http://dx.doi.org/10.5902/1984686X64156

Ensino de Química em Libras: Estado da Arte de sinais-termo químicos no Brasil

Chemistry Teaching in Libras: State of the Art of chemical thermo-signals in Brazil

Enseñanza de la química en Libras: Estado del Arte en señal-término químicas en Brasil

Maitê Thainara Barth                                                    

Mestranda na Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil

E-mail: maitebarth13@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5072-6561

Fernanda Luiza de Faria

Professora doutora da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil

E-mail: fernanda.faria@ufsc.br ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3326-9204

Fabiana Schmitt Corrêa

Professora mestra da Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil

E-mail: fabiana.s.c@ufsc.br ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3984-1937

Recebido em 08 de fevereiro de 2021

Aprovado em 18 de fevereiro de 2022

Publicado em 30 de março de 2022

RESUMO

Em um mundo em que as diferenças são marginalizadas, alunos surdos tendem a ser deixados de lado por conta da imposição oralista da comunicação. Contra essa corrente, esse artigo tem como objetivo a elaboração de um Estado da Arte de pesquisas que se debruçam no desenvolvimento e/ou compilação de sinais-termo para serem utilizados no ensino de Química. Ao investigar as plataformas de periódicos CAPES e BDTD utilizando as palavras-chave: Libras, Química, glossário, sinal e sinal-termo, identificou-se nove pesquisas, sendo a primeira publicada no ano de 2011. Todas as pesquisas são dissertações de mestrado vinculadas principalmente a áreas de concentração de educação/ensino de Ciências ou Química, revelando a preocupação desses profissionais no processo de ensino e aprendizagem de estudantes surdos. Analisando a organização dos glossários encontrados, percebe-se minúcias que dificultam o acesso e entendimento dos verbetes, bem como compreensão da sinalização disposta. Ao total, foram identificadas 286 palavras diferentes presentes nas pesquisas, 355 sinais-termo para representá-las e, apesar disso, diversas palavras importantes do contexto químico não tiveram sinalização encontrada. Desse modo, a produção de glossários de sinais-termo químicos em Libras apresenta-se como temática de estudo com diversas possibilidades a serem aprimoradas e exploradas.

Palavras-chave: Sinal-termo; Ensino de Química; Estado da Arte.

ABSTRACT

In a world where differences are marginalized, deaf students tend to be left out because of the oralism imposition of communication. Against this current, this article aims to develop a State of the Art of research that focuses on the development and/or compilation of thermo-signals used in teaching Chemistry. When investigating the platforms of CAPES and BDTD journals using the keywords: Libras, chemistry, glossary, signal and thermos-signals, nine researches were identified, the first being published in 2011. All research are master's thesis linked mainly to areas of concentration of education/teaching of Science or Chemistry, revealing the concern of these professionals in the teaching and learning process of deaf students. Analyzing the organization of the glossaries found, it is possible to notice minutiae that hinder the access and understanding of the entries, as well as the understanding of the available thermo-signals. In total, 286 different words present in the research were identified, 355 thermo-signals to represent them and, despite this, several important words from the chemical context had no thermo-signals found. In this way, the production of glossaries of chemical thermo-signals in Libras presents itself as a study theme with several possibilities to be improved and explored.

Keywords: Thermo-signals; Chemistry teaching; State of Art.

RESUMEN

En un mundo donde las diferencias están marginadas, algunas de ellas tienden a pasarse por alto debido a la imposición de la comunicación oral. En contra de esta corriente, este artículo tiene como objetivo desarrollar un Estado del Arte de la investigación que se centre en el desarrollo y/o recopilación de señal-término para ser utilizados en la enseñanza de la Química. Al investigar las plataformas de las revistas CAPES y BDTD utilizando las palabras clave: Libras, Química, glosario, señal y señal-término, se identificaron nueve investigaciones, siendo la primera publicada en 2011. Todas las investigaciones son tesis de maestría vinculadas principalmente a áreas de concentración de la enseñanza/enseñanza de las Ciencias o la Química, revelando la preocupación de estos profesionales en el proceso de enseñanza y aprendizaje de los estudiantes sordos. Analizando la organización de los glosarios encontrados, es posible notar minucias que dificultan el acceso y comprensión de las entradas, así como la comprensión de señal-término disponibles. En total, se identificaron 286 palabras diferentes presentes en la investigación, 355 señal-término para representarlos y, a pesar de esto, varias palabras importantes del contexto químico no encontraron señal-término. De esta manera, la producción de glosarios de termo-señales químicos en Libras se presenta como un tema de estudio con varias posibilidades para ser mejoradas y exploradas.

Palabras clave: Señal-término; Enseñanza de la química; Estado del arte.

