Desenho universal para a aprendizagem: uma proposta de sequência didática para o ensino cartográfico inclusivo
Universal design for learning: a proposal of didactic sequence for inclusive cartographic teaching
Diseño universal para el aprendizaje: una propuesta de secuencia didáctica para la enseñanza cartográfica inclusiva
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Louise Christine
Rodrigues Ramos
Universidade Federal Fluminense, UFF, RJ, Brasil. |
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Ricardo Abrate Luigi Junior
Universidade Federal Fluminense, UFF, RJ, Brasil.
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Liamar Bonatti
Zorzanello Instituto Federal de Santa Catarina, IFSC, Bela Vista, Gaspar – SC.
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Recebido em 16 de abril de 2024
Aprovado em 17 de março de 2025
Publicado em 08 de abril de 2025
RESUMO
A presente pesquisa visa propor a elaboração de uma sequência didática com o conteúdo de cartografia, nas aulas de geografia do 1º ano do Ensino Médio, na perspectiva do Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA). A partir disso, foram elaborados os materiais didáticos para a execução de tal proposta, sendo as projeções tátil, mapa tátil e régua sinalizada. Os materiais possuem legendas em Libras, Braille e Português, visando abarcar a diversidade de uma sala de aula. A fundamentação teórica é composta por três seções: a primeira, apresenta o conceito do DUA e seus princípios, ressaltando como podem ser aplicados no ambiente escolar; a segunda, apresenta informações e orientações sobre transtornos de aprendizagem e deficiências, com ênfase nas práticas inclusivas na educação; e, a terceira, revela a importância da cartografia para a geografia escolar. No tópico resultados e discussões, apresenta-se a proposta da sequência didática e os materiais didáticos desenvolvidos de acordo com os princípios do DUA. Por fim, observa-se que as práticas pedagógicas baseadas na perspectiva do DUA, especialmente no tocante ao ensino da cartografia, potencializam a aprendizagem, despertando o interesse dos discentes ao transpor o conteúdo abstrato em tátil, garantindo o acesso ao currículo mínimo aos alunos com deficiência, em especial a visual e a auditiva.
Palavras-chave: Desenho Universal para a Aprendizagem; Geografia; Cartografia. Inclusão.
ABSTRACT
The present research aims to present the proposition of a didactic sequence with the content of cartography in Geography classes of the 1st year of High School from the perspective of Universal Design for Learning (UDL). From this, didactic materials were prepared for the execution of such a proposal, being the tactile projections, tactile map and signaled ruler. The materials have subtitles in Libras, Braille and Portuguese aiming to encompass the diversity of a classroom. The theoretical foundation is composed of three sections: the first presents the concept of UDL and his principles, highlighting how they can be applied in the school environment; the second presents information and guidance about learning disorders and disabilities, with an emphasis on inclusive practices in education; and, thirdly, reveals the importance of cartography for school geography. The topic results and discussions presents the proposal of the didactic sequence and the didactic materials developed, according to the principles of the UDL. Finally, it's observed that pedagogical practices based on the UDL perspective, especially regarding the teaching of cartography, enhance learning, arousing students' interest by transposing abstract content into tactile, guaranteeing access to the minimum curriculum for students with disabilities, especially visual and auditory.
Keywords: Universal Design for Learning; Geography; Cartography; Inclusion.
RESUMEN
La presente investigación tiene como objetivo proponer la elaboración de una secuencia didáctica con el contenido de la cartografía en las clases de Geografía del 1° año de la Enseñanza Media en la perspectiva del Diseño Universal para el Aprendizaje (DUA). A partir de ello, se elaboraron materiales didácticos para la ejecución de dicha propuesta, siendo las proyecciones táctiles, mapa táctil y regla señalizada. Los materiales tienen subtítulos en Libras, Braille y Portugués, con el objetivo de cubrir la diversidad de un aula. La fundamentación teórica se compone de tres apartados: el primero presenta el concepto de DUA y sus principios, destacando cómo pueden aplicarse en el ámbito escolar; el segundo presenta información y orientación sobre trastornos y discapacidades del aprendizaje, con énfasis en prácticas inclusivas en educación; y, en tercer lugar, revela la importancia de la cartografía para la geografía escolar. Los resultados y discusiones del tema presentan la secuencia didáctica propuesta y los materiales didácticos desarrollados, de acuerdo con los principios de la DUA. Finalmente, se observa que las prácticas pedagógicas basadas en la perspectiva DUA, especialmente en lo que se refiere a la enseñanza de la cartografía, potencian el aprendizaje, despertando el interés de los estudiantes al traducir contenidos abstractos en contenidos táctiles, garantizando el acceso al currículo mínimo a los estudiantes con discapacidad, especialmente visual y auditivo.
Palabras clave: Diseño Universal para el Aprendizaje; Geografía; Cartografía; Inclusión.
Introdução
Embora não seja exclusividade da geografia, é comumente atribuída a ela a tarefa do ensino da cartografia, pois a análise do espaço geográfico, realizada por meio das escalas e da representação cartográfica, contribuiu decisivamente para que a geografia se constitua enquanto campo do conhecimento e disciplina escolar. Não à toa, no imaginário e em simbologias, tantas vezes se associa a figura do mapa à ciência geográfica. Contudo, ensinar cartografia é uma das mais árduas tarefas, e a abstração, as diferenças escalares e a representação bidimensional de espaços tridimensionais contribuem para tal. A aprendizagem da cartografia precisa ainda levar em conta a criação de um ambiente educacional inclusivo.
