Universidade Federal de Santa Maria

Econ. e Desenv., Santa Maria, v. 33, e4, 2021

DOI: 10.5902/1414650964073

ISSN 2595-833X

Recebido: 02/02/2021 • Aceito: 17/09/2021 • Publicado: 29/04/2022

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Estado, Mercado e as suas interações

Das premissas metodológicas e conceituais da ética furtadiana aos desafios morais de um projeto estruturalista

Methodological and conceptual premises of ethics furtadian and moral challenges of a structuralist project

Alexandre Lyra Martins I

I Doutor em Economia, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil

lyramartins@hotmail.com - https://orcid.org/0000-0001-5150-7061

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo esboçar a concepção ética subjacente à tese estruturalista de Celso Furtado, a partir de suas premissas metodológicas e conceituais, para delinear os parâmetros e desafios morais de um projeto político-econômico inspirado em suas ideias. O estudo mostrou que, como adepto da tradição da economia política clássica, Furtado se alinha à ética smithiana, mas com a introdução do marco conceitual do subdesenvolvimento periférico, vem a recomposição dos princípios éticos que norteiam sua obra e a proposta de repactuação social em torno do desenvolvimento das periferias econômicas.

Palavras-chave: Teoria econômica; Ética econômica; Desenvolvimento econômico

ABSTRACT

The present work aims to outline the ethical concept underlying Celso Furtado's structuralist thesis, from its methodological and conceptual premises, to delineate moral parameters and challenges of a political-economic project inspired by his ideas. The study showed that, as a follower of the tradition of classical political economy, Furtado aligns himself with Smithian ethics, but with the introduction of conceptual framework of peripheral underdevelopment, comes the reset of the ethical principles that guide his work and the proposal for social renegotiation around development economic peripheries.

Keywords: Economic theory; Economic ethics; Economic development

1 INTRODUÇÃO

Celso Furtado é reconhecido como o economista brasileiro de maior projeção acadêmica no mundo e muito tem sido escrito sobre suas contribuições[1], entretanto, não há uma discussão acerca de sua concepção ética na literatura especializada. Até pouco tempo isso ocorria com muitos autores porque era pequeno o interesse nessa dimensão de todas áreas do conhecimento, inclusive no pensamento econômico.

A ciência econômica nasceu com Adam Smith, que escreveu um tratado sobre ética[2], mas depois dele poucos voltaram à área e só com a chegada de Sen (1999), a temática retorna ao debate acadêmico a partir de uma crítica à ética neoclássica, com Smith como referencial. Desde então, a ética econômica voltou ao centro das discussões[3]. Mesmo quando a variável ética não é exposta, entretanto, pode ser alvo de estudo posterior para identificação das premissas éticas subjacentes ao texto, tomando como referência a concepção teórico-metodológica, os principais conceitos e as formulações que lhe dão suporte.

O presente artigo pretende esboçar a concepção ética furtadiana a partir de suas bases metodológicas e conceituais, para também identificar a dimensão moral de um projeto político-econômico desenvolvimentista. Esses dois exercícios teóricos seguem a linha do que foi feito por Martins (2019) para alguns dos principais marcos da histórica do pensamento econômico[4]. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, prioritariamente na obra original de Furtado, mas usando também estudos sobre o autor, de maneira subsidiária, para complementar o entendimento acerca da teoria discutida.

2 FORMULAÇÕES PRINCIPAIS E SUAS PREMISSAS ÉTICAS

A teoria estruturalista explica especificamente os países subdesenvolvidos, para o que considera fundamental entender historicamente a relação econômica desses com os demais países, em particular os desenvolvidos (Furtado, 2014, 88). Esses últimos compõem o denominado centro econômico, porque em torno deles gravitam as nações mais pobres, a periferia econômica subdesenvolvida. O objetivo dos estruturalistas é compreender as articulações entre esses dois blocos e dentro disso, os mecanismos de reprodução da pobreza nas nações periféricas, com vistas à sua superação, sendo, nesse sentido, uma teoria de desenvolvimento econômico crítica às teorias convencionais dessa área, em particular a rostowiana (Furtado, 1998, 25).