Introdução

Em um mundo marcado por diferentes modos de ser e estar, percebemos pequenas amarras que ligam as pessoas, sendo uma delas a língua. Por meio dela as relações interpessoais são estabelecidas, os conhecimentos são difundidos e, ainda, é proporcionado o engrandecimento pessoal através da compreensão cultural explorando textos, músicas, cinema e demais possibilidades artísticas e políticas humanas. Através da língua nos expressamos, criamos, compreendemos o mundo em que vivemos e por conta de sua naturalidade, sua influência passa despercebida.

Além da Língua Portuguesa, temos no Brasil o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras) como forma de expressão e comunicação por meio de um sistema linguístico visual e espacial (BRASIL, 2002), que propicia aos surdos diferentes percepções e interações com o ambiente. Silva (2000) define identidade como um conjunto de características que diferem grupos e culturas e, se pensarmos no contexto brasileiro, temos identidades distintas entre a comunidade surda e a oralizada.

É por meio da Libras que o indivíduo surdo significa o mundo e, pensando no contexto escolar, é fundamental que o processo de aprendizagem contemple e respeite as particularidades linguísticas. Por conta da imposição oralista já perpetuada na sociedade, os indivíduos surdos são marginalizados e, por vezes, não consolidam o uso da Libras como forma de comunicação (DIZEU; CAPORALI, 2005). Compreender a influência da linguagem oral é um fator fundamental para assimilar as falácias que apontam que indivíduos surdos possuem limitações cognitivas, visto que mal possuem acesso básico à língua apropriada.

Em sala de aula, conforme Feltrini e Gauche (2007), Machado (2006), Junqueira e Lacerda (2019) e Lindino et al.(2009) destacam, a dominância de abordagens tradicionais oralistas, com apoio restrito de estratégias visuais e experimentais, dificultam a construção de conceitos científicos pelos estudantes surdos. Nesse sentido, o trabalho de Tradutores e Intérpretes de Língua de Sinais (TILS) torna-se fundamental para o caminhar inicial de condições mais justas no processo de ensino para surdos, contudo, é necessário a existência de sinalização científica em Libras para que a comunicação seja adequada. Desse modo, realizou-se uma pesquisa Estado da Arte a fim de mapear e analisar trabalhos que têm em sua discussão a produção de sinais-termo no âmbito do ensino de Química.

Fundamentação Teórica

Ao refletirmos sobre os processos mutativos que uma língua apresenta ao longo dos anos nos aproximamos da concepção de neologismo e, se caracterizado como semântico, temos que novos significados são atribuídos a palavras já existentes (ALVES, 1996). Esse movimento pode ser percebido na Libras onde diferentes sinalizações são utilizadas para uma mesma palavra dependendo do contexto a ser utilizado.

Podemos tomar como exemplo a palavra concentração que no contexto cotidiano possui sinônimo de atenção, contudo no contexto científico, mais especificamente na Química, temos como significado composição de misturas (LINDINO et al., 2009). Dessa maneira, distingue-se o conceito de sinal e sinal-termo na Libras, visto que o primeiro diz respeito ao vocabulário utilizado diariamente, já sinal-termo representa palavras que possuem significados específicos, fruto da linguagem de áreas especializadas (FAULSTICH, 2014). Assim, haverá o sinal para utilizar a palavra concentração no contexto cotidiano e o sinal-termo para o contexto científico.

Uma recorrente preocupação acerca dos sinais-termo tem sido evidenciada: seu processo de padronização. De acordo com Stadler (2019), esse movimento não é encontrado e pode ser justificado pela pouca produção de sinais-termo no Ensino Superior e pela pouca divulgação da sinalização já existente. Por vezes, sinais-termo são criados em sala de aula por TILS e estudantes surdos por meio de combinados, sem participação de uma equipe de profissionais que auxilie no desenvolvimento e sem o compartilhamento com a comunidade surda brasileira.

Investigando sobre a formação científica de TILS, Riegel (2016) apresenta discussões acerca de lacunas existentes na atuação desses profissionais em disciplinas relacionadas às ciências, visto que não existe enfoque em comunicação e sinais-termo científicos ao longo de seu percurso formativo. Dessa forma, não estão aptos para identificar nuances científicas que podem permear os sinais-termo, uma vez que não há padronização. Somado a isso, temos a problemática da carga de professor que é atribuída a TILS por conta do contato diário com o estudante surdo (LINDINO et al., 2009). Esses fatores, incluindo a falta do trabalho colaborativo entre professor de Química e TILS, acabam dificultando o processo a aprendizagem do estudante surdo no que tange ao ensino de química, visto que haverá carência de conceituação e o acesso a comunicação adequada - os sinais-termo do conteúdo químico.

Ainda, Stadler (2019), Sperb e Laguna (2010) destacam que a não padronização dos sinais-termo afeta a divulgação da sinalização já existente e interfere no desenvolvimento de sinais-termo para palavras que ainda não foram contempladas. É recorrente que estudantes e TILS mudem de escola, mas, por conta das diferentes sinalizações de cada instituição, o processo de adaptação é dificultado. Pensando ainda em avaliações de larga escala, diversos estudantes surdos podem ser prejudicados pela falta de sinais-termo dominados por TILS, visto que esses não possuem acesso a prova para estudo prévio da sinalização (JUNQUEIRA; LACERDA, 2018).

