http://dx.doi.org/10.5902/1984686X67847

Bullying envolvendo alunos com deficiência: análise a partir de uma revisão de literatura

Bullying involving students with disabilities: analysis based on a literature review

Bullying que involucra a estudiantes con discapacidades: análisis basado en una revisión de la literatura

Mônica Tessaro

Doutoranda na Universidade do Oeste de Santa Catarina, Joaçaba, SC, Brasil

E-mail: m_tessaro@unochapeco.edu.br ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4784-3606

Maria Teresa Ceron Trevisol

Professora doutora da Universidade do Oeste de Santa Catarina, Joaçaba, SC, Brasil

E-mail: mariateresa.trevisol@unoesc.edu.br ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9289-4627

Tania Mara Zancanaro Pieczkowski

Professora doutora da Universidade Comunitária da Região de Chapecó, Chapecó, SC, Brasil

E-mail: taniazp@unochapeco.edu.br ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5257-7747

Recebido em 27 de setembro de 2021

Aprovado em 18 de fevereiro de 2022

Publicado em 30 de março de 2022

RESUMO

Este artigo tem por objetivo identificar e analisar o que vem sendo discutido entre as pesquisas envolvendo o bullying e os alunos com deficiência bem como apresentar estratégias de enfrentamento e prevenção desse problema. Com o propósito de embasar esta análise, foi realizada uma revisão sistemática da literatura em trabalhos indexados nas bases de dados: Scientific Electronic Library Online (Scielo), Portal de Periódicos CAPES e Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES, no recorte temporal entre os anos de 2011 a 2021. Utilizando-se de critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 16 trabalhos acadêmicos, os quais constituem a amostra deste estudo. Do processo analítico a partir das indicações da revisão sistemática, emergiram duas categorias: i) Relações interpessoais com/entre alunos com deficiência; ii) Estratégias de enfrentamento e prevenção do bullying envolvendo alunos com deficiência. A pesquisa evidenciou que os alunos com deficiência estão mais propensos a serem rejeitados e vitimizados na escola, por conta disso, entre as estratégias de prevenção e enfrentamento do bullying envolvendo esse público, destaca-se aquelas de caráter contextualista/interacionista, como preconiza a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (TBDH), por meio do fortalecimento das relações entre pares, a formação de professores e o fortalecimento do vínculo família-escola.

Palavras-chave: Bullying; Alunos com deficiência; Revisão Sistemática.

ABSTRACT

This article aims to identify and analyze what has been discussed among research involving bullying and students with disabilities, as well as to present strategies for coping and preventing this problem. In order to support this analysis, a systematic review of the literature was carried out in works indexed in the following databases: Scientific Electronic Library Online (Scielo), Portal de Periódicos CAPES and Catalog of Theses and Dissertations of CAPES, in the time frame between the years from 2011 to 2021. These works were indexed in the following databases: Scientific Electronic Library Online (Scielo), CAPES Journal Portal and CAPES Theses and Dissertations Catalog. Using inclusion and exclusion criteria, 16 academic works were selected, which constitute the sample of this study. From the analytical process, based on the indications of the systematic review, two categories emerged: i) Interpersonal relationships with/among students with disabilities; ii) Strategies for coping and preventing bullying involving students with disabilities. The research showed that students with disabilities are more likely to be rejected and victimized at school. Because of this, among the strategies for preventing and coping with bullying involving this audience, those of a contextualist/interactionist nature stand out, as advocated by the Bioecological Theory of Human Development (TBDH), through the strengthening of relationships between peers, the training of teachers and the strengthening of the family-school bond.

Keywords: Bullying; Students with disabilities; Systematic review.

RESUMEN

Este artículo tiene como objetivo identificar y analizar lo discutido entre las investigaciones que involucran el acoso escolar y los estudiantes con discapacidad, así como presentar estrategias para enfrentar y prevenir este problema. Para sustentar este análisis, se realizó una revisión sistemática de la literatura en trabajos indexados en las siguientes bases de datos: Scientific Electronic Library Online (Scielo), Portal de Periódicos CAPES y Catálogo de Tesis y Disertaciones de la CAPES, en el lapso de tiempo comprendido entre los años del 2011 al 2021. Utilizando criterios de inclusión y exclusión, se seleccionaron 16 trabajos académicos, que constituyen la muestra de este estudio. Del proceso analítico, a partir de las indicaciones de la revisión sistemática, surgieron dos categorías: i) Relaciones interpersonales con / entre estudiantes con discapacidad; ii) Estrategias para afrontar y prevenir el acoso escolar que involucra a estudiantes con discapacidad. La investigación mostró que los estudiantes con discapacidad tienen más probabilidades de ser rechazados y victimizados en la escuela, por ello, entre las estrategias de prevención y afrontamiento del bullying que involucran a esta audiencia, destacan las de carácter contextualista / interaccionista, como defiende la Teoría. Desarrollo Bioecológico del Desarrollo Humano (TBDH), a través del fortalecimiento de las relaciones entre pares, la formación de docentes y el fortalecimiento del vínculo familia-escuela.

