr�ticas que consideravam abusivas como a prote��o ao seu mercado interno e acusa��es de dumping das empresas japonesas no com�rcio internacional (Brown; Linden, 2009). Em 1986, os dois pa�ses estabeleceram o US-Japan Semiconductor Trade Agreement que, entre as principais medidas, estabeleceu a reserva de 20% do mercado interno japon�s para empresas estrangeiras (Irwin, 1996). Internamente, o governo americano flexibilizou a colabora��o entre as empresas de semicondutores e subsidiou a pesquisa e desenvolvimento com a cria��o da Sematech. Isso permitiu que os produtores americanos desenvolvessem tecnologias e processos para melhorar a qualidade de seus produtos e reduzir custos para competir com o Jap�o. A estrat�gia americana surtiu efeitos e em 1993 os Estados Unidos retomaram a lideran�a da ind�stria de chips (Miller, 2022a).
Brown e Linden (2009) apontam que as ferramentas utilizadas no sucesso do Jap�o explicam em parte sua derrocada no mercado de semicondutores. A �nfase excessiva em qualidade e processos assim como os exorbitantes investimentos em capacidade produtiva erodiram a presen�a japonesa na ind�stria e abriram espa�o tanto para retomada da lideran�a pelos Estados Unidos, como pela ascens�o da Coreia do Sul e Taiwan.
As fric��es entre os Estados Unidos e Jap�o remodelaram a din�mica da ind�stria de semicondutores e trouxeram uma transforma��o profunda que explicam a configura��o atual do setor.
A Coreia do Sul foi o maior benefici�rio do embate entre Jap�o e Estados Unidos. Assim como os japoneses, o pa�s tamb�m usou elementos parecidos para desenvolver sua ind�stria de semicondutores como subs�dio do governo e licenciamento de tecnologia americana. A Coreia come�ou por produzir semicondutores com tecnologia duas gera��es atr�s da fronteira tecnol�gica dos Estados Unidos, e com isso ganhou know-how para aprimorar a produ��o (Miller, 2022a).
O sucesso sul-coreano pode ser entendido atrav�s da Samsung, que, assim como as empresas japonesas, tamb�m fazia parte de um conglomerado com expertise em eletr�nicos, especificamente no mercado de televisores. Miller (2022a) coloca que um dos elementos que distinguem o sucesso duradouro da Coreia em compara��o ao Jap�o foi que, desde o in�cio, a Samsung esteve voltada para o mercado internacional, e isto a obrigou a seguir o ritmo tecnol�gico das l�deres americanas.
Estando exposta � concorr�ncia acirrada no mercado internacional, a Samsung otimizou sua forma de produzir, aumentando a rapidez e reduzindo os custos em compara��o com as empresas japonesas e americanas, enquanto esses dois pa�ses negociavam acordos comerciais mais justos que foram aproveitados pela Coreia do Sul.
No final dos anos 1990, a Samsung assumiu a lideran�a da produ��o de chips de mem�ria antes ocupada pelo Jap�o e preserva essa posi��o at� os dias atuais, ajudando a consolidar a Coreia do Sul como um dos l�deres da ind�stria ao lado dos Estados Unidos e Taiwan (Brown; Linden, 2009; Mckinsey & Company 2020).
Assim como Jap�o, Coreia do Sul, Hong Kong, Mal�sia e Singapura, Taiwan se aliou aos Estados Unidos em busca de prosperidade econ�mica e prote��o contra a URSS e o avan�o do comunismo durante a Guerra Fria, utilizando para isso o desenvolvimento de sua ind�stria de tecnologia, focando na base, isto �, no elemento que possibilitou o progresso tecnol�gico das �ltimas seis d�cadas: semicondutores.
Diferente de seus vizinhos asi�ticos, Taiwan ocupa uma posi��o central na ind�stria de semicondutores e na rela��o pol�tica e b�lica com a China, pois a ilha depende da prote��o americana contra a amea�a de invas�o chinesa (Hille, 2021).
Taiwan disputa sua sobreviv�ncia pol�tica e territorial com a China desde 1949, quando o Partido Comunista Chin�s instaurou o comunismo como regime pol�tico do pa�s. Os l�deres pol�ticos derrotados fugiram para Taiwan, enquanto a China clama a ilha como sua e espera integr�-la ao seu regime pol�tico e social. Devido �s tens�es pol�ticas com o pa�s vizinho, estar alinhado aos Estados Unidos e tornar-se essencial para essa na��o � uma forma utilizada por Taiwan para garantir sua sobreviv�ncia (Wasser; Rasser; Kelley, 2022).
Assim como os outros pa�ses asi�ticos, Taiwan usou de apoio do governo subsidiando pesquisa e desenvolvimento, constru��o de f�bricas, investimento em forma��o t�cnica e alian�a direta com os Estados Unidos e atraindo investimentos e empresas americanas para o pa�s. A ilha come�ou na base da cadeia como um centro para montagem e testagem devido � sua m�o de obra barata nas d�cadas de 1960 a 1980, e fez disso sua porta de entrada para escalar a pir�mide do setor de semicondutores (Miller, 2022b).
Nos anos 1980, a ind�stria de semicondutores de Taiwan come�ou a decolar, impulsionada pelo surgimento da TSMC, fundada em 1987 (Miller, 2022b). O modelo de neg�cio da TSMC � conhecido como foundrie, e baseia-se inteiramente na produ��o de chips para outras empresas de semicondutores, o que permitia a essas companhias se concentrarem no design e marketing de circuitos integrados.