Com relação a organização de glossários bilíngues Libras - Língua Portuguesa Tuxi (2015) relata uma proposta para apresentação dos verbetes com a seguinte estrutura: entrada (palavra), definição e contexto, sendo esses três contemplados em ambas as línguas. Ou seja, o glossário deve possuir informações mínimas para compreensão do termo e seu significado, além de utilizar recursos acessíveis para que indivíduos surdos e ouvintes possam utilizar esse material, explorando a escrita, imagens, vídeos e novas tecnologias que vão sendo aprimoradas ao longo dos anos.

Por conta de tantas carências relacionadas aos sinais-termo científicos em Libras, um estudo que explore os diferentes sinais-termo existentes no campo no ensino de química pode contribuir para o iniciar de um movimento que se aprofunde nas questões relacionadas à comunicação para ensinar a Química para estudantes surdos.

Metodologia

Em busca de mapear pesquisas relacionadas à temática de desenvolvimento e/ou compilação de sinais-termo para o ensino de química em Libras ao longo dos anos no Brasil, foi adotada a metodologia de Estado da Arte. Vosgerau e Romanowski (2014) discorrem que pesquisas Estado da Arte tem como objetivos analisar, classificar, caracterizar a temática de estudo.

Esse tipo de levantamento de dados possibilita mapear e perceber fenômenos que são destacados e privilegiados ao longo das produções analisadas, bem como discutir novas possibilidades (FERREIRA, 2002). Dessa maneira, essa metodologia viabiliza compreender de que forma os pesquisadores vêm explorando determinada temática e, ao separar as análises em categorias, torna-se possível perceber quais as similaridades e limitações promovendo discussões antes não observadas.

Assim, buscou-se uma organização e análise rigorosa dos dados, investigando desde a caracterização de tempo e lugar das produções quanto a sinalização apresentada para a representação Química, a fim de construir um referencial que auxilie a construção de novas pesquisas.

Os bancos de dados investigados foram escolhidos por conta do fácil acesso a conteúdo gratuito e a grande extensão de trabalhos publicados, sendo eles: Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD). Para a busca, foram combinadas as palavras-chave: Libras, Química, glossário, sinal e sinal-termo. A palavra-chave sinal também foi utilizada pois o conceito de sinal-termo não é difundido entre todos os autores na literatura e, desse modo, produções que utilizassem do termo sinal ainda poderiam compor este trabalho.

Para a análise das pesquisas, categorias foram construídas a priori com base em temas, mediante a Análise de Conteúdo de Bardin (2011), sendo elas: Tipo de Trabalho, Área de Concentração do Título, Cidade/Estado, Ano de Publicação, Objetivo de Pesquisa, Glossários, Equipe Profissional e Diferentes Sinais-termo Químicos. Destaca-se que as definições das categorias foram pautadas nas discussões teóricas que permeiam os estudos envolvendo Estado da Arte, sendo recorrentes nesse tipo de metodologia de pesquisa.

A categoria de Tipo de Trabalho dispõe a qual título acadêmico determinada pesquisa pertence. Em complemento, a Área de Concentração do Título organiza a área de concentração do programa de pós-graduação a qual a pesquisa foi associada. Cidade/Estado e Ano de Publicação verificam em que locais e ano as pesquisas tiveram mais produção. Já a categoria Objetivo de Pesquisa busca compreender se a criação de um glossário químico em Libras foi o objetivo central do trabalho ou se esse processo foi apenas um passo para viabilizar o objetivo central.

Em Glossários, verificou como foram organizados e apresentados os glossários químicos em Libras nas pesquisas. Temos ainda a categoria Equipe Profissional que aponta para quais profissionais integram a equipe de desenvolvimento dos sinais-termo.

Por fim, a categoria Diferentes Sinais-termo Químicos traz discussões sobre quais palavras tiveram a sinalização representada, palavras que as pesquisas mais abrangeram e especificidades dos sinais-termo. Diante disso, essa categoria contemplou subcategorias criadas posteriormente, a fim de deixar mais claro os resultados emergidos, são elas: Química Geral, Materiais de Laboratório, Palavras e Verbos Relacionados a Química, Compostos Químicos, Química Orgânica, Radioatividade, Energia e Nome de Cientistas.

As principais percepções de cada categoria e subcategorias são apresentados a seguir nos resultados e discussão.

Resultados e Discussões

Em busca de referências para compreender como foram desenvolvidas as produções Estado da Arte relacionando o ensino de Química e o uso da Libras, foi encontrado diversas tendências. Guellis, Maestre e Frohlich (2019) investigam produções de 2014 a 2018 que apresentam estratégias metodológicas para ensinar Química aos estudantes surdos, já Santana e Sofiato (2018) investigam produções publicadas entre 2012 e 2017 que se dedicaram ao ensino de Ciências a estudantes surdos. Assim, não foram encontradas pesquisas Estado da Arte que se debruçaram em publicações envolvendo a criação e compilação de sinalização Química em Libras.