O nível de desenvolvimento ocorre quando os padrões técnico-materiais de produção e produtividade mais avançados são alcançados de forma relativamente homogênea por uma economia capitalista, gerando também um nível de consumo elevado e demandando exploração insustentável de recursos naturais no longo prazo. O subdesenvolvimento, por sua vez, corresponde a um padrão de atividade produtiva de mercado com pouca dinâmica interna, baixa criação e disseminação de tecnologia, podendo compreender tanto situações de pobreza generalizada quanto relativa, em que ocorre simultaneamente a espaços restritos de oferta industrializada e de consumo alto (Furtado, 2014, 87-94).

Furtado (1974, 77-79) assevera que se estabelece uma dupla relação de dependência, tecnológica e de capital por parte da periferia em relação ao centro e de matérias-primas, dos países centrais em relação à periferia. Nessa dinâmica, o centro tem hegemonia e é referência de produção. A periferia, por sua vez, é induzida por meio de uma colonização cultural (Furtado, 1974, 84-85) a copiar o modelo centrista como um todo, e em particular nos níveis de consumo elevado (Furtado, 1974, 80), aspecto que o pensador reputa como essencial, de modo que retoma a proposição posteriormente em outras obras, como Furtado (1998, 69-72) e Furtado (1984).

Tudo começa após o primeiro ciclo histórico de industrialização, quando o mercado tendeu a formar uma zona periférica que abastece as economias centrais com mercadorias primárias[5], disparando o processo de aumento das desigualdades socioeconômicas e tecnológicas entre países industrializados e países de base agrícola, já que as mercadorias de maior valor agregado são produzidas apenas no centro[6].

O processo de industrialização no centro entra em outra fase depois do término da segunda guerra mundial, quando o capital internacional pode voltar a se expandir sem restrições. Nesse contexto, devido ao excesso de liquidez, começa a exportação de capital financeiro e produtivo, no sentido de também aproveitar as possibilidades de ganhos com trabalhadores menos qualificados e remunerados da periferia. Na década de 1950, vai se iniciar a industrialização em alguns países da América do sul[7], mas ela não consegue encaminhar a periferia rumo ao desenvolvimento econômico, ao contrário, paradoxalmente reforça suas características históricas, na medida em que o capital nacional não acompanha o processo, inibindo a expansão tecnológica local e a formação da demanda interna[8].

Os esforços de industrialização em nações periféricas foram orientados em grande medida pelas teorias convencionais hegemônicas, eventualmente com solicitações de ajuda a governos de países centrais, capitais estrangeiros e agências internacionais (Furtado, 1974, 62), em processos conservadores que pouco afetaram as estruturas sociais, piorando a distribuição de renda, sendo que “Uma modificação qualitativa desse campo constitui muito mais um problema de reconstrução de estruturas sociais que propriamente de política econômica” (Furtado, 2014,151).

Dessa síntese da concepção estruturalista furtadiana podem ser extraídas algumas premissas éticas referenciais. Em primeiro lugar, sendo as transações econômicas entre centro e periferia desiguais, essa última não pode reconhecer uma suposta reciprocidade no comércio internacional como consequência de uma especialização produtiva baseada em vantagens comparativas (Furtado, 1974, 78). A intensificação de comércio gera receitas na periferia, mas muito inferiores em relação aos maiores ganhos econômicos obtidos pelo centro.

Em segundo lugar, a periferia deve desacatar a argumentação em torno da naturalidade do processo histórico e da consequente vocação agrícola da periferia, posto que o desenvolvimento é construído historicamente (Furtado, 1998, 47-48). Os países centrais participaram do nascimento e crescimento da indústria, enquanto os periféricos perderam esse momento histórico, mantendo exportações de bens primários e importando itens industrializados até o século XIX. Esse descompasso resulta em defasagem de acumulação de capital e tecnologia significativos, que não podem ser repostos pelo mercado no curto prazo e são acentuados no longo prazo, quando ganham outros contornos.

Em terceiro lugar, as pressões produtivas sobre os limitados recursos disponíveis decorrem do modelo de crescimento industrial centrista e sua redefinição de padrão de consumo, embora possua significativas manifestações na periferia, de modo que ao centro devem ser atribuídas as maiores responsabilidades (Furtado, 1998, 63-64). A periferia, por sua vez, deve ter a consciência da inviabilidade da reprodução desse modelo, trabalhando um projeto alternativo de acumulação de capital com crescimento econômico e distribuição e renda, balizado na preservação dos recursos naturais no longo prazo.