Palabras clave: Bullying; Estudiantes con discapacidades; Revisión sistemática.

Introdução

Por meio do processo de democratização, a educação brasileira, passou por inúmeras transformações, entre elas, destacamos o ingresso de alunos com deficiência no ensino regular, considerada neste texto, um avanço no campo educacional. O direito de acesso a esse público passou a ser garantido pela Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, no seu capítulo V, quando trata da educação especial, mais especificamente, no artigo 58º quando afirma, para os efeitos da lei, que a rede regular de ensino deve garantir o acesso a todos os educandos incluídos (BRASIL, 1996).

Ao buscarmos dados atuais, nos deparamos com o resultado do Censo Escolar de 2016, quando o Brasil apresentou um aumento de 70% no número de matrículas de alunos com alguma deficiência incluídos na escola regular, chegando a uma margem de 900.000 estudantes matriculados. É notável a inserção desse público no contexto educacional, entretanto, inúmeras fronteiras demandam ser ultrapassadas, entre elas, as que não estão favorecendo a permanência, devido à falta de estrutura física, pedagógica e relacional a esses alunos (BRASIL, 2017; KASPER, LOCH, PEREIRA, 2008).

A Lei n° 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprovou o Plano Nacional de Educação, apresenta a determinação de metas e estratégias para a educação até 2024, nela encontramos a meta 4, a qual prevê:

universalizar para a população de 4 (quatro) a 17 (dezessete) anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, o acesso à educação básica e ao atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino, com a garantia de sistema educacional inclusivo, de salas de recursos multifuncionais, classes, escolas ou serviços especializados, públicos ou conveniados (BRASIL, 2014, p. 6).

Essa meta trata dos direitos dos alunos com deficiência, visando garantir o acesso em todos os níveis da educação básica, entretanto, preocupa-nos as condições de permanência. Posteriormente, a Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, a qual indica: “é dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação.” (BRASIL, 2015, s/p.).

Já a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável, contempla dezessete objetivos interconectados os quais tratam sobre os principais desafios de desenvolvimento que deverão ser enfrentados por todos os países. Chamamos a atenção para o desafio quatro, que trata da educação de qualidade, cujo objetivo é “assegurar a educação inclusiva, equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas e todos” (NAÇÕES UNIDAS, 2017, p.4), no que tange a educação para alunos com deficiência define:

até 2030, eliminar as disparidades de gênero na educação e garantir a igualdade de acesso a todos os níveis de educação e formação profissional para os mais vulneráveis, incluindo as pessoas com deficiência, povos indígenas e as crianças em situação de vulnerabilidade [...]. Construir e melhorar instalações físicas para educação, apropriadas para crianças e sensíveis às deficiências e ao gênero, e que proporcionem ambientes de aprendizagem seguros e não violentos, inclusivos e eficazes para todos. (NAÇÕES UNIDAS, 2017, p. 54-76).

Partindo dessas perspectivas legislativas (Lei nº 9.394/1996; Lei n° 13.005/2014; Lei nº 13.146/2015 e Agenda 2030), acreditamos que o cumprimento dessas metas/leis requer monitoramento e trabalho contínuo, tanto da sociedade civil quanto das instituições públicas, incluindo o Ministério da Educação. O Brasil precisa empenhar-se para desenvolver um sistema educacional mais inclusivo e que dê condições de permanência para esse público escolar. Dentre esses desafios, acreditamos que construir relações humanas mais saudáveis no contexto educacional é urgente, especialmente, quando nos referimos a uma população historicamente esquecida e excluída.

Entendemos que a educação inclusiva “traz consigo uma mudança dos valores da educação tradicional, o que implica desenvolver novas políticas e reestruturação da educação.” (SILVA NETO et al., 2018, p. 82). Nesse sentido, o processo de inclusão de pessoas com deficiência deve ser contínuo em todos os setores da sociedade, principalmente na escola, devido às características multifatoriais desse ambiente. Para Mantoan (2003, p. 12), a inclusão propõe uma ruptura na base estrutural e organizacional da escola, trata-se de “uma saída para que a escola possa fluir, novamente, espalhando sua ação formadora para todos os que dela participam.”

Contudo, apesar dos avanços da educação inclusiva em termos de acesso à educação básica garantido em termos legais, evidenciamos a necessidade da sequência das pesquisas que tratem da promoção da convivência envolvendo os alunos com deficiência no contexto escolar. Embora presenciemos avanços em relação ao modo como a sociedade vem se relacionando com as pessoas com deficiência, “também é verdade que se adentrou o século XX com uma visão pejorativa da deficiência ainda bastante arraigada.” (BOTELHO; PORCIÚNCULA, 2018, p. 114).

Por conta disso, Silva e Oliver (2019, p. 280) defendem que os espaços educacionais devem ser “lugares para a convivência e o apoio solidário entre seus participantes, de forma a também buscar um espaço de maior visibilidade na sociedade.” Portanto, neste artigo, trataremos de um tipo específico de violência, que inviabiliza a convivência entre/com os alunos com deficiência, o bullying.