Ao total, foram encontradas nove pesquisas que desenvolveram glossários químicos em Libras, seja como produto principal do trabalho ou apenas como um passo para tornar o objetivo central da pesquisa acessível aos estudantes surdos. Ainda, foram consideradas apenas pesquisas sem restrições de acesso e compartilhamento do material e que possuíam o glossário no documento, desconsiderando gravações em CD ou sites. Os autores, os títulos e os tipos de pesquisas são apresentados no Quadro 1.

Quadro 1 – Pesquisas relacionadas à produção de glossários químicos em Libras

AUTORES

TÍTULO DA PESQUISA

TIPO DE PESQUISA

Esilene dos Santos Reis

O ensino de Química para alunos surdos: desafios e práticas dos professores e intérpretes no processo de ensino e aprendizagem de conceitos químicos traduzidos para Libras

Dissertação

Rosilene Silva Marinho

Neologismo em Libras: um estudo sobre a criação de termos na área de Química

 

Dissertação

Laerte Leonaldo Pereira

A aprendizagem do conteúdo de radioatividade por estudantes surdos usuários de Libras em um contexto de argumentação: um estudo de caso

Dissertação

Jomara Mendes Fernandes

Propostas alternativas para a educação inclusiva a surdos: enfoque nos conteúdos de balanceamento de equações químicas e estequiometria para o ensino médio

Dissertação

Vinícius da Silva Carvalho

Investigando os processos de emersão e modificação de sinais, durante a apropriação da sinalização científica por surdos ao abordar os saberes químicos matéria e energia

Dissertação

Joana Correia Saldanha

O ensino de química em Língua Brasileira de Sinais

Dissertação

Amanda Bobbio Pontara

Desenvolvimento de sinais em Libras para o ensino de Química Orgânica: um estudo de caso de uma escola de Linhares/ES

Dissertação

Edivaldo da

Silva Costa

O ensino de Química e a Língua Brasileira de Sinais – Sistema SignWritting (Libras-SW): monitoramento interventivo na produção de sinais científicos

Dissertação

Rayan Soares dos Santos

Quimlibras: Objeto Virtual de Aprendizagem (OVA) como instrumento de articulação entre a química e a Libras/ELiS

Dissertação

Fonte: Elaborado pelas autoras (2020).

Para compreender melhor as especificidades de cada pesquisa, temos no tópico a seguir um breve resumo de cada trabalho, apresentando quantas palavras e sinais-termo químicos foram contemplados.

Conhecendo as pesquisas

A pesquisa de Reis (2015), busca compreender como os professores e TILS trabalham para garantir a aprendizagem de alunos surdos, investigando duas escolas públicas do Ceará, sendo uma delas considerada escola bilíngue e outra inclusiva. Em entrevista com professores de Química e TILS, notou-se que a falta de simbologia específica da área de Química prejudica a aprendizagem do estudante, visto que TILS não possuem formação científica e a maioria dos professores entrevistados não sabem se comunicar em Libras. Ao fim de sua pesquisa, Reis (2015) ainda compila um material intitulado “Mini Dicionário Digital de Conceitos Químicos Adaptado para Libras” onde apresenta 52 palavras e 53 sinais-termo do contexto da Química, buscando aporte em sinalizações já apresentadas por Saldanha (2011), Souza e Silveira (2011) e sinalizações identificadas nas escolas pesquisadas.

Para compreender como ocorrem os neologismos no processo de criação de sinalização em Libras, Marinho (2016) acompanhou um grupo de profissionais que desenvolvem sinais-termo químicos. Assim, catalogou 30 palavras e 30 sinais-termo e descreveu os movimentos da sinalização em uma adaptação do modelo de quadro para descrição de neologismo de Faria-Nascimento (2009). Ainda, entrevistou os profissionais sobre aspectos gerais do processo de criação de sinalização em Libras, concluindo que a Língua Portuguesa influencia no processo de criação na língua de sinais.

Em duas pesquisas, o glossário elaborado, fundamental para a comunicação científica dos alunos surdos, torna-se apenas um dos passos para que o objetivo central seja investigado. Assim, temos como exemplo o trabalho de Pereira (2017), que busca analisar a importância da argumentação no processo de aprendizagem de estudantes surdos a respeito do conteúdo de radioatividade, que apresenta 22 palavras e seus sinais-termo químicos correspondentes. Já Fernandes (2016) propõe estratégias de ensino que relacionam o conteúdo de balanceamento de equações químicas e estequiometria e discute a aplicação dos materiais desenvolvidos em sala de aula, desenvolvendo 9 sinais-termo para palavras utilizadas nesse contexto.

Carvalho (2017) desenvolve um glossário com 54 palavras e 54 sinais-termo envolvendo matéria e energia trabalhados por meio de um recurso didático também construído na pesquisa. Para avaliar a aprendizagem e o uso dos sinais-termo químicos trabalhados em aula, utilizou um recurso de Roleplaying Game (RPG), onde observou a utilização natural dos conceitos e sinalização criada.