Enfim, em quarto lugar, deve ser colocado que há um problema ético fundamental na associação histórica do mercado com a perpetuação da pobreza periférica, através da exploração e manutenção das estruturas sociais e econômicas (a partir das relações de produção) defasadas. O mercado é guiado apenas pela acumulação de capital, levando-o a expansões territoriais em busca da superexploração de mão de obra barata que não afetam as estruturas sociais, terminando por compactuar com a reprodução histórica da pobreza em vários países.

Formuladas as premissas éticas principais da construção estruturalista furtadiana, pode-se passar para uma investigação de caráter epistemológico buscando suas fundamentações, metodológica e ética propriamente dita.

3 MÉTODO E BASES ÉTICAS

De acordo com os paradigmas liberais, a superação de estágios de pobreza e ingresso no mundo industrializado seria questão de tempo, já que se trata de processo de longo prazo. Essa visão, no entanto, é ora fundada em uma perspectiva natural da história (escola clássica), ora é simplesmente desprovida do componente histórico (vertente neoclássica), e assim, deixa de considerar elementos que se articulam num processo contínuo de evolução das economias. São teorias que se pretendem gerais sem ser, mas são hegemônicas, o que leva à sua adoção em espaços periféricos, sem resultados: ”... A crítica das teorias é, portanto, indispensável se se pretende detectar o conteúdo ideológico das mesmas e definir o seu alcance explicativo.” (Furtado, 1982, 98).

Além da questão histórica, deve ser observada uma outra distinção entre as abordagens metodológicas clássica e neoclássica, que é reforçada quando se estende a discussão à esfera ética. Do ponto de vista da produção, o mercado chega para democratizar as iniciativas e a riqueza, ainda que em alguns espaços desenvolva mecanismos que reforçam a pobreza, contrariando a lógica esperada. Por outro lado, a referência política da sociedade liberal moderna é o Estado de direito, derivado diretamente do livre acordo social[9], representativo e ratificador dos costumes e da revisão desses pelo debate democrático.

De acordo com Martins (2019, 25-26), os teóricos neoclássicos, entretanto, não admitem a possibilidade de diálogo entre os universos social e econômico, pois são tidos como esferas independentes, soberanas e sobrepostas (embora norteadas pelos mesmos princípios). Essa autonomia implica classificar interferências mútuas como equívocos antiéticos. Furtado é contratualista e rompe com essa interpretação, adotando o paradigma clássico da economia, na qual é integrada à sociedade.

Furtado segue um percurso metodológico próprio para fundar uma teoria original dentro da tradição da economia política clássica. A esse respeito, declara a Biderman, Cozac e Rego (1996, 64) o duplo caráter de seu método e sua essência:

“O primeiro é o analítico clássico, criado pelas ciências naturais. O segundo é o método holístico, que pretende captar uma visão global da realidade, ... Nas ciências sociais os dois métodos se completam. O estudo das instituições abre a porta à percepção da importância das relações estruturais, o que sempre me pareceu essencial.”

A abordagem metodológica do pensador paraibano aqui discutido é denominada por Tavares (2000b, 132) de histórico-estrutural, e nela o subdesenvolvimento não é simplesmente uma etapa, mas um processo histórico específico. Seu método absorve o conceito marxista de estrutura para compreender as organizações socioeconômicas através da evolução e da dinâmica dessas[10], porém, se afasta dessa teorização como referência maior (Furtado, 1998, 9-10) para utilizar o método histórico em suas tradicionais variantes dedutiva e indutiva[11]. Suas bases representam, portanto, uma reforma do prisma clássico smithiano, ao qual é agregado o componente estrutural para a interpretação da observação histórica.

Por fim, Furtado não aceita a premissa neoclássica da incomunicabilidade entre as esferas sociais e econômicas, mas compartilha a base indutiva e dedutiva com Smith, que tem compreensão política das relações econômicas, para fazer um reparo estrutural no caráter natural da evolução histórica por ele indicado, o que reflete na sua concordância, também parcial, em relação à perspectiva ética smithiana em torno do pacto social liberal ocidental moderno.