O bullying é compreendido como conflitos entre pares, como um problema, que também, atinge alunos com deficiência. Uma ação é considerada bullying, quando alguém mal-intencionado(a) afeta, fere, ou desconforta outra pessoa. Essas ações podem ser realizadas por meio do contato físico, verbal, por mímicas ou gestos obscenos, ou ainda, excluindo de forma intencional a vítima de um grupo. Nesse sentido, o termo bullying associa-se obrigatoriamente a três critérios: intencionalidade, repetição e, desequilíbrio de força e poder entre a vítima e o agressor.

É uma forma de violência cometida por um ou vários alunos sobre seus pares, sem aparente provocação por parte da pessoa que está sendo alvo das intimidações (OLWEUS, 1994; 1997; 2005; 2011). Nesse sentido, os papeis desempenhados em uma situação de bullying podem ser assim classificados: vítima, agressor e espectadores. (OLWEUS; LIMBER, 2010). A pesquisa desenvolvida por Tognetta et al. (2015) realizada em escolas públicas e privadas, constatou que 16,5% dos alunos são alvos e bullying, 19,5% são os agressores e 63% são espectadores.

O bullying no contexto escolar ocorre, na maioria das vezes, escondido dos adultos, por isso, destacamos a importância dos espectadores que, no cotidiano escolar, presenciam, testemunham uma ação ou uma situação de bullying. É esse público que assiste às agressões que pode reforçar o comportamento dos agressores por meio da omissão, ou pode proteger as vítimas, denunciando os agressores a um adulto. E no caso, dos espectadores de bullying contra alunos com deficiência, esse público chama ainda mais atenção, tendo em vista que, ao intervirem contra essa situação, ela tende a parar ou pelo menos diminuir rapidamente (ZEQUINÃO et al., 2016).

Alguns problemas vinculados às situações de bullying envolvendo alunos com deficiência já foram descritos na literatura, entre eles, destacamos o estudo de Oksendal et al. (2019) que teve por objetivo investigar se crianças com dificuldades de desenvolvimento e comportamento têm maior risco de sentirem-se vítimas por pares em comparação com crianças em desenvolvimento típico. Entre os resultados, a pesquisa nos indica que crianças com espectro autista e crianças com cinco ou mais dificuldades de desenvolvimento e comportamento, possuem maior risco de serem vítimas de bullying em comparação com crianças em desenvolvimento típico.

E ainda, a pesquisa de Cerqueira et al. (2021, p. 72) nos indica que em 2019 “[...] foram registrados 7.613 casos de violências contra pessoas com deficiência no sistema Viva-Sinan. Tais números consideram as pessoas que apresentavam pelo menos um dos quatro tipos de deficiência: física, intelectual, visual, auditiva.” Esse indicador mostra outro dado preocupante: 58% das notificações de violência contra pessoas com deficiência trata-se de violência doméstica (provocada por alguém que faz parte de seu núcleo familiar) e 24% são casos de violência comunitária (cometida por amigos, pessoas que frequentam os mesmos espaços sociais, por exemplo, a escola).

Diante desses dados, consideramos que os espaços educacionais devem viabilizar debates sobre as violências, prioritariamente, o bullying envolvendo os alunos com deficiência, ampliando as possibilidades de enfrentamento e prevenção desses casos. Por conta disso, este texto objetiva identificar e analisar o que as pesquisas têm apresentado em relação à violência do tipo bullying e aos alunos com deficiência, bem como, discutir estratégias de enfrentamento e prevenção desse problema.

Procedimentos metodológicos

Este artigo configura uma revisão sistemática da literatura, como um método de pesquisa científica sobre o bullying envolvendo os alunos com deficiência.

Pesquisas assim cooperam com a “organização e análise na definição de um campo, uma área, além de indicar possíveis contribuições da pesquisa para com as rupturas sociais.” (ROMANOWSKI, ENS, 2006, p. 39). Esse tipo de revisão apoia-se nas seguintes etapas: a) elaboração de um objetivo de pesquisa; b) delimitação de diferentes fontes de pesquisa para a busca literária; c) utilização de critérios de inclusão e exclusão; d) categorização dos dados, e por fim, e) sistematização e interpretação dos trabalhos selecionados acerca do objetivo da pesquisa (MENDES; SILVEIRA; GALVÃO, 2008).

Desta forma, a partir do objetivo de pesquisa, delimitamos o campo do conhecimento científico em três bases de dados virtuais, a saber: Scielo, Portal de Periódicos CAPES e Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES. Utilizamos os seguintes descritores: Par de descritor 1: Alunos com deficiência AND Bullying; Par de descritor 2: Deficiência AND Bullying; Par de descritor 3= Vitimização AND deficiência. Selecionamos os idiomas: Inglês, Espanhol e Português, no recorte temporal: 2011 a 2021. O levantamento bibliográfico foi realizado em junho de 2021. Os filtros utilizados na busca bibliográfica em cada base de dados estão descritos no quadro 1.