A pesquisa de Saldanha (2011) é uma das pioneiras no desenvolvimento de glossário químico em Libras e justifica sua pesquisa por conta da falta de materiais nessa área. Assim, junto de uma equipe de TILS e surdos, foi criado e compilado a sinalização de 20 palavras dos principais conceitos utilizados no ensino de Química.

Em conjunto de profissionais e alunos surdos de uma escola pública no Espírito Santo, Pontara (2017) compilou sinais-termo químicos e criou a sinalização para a área da Química Orgânica, contemplando 82 palavras e 99 sinais-termo. Além do glossário, foi desenvolvido diversos materiais para a utilização em sala de aula como: apostilas, avaliações, jogos e roteiros experimentais.

Pensando na acessibilidade textual de estudantes surdos, dois trabalhos reuniram sistemas de transcrição da Libras sem utilizar a Língua Portuguesa. Essa metodologia torna-se importante, visto que nem todos os alunos surdos são alfabetizados na Língua Portuguesa, já que se trata de uma linguagem oral (FELTRINI; GAUCHE, 2007). A pesquisa de Costa (2014) debruçou-se em reunir 130 sinais-termo químicos utilizando o sistema SignWritting (SW). Já o sistema utilizado por Santos (2018) é conhecido como ELiS (Sistema Brasileiro de Escrita de Sinais), formado por 95 visografemas1. O autor, junto de uma equipe, desenvolveu um Objeto Virtual de Aprendizagem (OVA) denominado Quimlibras, que busca articular o ensino de Química e o uso da Libras. Ainda, teve como produto de pesquisa um glossário químico composto por 20 palavras, tabela periódica utilizando ELiS e uma busca de diversos sinais-termo químicos na língua de sinais de outros países.

Um olhar para as categorias formadas

As categorias foram criadas para direcionar as análises em pontos que podem vir a ser importante para caracterizar as pesquisas com enfoque do Ensino de Química em Libras. Para compreender qual o nível acadêmico que as pesquisas ocorrem, foi criada a categoria de Tipo de Trabalho e foi possível notar que todas as pesquisas encontradas se tratavam de dissertações de mestrado. Em complemento, a categoria Área de Concentração do Título desejado, que tem suas informações dispostas na Figura 1, apresenta a qual área de concentração os programas de mestrado estão ligados nas pesquisas encontradas.

Figura 1 – Área de concentração das pesquisas de mestrado

 Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Destaca-se o predomínio de programas ligados ao Ensino/Educação de Ciências ou Química, o que revela a preocupação dos profissionais de Química pelo processo de ensino e aprendizagem de estudantes surdos. A pesquisa de Marinho (2016) é ligada à área de concentração em Letras pois seu principal objetivo foi compreender como são criados os neologismos na formação dos sinais-termo, participando de reuniões de um grupo que desenvolvia um glossário na área da Química.

No Quadro 2 são dispostas as informações da categoria Cidade/Estado que verificou onde as dissertações de mestrado foram defendidas e as regiões do país que fizeram produção de sinais-termo químicos em Libras.

A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), que tem como representantes Carvalho (2017) e Fernandes (2016), foi a única instituição apresentada com pesquisas vinculadas a programa de mestrado e doutorado em Química, com área de concentração em Educação em Química, que apresenta linha de pesquisa em Inclusão no Ensino de Ciências.

Quadro 2 – Distribuição das produções pelo Brasil

AUTORES

CIDADE / ESTADO

REGIÕES DO BRASIL

Esilene dos Santos Reis

Fortaleza / CE

Nordeste

Laerte Leonaldo Pereira

Caruaru / PB

Edivaldo da Silva Costa

São Cristóvão / SE

Vinícius da Silva Carvalho

Juiz de Fora / MG

Sudeste

Jomara Mendes Fernandes

Juiz de Fora / MG

Amanda Bobbio Pontara

São Mateus / ES

Joana Correia Saldanha

Duque de Caxias / RS

Sul

Rosilene Silva Marinho

Manaus / AM

Norte

Rayan Soares dos Santos

Anápolis / GO

Centro-Oeste

Fonte: Elaborado pelas autoras (2020).

Para dar mais significado a categoria a seguir, retomamos a Lei Nº 10.436, de 2002, que torna a Libras reconhecida como forma de expressão e comunicação (BRASIL, 2002) e, em 2005, o Decreto Nº 5.626 que torna obrigatório a disciplina de Libras nos cursos de formação de professores (BRASIL, 2005). Com isso, podemos compreender a categoria Ano de publicação, com dados expostos na Figura 2.

Figura 2 – Ano de publicação das pesquisas

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Destacamos a pesquisa de Saldanha (2011), que se trata da precursora no desenvolvimento de glossários químicos em Libras, publicada quase 10 anos após a implementação das leis que asseguram direitos linguísticos à comunidade surda.