3.1 A concepção ética

As premissas éticas extraídas das principais formulações furtadianas no item 2 são críticas à teoria neoclássica em geral e à sua concepção de desenvolvimento econômico em particular. Na seção anterior, por sua vez, verificou-se um coerente desvinculamento metodológico da tese estruturalista em relação aos neoclássicos e ao paradigma marxista, restando uma afinidade com Smith. Nesse subitem se continua a cotejar Furtado com Smith, investigando a hipótese das premissas éticas furtadianas derivarem, em alguma medida, da concepção ética smithiana.

Smith (2006) é destaque entre os clássicos por ter elaborado uma concepção que explica a possibilidade da convivência social em liberdade apoiada nos sentimentos morais como reflexo da razão, porque assim as pessoas se beneficiam umas das outras através das iniciativas individuais. As iniciativas que geram benefício para terceiros, seja de ordem social ou econômica, são reconhecidas como meritórias porque proporcionam bem-estar, de forma que a interação social é garantida pela moral liberal. O grau de liberdade demandado no acordo liberal inicial era alto por uma rejeição ao predomínio anterior do intervencionismo governamental excessivo, mas o pacto pode ser livremente rediscutido a qualquer instante em decorrência de mudanças na dinâmica social, acarretando revisão de premissas éticas pontuais, desde que mantido o norte da liberdade e os princípios do mercado como fundamento da produção.

 A concepção smithiana, por sua vez, está ancorada no iluminismo. Rouanet (1992, 149-151) sustenta que a moral iluminista possui três traços principais - cognitivismo, individualismo e universalismo – sendo o primeiro deles “legitimado por um fundamento jusnaturalista, ... empirista, ... e ... na própria razão.” Todas essas premissas estão presentes na ética de Smith, que enfatiza as experiências e as iniciativas individuais como objeto de aprendizagem e assimilação racional dos parâmetros exitosos na constituição das modernas economias de mercado.

Pode-se observar esses fundamentos e características também nas teses furtadianas, acentuando o cognitivismo e o empirismo como essenciais na construção de projetos estruturalistas. A crítica à dinâmica do capitalismo global decorre de estudo e aprendizado com o processo histórico, enquanto o processo de industrialização via indução governamental, por sua vez, é amparado nesse princípio e também no racionalismo, que é referência crucial para o planejamento econômico.

Se o método e a teoria moral smithiana podem ser tomados por ponto de partida de uma ética furtadiana, a revisão do primeiro encaminha para uma compreensão distinta dos desdobramentos históricos de longo prazo, que também afetam a perspectiva ética. Enquanto Smith só vislumbrou projeções positivas para a evolução das economias de mercado, Furtado (1974, 75) aponta problemas na simples extensão do padrão de desenvolvimento econômico às periferias, pois “... O custo, em termos de depredação do mundo físico, desse estilo de vida, é de tal forma elevado que toda tentativa de generalizá-lo levaria inexoravelmente ao colapso de toda uma civilização.”.

A contestação furtadiana é em relação à produção e reprodução da pobreza e da riqueza, e, portanto, ao modelo como um todo, mas é uma consideração que entende poder ser apreciada dentro dos cânones do mundo ocidental moderno. Nesse processo, o foco se desloca do individual para o coletivo, na direção da dimensão universal dos interesses da coletividade (Furtado, 1998, 70), registrando uma aposta na conscientização de grupos chave na sociedade organizada, que cumpririam o papel de irradiar a mudança de valores aos demais. Embora enfatize os caminhos desarmônicos que o capitalismo tomou, Furtado acredita na conscientização e na negociação social para retomar o rumo da convivência harmônica smithiana.

A pactuação é em torno do mercado e Smith ressalta que países pobres são aqueles em que o mercado não se desenvolveu porque não houve aprofundamento da divisão do trabalho[12], de maneira que os estímulos devem ser ao mercado e seus mecanismos. Furtado concorda parcialmente, ressaltando que o subdesenvolvimento periférico mostra uma ausência de dinâmica interna devido não só ao tipo de relação comercial que se estabelece com o centro econômico, mas também em decorrência da manutenção de valores, que contribuem para a perpetuação de estruturas socioeconômicas, tendo papel importante no travamento do processo de evolução para uma mentalidade de mercado[13]. Esta constatação remete à necessidade de estímulos externos, no caso, advindos do Estado, articulador desse novo projeto, que vem para reafirmar o mercado como parâmetro na geração de riqueza (Furtado, 1998, 19).