Quadro 1 – Distribuição das publicações nas bases de dados selecionadas

BASE DE DADOS

DESCRITORES/FILTROS

NÚMERO DE TRABALHOS LOCALIZADOS

Scielo

Par de descritor 1: Alunos com deficiência AND Bullying

Par de descritor 2: Deficiência AND Bullying

Par de descritor 3= Vitimização AND deficiência

 

Filtros: Coleções=todos; Periódico= todos; Idioma= Inglês, Espanhol e Português; Ano de Publicação= 2011-2021; Áreas temáticas= todos.

 

Par de descritor 1=00

Par de descritor 2= 04

Par de descritor 3= 2

Total= 06

Portal de Periódicos CAPES

Par de descritor 1: Alunos com deficiência AND Bullying

Par de descritor 2: Deficiência AND Bullying

Par de descritor 3= Vitimização AND deficiência

 

Filtros: Data de publicação: 2011-2021; Tipo de recurso= Artigos; Nível superior= Periódicos revisados por pares; Idioma= Inglês, Espanhol e Português; Coleção= todos.

 

Par de descritor 1= 27

Par de descritor 2= 69

Par de descritor 3=44

 

Total= 140

Catálogo de teses e dissertações da CAPES

Par de descritor 1: Alunos com deficiência AND Bullying

Par de descritor 2: Deficiência AND Bullying

Par de descritor 3= Vitimização AND deficiência

 

Filtros: Tipo= Mestrado e doutorado;

Ano= 2011- 2021; Grande Área do conhecimento= Todas; Área do conhecimento= Todas; Área de Concentração= Todas.

 

Par de descritor 1= 14

Par de descritor 2= 11

Par de descritor 3= 09

 

Total= 34

Fonte: Dados da pesquisa bibliográfica (2021).

Na seleção dos trabalhos, delimitamos os seguintes critérios de inclusão: a) trabalhos que tinham como principal objetivo de análise a questão do bullying envolvendo alunos com deficiência; b) trabalhos que apresentavam estratégias de prevenção e enfrentamento do bullying envolvendo alunos com deficiência; e ainda; c) trabalhos que estivessem disponíveis de forma online e na íntegra. Desse modo, os estudos que atendiam a estes itens foram incluídos na revisão sistemática da literatura.

Resultados

No levantamento bibliográfico foram localizados 180 trabalhos, os quais passaram pelo processo de triagem, quando identificamos 103 duplicados entre as bases de dados e que 22 não estavam disponíveis de forma online e na íntegra. Portanto, foram excluídos no processo de triagem 125 trabalhos. Desta forma, restaram 55 trabalhos para o processo de elegibilidade da pesquisa que contemplou a leitura na íntegra e a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão. Na figura 1 apresentamos as informações de cada etapa de levantamento dos dados bibliográficos, de acordo com as recomendações do protocolo Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA).

Figura 1 – Fluxograma PRISMA da seleção dos trabalhos localizados nas bases de dados: SCIELO, Portal de Periódicos CAPES e Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES

Fonte: PRISMA. Dados da pesquisa (2021).

A partir da aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, através do processo de elegibilidade, foram excluídos 39 trabalhos. Destes, 17 foram excluídos por tratarem apenas do tema da deficiência, outros 12 porque as discussões sobre bullying envolvendo alunos com deficiência foram realizadas somente nas considerações finais das pesquisas e outros 10 trabalhos por não apresentarem estratégias de enfrentamento do bullying contra alunos com deficiência. Assim, 16 trabalhos foram selecionados para compor nossa análise. Nos quadros 2, 3 e 4, apresentamos uma síntese dos trabalhos selecionados para este artigo.

Quadro 2 – Publicações selecionadas na base de dados Scielo

AUTORES

TÍTULO

LOCAL E ANO DE PUBLICAÇÃO

Marcília de Morais Dalosto; Eunice Maria Lima Soriano de Alencar

Manifestações e prevalência de bullying entre alunos com altas habilidades/superdotação

Revista Brasileira de Educação Especial, São Paulo, 2013.

Cristina Del Barrio;

 Kevin Van Der Meulen

Maltrato por abuso de poder entre ¡guales en el alumnado con d¡scapac¡dad

Revista Pensamiento Psicológico, Cali, 2016.

María Luisa Belmonte Almagro; Abraham Bernárdez Gómez; Ana Belén Mirete Ruiz

La Voz del Silencio: Evaluación Cualitativa de Prácticas de Bullying en Personas con Discapacidad Intelectual

Revista Brasileira de Educação Especial, São Paulo, 2021.

Fonte: Dados da pesquisa bibliográfica (2021).

Quadro 3 – Publicações selecionadas na base de dados Portal de Periódicos CAPES

AUTORES

TÍTULO

LOCAL E ANO DE PUBLICAÇÃO

Marisa Ferreira Aderaldo

Bullying e semiótica: um estudo dos estados de alma dos sujeitos

Revista Linguagem e Tecnologia, Minas Gerais, 2012.