A seguir, serão apresentadas o restante, das categorias construídas, em forma de tópicos para que todos os pormenores sejam explorados individualmente.

Objetivo de Pesquisa

A categoria Objetivo de Pesquisa foi criada para perceber se o objetivo principal das pesquisas era o desenvolvimento de um glossário químico em Libras ou se esse processo foi apenas um passo para atingir o objetivo central do trabalho, conforme apresenta a Figura 3.

Figura 3 – O objetivo principal da pesquisa era o glossário?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Os trabalhos que não tiveram como objetivo central o desenvolvimento de glossário foram: Reis (2015), que investigou a atuação do professor e TILS no processo de ensino-aprendizagem de alunos surdos; Marinho (2016), que buscou compreender como são formados os neologismos na Libras; Pereira (2017), que analisou a aprendizagem do conteúdo de radioatividade por meio da argumentação e Fernandes (2016), que desenvolveu e aplicou diversos materiais relacionados ao conteúdo de estequiometria e balanceamento de equações químicas. Assim, tivemos cinco trabalhos que se dedicaram como objetivo principal da pesquisa a elaboração de glossário.

Glossários

Para compreender como foram dispostas as palavras e a representação dos sinais-termo químicos nas pesquisas analisadas com base em Tuxi (2015), organizou-se a categoria Glossários.

As pesquisas de Saldanha (2011) e Pereira (2017) tiveram o design mais simples, apresentando a palavra e uma imagem do sinal-termo químico, conforme exemplo da Figura 4. Apesar disso, Saldanha (2011) intercala cada exemplo com a discussão feita para a criação da sinalização. Já Pereira (2017) apresenta sua sinalização em uma etapa prévia de sua pesquisa, visto que os sinais-termo foram desenvolvidos para que os estudantes surdos pudessem participar da prática principal de sua pesquisa.

Figura 4 Disposição mais simples encontrada nos glossários

Fonte: Pereira, 2017, p. 60.

Além de utilizar o design apresentado anteriormente, Reis (2015) incorporou uma imagem que representasse a palavra, trazendo um aporte visual para seu glossário.

Carvalho (2017) e Pontara (2017) trouxeram novos complementos utilizando o alfabeto manual em Libras, como apresentado na Figura 5. Pontara (2017) ainda apresenta uma breve conceitualização da palavra sinalizada.

Figura 5 Disposição de glossário utilizando o alfabeto manual em Libras

Fonte: Pontara, 2017, p. 195.

Carvalho (2017) ainda disponibiliza ao final de seu glossário QR codes e Links direcionado para o YouTube caso o indivíduo necessite visualizar a sinalização tridimensionalmente. Dessa mesma maneira, Fernandes (2016) disponibiliza o link correspondente ao vídeo da palavra na plataforma YouTube além da imagem do sinal-termo e uma breve explicação textual do conceito que a palavra possui no contexto químico.

A pesquisa de Marinho (2016) apresentou a discussão e o processo de desenvolvimento do sinal-termo e para representá-los, adequou o modelo de descrição de sinalização desenvolvido por Faria-Nascimento (2009), assim, contemplou diversos detalhes que dizem respeito à movimentação do sinal-termo.

Costa (2014) teve como objetivo passar os sinais-termo já existentes para o sistema SignWritting (SW), que se trata de uma forma de transcrição acessível no aspecto visual e espacial, buscando descrever a sinalização em um formato de duas dimensões, conforme exemplo na Figura 6.

Figura 6 Utilização do sistema SignWritting para descrição do sinal-termo

Fonte: Costa, 2014, p. 128.

Santos (2018) utiliza o sistema ELiS que é composto por diferentes visografemas para descrever a sinalização em um novo formato. Na Figura 7 podemos ver o uso do ELiS entre parênteses, onde cada signo e cor possuem significados específicos.

Figura 7 Utilização do sistema ELiS para descrição do sinal-termo

Fonte: Santos, 2018, p. 68.

Cada uma das pesquisas apresentou os sinais-termo de maneira particular, explorando diversos recursos que possam ser efetivos para a compreensão da sinalização, porém nem todos os glossários apresentados são de fácil compreensão para ambos os públicos-alvo: estudantes surdos e TILS. É possível notar que a maioria das pesquisas apresenta a entrada (palavra) e o sinal-termo, mas é necessário incluir a definição (significado) e contexto (exemplo de uso) em ambas as línguas (Libras e Língua Portuguesa) para que a seja acessível e utilizado em frases adequadas, sem equivocar seu sentido e mantendo o rigor científico ao longo da disseminação da sinalização

Para que o glossário e os sinais-termo sejam validados, Stadler (2019) discorre que a participação de toda a comunidade surda é essencial, visto que são esses que se apropriarão da sinalização desenvolvida. Dessa forma, esse dado será mais bem explorado na categoria a seguir.