A terceiriza��o da manufatura revolucionou a ind�stria de semicondutores e ajudou a decolar nos Estados Unidos o modelo de neg�cio conhecido como fabless � empresas inteiramente dedicadas ao design de chips e que terceirizam a produ��o para as foundries, tornando a TSMC e Taiwan atores vitais na ind�stria global de semicondutores.
Estar totalmente focada na fabrica��o permitiu � TSMC conquistar e garantir a lideran�a na manufatura avan�ada de semicondutores, particularmente na produ��o de microprocessadores e chips de mem�ria. A tecnologia inovadora de processos da TSMC permitiu produzir chips com maior desempenho, menos consumo de energia e menor tamanho do que seus concorrentes.
�De acordo com Varas et al. (2021), em 2019 a TSMC detinha 53% do mercado de foundries e 92% da produ��o dos chips mais avan�ados do mundo � abaixo dos 10 nan�metros. A lideran�a da TSMC em tecnologia sofisticada de processos tamb�m atraiu os principais projetistas de chips do mundo, incluindo Apple, Qualcomm e Nvidia. Isso fortaleceu ainda mais a posi��o da empresa no setor de microchips e tornou Taiwan um jogador fundamental na cadeia de suprimentos global de alta tecnologia (Miller, 2022a).
Diante de sua import�ncia para a cadeia global de semicondutores e para o progresso tecnol�gico mundial, Taiwan faz da posi��o que ocupa um �escudo de silicone�. Isto �, em ser indispens�vel para o avan�o tecnol�gico e para que os Estados Unidos continuem como l�deres mundiais do setor, a ilha espera contar com o apoio militar e pol�tico norte-americano. Enquanto, para a China, controlar Taiwan a colocaria no centro das ind�strias globais de tecnologia e semicondutores e com o poder de ditar o avan�o tecnol�gico e as implica��es disso nas esferas pol�tica, econ�mica e b�lica (Wasser; Rasser; Kelley, 2022).
Miller (2022a) afirma que o objetivo dos Estados Unidos em retomarem o topo da ind�stria, assim como o da China de conquistar a primeira posi��o, est�o diretamente conectados a Taiwan, assim como a rela��o pol�tica e militar dos dois primeiros. Taiwan, por sua vez, n�o tem interesse em abdicar ou reduzir sua import�ncia na cadeia global n�o somente pelas implica��es tecnol�gicas e econ�micas em estar no topo da ind�stria, mas sobretudo como estrat�gia de autopreserva��o.
A China ainda n�o disp�e de uma posi��o relevante nas etapas de design e manufatura de semicondutores, que s�o as mais avan�adas e com maior valor agregado ao longo da cadeia produtiva. O pa�s, no entanto, � o segundo maior mercado consumidor de semicondutores e lidera nas etapas de montagem e embalagem, que s�o os est�gios menos importantes e com menor valor agregado (SIA, 2021).
Dada a posi��o da China na economia mundial e a import�ncia dos circuitos integrados para a inova��o e lideran�a tecnol�gica, fundamentais para o crescimento sustent�vel, o pa�s lan�ou em 2015 o plano �Made in China 2025�. A iniciativa � projetada para aprimorar a qualidade e a capacidade de inova��o da manufatura chinesa, acelerar avan�os tecnol�gicos e alcan�ar autossufici�ncia em setores estrat�gicos, como semicondutores. Dentro desse contexto, semicondutores t�m uma import�ncia particular, uma vez que a iniciativa visa aprimorar as capacidades de pesquisa e desenvolvimento, estabelecer instala��es de manufatura de alto padr�o e atrair investimentos e talentos (Thomas, 2015; China, 2015).
A �nfase do pa�s em desenvolver seu setor de semicondutores decorre do reconhecimento do papel fundamental do segmento no impulsionamento do crescimento econ�mico e seguran�a nacional. Com uma grande depend�ncia da importa��o de semicondutores, a China busca reduzir sua exposi��o � tecnologia estrangeira e estabelecer uma ind�stria dom�stica de chips robusta e resiliente (China, 2015). Ao superar lacunas tecnol�gicas, alcan�ar autossufici�ncia e fomentar a lideran�a em design, manufatura e inova��o, o pa�s busca fortalecer sua posi��o no cen�rio internacional de semicondutores e se consolidar como uma pot�ncia global na economia, seguran�a e pol�tica (Miller, 2022b).
Com a elei��o americana de 2016 em diante, a necessidade de independ�ncia ficou ainda mais evidente para Beijing. O discurso de Donald Trump, candidato � presid�ncia americana em 2016, teve como uma das propostas de campanha restaurar a ind�stria de seu pa�s. Trump responsabilizava a China diretamente pela decad�ncia industrial dos EUA. A partir de 2018, os Estados Unidos impuseram tarifas em diversos produtos importados chineses, entre eles semicondutores. Visando dificultar ainda mais o desenvolvimento do setor de chips chin�s, o pa�s restringiu a exporta��o de produtos, m�quinas, equipamentos e tecnologia fundamentais para a produ��o de circuitos integrados. Na guerra comercial e tecnol�gica, a mais prejudicada foi a empresa chinesa Huawei, que era a l�der do setor tecnol�gico chin�s e liderava mundialmente na tecnologia 5G (Bown, 2020).