Deisy Ribas Emerich;

 Felipe Alckmin Carvalho;

 Márcia Helena Silva Melo

Rejeição e vitimização por pares em crianças com Deficiência Intelectual e Transtorno do Espectro Autista

Revista Educação Especial, Santa Maria, 2017.

Maria Luisa Bissoto;

Danilo Silva Filho

O fenômeno do bullying em relação aos alunos com necessidades educacionais especiais: um estudo a partir do cotidiano escolar???

Revista Cocar, Pará, 2017.

Morgana Christmann;

Sílvia Maria de Oliveira Pavão

A inerência do diagnóstico clínico na produção de (in)exclusão educacional

Revista Acta Scientiarum, Maringá, 2018.

Anna Karolina Santoro Borges; Letícia Lovato Dellazzana-Zanon

Bullying e inclusão no ensino fundamental I: ações de professores

Revista Educação Especial, Santa Maria, 2019.

Matheus do Nascimento Batista; Hellen Tsuruda Amaral; Josafá Moreira da Cunha

Autoconceito Físico e Vitimização entre Pares em Pessoas com Deficiência

Revista Brasileira de iniciação científica, São Paulo, 2019.

Paola Raffaella Arabbi HumpelI; Kelly Cristina Menezes BentoII; Celestino Manuel Madaba

Bullying vs. educação escolar inclusiva

 

Revista psicopedagogia, São Paulo, 2019.

Hellen Tsuruda Amaral;

Josafá Moreira da Cunha;

Iasmin Zanchi Boueri;

Jonathan Bruce Santo

Clima escolar e vitimização entre pares: percepções de estudantes com deficiência intelectual

Revista Educação Especial, Santa Maria, 2021.

Fonte: Dados da pesquisa bibliográfica (2021).

Quadro 4 – Publicações selecionadas na base de dados Catálogo de Teses e Dissertações CAPES

AUTORES

TÍTULO

LOCAL E ANO DE PUBLICAÇÃO

Elani Cristina Vieira Magalhães de Castro;

Orientadora: Sandra Francesca C. de Almeida

Concepções e práticas de professores do ensino fundamental sobre bullying contra alunos com deficiência intelectual: um estudo exploratório

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Católica de Brasília, 2012.

Mary Cristina Olimpio Pinheiro;

Orientadora: Aline Maira da Silva

Caracterização das relações interpessoais entre alunos com deficiência intelectual e seus pares em sala de aula regular

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Grande Dourados, 2017.

Rogério Alvez dos Santos;

Orientadora: Rita de Cássia Barbosa Paiva Magalhães

A voz dos estudantes com deficiência intelectual: rebatimentos dos tempos de escola na construção identitária

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2017.

Letícia Maria Capelari Tobias Venâncio;

Orientadora: Aline Maira da Silva

Alunos com deficiência intelectual em contexto de inclusão escolar: estratégias utilizadas pelos professores para promoção das relações interpessoais

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Grande Dourados, 2018.

Isaías Alves Rodrigues dos Anjos

Orientador: Prof. Dr. Josemar da Silva Martins

“3 entre 1000”: enxergando os contextos de jovens

estudantes com deficiência visual em Juazeiro-BA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), 2019.

Fonte: Dados da pesquisa bibliográfica (2021).

Os estudos selecionados para compor esta amostra foram analisados por meio da Análise de Conteúdo com o uso da técnica da análise temática, a qual “consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação e cuja presença, ou frequência de aparição, podem significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido.” (BARDIN, 2011, p. 135). Ou seja, com o uso da técnica da análise temática, analisamos o que vem sendo discutido entre as pesquisas envolvendo a violência do tipo bullying e os alunos com deficiência, e ainda, refletimos sobre as estratégias de enfrentamento e prevenção desse problema apresentadas pelos trabalhos selecionados.

Nesse sentido, as análises que seguem, foram organizadas a partir das seguintes categorias: i) Relações interpessoais com/entre alunos com deficiência; ii) Estratégias de enfrentamento e prevenção do bullying envolvendo alunos com deficiência. No quadro 5, apresentamos uma síntese destas categorias.

Quadro 5 – Síntese das categorias de análise

CATEGORIA

TRABALHOS SELECIONADOS PARA ANÁLISE

CONTRIBUIÇÕES DOS TRABALHOS SELECIONADOS

Relações interpessoais com/entre alunos com deficiência.

Aderaldo (2012); Castro (2012); Dalosto e Alencar (2013); Del Barrio e Meulen (2016); Emerich, Carvalho e Melo (2017); Pinheiro (2017); Santos (2017); Humpel, Bento e Madaba (2019); Venâncio (2018); Anjos (2019).

Os estudos apontam que os alunos com deficiência estão mais propensos a serem rejeitados na escola.

Estratégias de enfrentamento e prevenção do bullying envolvendo alunos com deficiência.

Bissoto e Silva Filho (2017); Christmann e Pavão (2018); Batista, Amaral e Cunha (2019); Borges, Dellazzana-Zanon (2019); Almagro, Gómez e Ruiz (2021); Amaral et al. (2021).