O ensino da cartografia é uma das atribuições mais desafiadoras da geografia escolar (Lunkes; Martins, 2015). As noções espaciais e a apropriação da linguagem cartográfica são aspectos fundamentais para que um indivíduo possa entender as diversas escalas, conexões e interações do meio em que está inserido. Comumente, para desenvolver a alfabetização cartográfica e a interpretação de suas informações, o professor tem a sua disposição mapas e globos. Porém, é difícil transpor a realidade de um mundo tridimensional para a bidimensionalidade de um mapa. É difícil, por exemplo, contextualizar a importância do relevo nas redes hidrográficas e como este interfere no fluxo dos rios, uma vez que o relevo apresentado pelos mapas e globos é plano.
Para promover a alfabetização cartográfica, as instituições educacionais devem fornecer aos professores uma variedade de materiais, incluindo bússolas para orientação básica, cartas topográficas para compreensão da base cartográfica, maquetes com relevo tridimensional e mapas táteis, em alto relevo e com audiodescrição. A falta desses recursos torna o ensino da cartografia desafiador e evidencia uma lacuna na formação dos professores nesta área.
Perante este cenário, a intenção é apresentar o desenvolvimento de uma sequência didática referente à leitura e à interpretação cartográfica, ancorada nos princípios do DUA, como meio de promover a disseminação de informações sobre ferramentas que podem vir a potencializar o ensino cartográfico inclusivo e sua aplicabilidade no cotidiano escolar. Além da proposta supracitada, elaboraram-se materiais como projeções e o mapa texturizados e régua sinalizada, fundamentais para promover a inclusão cartográfica, devido a sua funcionalidade tátil. Os recursos têm seus conteúdos, como legenda e título, apresentados em Português, Libras e Braille (PLB), deste modo, indivíduos que fazem uso destas diferentes linguagens terão acessibilidade na leitura e na compreensão do material.
De acordo com o IBGE (2019), cerca de 17.258.000 pessoas no Brasil, com 2 anos de idade ou mais, declararam ter algum tipo de deficiência. Entre elas, 6.978.415 possuem deficiência visual, aproximadamente 8.329.095 declararam ter deficiência motora, 2.330.441 relataram deficiência auditiva e cerca de 2.455.127 têm deficiência mental ou intelectual. Importa destacar que 5.316.746 pessoas podem apresentar mais de um tipo de deficiência. Portanto, o número total de deficientes por categoria pode ser superior ao total geral, já que uma mesma pessoa pode ter sido contabilizada em mais de uma categoria.
Mesmo com a realidade acima retratada, muitas instituições de ensino continuam a trilhar caminhos equivocados, partindo da falsa ideia de turmas homogêneas e com predomínio de práticas tradicionais. Neste sentido, além das deficiências, a sequência didática será pensada para também possibilitar maiores oportunidades aos que têm transtornos de aprendizagem. Os alunos apresentam diferentes maneiras de compreender as informações, e mesmo os tidos como típicos, sempre apresentam formas diferentes de aprender e expressar o que sabem (Grellet et al, 2015). Deste modo, por meio dos princípios do DUA, espera-se que o aprendizado seja fomentado e sejam ampliadas as possibilidades de eliminação de barreiras pedagógicas que promovem a exclusão de indivíduos no contexto escolar.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para atingir seu objetivo, o artigo é dividido em três seções de fundamentação teórica: a primeira aborda o Desenho Universal para Aprendizagem (DUA), seus princípios e sua aplicação no contexto escolar; a segunda apresenta características e estratégias para lidar com transtornos de aprendizagem e deficiências em sala de aula; e a terceira, discute a geografia e a cartografia escolar, destacando a importância da alfabetização cartográfica e a necessidade de uma abordagem inclusiva na educação.
O Desenho Universal para a Aprendizagem
O conceito do DUA surge na arquitetura visando eliminar barreiras arquitetônicas impostas nos espaços públicos e privados. O conceito de Desenho Universal (DU), advindo da arquitetura, tem como objetivo a inclusão, segundo Carletto e Cambiaghi (2016), sem que tenham que existir espaços voltados apenas para um público específico, nesse caso, para pessoas com deficiência, promovendo a criação de produtos e ambientes que possam ser utilizados por todos:
O Desenho Universal não é uma tecnologia direcionada apenas aos que dele necessitam; é desenhado para todas as pessoas. A ideia do Desenho Universal é, justamente, evitar a necessidade de ambientes e produtos especiais para pessoas com deficiências, assegurando que todos possam utilizar com segurança e autonomia os diversos espaços construídos e objetos (Carletto; Cambiaghi, 2016, p. 10).
Partindo da diversidade dos indivíduos, de suas formas peculiares de lidar com o processo de aprendizagem e com a variedade de deficiências presentes em sala de aula, o conceito de DU da arquitetura foi aplicado ao contexto escolar, tendo por objetivo a criação de um currículo que viabilize atender todas as necessidades dos alunos, constituindo-se assim o Desenho Universal de Aprendizagem (DUA). O DUA parte de três princípios, segundo Sebastián-Heredero (2020), que focam no acesso físico à sala de aula e a todos os aspectos da aprendizagem, proporcionando múltiplos modos de apresentação, múltiplos modos de ação e expressão, e múltiplos modos de envolvimento.