Equipe de Profissionais

Para analisar os diferentes profissionais que participaram do processo de criação dos sinais-termo químicos, foi criada a categoria Equipe de Profissionais. De início, analisamos se as pesquisas foram responsáveis pela criação ou não dos sinais-termo apresentados, conforme a figura 8.

Figura 8 – O trabalho desenvolveu todos os sinais-termo?

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

A pesquisa de Reis (2015) não criou nenhum sinal-termo e seu processo de desenvolvimento do glossário se deu da compilação de produção de outros autores. As pesquisas que abrangem o item Em Partes equilibram entre a criação e a compilação de sinais-termo químicos já existentes. Os autores mais utilizados nas compilações são referenciais importantes no âmbito da Libras e Ensino de Química em Libras: Deit-Libras de Capovilla, Raphael e Mauricio (2009), Dicionário Enciclopédico Ilustrado Trilíngüe da Língua de Sinais Brasileira de Capovilla e Raphael (2001) e Terminologia Químicas de Souza e Silveira (2011).

As pesquisas que se debruçaram integralmente ou de modo pontual na criação de sinais-termo químicos apresentaram equipes de multiprofissionais para auxiliar no processo. No Quadro 3, está disposto quem são os sujeitos integrantes dessas equipes.

Quadro 3 Equipes de profissionais das pesquisas que criaram sinais-termo químicos

PROFISSIONAIS NOS GRUPOS DE DESENVOLVIMENTO DOS SINAIS-TERMO QUÍMICO NAS PESQUISAS

QUANTIDADE DE TRABALHOS

Professora Universitária de Química, Professora Universitária de Libras, Grupo de Pesquisa em Educação em Química Inclusiva a Surdos (GPEQIS) e professores de Libras da comunidade surda.

1

Professora Universidade de Libras, Grupo de Pesquisa em Educação em Química Inclusiva a Surdos (GPEQIS) e alunos surdos

1

Professor-pesquisador de Química bilíngue, alunos surdos e comunidade surda convidada para avaliar o produto final

1

Professor da sala de recursos, TILS, Instrutor de Libras e alunos surdos

1

Professora de Química, TILS e alunos surdos

1

TILS e alunos surdos

3

Fonte: Elaborado pelas autoras (2020).

Ao analisar como são criados e utilizados os sinais-termo em sala de aula, Souza e Silveira (2011) discorrem que, por vezes, são TILS que desenvolvem a sinalização com base em seu entendimento no conteúdo químico ou por meio de combinados entre TILS e alunos. Ou seja, o professor de Química não participa do processo de criação da sinalização, deixando lacunas no rigor científico do sinal-termo, visto que TILS não possuem formação científica durante seu período formativo. Stadler (2019) discute a importância da presença de multiprofissionais no desenvolvimento de sinais-termo químicos em Libras e ressalta a importância da comunidade surda na construção e validação da sinalização. Essa mesma tendência pode ser observada nas pesquisas analisadas, visto que a maioria buscou contemplar profissionais de diversos segmentos para contribuir nesse trabalho de parceria.

Dessa forma, será contemplado o rigor científico do conceito por trás da palavra por conta dos profissionais ligados à Química. Felipe (1997) destaca que a Libras é composta por diversas especificidades que devem ser considerados no desenvolvimento da sinalização, como os aspectos visuais, espaciais e gramaticais que podem ser facilitados pela presença de um profissional da Libras na equipe de desenvolvimento. E, sem esquecer da comunidade surda, em especial os estudantes, que auxiliam principalmente na validação dos sinais-termo, visto que são esses que se apropriarão da sinalização.

Diferentes sinais-termo químicos

A organização dessa categoria ocorreu de uma maneira singular, visto a quantidade de material produzido pelas pesquisas analisadas. Assim, todas as palavras e os sinais-termo apresentados foram ordenados em uma tabela e identificadas as similaridades. Palavras iguais foram unidas e quantificou-se as pesquisas que a abrangiam e a quantidade de sinais-termo diferentes para representá-la. Esses parâmetros podem ter quantidades distintas porque uma mesma palavra pode ter atribuído mais de um sinal-termo, visto que não existe a padronização de sinalização na Libras.

Dessa maneira, foram identificadas 286 palavras diferentes nas pesquisas investigadas e 355 sinais-termo para representá-las. Posteriormente, buscando compreender melhor as palavras que foram ou não sinalizadas e como são os sinais-termo químicos desenvolvidos, foram criadas subcategorias: ‘Química Geral’, ‘Materiais de Laboratório’, ‘Palavras/Verbos Relacionados a Química’, ‘Compostos Químicos’, ‘Química Orgânica’, ‘Radioatividade’, ‘Energia’ e ‘Nome de Cientistas’. A quantidade de palavras encontradas para cada subcategoria é apresentada na Figura 9.