Varas et al. (2021), divide a cadeia de valor de circuitos integrados em quatro grandes n�veis: pesquisa e desenvolvimento pr�-competi��o; design; manufatura (que abarca a produ��o dos wafers); e montagem, testagem e embalagem. Os elos da cadeia s�o os setores de materiais, equipamentos, Eletronic Design Automation (EDA), e Core IP.
Pesquisa e desenvolvimento s�o F�sicos, Engenharias e Ci�ncias Computacionais intensivos; Design � Criatividade, Design gr�fico e Engenharias intensivo; Manufatura � capital intensivo; e montagem, testagem e empacotamento s�o trabalho intensivo. A �ltima fase da cadeia � caracterizada pela atua��o de trabalhadores com baixa especializa��o quando comparados com os profissionais das etapas precedentes (OCDE, 2019).
O n�vel de Pesquisa e Desenvolvimento engloba as pesquisas de ci�ncia de base e aplicada pela academia, governo e setor privado, que mais tarde s�o utilizadas pelas empresas privadas para desenvolverem produtos e servi�os a serem comercializados. � comum as esferas p�blica e privada unirem esfor�os e recursos em P&D como uma forma de redu��o de custos, compartilhamento de conhecimento e viabilizar as descobertas da academia para o mercado (OCDE, 2019). Na cadeia de valor de semicondutores, a divis�o de custos entre as empresas e o setor p�blico ou outro parceiro � ainda mais necess�ria dado os elevados custos de P&D. Segundo a Semiconductor Industry Association (2022), a ind�stria de semicondutores americana foi a segunda maior em gasto com Pesquisa e Desenvolvimento no pa�s, atr�s apenas do segmento farmac�utico, com um disp�ndio em P&D em 2021 de 50.2 bilh�es de d�lares.
Segundo relat�rio da SIA, o design de chips representa 50% do valor agregado na cadeia, enquanto a fabrica��o de wafers representa 24% e montagem, testagem e embalagem somadas representam 6%. O restante do valor � agregado pela ind�stria de suporte, isto �, materiais, equipamentos e EDA (Varas et al., 2021).
A cadeia produtiva da ind�stria de semicondutores � t�o global quanto a demanda e o uso de microchips. Pesquisadores, designers, fabricantes, fornecedores, distribuidores e consumidores est�o espalhados ao redor do mundo e um movimento ao longo da corrente tem efeito cadeia (Nathan Associates, 2016).
Dada a escala global da demanda por microchips e os altos investimentos ao longo da cadeia produtiva para desenvolver formas cada vez mais eficientes de redu��o de custos e ganhos de desempenho, uma s� companhia n�o consegue abarcar o mercado todo e dificilmente obteria sucesso ao tentar faz�-lo. Isso levou os grandes produtores do setor a adotarem um dos seguintes modelos de neg�cio: Integrated Device Manufacturer (IDM), que concentra Pesquisa e Desenvolvimento, design e manufatura; Fabless � empresas inteiramente dedicadas ao design e que terceirizam a produ��o; e as Foundries, que apenas fabricam os chips para as fabless, e ocasionalmente para as IDMs (Brown; Linden, 2009).
Conforme visto anteriormente, a primeira grande transforma��o do modelo de neg�cio da ind�stria foi for�ada pelo crescimento e eventual lideran�a do Jap�o no segmento de chips de mem�ria NAND, na d�cada de 1980. Al�m da concorr�ncia em custos e qualidade com os japoneses, o setor tamb�m teve que se reinventar para garantir o progresso tecnol�gico, o que foi fundamental para o surgimento das fabless, que se especializaram no design, possibilitando aumentar o n�mero de transistores nos circuitos integrados ao passo em que reduziam o tamanho daqueles.
Assim como as fabless, as foundries foram uma resposta aos custos de produ��o crescente e permitiram que aquelas prosperassem. A inova��o que esses dois modelos de neg�cio trouxeram revolucionaram a produ��o de chips geograficamente, permitindo que os gastos fossem divididos entre empresas e na��es.
Al�m da divis�o do modelo de neg�cio, outro mecanismo utilizado pelas empresas em resposta aos custos crescentes � a especializa��o em um segmento, como � o caso da Intel, que � l�der mundial em microprocessadores; e a Samsung, que lidera na produ��o de chips de mem�ria. A sul-coreana � respons�vel por grande parte dos avan�os obtidos nesse nicho atrav�s de massivos investimentos e conhecimento oriundos da expertise em outros mercados nos quais a companhia tamb�m atua, como o de televisores (Brown; Linden, 2009). A NVIDIA � a l�der em GPUs, componentes respons�veis pela parte gr�fica e visual dos computadores e outros dispositivos eletr�nicos, enquanto a Qualcomm lidera o segmento de chips para smartphones tanto no sistema operacional Android da Google como IOS da Apple; e a TSMC � a l�der global na produ��o dos chips mais modernos, manufaturando na escala abaixo de 10 nan�metros (Bauer et al., 2020).
Com a especializa��o por segmento e modelo de neg�cio, percebe-se uma mudan�a na posi��o ocupada pelos principais pa�ses envolvidos na cadeia global de semicondutores. Os Estados Unidos s�o os l�deres em design e equipamentos, que possuem maior especializa��o e valor agregado, enquanto o leste asi�tico � l�der em fabrica��o. A China vem avan�ando em outras etapas, mas o setor no qual lidera � o de montagem, testagem e embalagem, que possui menor valor agregado em compara��o com os seus concorrentes asi�ticos e com os Estados Unidos (Varas et al., 2021).