A ação coordenadora do Estado tem missão inicial de preencher lacunas estruturais na indústria de base e em ramos da atividade desprezados pela iniciativa empresarial, o que exige evolução burocrática e institucional do aparato estatal (Furtado, 1974, 61), mobilização social e envolvimento da classe industrial nascente nesse momento histórico (Furtado, 1998, 17), dada a resistência natural dos segmentos dominantes conservadores da economia a um projeto dessa envergadura. O maior problema político estruturalista é conseguir quebrar a constante renovação conservadora da composição entre as oligarquias e oligopólios internacionais, para reformular a ética econômica predominante.

Por fim, é preciso lembrar que Smith foi contemporâneo do surgimento da indústria, não vivendo para observar as diferenças econômicas entre periferias e centro que viriam a seguir, nem o caráter destrutivo que o capital tomaria, mas já em seu contexto histórico condenou os projetos coloniais, tanto economicamente quanto politicamente, por seu desrespeito a outros povos e por sua irracionalidade econômica (Smith, 1996, 85 e 98). Guiado por seu método e sua concepção ética, demonstrou coerência na defesa da sociedade liberal, do mercado e da divisão do trabalho como soluções para os autoritarismos e a pobreza de todas nações, desde que preservadas suas respectivas independências.

4 RESPONSABILIDADES COLETIVAS, GRUPAIS E INSTITUCIONAIS

A possibilidade de uma repactuação em nações liberais modernas, dentro de suas instituições e focada na superação da condição do subdesenvolvimento é premissa ética furtadiana fulcral. Colocá-la em prática requer introduzir políticas industrializantes sustentáveis, correções de infraestrutura, medidas diversas para enfraquecer os mecanismos de perpetuação da pobreza e disseminar os valores de uma modernidade alternativa (ciente dos problemas da contemporaneidade) para alterar as estruturas sociais. Trata-se de uma tarefa política complexa, mas possível, como outras vezes ficou demonstrado historicamente pela força de segmentos organizados na condução dos rumos da sociedade (Furtado, 1998, 21). A perspectiva ativa dos grupos sociais remete à influência marxista, mas a previsão do processo ocorrer dentro do diálogo social e da ordem instituída marca novamente a discordância em relação à ética marxista.

O projeto estruturante requer mobilização nas esferas social e econômica para mudança de paradigmas éticos. A contemporaneidade agregou alguns complicadores[14], mas sua essência não sofreu alterações significativas, pelo contrário, reforçou as conclusões de Furtado (1998, 63) acerca do aumento na concentração de renda e da depredação dos recursos naturais disponíveis. A acentuação desses processos pode contribuir para um despertar da sociedade para a necessidade da correção de rumos (Furtado, 1998, 67).

Furtado (1998, 14) enfatiza que é preciso pensar uma nova concepção de desenvolvimento econômico calcada na sustentabilidade produtiva, como parte de uma “responsabilidade moral” para a superação da exclusão social.  Esse é um compromisso que os círculos acadêmicos raramente têm feito, optando pelo economicismo, ou, o que é pior, pelo desvirtuamento das ideias, como foi o caso da disseminação da interpretação equivocada da teoria smithiana feita pelo influente Visconde de Cairu no Brasil, destacando apenas o livre comércio e evitando a ênfase na industrialização, diferentemente da leitura predominante nos EUA feita por Hamilton que enfatizava a divisão do trabalho e a indústria (Furtado, 2007a, 152-153).

A transformação cultural e educacional dos valores econômicos precisa atingir as classes dominantes internacionais, maiores responsáveis pela perpetuação do modelo centrista, e as conservadoras elites periféricas (Furtado, 2014, 119-127), que praticam uma ética mercantil primitiva, dificultando significativamente a mobilização em torno de uma dinâmica interna do mercado com redistribuição de renda e aumento de investimento e poupança. Esses requerimentos lançam a um modelo alternativo o desafio de encontrar formas de valorizar as ações empreendedoras, de modo a garantir a adesão da iniciativa empresarial e manter a diversificação e a competitividade na atividade produtiva, (Furtado, 1998, 60).