Entre as estratégias de prevenção e enfrentamento do bullying, envolvendo os alunos com deficiência, destaca-se o fortalecimento das relações entre pares, a formação de professores e o fortalecimento do vínculo família-escola.

Fonte: Dados da pesquisa bibliográfica (2021).

A seguir, apresentamos as análises fruto da revisão sistemática da literatura.

Relações interpessoais com/entre alunos com deficiência

Dar apelidos, xingar, excluir das atividades em grupo, agredir fisicamente, roubar e humilhar, são ações que caracterizam o bullying escolar. Embora ouçamos de uma grande parcela da população que estes são comportamentos típicos de crianças e adolescentes em idade escolar, esses atos não podem ser normalizados, naturalizados e tolerados no contexto educacional, tampouco serem considerados brincadeiras, devido aos impactos negativos que causam na vida de muitas crianças e adolescentes.

Quando tratamos de alunos com deficiência, as repercussões desses atos negativos são potencializadas considerando suas especificidades (físicas, cognitivas e comportamentais). Ao nos referirmos aos impactos desses comportamentos, estamos falando da evasão escolar, dos problemas emocionais e psíquicos, dos problemas de autoestima, das dificuldades de aprendizagem que podem se acentuar, entre outras situações de sofrimento, as quais podem levar a atos como homicídio e o suicídio (PINHEIRO, 2017).

Os estudos identificados e relacionados a esta categoria evidenciaram que os alunos com deficiência gostam da escola, com destaque para o recreio. Entretanto, é também na escola e, em particular, na sala de aula, onde mais se evidenciam as situações de bullying envolvendo os alunos com deficiência, pois, são excluídos pelos colegas das atividades grupais, na maioria do tempo são isolados e, ainda, enfrentam o problema da falta de atividades pedagógicas adaptadas às suas necessidades, o que contribui, com o aumento da exclusão e distanciamento da escola (SANTOS, 2017; PINHEIRO, 2017; VENÂNCIO, 2018; ANJOS, 2019).            

Localizamos apenas uma pesquisa que indicou a sala de aula como um espaço onde os alunos com deficiência possuem maior vínculo. O que diferencia essa pesquisa das demais é a sua amostra, pois, fizeram parte do estudo desenvolvido por Dalosto e Alencar (2013) alunos com altas habilidades/superdotação, ou seja, embora público da educação especial, não apresentam deficiência. Portanto, esse estudo difere dos demais pela característica específica dos participantes. Trata-se de uma especificidade que na maioria das vezes é vista como positiva, uma vez que esses alunos, em específico, destacam-se devido ao bom desempenho acadêmico, caso seja nesse aspecto as altas habilidades.

Por outro lado, o estudo de Dalosto e Alencar (2013) nos indica que fora do espaço da sala de aula 50% dos alunos com altas habilidades/superdotação afirmaram já terem sofrido manifestações físicas do bullying, por exemplo, já foram atingidos por objetos jogados de maneira proposital. Em uma análise enumerada pelos alunos, o bullying ocorre especialmente devido aos aspectos físicos desses alunos. Eles se referem aos chamados nerds de óculos, tímidos e com poucos amigos.

Se por um lado os alunos com altas habilidades/superdotação são vitimizados pelos seus pares, as pesquisas de Castro (2012) e Pinheiro (2017) evidenciaram o preconceito e a discriminação como motivadoras da prática de bullying contra os sujeitos com deficiência intelectual. Os alunos com deficiência intelectual são, em sua maioria, rejeitados, humilhados e zoados pelos colegas, tanto no que tange às atividades acadêmicas quanto às atividades recreativas. Ou seja, quando se trata de diferentes tipos de deficiência, os alunos com deficiência que afeta em menor grau a resolução de problemas, a regulação emocional e comportamental, estão mais propensos a serem aceitos pelo grupo em algumas atividades.

Em consonância com esses resultados, as pesquisas desenvolvidas por Del Barrio e Meulen (2016), Emerich, Carvalho e Melo (2017) apresentam tipos de deficiência e vitimização e entre os resultados localizamos que: no que diz respeito às deficiências físicas, os insultos são mais comuns; no que se refere às deficiências sensoriais o cyberbullying é o tipo de violência mais convencional; com relação às dificuldades de fala destaca-se a dificuldade de fazer amigos; quanto as deficiências comportamentais o assédio é o tipo de violência mais acentuado; contudo, os alunos com deficiência intelectual são os que sofrem maior risco de violência. Significa dizer que o bullying contra os alunos com deficiência ocorre dentro de relações desiguais de força e poder (ADERALDO, 2012).