Devido a essa necessidade e aprendizagem em muitas vezes por tentativa e erro, o modelo de neg�cio predominante no setor nas d�cadas de 1960 e 1970 eram as Integrated Device Manufacturer � IDM, empresas que concentram Pesquisa e Desenvolvimento, design e fabrica��o. Com a evolu��o da ind�stria e sua expans�o geogr�fica para �sia, que culminou na entrada de competidores, especialmente do Jap�o, Coreia do Sul e Taiwan, concentrar todas as etapas em uma mesma empresa ficou cada vez mais custoso, principalmente para os produtores americanos, que passaram a enfrentar a concorr�ncia de firmas japonesas, caracterizadas por sua excel�ncia em processos e redu��o de custos (Brown; Linden, 2009).
A evolu��o da ind�stria de semicondutores atrav�s da entrada de outros pa�ses e o surgimento de novos modelos de neg�cio, conforme demonstrado, pode ser observada no gr�fico abaixo, que demonstra a especializa��o dos pa�ses envolvidos em determinadas partes da cadeia.
Gr�fico 1 � Cadeia de valor global de semicondutores � distribui��o por regi�o (% do total mundial, 2019)
Fonte: Varas, Antonio et al. (2021) adaptado pelo autor. Nota: Leste Asi�tico inclui Cor�ia do Sul, Taiwan e Jap�o
Assim como a cadeia produtiva, a receita de vendas de semicondutores tamb�m � compartilhada entre as mesmas regi�es.
O gr�fico abaixo mostra a distribui��o da receita de vendas nos �ltimos 10 anos. Os Estados Unidos ocupam a primeira posi��o, seguidos pela Coreia do Sul.
Gr�fico 2 � Receita anual de vendas de semicondutores por regi�o � em bilh�es de d�lares (2014 a 2023)
Fonte: Elabora��o pr�pria a partir de dados anuais da Semicondutor Industry Association � SIA (2024)
De acordo com a SIA, a ind�stria saiu de uma receita anual de vendas de 101,9 bilh�es de d�lares em 1994, para 526,9 bilh�es de d�lares em 2023 (SIA - Semiconductor Industry Association, 2015) e (Semiconductor Industry Association, 2024).
O gr�fico abaixo mostra a receita global de semicondutores desde 2005. � poss�vel observar que mesmo com oscila��es a trajet�ria geral da ind�stria se manteve ascendente, com destaque para 2022 com o maior recorde de vendas.
Gr�fico 3 � Receita global de vendas de semicondutores � em bilh�es de d�lares (2005 a 2023)
Fonte: Elabora��o pr�pria a partir de dados anuais da Semicondutor Industry Association � SIA (2024)
Analisando os dados apresentados nos gr�ficos acima, fica claro que a fragilidade dos Estados Unidos n�o � econ�mica. O pa�s lidera em receita e em �reas-chave da cadeia de semicondutores, como P&D, design e equipamentos. No entanto, na manufatura avan�ada, um dos segmentos mais cr�ticos, o pa�s, assim como o resto do mundo, depende de Taiwan, que controlava 92% da produ��o em 2019. Essa depend�ncia � ainda mais delicada para a Am�rica, pois Taiwan est� no centro de suas rela��es pol�ticas, diplom�ticas e b�licas com a China, seu principal advers�rio. Al�m disso, a revolu��o tecnol�gica, liderada por empresas americanas, depende do avan�o na manufatura de semicondutores para viabilizar tecnologias emergentes como computa��o em nuvem, intelig�ncia artificial, machine learning e ve�culos aut�nomos. Eventos que afetam Taiwan�sejam pol�ticos, b�licos ou naturais�impactam diretamente a ind�stria tecnol�gica americana e reverberam por toda a economia dos Estados Unidos e global.
A gest�o do presidente democrata Joe Biden, que iniciou seu mandato em 2021, trouxe de volta um plano econ�mico que remonta aos tempos de Franklin Delano Roosevelt em resposta �s fragilidades sociais e econ�micas causadas pela pandemia de Covid-19, instabilidades nas cadeias globais de valor, mudan�a clim�tica e as aspira��es chinesas na geopol�tica, economia, tecnologia e seguran�a nacional. O �once in a Generation economic plan� � uma combina��o de quatro planos:� American Rescue Plan Act (ARP); Infrastructure Investment and Jobs Act (IIJA); CHIPS and Science Act e; Inflation Reduction Act (IRA), com um or�amento combinado de aproximadamente $3.8 trilh�es (Muro et al., 2022).
O American Rescue Plan (ARP), assinado em 11 de mar�o de 2021, representa uma resposta abrangente em rela��o aos efeitos da pandemia de COVID-19 na sociedade e economia norte-americana. O ARP compreende um total de gastos de US$ 1,9 trilh�o, distribu�dos entre algumas medidas como pagamentos diretos aos indiv�duos, extens�o dos benef�cios de desemprego, financiamento para vacina��o, testes de COVID-19 e suporte aos governos estaduais e locais (United States, 2021a, 2021b).
O Infrastructure Investment and Jobs Act (IIJA) � um projeto de lei bipartid�rio do congresso americano e assinado por Biden em 15 de novembro de 2021. O projeto � voltado para infraestrutura e tem um or�amento aproximado de 1.2 trilh�es de d�lares para investir no sistema de transporte, energia, comunica��o, banda larga e �gua do pa�s (United States, 2021d).