O primeiro princípio do DUA, definido por Sebastián-Heredero (2020), é voltado para estudantes que captam a informação de maneira distinta, como os alunos surdos, cegos, disléxicos e outros. Assim, para aqueles que não conseguiram compreender o conteúdo apresentado a partir de recursos visuais e auditivos comuns, é necessário fazê-lo por múltiplos modos e por meio de materiais variados, possibilitando a compreensão e a elaboração de analogias.
O segundo princípio está relacionado aos estudantes que expressam seu conhecimento de forma diferente, aqueles com deficiência motora, transtornos da função executiva, com barreiras de comunicação, dentre outros: uns necessitam de avaliação oral e outros de avaliação escrita (Sebastián-Heredero, 2020).
O terceiro princípio reconhece a diversidade de emoções e afetividades como elementos essenciais para a aprendizagem. Fatores neurológicos e culturais contribuem para a variabilidade individual no envolvimento dos alunos, que podem ser motivados por atividades novas ou preferir rotinas. Não há uma abordagem única para lidar com essas variações, exigindo métodos diversos e flexíveis (Sebastián-Heredero, 2020). A figura 1 ilustra os princípios aqui descritos.
Figura 1 - Princípios do Desenho Universal para a Aprendizagem
Fonte: Elaborado por Rodrigues com base nas informações do AAIDD (2021) Universal Design for Learning Guidelines, 2021.
A aplicação do DUA no planejamento e nas estratégias de ensino sugere que o mesmo conteúdo precisa estar disponível em diferentes formas e mídias, um assunto ou conceito podendo ser apresentado de modo interativo, usando recursos didáticos como áudio, imagem, vídeo ou animação (Pletsch et al, 2020). É fundamental que os recursos didáticos sejam elaborados de acordo com a usabilidade dos alunos, sendo, preferencialmente, validados pelos mesmos.
Ao aplicar os princípios norteadores do DUA, o objetivo é possibilitar que todos tenham acesso ao mesmo currículo educacional, sem que haja adaptações e segregação dos alunos, a partir de estratégias voltadas para a diversidade das formas de aprendizagem. Para que se alcance esse objetivo é necessário que exista um levantamento do perfil dos alunos e dos diferentes tipos de transtornos de aprendizagem existentes, para, a partir disso, sugerir recursos e estratégias para que o processo de ensino-aprendizagem se torne mais efetivo.
Os Transtornos de Aprendizagem e deficiências
O Estatuto da Pessoa com Deficiência, na lei nº 13.146 define como deficiente quem “tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (Brasil, 2015, p.1). A Política Nacional de Educação Especial (PNEE), ao tratar de seu público-alvo, assevera que:
São considerados público-alvo da Política Nacional de Educação Especial: Equitativa, Inclusiva e com Aprendizado ao Longo da Vida: I - educandos com deficiência, conforme definido pela Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 - Estatuto da Pessoa com Deficiência; II - educandos com transtornos globais do desenvolvimento, incluídos os educandos com transtorno do espectro autista, conforme definido pela Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012; e III - educandos com altas habilidades ou superdotação que apresentem desenvolvimento ou potencial elevado em qualquer área de domínio, isolada ou combinada, criatividade e envolvimento com as atividades escolares (PNEE, 2020, p. 117-118).
As deficiências que são consideradas por lei e pelo Censo Escolar são, respectivamente: deficiência intelectual; deficiência física; surdez e deficiência auditiva; deficiência visual: cegueira e baixa visão; e surdocegueira deficiência múltipla; e o Transtorno do Espectro Autista. De acordo com o Censo Escolar (2023),
Do total de matrículas, 53,7% são de estudantes com deficiência intelectual (952.904). Em seguida, estão os estudantes com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), com 35,9% (636.202) delas. Na sequência, estão pessoas com deficiência física (163.790), baixa visão (86.867), deficiência auditiva (41.491), altas habilidades ou superdotação (38.019), surdez (20.008), cegueira (7.321) e surdocegueira (693). Além disso, 88.885 estudantes possuem duas ou mais deficiências combinadas (IBGE, 2023, s.p.).
Os transtornos de aprendizagem “compreendem uma inabilidade específica, como de leitura, escrita ou matemática, em indivíduos que apresentam resultados significativamente abaixo do esperado para seu nível de desenvolvimento, escolaridade e capacidade intelectual” (Rotta et al, 2016, p. 108).
Em novembro de 2021, a Lei nº 14.254 instituiu o acompanhamento integral, que “compreende a identificação precoce do transtorno, o encaminhamento do educando para diagnóstico, o apoio educacional na rede de ensino, bem como o apoio terapêutico especializado na rede de saúde” (Brasil, 2021, p.1). Oliveira et al (2020) elucida que os transtornos de aprendizagem mais comuns em sala de aula são: dislexia, discalculia, disgrafia, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e transtorno opositor desafiador (TOD).
Mediante a contextualização ora realizada, é possível perceber a diversidade de indivíduos que a sala de aula pode abrigar. Torna-se, assim, um grande desafio proporcionar vivências de ensino-aprendizagem que acolham os alunos em suas particularidades e atendam às suas necessidades. É necessário considerar que a inclusão dos deficientes deverá ser progressiva na escala temporal, pois houve um aumento significativo de 79,8% da matrícula de alunos na educação especial em todo o Brasil (PNEE, 2020). Portanto, pensar aulas baseadas nos princípios do DUA pode auxiliar os professores a tornar o processo de ensino-aprendizagem mais efetivo e significativo para um número maior de alunos.