A conscientização acerca dos problemas a serem encaminhados deve ser ampla, alcançando todos segmentos internos e internacionais envolvidos. A participação de todos deve ser construída, uma vez que boa parte da população periférica é contaminada pela ideologia dominante, no sentido de se conformar com a naturalidade de sua condição, mas os movimentos sociais são dinâmicos e a atualização das pautas sociais tem enfatizado a dimensão estrutural de pontos centrais das pautas identitárias, como o racismo, apontando para conexões com a leitura furtadiana[15]. Devido à complexidade de todo processo, o Estado é a instância competente para a coordenação e execução de um projeto estruturalista, pois tanto a articulação política quanto as políticas econômicas estão em suas mãos (Furtado, 1998, 22).

4.1 Questões morais relacionadas ao Estado

A preservação da humanidade como um todo, em sua riqueza material e cultural, deve ser parâmetro econômico maior e também norte de uma gestão estatal estruturalista, porém as experiências históricas de projetos desenvolvimentistas revelam a humanidade mais nas falhas éticas recorrentes na condução do Estado. Os problemas começam num ponto comum entre todas experiências desenvolvimentistas: a expansão dos gastos do Estado. Em um projeto estruturalista, as funções estatais são ampliadas em relação aos papéis clássicos do Estado liberal, incluindo aqui a abordagem keynesiana[16].

O aumento da participação dos gastos governamentais no PIB coloca o governo na condição de protagonista na atividade produtiva, o que leva a um questionamento acerca dos limites do Estado na economia de mercado e do mercado no Estado. A definição do que é público e o que é privado depende do acordo social, mas a voracidade do mercado tem se manifestado no transcorrer do tempo através de seu avanço na parte pública da demanda agregada, desviando de seu campo de interesse original, os negócios privados. O governo adentra no espaço do mercado em cumprimento a decisões sociais e políticas, mas o espaço público tem sido frequentemente manipulado e desvirtuado para atender a interesses do mercado[17].

Além desse problema, há outro na mesma seara. O desenrolar da história mostrou com frequência um prolongamento na intervenção estatal, que levou à exponenciação da dívida pública. Particularmente após Keynes publicar a Teoria geral (década de 1930), a maioria dos governos aumentaram regularmente seus gastos, extrapolando a perspectiva original e deixando o endividamento público maior que o PIB passadas algumas décadas, o que terminou sendo argumento dos neoliberais para atacar políticas intervencionistas de qualquer ordem, principalmente depois do fim do socialismo real.

A ação governamental não deve se prolongar além da necessidade, daquilo que se propõem, pois o objetivo é corrigir o mercado e seus mecanismos, transitoriamente, especialmente contendo seu componente de agressividade. A ação estruturalista é de longo prazo por definição, mas, por isso mesmo, deve ser o mais eficiente possível, minimizando o sacrifício social e maximizando recursos, empréstimos e investimentos. O risco da própria política econômica criar uma dificuldade adicional para a economia com o alto endividamento (Furtado, 1982, 31-33), deve ser evitado com transparência e eficiência. O histórico domínio da política tradicional e a influência de interesses privados, no entanto, já deram mostras de estragos em má gestão com desperdício de recursos e desvio dos objetivos originais[18].

5 VALORES REFERENCIAIS E DESAFIOS ÉTICOS

O próprio Furtado (2004, 484) já observou que, para além do histórico desafio do ajuste nas contas públicas, se deve denunciar, dentro desse, a falácia do argumento da necessidade de superávit primário em nações de elevadas demandas sociais e econômicas básicas. Após subestimar a importância do capital financeiro na dinâmica do sistema, o pensador acata as críticas e incorpora esse elemento fundamental na contemporaneidade, ao qual podem ser adicionados outros para encaminhar uma resposta à pergunta que deixa (ibidem): porque após décadas de democracia e programas de orientação desenvolvimentista, muitos problemas estruturais permanecem na periferia econômica?

De início, é necessário relembrar o necessário “... compromisso ético com valores universais... e a confiança na liderança de forças sociais cujos interesses se confundem com os da coletividade nacional” (Furtado, 1998, 11). Um projeto de cunho estruturalista para a sociedade tem de estar vinculado à melhora na qualidade e nas condições de vida da população dos países periféricos. Para isso, a produção local e as transações comerciais internacionais não podem ser canais de concentração de renda ou de fuga de riqueza para o exterior e devem atender prioritariamente às demandas sociais e a manutenção da riqueza cultural local.