O CHIPS and Science Act, que � o objeto de estudo deste trabalho, foi sancionado por Biden em 09 de agosto de 2022 e � voltado para a ind�stria americana de semicondutores. O projeto disp�e de um or�amento aproximado de 280 bilh�es de d�lares, visando fortalecer a lideran�a dos Estados Unidos no setor (Badlam et al., 2022).
Por �ltimo, o Inflation Reduction Act, de 16 de agosto de 2022, � voltado para o setor de energia e objetiva a transi��o energ�tica do pa�s para um modelo sustent�vel em resposta �s mudan�as clim�ticas (United States, 2022e).
Conforme visto nas sess�es anteriores, os Estados Unidos s�o o ber�o da ind�stria de semicondutores e nas primeiras d�cadas da inven��o dos circuitos integrados o pa�s era o l�der no setor. Ap�s mais de 60 anos da cria��o dos chips em solo americano, o pa�s continua � frente nas etapas de P&D e Design, junto com os segmentos de materiais e ferramentas utilizados na manufatura. No entanto, no est�gio de fabrica��o, a hegemonia americana come�ou a erodir na d�cada de 1980. J� na d�cada de 1990, o pa�s detinha 37% da produ��o global de microchips, em compara��o com 12% atualmente (Varas et al., 2020).
Para os Estados Unidos, semicondutores s�o essenciais para al�m do setor de eletr�nicos. Eles s�o fundamentais para o seu sucesso econ�mico, tecnol�gico e militar, que reconhece que, sem trazer de volta a manufatura ou a parte mais importante dela (a produ��o de chips abaixo dos 10 nan�metros, que � considerada atualmente como a fronteira tecnol�gica) para solo americano, a hegemonia do pa�s � incerta no futuro (United States, 2021c).
Em resposta a esse desafio, em 09 de agosto de 2022 o presidente americano assinou a lei n�mero 117-167, tamb�m conhecida como �the Creating Helpful Incentives to Produce Semiconductors (Chips)�, ou Chips Act, com o objetivo de restaurar a lideran�a americana na ind�stria de semicondutores e desenvolver pesquisa e inova��o avan�ada na �rea de tecnologia e ci�ncia, tendo como uma das raz�es mais importantes fazer frente ao avan�o chin�s nessas �reas.
O Chips and Science Act tem um or�amento aproximado de $280 bilh�es que ser� alocado na ind�stria de semicondutores e no desenvolvimento da ci�ncia atrav�s da pesquisa e inova��o (United States, 2022f).
De acordo com a Casa Branca:
The CHIPS and Science Act provides $52.7 billion for American semiconductor research, development, manufacturing, and workforce development. This includes $39 billion in manufacturing incentives, including $2 billion for the legacy chips used in automobiles and defense systems, $13.2 billion in R&D and workforce development, and $500 million to provide for international information communications technology security and semiconductor supply chain activities. It also provides a 25 percent investment tax credit for capital expenses for manufacturing of semiconductors and related equipment [�]
[�]� These funds also come with strong guardrails, ensuring that recipients do not build certain facilities in China and other countries of concern [�]. (United States, 2022f).
O Chips Act est� dividido em duas partes: a primeira intitulada DIVISION A - CHIPS ACT OF 2022, trata dos semicondutores e das a��es a serem executadas para suportar a manufatura de chips nos EUA. A segunda, intitulada DIVISION B - RESEARCH AND INNOVATION, � dedicada � pesquisa e inova��o e estabelece as atividades a serem executadas para o desenvolvimento da ci�ncia avan�ada no pa�s (United States, 2022a; 2022d).
A National Science Foundation (NSF), o Departamento de Energia (DOE) e o Departamento de Com�rcio (DOC) s�o os principais �rg�os do governo americano respons�veis pela implementa��o da lei, coordena��o das atividades e gest�o dos recursos. O �ltimo chefiar� os projetos dedicados ao setor de semicondutores, enquanto os primeiros ficar�o � frente da ci�ncia e pesquisa. O que faz sentido, visto que a primeira divis�o tem um aspecto mais comercial e econ�mico e com ganhos a curto e m�dio prazo. Enquanto a segunda parte da Lei est� mais focada na constru��o da ci�ncia para m�dio e longo prazo.
A se��o A do CHIPS Act de 2022 trata das iniciativas para fortalecer a manufatura de semicondutores em territ�rio americano. Com iniciativas que v�o desde o cr�dito fiscal de at� 25% para empresas que produzem chips na fronteira tecnol�gica, passando pela capacita��o da for�a de trabalho e inclus�o de minorias na cadeia produtiva.
A maioria dos recursos est�o dispostos na se��o 102, que determina:
The act establishes and provides funding for the Creating Helpful Incentives to Produce Semiconductors (CHIPS) for America Fund to carry out activities relating to the creation of incentives to produce semiconductors in the United States. (United States, 2022c).
O fundo disp�e de um total de $52.7 bilh�es a serem alocados conforme segue:
$50.0 bilh�es ser�o utilizados para implementar o programa de incentivos do Departamento de Com�rcio para a produ��o de chips, e ser�o alocados ao longo de cinco anos, sendo:
$39 bilh�es a serem distribu�dos diretamente em incentivos para a produ��o de semicondutores. Deste valor, 2 bilh�es ser�o utilizados na produ��o de chips legados, que s�o menos avan�ados e s�o usados principalmente na ind�stria de automotivos e pelo Departamento de Defesa. Outros $6 bilh�es ser�o usados para cobrir custos e garantias de empr�stimos (United States, 2022a; 2022c; 2022d).