A Geografia e a Cartografia Escolar
A geografia é uma ciência que estuda o espaço geográfico e as relações das pessoas com esse espaço e entre si. A cartografia é uma ferramenta importante para a análise e para a compreensão do espaço geográfico. Para representar o espaço geográfico, a geografia utiliza-se da cartografia (Santos et al, 2011). Os princípios básicos da cartografia são responsáveis pela alfabetização espacial do aluno, contribuindo para o entendimento e compreensão da realidade a partir da utilização de mapas, cartas, maquetes e outras representações possíveis do espaço geográfico (Santos et al, 2014).
É importante que a alfabetização cartográfica tenha se concretizado no ensino fundamental, para que no ensino médio os alunos consigam sintetizar e compreender as informações apresentadas nos conteúdos cartográficos. A alfabetização é uma construção do conhecimento cartográfico, como exposto por Santos et al (2014), que ocorre durante os anos de escolarização e que é consolidada no momento em que os alunos aprendem a utilizá-la em sua rotina. Muitas vezes as pessoas utilizam-se de produtos cartográficos e dos seus elementos no dia a dia sem saber que o processo de manusear, por exemplo, o GPS, caracteriza o uso da cartografia.
Assim, por meio do ensino cartográfico, busca-se a autonomia do estudante, promovendo uma melhor compreensão do seu papel no espaço:
objetiva-se além do fornecimento de alternativas para trabalhar conteúdos de ensino, gerar um aluno autônomo, despertando-o para possíveis leituras do mundo a sua volta - cidade, bairro e escola - compreendendo os elementos e suas interações nesses espaços (Santos et al, 2014, p. 22).
A linguagem cartográfica é importante para que os alunos desenvolvam a habilidade de compreender não somente os mapas, mas também entender, fazer conexões e representar seu espaço de vivência, pois a cartografia, como representação, possibilita refletir sobre o mundo:
A cartografia permite uma reflexão do mundo através de representações, e estas serão suporte para que na prática do processo ensino-aprendizagem haja uma construção do conhecimento de forma dinâmica e criativa. Já que o uso de mapas permite ao aluno um estudo de áreas e fenômenos ali representados (Santos et al, 2011, p. 8).
Não basta somente entender os fundamentos e a prática da cartografia, sendo necessário, para Nóvoa (2016), que, além do domínio de conteúdo, o docente entenda e aplique as bases pedagógicas e as teorias da aprendizagem, compreendendo como os alunos aprendem os conteúdos, visto que não existe uma forma única de aprender.
A cartografia tem importância histórica ancestral, desde que os homens desenhavam em rochas para se comunicar a partir de linguagem gráficas, “que serviram por muito tempo como forma de comunicação e era a maneira pelo qual por meio de desenhos representam o espaço em que viviam” (Santos et al 2011, p. 3). Atualmente, a cartografia, por meio de livros didáticos e demais materiais, representa diversos conteúdos do espaço geográfico, como relevos, corpos hídricos, climas, dados populacionais, econômicos e outros.
A cartografia escolar é interdisciplinar e não exclusiva da geografia, podendo ser utilizada, segundo Santos et al (2011), por todos aqueles que representam algum tipo de informação. Ela está presente no cotidiano do aluno e a escola e o docente se tornam mediadores deste conhecimento. De acordo com a BNCC, o desenvolvimento do pensamento espacial, que estimula o raciocínio geográfico e, para o qual é necessário o desenvolvimento da alfabetização cartográfica, é a grande contribuição da geografia para a educação básica (Brasil, 2018):
[...] a grande contribuição da Geografia aos alunos da Educação Básica: desenvolver o pensamento espacial, estimulando o raciocínio geográfico para representar e interpretar o mundo em permanente transformação e relacionando componentes da sociedade e da natureza. Para tanto, é necessário assegurar a apropriação de conceitos para o domínio do conhecimento fatual (com destaque para os acontecimentos que podem ser observados e localizados no tempo e no espaço) e para o exercício da cidadania (Brasil, 2018, p. 360).
O aprimoramento do raciocínio geográfico se dá por meio do pensar espacialmente e articuladamente (fatos, fenômenos, localizações e relações) e por meio da apropriação das técnicas cartográficas. Cabe à geografia a tarefa de instrumentalizar o aluno com os conhecimentos cartográficos, os quais não podem ser puramente técnicos, mas devem culminar em uma leitura mais crítica da sociedade (Lunkes; Martins, 2007), assim, possibilitando um letramento de mundo:
Para fazer a leitura do mundo em que vivem, com base nas aprendizagens em Geografia, os alunos precisam ser estimulados a pensar espacialmente, desenvolvendo o raciocínio geográfico. O pensamento espacial está associado ao desenvolvimento intelectual que integra conhecimentos não somente da Geografia, mas também de outras áreas (como Matemática, Ciência, Arte e Literatura). Essa interação visa à resolução de problemas que envolvem mudanças de escala, orientação e direção de objetos localizados na superfície terrestre, efeitos de distância, relações hierárquicas, tendências à centralização e à dispersão, efeitos da proximidade e vizinhança etc (Brasil , 2018, p. 359).