O primeiro desafio é, considerando a hegemonia da ética de mercado após a queda do socialismo, se contrapor a ela e convencer internamente a sociedade periférica da possibilidade de uma ética alternativa, tarefa dificultada recentemente no Brasil pelo desgaste moral na imagem de governos de inspiração estruturalista[19]. Uma vez convencida a sociedade, os desafios éticos de um projeto de cunho estruturalista são maiores que todos os outros[20] porque se propõe a mudanças mais profundas na economia e na sociedade.

Para a perspectiva estruturalista, no entanto, o homem é histórico, construído ao longo do tempo por meio da educação, que pode e deve ser transformada para quebrar o caráter passivo, o conformismo, a impotência e os valores antiquados que sustentam o atraso e a pobreza, trazendo para o centro da cena os valores de um ocidente moderno reformado, consciente da questão ecológica e da necessidade da distribuição da riqueza. Trata-se de um projeto de longo prazo que passa por (trans)formações educacional e cultural que ainda não foram efetivamente colocadas em prática, pois todas experiências que tinham alguma conotação desenvolvimentista minimizaram esses pontos estratégicos e fundamentais[21].

A mudança de valores exigida por um projeto desenvolvimentista é complexa também por sua ambiguidade, pois remete aos valores de mercado, mas com paralelo fortalecimento do Estado; remete à ênfase no mercado interno, mas envolve uma perspectiva social na inclusão de camadas marginalizadas da população. Dar unidade a estas questões, apenas aparentemente contraditórias, é primordial para a consistência do projeto. A nova ética deve, partindo da humanidade como valor maior, incentivar o Estado e o mercado, cada qual no seu devido lugar. O primeiro coordena o processo e interfere no segundo temporariamente, estimulando a competição, a produtividade e as iniciativas privadas, para provocar um salto quantitativo e qualitativo na atividade produtiva, sem esquecer de dar tratamento diferenciado a setores estratégicos.

Enfim, a ética estruturalista segue uma linha que investe na melhoria do homem através da conscientização de sua sociabilidade, não fazendo sentido aqui a coletividade como somatório de indivíduos que buscam apenas riqueza. É retomada a ideia smithiana do mercado como instrumento democratizante da riqueza e legitimador de valores virtuosos na sociedade, mas reparando seu caráter predatório desenvolvido posteriormente, que gerou um modelo econômico insustentável e, dentro dele, a condição específica do subdesenvolvimento periférico. Esta ética propõe um novo trato social via Estado, viabilizando um desenvolvimento estruturante e sustentável, condicionado à melhora do homem como ser social, pois se não for assim, não estará à sua altura.

6 NOTAS CONCLUSIVAS

O estudo procurou delinear as premissas metodológicas e conceituais de uma ética furtadiana, para chegar aos parâmetros e desafios morais de um projeto estruturalista. As premissas éticas fundamentais foram extraídas de sua concepção de subdesenvolvimento, que indica uma contestação da reciprocidade e da naturalidade das trocas internacionais, além da responsabilização do centro pela execução de um modelo econômico que exaure recursos naturais, produz e reproduz da pobreza na periferia.

Na investigação acerca das bases metodológicas da concepção furtadiana, se constatou uma herança da economia política clássica, em especial, de Smith.  Furtado se afasta dos neoclássicos, de Marx e de Keynes em pontos cruciais do método, se mantendo na linha das induções e deduções históricas, às quais revisa para acrescentar um complemento estruturalista. Do ponto de vista ético, Furtado é contratualista em sua essência, podendo-se dizer que, na ausência de uma proposição específica, inicialmente segue a ética smithiana dos sentimentos morais que preveem um convívio social harmônico baseado na liberdade, tanto na sociedade quanto no mercado, até que o conceito de subdesenvolvimento periférico impõe uma reforma também no paradigma ético.

Constatada a incapacidade histórico/estrutural do modelo liberal em promover um desenvolvimento global sustentado de maneira geral, e do mercado interno nas periferias em particular, devido à agressividade exponenciada dos capitais, segue a defesa da entrada do Estado como agente legítimo e coordenador de uma repactuação social nos moldes ocidentais modernos, contendo a acumulação, administrando a redução do espaço da iniciativa privada e o aumentando o do interesse público, em prol da supressão da condição periférica e da formação de sociedades ricas material e culturalmente.