$11 bilh�es ser�o utilizados no National Semiconductor Technology Center, National Advanced Packaging Manufacturing Program e no desenvolvimento e capacita��o da m�o-de-obra para a ind�stria de chips (United States, 2022d).
$2 bilh�es ser�o destinados ao America Defense Fund, que financiar� a cria��o de uma rede nacional de colabora��o entre universidades e ind�stria, de modo a desenvolver e transferir tecnologia na produ��o de semicondutores e o treinamento da for�a de trabalho (United States, 2022a; 2022c; 2022d).
$500 milh�es ser�o direcionados ao America International Technology Security and Innovation Fund, para a forma��o de uma rede de colabora��o entre os Estados Unidos e pa�ses aliados para dividir esfor�os e know-how na cria��o de uma cadeia produtiva global de semicondutores mais resiliente. Al�m disso, o fundo tamb�m custear� iniciativas entre os pa�ses visando promover a ado��o de chips e tecnologias da informa��o e comunica��o seguros (United States, 2022d).
$200 milh�es ser�o destinados ao America Workforce and Education Fund for the National Science Foundation, com o objetivo de capacitar e ampliar a m�o-de-obra dom�stica voltada para a ind�stria de chips (United States, 2022d).
Outro ponto a ser tratado na implementa��o dos programas do Chips Act � tornar a ind�stria de semicondutores mais igualit�ria e inclusiva, promovendo a participa��o de minorias, seja atrav�s de contratos com empresas cujos propriet�rios sejam de origens menos favorecidas e/ou na qualifica��o de profissionais pertencentes a grupos minorit�rios.
O Chips and Science Act � Division A tamb�m pro�be a utiliza��o dos recursos da Lei para a constru��o de f�bricas em solo estrangeiro e veta a participa��o de empresas de pa�ses considerados como amea�a aos interesses americanos em programas financiados pelos fundos do Chips Act. Por na��es vistas com preocupa��o aos objetivos do pa�s. O texto da Lei diz:
any country that the Secretary, in consultation with the Secretary of Defense, the Secretary of State, and the Director of National Intelligence, determines to be engaged in conduct that is detrimental to the national security or foreign policy of the United States. (United States, 2022a, p.16).
Ainda sobre as na��es que a Lei pede cautela, o texto cita China, Coreia do Norte, R�ssia e Iran.
Quanto �s proibi��es citando especificamente a China, cabe destacar o texto expresso na p�gina 19 que veta a expans�o da capacidade produtiva no pa�s por benefici�rios dos recursos do Chips Act:
IN GENERAL.� On or before the date on which the Secretary awards Federal financial assistance to a covered entity under this section, the covered entity shall enter into an agreement with the Secretary specifying that, during the 10-year period beginning on the date of the award, subject to clause (ii), the covered entity may not engage in any significant transaction, as defined in the agreement, involving the material expansion of semiconductor manufacturing capacity in the People�s Republic of China or any other foreign country of concern. (United States, 2022a, p. 19)
Al�m disso, agentes recipientes de recursos da Lei est�o impedidos de colaborar com entidades que representem um risco para a seguran�a dos Estados Unidos, seja P&D ou transfer�ncia de tecnologia. As empresas que n�o observarem a essas diretrizes ser�o obrigadas a devolver o valor integral recebido (United States, 2022a; 2023a).
Ainda, o Chips Act tamb�m autoriza a concess�o de 25% de cr�dito fiscal para a manufatura de chips avan�ados, que inclui tanto a produ��o direta, no caso das foundries, quanto a fabrica��o de materiais e equipamentos utilizados pela ind�stria avan�ada. O Congressional Budget Office (CBO) estima que o cr�dito fiscal custar� aos cofres p�blicos americanos aproximadamente $24,2 bilh�es (United States, 2022b, 2022d).
A divis�o A � diretamente voltada para a ind�stria de semicondutores e visando ganhos no curto e m�dio prazo para reconquistar e solidificar a lideran�a americana na cadeia global de circuitos integrados. A divis�o B, por sua vez, � dedicada para o ecossistema tecnol�gico como um todo, com o objetivo de colocar os Estados Unidos na vanguarda das novas tecnologias como Intelig�ncia Artificial, Machine Learning e Computa��o Qu�ntica. Para isso, essa parte da Lei est� voltada ao desenvolvimento cient�fico, abarcando da Engenharia � F�sica, da Qu�mica � Biologia, da Aeron�utica � Astronomia.
A divis�o B concentra a maioria dos recursos do Chips Act. De $278.2 bilh�es, s�o estimados $200 bilh�es para Research and Innovation, com grande parte dos recursos sob a gest�o da National Science Foundation (NSF) e Departamento de Energia (DOE) (Badlam et al., 2022; United States, 2022d).
Dos projetos financiados pela Divis�o B, cabe destacar os seguintes projetos, cujos recursos ser�o distribu�dos ao longo de cinco anos:
A cria��o do Directorate for Technology, Innovation, and Partnerships (�TIP�), que estar� sob a gest�o da National Science Foundation (NSF) e tem um or�amento de $20 bilh�es, direcionados para o investimento em pesquisa e tecnologia avan�ados. O objetivo do TIP � tornar essas descobertas comercialmente vi�veis, ou seja, com uma aplica��o pr�tica para o benef�cio social e econ�mico da sociedade norte-americana. Isso ser� alcan�ado atrav�s da parceria entre �rg�os governamentais nacionais e internacionais, academia e outra institui��es sociais como sindicatos e organiza��es n�o governamentais (United States, 2022d).