Na perspectiva do ensino da cartografia no âmbito inclusivo é necessário que os docentes repensem a produção de materiais didáticos para que se tenha um aprendizado cartográfico efetivo. É neste sentido que surge a cartografia tátil, que é uma ramificação da cartografia voltada para a confecção de mapas textualizados, em relevos, maquetes e afins, para pessoas com deficiência, principalmente alunos cegos ou baixa visão, possibilitando uma melhor percepção do espaço (Campos, 2021):
Sugere-se, por exemplo, a construção de maquetes, gráficos, tabelas, mapas táteis e outros recursos cartográficos, sendo fundamental, também, a análise e interpretação dos mesmos, já que, sem isso, não é possível fazer com que os alunos com Deficiência Visual compreendam a distribuição e organização dos espaços, perdendo, portanto, o sentido das atividades (Campos, 2009, p. 5).
A inclusão não se está apenas em proporcionar medidas para que seja possível a presença física em uma escola regular, é importante que sejam proporcionadas estratégias e materiais para que os alunos com deficiência participem das atividades escolares (Freitas, 2019).
Quanto aos alunos surdos, por exemplo, é necessário que se tenha atenção na linguagem dos mapas, pois deve-se sempre respeitar a Língua de Sinais Brasileira como primeira língua, uma vez que estes alunos possuem dificuldade na leitura de mapas tradicionais, em que a linguagem verbal utilizada nas representações gráficas está em língua portuguesa.
Segundo Neto et al (2019), a utilização de Mapas em Libras e a VisioGrafia representa uma significativa melhoria no processo da leitura cartográfica, facilitando o processo de construção do pensamento geográfico e da cartografia. Essa abordagem leva em consideração a estrutura da Língua de Sinais, otimizando a compreensão e a interpretação dos mapas para os surdos, que fazem uso da Libras.
Os mapas táteis são os mais interessantes para que se possa trabalhar numa perspectiva inclusiva, visto que a cartografia é uma ferramenta basicamente visual. Porém, há outros tipos de ferramentas que podem ser utilizadas para auxiliar a aprendizagem da cartografia, como os mapas mentais. Os mapas mentais podem, de acordo com Batista et al (2015), possibilitar a inserção de elementos subjetivos, que não estão presentes em mapas tradicionais, pois remetem a sentimentos topofílicos e topofóbicos, possibilitando ao mapeador a expressão de sua afetividade e, às vezes, do seu inconsciente.
Compreender as particularidades de cada linguagem cartográfica, suas potencialidades e limitações, promove, conforme a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), o reconhecimento dos produtos como possibilidades. A diversidade no trabalho com linguagens amplia o repertório dos alunos, facilitando a leitura de mundo. Mapas mentais são ferramentas eficazes para fixação de conteúdo, especialmente para alunos com deficiência intelectual ou déficit de atenção.
Sendo assim, é possível perceber a importância da cartografia na aprendizagem do espaço e no uso dos mapas como ferramenta norteadora para eficiência do ensino cartográfico. Desse modo, na perspectiva inclusiva, veem-se muitos trabalhos sobre mapas táteis, em diversas escalas, para o público com deficiência visual. De acordo com Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022), cerca de 18,6 milhões de brasileiros têm algum tipo de deficiência, aproximadamente 8,9% da população total brasileira.
Devido à predominância de pessoas com deficiência visual, os materiais cartográficos priorizam mapas táteis. No entanto, esses mapas são inclusivos, beneficiando também alunos com outras deficiências, por sua interatividade e intuitividade. Adaptar títulos e legendas para deficientes auditivos amplia a acessibilidade, tornando os mapas ferramentas valiosas no ensino cartográfico para todos.
Metodologia
O desenvolvimento desta pesquisa e a obtenção dos resultados relacionados à problemática apresentada baseiam-se metodologicamente na análise bibliográfica sobre a temática em questão. A pesquisa básica, conforme descrita por Silva et al. (2001), visa gerar conhecimento novo e útil para o avanço da ciência, sem uma aplicação prática específica prevista. Além disso, este trabalho possui um objetivo exploratório, conforme definido por Gil (1991), que busca proporcionar maior familiaridade com a problemática por meio do levantamento bibliográfico.
A fim de direcionar o trabalho a ser desenvolvido, podem-se destacar os seguintes procedimentos metodológicos: desenvolvimento de uma sequência didática, na perspectiva do DUA, fundamentada na habilidade designada como EM13CHS106[1]; elaboração do material pedagógico didático, referente à sequência didática, na perspectiva do DUA.
Resultados e discussões
Esta seção está dividida em duas subseções de resultado e discussões, sendo a primeira, o desenvolvimento da sequência didática ancorada nos princípios do DUA, trazendo exemplos de atividades para aplicação em sala de aula. E, na segunda seção, apresenta-se a elaboração dos materiais didáticos para execução da sequência didática.
Sequência didática ancorada nos princípios do DUA
A sequência didática configura um conjunto de propostas metodológicas, sendo uma série ordenada e articulada de atividades que formam as unidades didáticas (Zabala, 1998). A importância da elaboração da sequência didática está relacionada ao modo de articulação e à metodologia de ensino de um determinado conteúdo. Dependendo dos alunos e dos professores, esse planejamento possibilita que o professor articule o conteúdo de acordo com o objetivo de ensino.
As sequências didáticas criam um ambiente de aprendizagem dinâmico e participativo, onde os alunos são encorajados a explorar, discutir e refletir sobre os conteúdos de maneira ativa. Ao longo desse processo, a construção do conhecimento é promovida através de diversas estratégias, incluindo debates, pesquisas, experimentações e produções escritas ou artísticas. Essas abordagens capacitam os estudantes a compreender e aplicar os conceitos de forma mais significativa e autônoma,
De modo geral, pode-se afirmar que as sequências didáticas tratam de uma proposta que tem como procedimento metodológico a construção e reconstrução de conceitos sobre as mais diversas temáticas inerentes à educação básica. Consistem na realização de uma série de atividades que visam à sistematização de conceitos individuais e na qual continuamente são desenvolvidas atividades com pequenos grupos, visando generalizar e sintetizar conclusões acerca do tema abordado (Neto, 2018, p. 92).