Por fim, o estudo mostrou os desafios de natureza ética de um projeto estruturalista furtadiano. Num primeiro plano, cabe se contrapor à hegemonia neoliberal dos mercados e superar a cultura subdesenvolvida arraigada na periferia, discutindo novos valores a partir de segmentos da sociedade civil organizada. Num segundo plano, há os complicadores relacionados à execução; como administrar a redefinição dos espaços público e privado, contornar o aumento histórico do endividamento público (e seus custos), além de perseverar no esforço contínuo de reformatação cultural e educacional da sociedade no sentido da reconstrução de uma coletividade harmônica e inclusiva.

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Contribuições de autoria

1 – Alexandre Lyra Martins

Contribuição: Conceituação, Metodologia, Redação - revisão e edição



[1] Para ficar em alguns trabalhos mais recentes: Mantega (1989), Bresser-Pereira e Rego (2001), Tavares (2000a), Mendes e Teixeira (2004) e Mourão e Veriano (2011).

[2] Para autores como Coutinho (1993, 99-102) e Bianchi (1988, 123-124), esse livro, A teoria dos sentimentos morais (Smith, 2006), é referencial para A riqueza das nações (1985), levando em conta a complementariedade conceitual e teórica existente entre eles.

[3] Sen (1999, 23) e Buarque (2007, 25-26), por abordagens distintas, destacam mais perdas que ganhos no afastamento dessas áreas de estudo humanas, especialmente para a ciência econômica.

[4] As escolas clássica, marxista, neoclássica e keynesiana.

[5] Seja diretamente através de seus mecanismos, ou via ingerências governamentais a favor dos capitais dos países centrais (como regulamentações, protecionismos, etc).

[6] Gerando maiores investimentos, lucros e acumulação de capital. Trata-se corolário basilar da teoria, mais evidenciado em livros como Furtado (1974), (1998) e (2007b).

[7] No caso do Brasil é uma retomada, que já havia começado o processo na década de 1930 com Vargas, mas em outros termos (fomentando a constituição de capital nacional).

[8] Furtado (2014, 133-147) examina os desmembramentos da industrialização periférica, já Furtado (1982) se atem mais às implicações financeiras do que denomina de “nova dependência”.

[9] Cujo principal marco é Montesquieu (2003).

[10] Concepção que vai ser alvo de críticas dos seguidores da metodologia marxista, que constroem uma teoria da dependência que se contrapõe à concepção da CEPAL (ver Almeida Filho, 2013, 12).

[11] Bresser-Pereira (2001, 30-31) defende a predominância do histórico-indutivo.

[12] Ver capítulos 1 e 3 de Smith (1985).

[13] O elemento cultural está presente em algumas obras do autor, mas principalmente em Furtado (1984).

[14] Ocorreram transformações na indústria (adoção de terceirização, robotização, etc.), os serviços passaram a ter importância expressiva na economia (agora apoiados na internet) e a dinâmica mundial, política e econômica, mudou com a ascensão de alguns países, especialmente a China, como discutem Hiratuka e Sarti (2017).

[15] Essa discussão ainda não foi realizada, mas trabalhos como Bersani (2018) mostram que essa é uma linha de investigação válida.

[16] A propósito, Furtado aproveita elementos macroeconômicos de Keynes, mas não dialoga com suas premissas, originárias da metodologia neoclássica. Keynes (1985) explicita suas referências no início da sua obra (capítulos 1 e 2), citando Ricardo e Marshall, entre outros, mas nunca Smith.

[17] Galbraith (2004, 73-77), por exemplo, é um dos que estudam e denunciam a expansão, de maneira distorcida, dos gastos militares no orçamento norte-americano, atendendo a capitais privados, enquanto ao sul do Equador o problema se manifesta no patrimonialismo entranhado na máquina estatal, gerando enriquecimento ilícito, caixa dois, compras de mandato, de legendas, etc.

[18] Algo que foi, como destaca Cavalcanti (2001), alvo de reflexões e busca de explicações pelo próprio Furtado.

[19] Era pública a admiração de Lula por Furtado, com quem dialogava eventualmente, mas as elites conservadoras, depois uma fase de convivência, preferiram se unir pela desarticulação do projeto, movimento que teve seu ápice no impedimento da presidente Dilma Rousseff.

[20] A exceção de projetos de inclinação socialista.

[21] Buarque (2007, 53) faz uma crítica de cunho estruturalista ao desenvolvimento econômico praticado no Brasil ao longo do século XX. Quando um governo tentou, foi interrompido por uma intervenção militar (1964).