$13 bilh�es que ser�o administrados pela NSF dedicados ao �STEM Education�, isto �, educa��o nas �reas de Ci�ncias, Tecnologia, Engenharias e Matem�tica. O projeto � chamado de National Advanced STEM Education Program e tem uma abordagem compreensiva de todo o sistema educacional americano, engajando a comunidade cient�fica, docentes e discentes, incluindo das �reas rurais e minorias. O investimento do desenvolvimento da �STEM workforce� ser� feito de diferentes maneiras, como bolsas de estudos a alunos do n�vel superior, pr�mios a professores, capacita��o de docentes e discentes das �reas rurais, etc. O programa tamb�m tem um foco especial na educa��o prim�ria, e sobretudo desenvolver um sistema educacional compat�vel com as necessidades da ind�stria e mercado de trabalho da �rea de tecnologia (United States, 2022c, 2022d).
$11 bilh�es ficar�o sob a gest�o do Departamento de Com�rcio (DOC), que usar� esses recursos para criar hubs regionais de tecnologia com o intuito de promover crescimento econ�mico e integra��o regional � cadeia produtiva nacional. $1 bilh�o ser� destinado ao Recompete Pilot Program, da Administra��o de Desenvolvimento Econ�mico do DOC. Esses recursos ser�o canalizados em iniciativas para �reas em vulnerabilidade econ�mica com foco na cria��o de emprego e renda nessas comunidades (United States, 2022c, 2022d).
$9 bilh�es para o National Institute of Standards and Technology (NIST), que se reporta diretamente ao Departamento de Com�rcio. O valor ser� utilizado na padroniza��o de pesquisa e desenvolvimento de tecnologias, criar cadeias produtivas resilientes e manufatura �made in USA� de alto padr�o (United States, 2022c, 2023b).
O Departamento de Energia (DOE), conforme dito, � um dos pilares do desenvolvimento cient�fico almejados pelo Chips Act. A Lei autoriza $50,3 bilh�es para serem investidos em P&D conduzidos pelo DOE, universidades e empresas privadas. Entre as atividades a serem desenvolvidas sob a coordena��o do �rg�o est�o pesquisas em energia, biologia, f�sica nuclear e infraestrutura de laborat�rios. Adicionalmente, o DOE ter� $17,6 bilh�es para investir em seguran�a energ�tica, transi��o para energias limpas, microeletr�nica, tecnologia nuclear avan�ada, e P&D aplicados em energia (United States, 2022c, 2022d).
Assim como a Division A, a Division B tamb�m aborda, em v�rias ocasi�es, a preocupa��o com pa�ses que representam risco aos interesses norte-americanos, proibindo-os de receber recursos destinados ao desenvolvimento da ci�ncia. O exemplo mais contundente dessa diretriz � encontrado na Se��o 10.636 da Lei, que coloca:
Certain persons and foreign entities of concern or any other country determined to be a country of concern may not receive or participate in any grant, award, program, support, or other activity under specified programs or activities, including the Manufacturing USA Program. (United States, 2022c)
Ao analisar o texto da Lei e os principais pontos elencados nas Divis�es A e B descritas acima, � poss�vel elencar tr�s objetivos centrais que se visam alcan�ar com o Chips and Science Act:
restaurar a lideran�a da ind�stria de chips americana enquanto preserva a hegemonia nas etapas de P&D e Design, atrav�s da amplia��o da capacidade produtiva das f�bricas americanas e capacita��o da m�o-de-obra do setor de semicondutores;
desenvolvimento da ci�ncia avan�ada, visando a aplica��o pr�tica na �rea de tecnologia, que possui uma rela��o de interdepend�ncia com semicondutores. Nos projetos dedicados ao progresso cient�fico, � v�lido destacar que seus efeitos demorar�o mais a serem notados quando comparados com as iniciativas na amplia��o da capacidade de manufatura, uma vez que investimentos na ci�ncia e educa��o s�o sentidos no longo prazo e geralmente est�o mais alinhados com a vis�o de futuro da na��o;
conter o avan�o de na��es rivais, proibindo a participa��o direta, seja como benefici�rias dos recursos financeiros, seja participando no desenvolvimento da ci�ncia. Al�m disso, tamb�m busca-se conter a participa��o indireta dos pa�ses identificados como amea�a, sobretudo da China, atrav�s da proibi��o da transfer�ncia de tecnologia e know-how por agentes que sejam benefici�rios dos programas estabelecidos no Chips Act.�
5 Considera��es Finais
O surgimento da ind�stria de semicondutores na d�cada de 1950 nos Estados Unidos foi o que possibilitou o avan�o tecnol�gico em uma escala in�dita na hist�ria. Os chips possibilitaram a revolu��o da computa��o e eletr�nica que transformaram a sociedade verticalmente, desde a economia, � integra��o entre pa�ses e as rela��es sociais.