Assim, a proposta aqui exposta é composta por uma sequência voltada para o componente curricular de geografia do 1º ano do Ensino Médio. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2018), foi selecionada a habilidade EM13CHS106, tendo como tema leitura e interpretação cartográfica, atrelados aos princípios do DUA.
A escolha pelo 1º ano do Ensino Médio está relacionada à intenção de avaliar a alfabetização cartográfica, que começa no ensino fundamental e é ampliada durante o Ensino Médio. Espera-se que os alunos desenvolvam a habilidade de sintetizar, compreender e interpretar adequadamente as informações apresentadas em diversos tipos de mapas, estabelecendo conexões entre as escalas e os fenômenos representados. Além disso, espera-se que sejam capazes de representar e analisar criticamente seu próprio espaço de vivência. A cartografia é revisitada e aprofundada no início do Ensino Médio para que os alunos se apropriem desse conhecimento e possam compreender melhor os conteúdos abordados nos anos seguintes.
Para que os princípios do DUA sejam atendidos e a aula possa ocorrer de modo a suprir as diversas realidades de um ambiente escolar, alguns materiais didáticos precisam ser elaborados, como: mapa e projeções cartográficas texturizados e/ou com cores vibrantes; as informações textuais do mapa precisam obedecer ao padrão de representação em Português, Libras e Braille (PLB); as figuras ilustrativas serão ampliadas e transpostas para a audiodescrição; réguas com sinalizações em braille; textos fixativos sobre os conteúdos serão disponibilizados impressos, ampliados e em audiodescrição.
Nesta sequência didática presente no quadro 1- Exemplo de Sequência Didática, a habilidade EM13CHS106 está relacionada a competência específica 1 da BNCC (Brasil, 2018), que tem como objetivo a análise de processos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais nos âmbitos local, regional, nacional e mundial em diferentes tempos. A competência específica pretende que os alunos ampliem a capacidade de elaborar hipóteses e compor argumentos com base na sistematização de dados qualitativos e quantitativos. Os conteúdos programáticos trabalharam o conceito de mapas, a diferenciações entre mapas, cartas e planas, os tipos de mapas, os elementos cartográficos fundamentais dos mapas e, por fim, a relação entre os dados apresentados e a vivência dos alunos.
Quadro 1- Exemplo de Sequência Didática:
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Unidade Curricular: Geografia |
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Anos: Primeiro Ano - Ensino Médio |
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Tema: Leitura e interpretação cartográfica |
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Unidade temática: Cartografia |
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Quais são as habilidades previstas: Utilizar as linguagens cartográfica, gráfica e iconográfica e de diferentes gêneros textuais e as tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva. |
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Conteúdos/orientações: ● Diferenciação de mapas, cartas e plantas; ● A importância de aprender a fazer a leitura de um mapa; ● Tipos de mapas; ● Os elementos básicos de um mapa (título, orientação, coordenadas geográficas, projeção cartográfica, legenda e escala); ● Leitura e interpretação do mapa, considerando seus elementos básicos; ● A posição geográfica do país utilizando-se das coordenadas geográficas; ● As diversas projeções cartográficas; ● Escala cartográfica, tipos, classificação e aplicação do conceito de escala; ● Relação entre os dados apresentados pelo mapa e a vivência dos alunos. |
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Objetivos de aprendizagem: ● Verificar a aprendizagem da cartografia; ● Praticar a leitura do mapa; ● Relacionar a distância da escala com a distância real da área; ● Orientar-se e localizar-se no mapa; ● Encontrar as coordenadas dos pontos marcados no Mapa Político do Brasil; ● Aplicar o conceito de escala em situações-problemas. |
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Duração: 3 aulas de 50 minutos. |
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Metodologia: Aula dialogada, sendo construída com a interação dos discentes e orientada pela professora. Com a proposição de interação, leitura, interpretação, cálculos e o desenvolvimento de atividades grupais e individuais. |
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Recursos didáticos: ● Mapa texturizado das regiões do Brasil; ● Figuras ilustrativas táteis e legendas em Português, Libras e Braille (PLB); ● Réguas sinalizadas para o cálculo da escala; ● Lousa; ● Projetor; ● Texto em Português, Libras e Braille (PLB); ● Audiodescrição do conteúdo disponibilizado em podcast. |
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Avaliação: Participação em aula. Atividade em grupo referente às projeções cartográficas. Cálculos de escala e sua interpretação. Síntese oral de como pode ser realizada a leitura do mapa, considerando as informações que seus elementos básicos transmitem. |
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Referências: COSTA, Jordana. Escala cartográfica. Disponível em: https://docente.ifrn.edu.br/jordanacosta/ disciplinas/caico-1o-ano-2014/informatica/cartografia. Acesso em: 31 abr. 2022. IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Conceitos gerais: o que é cartografia? coordenadas geográficas. Disponível em: https://atlasescolar.ibge.gov.br/conceitos-gerais /o-que-e-cartografia/coordenadas-geogra-ficas.html. Acesso em 31 abr. 2022. MEDEIROS, Anderson. Quais são os principais elementos cartográficos para um mapa? Disponível em: https://clickgeo.com.br/elementos-cartograficos-mapas/. Acesso em 31 abr. 2022. MOREIRA, João Carlos; SENE, Eustáquio de. Geografia Geral e do Brasil - Espaço geográfico e globalização. Volume 1. São Paulo: Scipione, 2016. Disponível em: https://storage.googleapis.com/edocente-content-production/Aplicacoes/Edocente/plugins/pdfjs-sem-download-e-print/web/viewer.html?file=https://storage.googleapis.com/edocente-content-production/PNLD/PNLD_2018/GeografiaGeralBrasil/1o%20Ano/GeografiaGeralBrasil_1_MP_0046P18053_PNLD218.pdf. Acesso em 31 abr. 2022. |
Fonte: Rodrigues, 2022.