Portanto, é fundamental que os profissionais da educação, que atendem diferentes alunos no contexto escolar, permaneçam atentos a manifestações como: agitação demasiada ou introspecção, as quais podem ser um indicativo de que algo não esteja bem; no recreio ficam isolados ou buscam proteção de um adulto; na sala de aula buscam pelo isolamento, não participam das aulas ou faltam com frequência; nas atividades grupais são sempre os últimos a serem escolhidos por um grupo ou, ainda, é o professor quem precisa indicar um grupo para que o aluno com deficiência seja inserido; em casos mais graves apresentam hematomas, objetos roubados e/ou danificados (HUMPEL, BENTO, MADABA, 2019).

A falta de confiança, isolamento, fragilidade e pouca compreensão acerca da violação dos seus direitos, favorece a escolha dos alunos com deficiência, (especialmente os alunos com deficiência intelectual) como alvos. Tais evidências sugerem que as relações interpessoais, envolvendo os alunos com deficiência, requerem investimentos políticos, sociais e pedagógicos.

Estratégias de enfrentamento e prevenção do bullying envolvendo alunos com deficiência

As pesquisas desta categoria evidenciam que identificar situações de bullying não é tarefa fácil, ainda mais quando envolvem alunos que não verbalizam, ou mesmo, não compreendem que estão sendo vítimas de agressão. Por essa razão, os espectadores que observam as agressões contra esse público é a principal rede que pode ser capaz de quebrar o silêncio e denunciar a existência dos problemas de convivência para uma figura de autoridade: professores e/ou responsáveis, os quais, são vistos “como a espinha dorsal das ações contra o bullying, sendo o elo entre o diálogo [...] com o agressor.” (ALMAGRO; GOMEZ; RUIZ, 2021, p. 224).

Por isso, se faz necessário pensar e construir estratégias de prevenção, mediação e manejo do bullying contra os alunos com deficiência, sendo a via da conscientização moral dos alunos espectadores e a capacitação dos profissionais da educação alternativas nesses casos (ALMAGRO; GOMEZ; RUIZ, 2021). Isso porque quando o aluno não tem capacidade de compreender o que está vivenciando, necessita de ajuda, tanto de um colega quanto de um adulto.

Outro estudo semelhante considera a fragilidade dos alunos com deficiência em relação aos demais colegas. Quanto às consequências mais drásticas, as quais implicam na necessidade de intervenção de um adulto, destaca-se que “os adolescentes por si só configuram-se elementos vulneráveis à violência e, quando somado à deficiência, o problema potencializa-se, necessitando de maiores investigações.” (CAVALCANTE, VIEIRA, SILVA, 2016, p. 85).

Por essa razão, as instituições sociais, em especial as educativas, tem como principal objetivo oferecer apoio social e emocional, visando a melhoria da qualidade de vida de seus usuários, buscando “reverter desvantagens cumulativas, ampliar capacidades e assegurar cuidado e proteção às crianças, adolescentes e jovens com deficiência.” (CAVALCANTE et al., 2009, p. 45). Nesse sentido, a relação família e escola é muito importante, uma vez que ambas as instituições são co-responsáveis em oferecer uma formação digna, saudável e respeitosa para os alunos com deficiência.

Em consonância com essas observações, Oliveira, Costa e Aquino (2012) afirmam que a maior barreira enfrentada pelos professores, diante das situações de violências envolvendo alunos com deficiência, é o despreparo para lidar com a prática de bullying. Muitas vezes, o processo de aceitação da turma ao receber um colega com algum tipo de deficiência é lento e resistente, exigindo do professor uma postura de sensibilização da turma e de estratégias inclusivas e colaborativas com esse novo aluno.

Outro fator limitador, apontado na pesquisa de Christmann e Pavão (2018), é a utilização, pelo professor, do diagnóstico clínico dos alunos com deficiência como fim em si mesmo. Identifica-se um apego aos dados relacionados à deficiência como um fator que generaliza e engessa as práticas pedagógicas. Ou seja, em muitas situações, os procedimentos adotados para os alunos com diferentes tipos de deficiência são os mesmos, excluídos a história pessoal, os níveis de compreensão e a singularidade e especificidades de cada caso.

Em linha com essas observações, Bissoto e Silva Filho (2017) consideram que o próprio diagnóstico clínico, inerente aos comportamentos e processos de aprendizagem dos alunos com deficiência, pode rotular os sujeitos como anormais. Isso reverbera em atitudes de valoração negativas desses alunos, pois, as diferenças podem se tornar elementos passíveis de segregação, desrespeito e isolamento. Por conta disso, as vivências interpessoais podem ficar comprometidas.

Nesse sentido, a questão que se coloca é a constituição de um diagnóstico que forneça subsídios para conduzir o processo de socialização e ensino-aprendizagem dos alunos com deficiência (CHRISTMANN; PAVÃO, 2018). E uma possibilidade é levar em consideração as indicações teórico-metodológicas da Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (TBDH) e seu Modelo Bioecológico, que considera os elementos Pessoa-Processo-Contexto-Tempo (PPCT). Ou seja, um diagnóstico que valorize as dimensões (cognitivas, emocionais, físicas e sociais) da pessoa com deficiência, do seu contexto (social, político, econômico, histórico), bem como, do tempo e processo de desenvolvimento.