Conforme demonstrado ao longo deste trabalho, essa ind�stria � caracterizada pela intensa competi��o e investimentos massivos em Pesquisa e Desenvolvimento, Design e Manufatura, e os Estados Unidos desenvolvem um papel fundamental, a come�ar por serem os criadores dos circuitos integrados. Conforme demonstrado, essa posi��o privilegiada, na verdade, foi conquistada atrav�s da a��o direta do Estado americano ao construir as bases para o surgimento e desenvolvimento da ind�stria de circuitos integrados, atrav�s do investimento na ci�ncia e na cria��o de um ecossistema atrativo para a participa��o da iniciativa privada.
Os Estados Unidos reconhecem a import�ncia dos semicondutores para o progresso tecnol�gico, crescimento econ�mico sustent�vel, poderio militar e influ�ncia cultural, fatores que fazem desse pa�s a maior pot�ncia mundial. Assegurar sua lideran�a nessa ind�stria � garantir que sua hegemonia perdure. A Am�rica tamb�m reconhece que mesmo liderando nas �reas de P&D, design e equipamentos, o pa�s, assim como o resto do mundo, depende de Taiwan para produzir os chips mais avan�ados. E para os Estados Unidos, essa depend�ncia � ainda mais preocupante, uma vez que a ilha est� no centro das rela��es da Am�rica com seu maior concorrente - a China, que tamb�m almeja o topo da ind�stria e pode explorar essa fragilidade americana.
Nesse sentido, a aprova��o do Chips Act pelo congresso americano e san��o pelo presidente Joe Biden em 2022, evidenciam o quanto os Estados Unidos primam pela ind�stria de semicondutores e a consideram vital para os interesses americanos. Isso pode ser percebido no or�amento massivo e nos projetos estabelecidos pela Lei, visando fortalecer a manufatura de semicondutores na Am�rica no curto e longo prazo, desenvolver a ci�ncia aplicada aos circuitos integrados, ao mesmo tempo em que buscam conter o avan�o de pa�ses que representam uma amea�a aos ideais americanos.
Os resultados que ser�o obtidos dependem n�o apenas da implementa��o da Lei, mas tamb�m da postura de outros pa�ses em rela��o �s suas ind�strias. O comportamento dos Estados Unidos pode incentivar outras na��es a adotarem projetos semelhantes. Al�m disso, mesmo para os Estados Unidos, conquistar a lideran�a em manufatura avan�ada ser� desafiador, pois, ao atingir o atual limite tecnol�gico, o atual l�der- Taiwan provavelmente j� ter� avan�ado para o pr�ximo est�gio. E a vantagem para os Estados Unidos reside em estar na vanguarda, que � crucial para o progresso tecnol�gico.
O eventual sucesso da nova pol�tica industrial americana impactar� significativamente a din�mica global da ind�stria de semicondutores, tornando-a mais resiliente ao reduzir a depend�ncia de Taiwan em uma fase crucial da cadeia de valor: a manufatura avan�ada, atualmente sujeita a tens�es pol�ticas e b�licas entre Estados Unidos e China, para os quais a ind�stria de semicondutores � estrat�gica. Outro efeito importante dessa pol�tica � garantir o avan�o tecnol�gico, que, por depender fortemente da capacidade de manufatura avan�ada, enfrenta os mesmos riscos. Al�m disso, com parte da produ��o dos chips mais modernos em solo americano, a ind�stria voltaria a ter semelhan�as com os seus prim�rdios, onde os Estados Unidos eram o eixo principal de todas as etapas da cadeia de valor. E isso daria � Am�rica mais poder para conter o avan�o Chin�s.
Uma cadeia de valor mais resiliente diminui os riscos para que as empresas de tecnologia continuem a desenvolver computa��o em nuvem, intelig�ncia artificial, machine learning, ve�culos aut�nomos e outras tecnologias essenciais para a economia global atual, al�m de potencialmente iniciar uma nova era econ�mica impulsionada pelo progresso tecnol�gico.
A ind�stria de semicondutores, com suas implica��es tecnol�gicas, econ�micas, pol�ticas e militares, � um tema rico para debate e pesquisa. Futuros estudos podem explorar os resultados da implementa��o do Chips Act e suas repercuss�es na din�mica global de semicondutores, o crescimento da China nesse setor, a competi��o entre Estados Unidos e China pela lideran�a na cadeia global de chips, as transforma��es tecnol�gicas impulsionadas pelos circuitos integrados (como Intelig�ncia Artificial, Machine Learning, Realidade Aumentada e Ve�culos Aut�nomos) e o impacto dessas mudan�as na economia global.
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Contribui��o de autoria
1 � Jos� Gabriel Pereira da Silva
Bacharel em Ci�ncias Econ�micas pela Universidade Federal do Cear�.
https://orcid.org/0009-0002-6241-6872 � josegabrielpsilva@outlook.com
Contribui��o: Escrita e primeira reda��o
2 � Sylvio Antonio Kappes
Professor Adjunto de Teoria Macroecon�mica na Universidade Federal de Alagoas
https://orcid.org/0000-0001-8886-9365 � sylviokappes@gmail.com
Contribui��o: Escrita e primeira reda��o
Como citar este artigo
SILVA, J. G. P.; KAPPES, S. A. The Chips and Science Act: uma An�lise da Nova Pol�tica Industrial dos Estados Unidos Voltada para a Ind�stria de Semicondutores. Econ. e Desenv., Santa Maria, v. 36, e86316, 2024. DOI 10.5902/1414650986316. Dispon�vel em: https://doi.org/10.5902/1414650986316. Acesso em: dia m�s abreviado. ano.