Com a intenção de aplicar os conceitos do DUA, a primeira aula, em especial, busca proporcionar múltiplos modos de apresentação dos conteúdos e a possibilidade dos alunos expressarem o conhecimento sobre o conteúdo, com o objetivo de transpor as barreiras de comunicação, como no mapa texturizado e legendados em Português, Libras e Braille (PLB).
Sendo assim, os discentes serão instruídos a identificar os elementos cartográficos fundamentais em um mapa. Para tal, usar-se-á o mapa texturizado das regiões do Brasil, com as informações cartográficas cobertas, permitindo que seja visualizado somente a figura representativa da área territorial do país. Assim, irá se abrir um debate, questionando: Qual seria o tema do mapa? O que cada cor/textura representa? Qual elemento auxilia para que se saiba o que cada cor/textura representa? Onde fica o norte, o sul, o leste e o Oeste? Qual elemento presente nos mapas nos indica as direções? Quantas vezes o território precisou ser diminuído para que pudesse ser representado? É possível descobrir? Como?
Conforme os alunos forem respondendo aos questionamentos de modo correto, a professora salientará a resposta correta e a escreverá no quadro. Na sequência, apresentará os conceitos com ilustrações e identificando os elementos principais do mapa, destacando que estes são indispensáveis para que uma figura seja considerada um mapa e que tais elementos devem ser compatíveis com o que está sendo representado.
Neste primeiro momento, é necessário que fique claro e sejam bem trabalhados os seguintes elementos: título, orientação, legenda, coordenadas geográficas e fonte.
Num segundo momento será trabalhado o conteúdo das projeções cartográficas: cilíndrica, cônica e plana. O docente irá apresentar os conceitos e as distinções entre as principais projeções cartográficas, com auxílio de formas/imagens texturizadas. Em seguida, os discentes serão orientados a realizarem uma atividade representativa das projeções, para isso será necessário dividir a turma em três grupos para que cada um fique responsável pela elaboração de uma projeção, bem como uma síntese das características da projeção escolhida.
Na figura 2, tem-se o passo a passo do processo a ser realizado pelos alunos:
Figura 2 - Atividade de
representação das projeções
Fonte: Rodrigues, 2022
Os recursos necessários incluem uma garrafa PET, papel vegetal, folha de acetato, cola glitter e um globo terrestre. Para a projeção cônica, corta-se o gargalo da garrafa PET para apoiar o globo, desenha-se o plano tocante na garrafa e transfere-se para o papel vegetal. Na projeção plana, a folha de acetato é apoiada em um dos pólos do globo, desenha-se o plano tocante e transfere-se para o papel. Na projeção cilíndrica, utiliza-se o corpo da garrafa cortado ao meio, envolvendo o globo como cilindro. Após a transferência para o papel vegetal, aplica-se glitter para criar relevo, facilitando a identificação tátil.
Nesta experiência, os alunos compreendem o processo de elaboração de mapas e as características das projeções utilizadas. Percebem as dificuldades de representação em plano bidimensional, analisando as distorções e potencialidades das projeções. O objetivo é aprofundar o entendimento sobre mapas e representações cartográficas.
Em um terceiro momento, a proposta é abordar com os discentes os tipos de escala cartográfica e os cálculos possíveis com a escala, a fim de elucidar a compreensão sobre as proporções entre o espaço e a representação. Os alunos deverão responder sobre a importância da escala, para que serve, como se pode definir e como descobrir, após os conceitos definidos o docente deverá iniciar os seguintes questionamentos: Quais são as duas formas de representação de escalas apresentadas em um mapa? A medida do mapa é igual à medida na realidade? Como descobrir a distância real? Tais questionamentos são importantes para que o discente compreenda que o objetivo principal da escala é nos informar quanto o espaço real foi reduzido, é importante atentar-se às unidades de medidas presentes no mapa.
Os recursos a serem utilizados nesta etapa serão o mapa texturizado das regiões brasileiras e as réguas sinalizadas. As distâncias serão mensuradas no mapa e alguns cálculos serão realizados, estipulando a relação entre a área real e a cartografada.
As duas últimas atividades dos momentos dois e três contemplam a perspectiva do DUA em relação à rede de afetividade, buscando permitir que o aluno se motive aprendendo o conteúdo. A rede de conhecimento também está presente, pois o conteúdo está expresso em mais de uma maneira, facilitando o acesso ao conteúdo de diferentes maneiras e, por fim, a rede de estratégia está na possibilidade dos alunos expressarem as informações aprendidas de diversas maneiras.