Estratégias como essa favorecem interações colaborativas que contribuem com o processo de aceitação e respeito aos alunos com deficiência, pois, o foco “não é a deficiência, mas as potencialidades e as maneiras de incentivar e subsidiar o desenvolvimento da criança, poderia minimizar a insegurança dos pais e da escola diante da deficiência.” (CHRISTMANN; PAVÃO, 2018, p. 9). Agindo assim, a escola irá promover o desenvolvimento das habilidades sociais de todos os alunos, abrindo espaço para as interações entre pares e escuta sobre as necessidades de cada sujeito (BISSOTO; SILVA FILHO, 2017).

No estudo de Batista, Amaral e Cunha (2019) também localizamos a indicação da TBDH como uma estratégia teórico-metodológica capaz de sustentar práticas pedagógicas visando a prevenção e enfretamento do bullying e outras formas de violências e desrespeito contra alunos com deficiências. Essa abordagem, devido ao seu caráter contextualista e interacionista, valoriza as interconexões entre os alunos com deficiência e os diferentes contextos que estão inseridos, os quais impactam o processo de desenvolvimento humano e ainda podem favorecer os processos de inclusão.

Nessa mesma linha, Amaral et al. (2021) defendem o uso da TBDH, especialmente, no que tange o desenvolvimento de prática educativas que visam a promoção do clima escolar. Mas para isso, é preciso incluir no currículo das instituições educativas, práticas sistematizadas, isto é, promover práticas de suporte físico, educacional, comportamental, emocional e moral, não apenas direcionados aos alunos com deficiência, mas para toda comunidade escolar, durante todo o ano letivo.

Segundo Borges e Dellazzana-Zanon (2019) temas transversais ao currículo escolar, como é o caso do respeito às diferenças, está amparado nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Ética, ou seja, o desafio permanente quando tratamos da convivência com os alunos com deficiência é fazer cumprir a lei. Nesse caso, precisamos investir na formação inicial e continuada de professores e, no planejamento e implementação de programas de prevenção do bullying.

Em síntese, entre as possibilidades que podem auxiliar os profissionais da educação na criação de espaços relacionais saudáveis, dialógicos e cooperativos, destacamos: valorizar as potencialidades dos alunos com deficiência; promover um espírito colaborativo no contexto escolar, por meio de estratégias pedagógicas adaptadas e que envolvam jogos e demais brincadeiras; enfatizar a importância da cooperação entre todos os alunos em detrimento da competição; (re)pensar as práticas pedagógicas, visando valorizar e respeitar a singularidade de cada aluno; promover e fortalecer a formação dos professores para que suas ações sejam multiplicadoras de práticas saudáveis, dialógicas e respeitosas.

Considerações finais

A dificuldade de conviver com a diferença é um dos principais aspectos que fundamentam a prática de bullying contra os alunos com deficiência. Por esse motivo, torna-se essencial, que o contexto educacional proporcione um ambiente favorável para a promoção dos valores humanos. Uma das vias é proporcionar o desenvolvimento de um clima escolar positivo, ajudando os alunos com deficiência a lidar com os fatores de risco. Mas para isso, é preciso envolver toda comunidade escolar (alunos, profissionais da educação e as famílias), incluindo atividades lúdicas, o estudo e a discussão de temas transversais, a exemplo das violências envolvendo alunos com deficiência, nos diferentes componentes curriculares e no Projeto Político Pedagógico da Escola.

A complexidade do processo de inclusão de estudantes com deficiência torna-se explícita quando a instituição escolar e a sociedade se amparam na lógica da identidade e, nesse contexto, a diferença é percebida como estranhamento, como algo que incomoda e desestabiliza. A sociedade estabelece normas e considera normal os que se ajustam às normas estabelecidas. Nessa perspectiva, estudantes com deficiência são compreendidos como alguém a ser corrigido, normalizado e até mesmo inferiorizado.

O reconhecimento da diferença como um direito humano, o que não justifica ações de bullying em relação a alunos com deficiência, pode ser potencializado pela mediação pedagógica, especialmente relevante na educação inclusiva, na qual a singularidade dos sujeitos pode demandar um olhar mais solidário e interativo. Nesse sentido, compreender a deficiência como algo relacional, ou seja, presente não apenas no sujeito, mas também nos contextos sociais que discriminam, excluem, não propiciam acessibilidade, pode ser um caminho para que cada um se sinta comprometido com esse movimento. Esse comprometimento implica em compreender e agir de forma que o “outro”, o “diferente” não seja inferiorizado, e que o processo de inclusão evidencie os quanto todos devem desconstruir olhares padronizados e aprender com a diferença.

A exclusão e discriminação de pessoas com deficiência foi naturalizada historicamente. Contudo, na contemporaneidade, a deficiência é compreendida como uma condição agravada pelas barreiras sociais, que podem obstruir a participação plena e efetiva em igualdade de condições com os demais sujeitos. Propiciar essa reflexão nas famílias, escolas e sociedade, é uma forma de difundir uma atitude ética que pode se contrapor às práticas de bullying na escola.

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