A produção de materiais cartográficos táteis baseados no DUA
Para que a cartografia possa ser acessível e faça sentido ao maior número possível de estudantes, é fundamental que essa não fique somente no abstrato e que possa ser manipulada, trabalhada de modo concreto, a fim de elucidar como ocorre a construção, a leitura e a interpretação de mapas ou figuras cartográficos.
Para bem desenvolver esta sequência didática é necessário que o docente adapte e/ou recrie recursos didáticos para facilitar o processo de ensino-aprendizagem. Os materiais sugeridos a seguir foram elaborados pela autora, no intuito de fomentar a participação dos alunos, atender à diversidade de uma sala e tornar a aula o mais inclusiva possível.
Assim, foi elaborado o mapa texturizado (figura 3), com destaque para características específicas: diferentes texturas em diferentes regiões para auxiliar a identificação por deficientes visuais; cores vibrantes para facilitar a leitura por pessoas com baixa visão; elementos cartográficos e nomenclatura dos estados sinalizados em Português, Libras e Braille (PLB) e/ou texturizados; a orientação (norte geográfico) e coordenadas geográficas representadas em relevo para melhor compreensão.
A utilização de contrastes de texturas e cores simplifica a identificação de diferentes áreas geográficas, enquanto a representação tátil do norte e das coordenadas geográficas proporciona uma compreensão espacial mais precisa para usuários com deficiência visual. Essas estratégias promovem a acessibilidade e a inclusão no uso do mapa, tornando-o eficaz para todos os usuários.
Figura 3 - Mapa texturizado das regiões brasileiras
Fonte: Rodrigues, 2022.
A abordagem tátil e visualmente estimulante proporciona uma compreensão mais profunda das diferentes distorções que ocorrem nas projeções cartográficas. Para contribuir com o entendimento das projeções cartográficas, estas foram texturizadas, com barbantes e palitos, sinalizadas em Português, Libras e Braille (PLB), conforme figura 4.
Figura 4 - Projeções cartográficas táteis e sinalizadas em Português, Libras e Braille (PLB)
Fonte: Rodrigues, 2022.
Para o trabalho com escala, como a mensuração de áreas e distâncias, réguas sinalizadas (figura 5) foram elaboradas, para que todos possam ter assegurado seu direito de participação nas atividades propostas. Estas foram sinalizadas com dois tipos de pérolas, as brancas possuem maior dimensão se são usadas para sinalizar o intervalo de cinco cm e as amarelas com menor tamanho são utilizadas para representar o intervalo de um centímetro.
Figura 5 - Régua sinalizada
Fonte:
Rodrigues, 2022.
Optou-se pela elaboração dos materiais, uma vez que a maioria das instituições de ensino não dispõem de materiais cartográficos táteis, o que dificulta a aprendizagem dos alunos, inclusive daqueles que são vistos como típicos. Sendo a cartografia um conhecimento prático e de representação da realidade geográfica, fazer estas adaptações torna o processo de ensino-aprendizagem mais significativo, efetivo e articulado, conjugando teorias e vivências.
Considerações finais
As práticas pedagógicas cartográficas ancoradas na perspectiva do DUA tendem a potencializar a aprendizagem e garantir o acesso ao currículo mínimo para alunos com e sem deficiência. Os recursos didáticos construídos dinamizam o processo de ensino-aprendizagem e atendem a uma gama variada de diferenças.
Tendo em vista a inexistência da homogeneidade dos alunos, a apropriação do conhecimento ocorre de variadas maneiras, dependendo da particularidade de cada indivíduo. Neste sentido, o DUA apresenta-se como uma perspectiva que visa a identificação e possibilita a quebra das barreiras pedagógicas. É fundamental que o docente leve em consideração a usabilidade prática dos estudantes e que os recursos a serem utilizados sejam escolhidos mediante a necessidade de cada turma.
Faz-se necessário justificar que, no decorrer da pesquisa, ocorreram alterações metodológicas que mudaram o desfecho do trabalho. Inicialmente, a proposta seria aplicada, com a intenção de mapear as potencialidades e os pontos de estrangulamento de tal metodologia, mas, devido a entraves com órgãos estaduais de educação, não foi possível submeter a pesquisa ao comitê de ética, inviabilizando a aplicação desta. Visa-se, em trabalhos futuros, a aplicação da sequência didática e a consequente reflexão sobre a ação.
Ao se apresentarem a sequência didática e os produtos educacionais que seriam utilizados para desenvolvê-la, deixou-se em aberto para os educadores a possibilidade de torná-la realidade e, se possível, dar um feedback para que os ajustes necessários sejam realizados e para que sua aplicabilidade possa ser avaliada.
Outra fragilidade encontrada foi a dificuldade em obter informações sobre materiais didáticos que não estejam voltados apenas para deficiente visual e/ou auditivo, uma vez que o espaço escolar recebe alunos com outras deficiências e transtornos. Pensar o cotidiano escolar na perspectiva do DUA é contemplar, ao máximo, toda a diversidade, é partir dela e não fazer adaptações para que todos se sintam integrados.
Para auxiliar na disseminação de materiais didáticos universais, na perspectiva do DUA, publica-se em formato de artigo a presente pesquisa e objetiva-se desenvolver oficinas em eventos regionais e instituições de ensino, fomentando o ensino da cartografia inclusiva na perspectiva do DUA.
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[1] Utilizar as linguagens cartográfica, gráfica e iconográfica, diferentes gêneros textuais e tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais, incluindo as escolares, para se comunicar, acessar e difundir informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.