Figura 9 – Quantidade de sinais-termo encontrados por categorias

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Na subcategoria ‘Química Geral’ são relacionados conceitos básicos da Química como ligações químicas, estrutura atômica, separação de misturas, interações intermoleculares etc. Foram encontradas 118 palavras e 180 sinais-termo diferentes e, como todas as pesquisas encontradas neste estudo se debruçam em aspectos gerais da Química, temos que a maioria das palavras que apareceram nos glossários pertencem a essa categoria, conforme Quadro 4.

Quadro 4 – Palavras que mais apareceram nas pesquisas analisadas

PALAVRA

QUANTIDADE DE PESQUISAS

PALAVRA

QUANTIDADE DE PESQUISAS

Átomo

7

Fenômeno Físico

4

Elétron

7

Fenômeno Químico

4

Nêutron

6

Mistura Homogênea

4

Próton

6

Mistura Heterogênea

4

Molécula

5

Gasoso

4

Substância

5

Água

4

Líquido

5

Núcleo

4

Matéria

5

Massa

4

Sólido

4

Elemento Químico

4

Ácido

4

 

 

Fonte: Elaborado pelas autoras (2020).

Tomamos como exemplo a palavra elemento químico que aparece nas pesquisas de Reis (2015), Pontara (2017), Pereira (2017), Carvalho (2017), porém, 3 sinais-termo diferentes foram identificados, ou seja, duas pesquisas (Reis (2015) e Pontara (2017)) utilizaram o mesmo exemplo de sinalização para essa palavra. Nas Figuras 10, 11 e 12 podemos notar que os sinais-termo possuem o modo de sinalizar bem diferente, o que pode confundir os TILS e alunos que busquem por essa sinalização.

Figura 10 – Exemplo 1 de sinal-termo encontrado para elemento químico

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Figura 11 – Exemplo 2 de sinal-termo encontrado para elemento químico

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Figura 12 – Exemplo 3 de sinal-termo encontrado para elemento químico

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Ainda na subcategoria Química Geral, percebemos a influência da Língua Portuguesa no desenvolvimento dos sinais-termo. Como exemplo na Figura 13, a palavra mol não teve sua desvinculação e o único exemplo de sinal-termo encontrado utilizou da datilologia.

Figura 13 – Exemplo do sinal-termo encontrado para mol

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Apesar de contemplar a maioria das palavras encontradas na análise, diversos termos importantes no estudo da Química foram deixados de lado, como: massa molar, concentração, solúvel, insolúvel, precipitação, camada de valência, moléculas diatômicas, triatômicas, gás ideal, difusão, forças intermoleculares (íon-dipolo, Van der Waals etc.), viscosidade, adesão, coesão, além dos diferentes modelos atômicos ao longo da história.

A subcategoria ‘Materiais de Laboratório’ abrangeu as principais vidrarias e equipamentos que compõem o laboratório de Química, sendo identificadas 26 palavras e 27 sinais-termo em Reis (2015), Marinho (2016) e Costa (2014). Podemos notar que os sinais-termo desenvolvidos foram bastante limitados nessa área, visto que para equipamentos de laboratório foram apresentados sinais-termo apenas para microscópio, telescópio e raio x. Os principais equipamentos como estufa, mufla e capela não foram citados. Ainda foram identificados sinais-termo para laboratório de Química, Física, Biologia e vidrarias básicas de laboratório que, em geral, tinham sua sinalização associada à forma do objeto, como apresentado na Figura 14 para bureta.

Figura 14 – Exemplo do sinal-termo encontrado para a bureta

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Já em relação à subcategoria ‘Palavras/Verbos Relacionados a Química’ trouxe palavras e verbos do vocabulário comum que também são utilizados no contexto químico, como exemplo: modificar, experiência, representação, pesquisar. Assim, encontrou-se 46 palavras e 47 sinais-termo e a pesquisa que trouxe mais contribuições para essa subcategoria foi Costa (2014).

A subcategoria ‘Compostos Químicos’ teve como enfoque substâncias químicas de laboratório e do cotidiano, abrangendo palavras como gás Hidrogênio, água, aço e vinagre. Nessa subcategoria foram encontradas 35 palavras e 37 sinais-termo e como principais contribuintes os autores Reis (2015), Pontara (2017), Costa (2014). Algumas similaridades podem ser encontradas nas sinalizações desta subcategoria onde evidenciam características visíveis dos compostos, como por exemplo, a Figura 15 referenciando o brilho do diamante.

Figura 15 – Exemplo do sinal-termo encontrado para diamante

 

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Destaca-se ainda a sinalização de compostos metálicos que abrangeu: aço, lítio metálico, cobre metálico, prata metálico, ouro metálico, alumínio metálico, ferro metálico. Com relação aos átomos apresentados na Tabela Periódica, temos apenas sinais-termo para Hidrogênio, Oxigênio, Nitrogênio e Alumínio, salientando a pouca produção nessa área.

A subcategoria ‘Química Orgânica’ apresentou 42 palavras e 44 sinais-termo e a pesquisa que se debruçou sobre essa área foi Pontara (2017). Aqui foram encontradas sinalizações para grupos funcionais, cadeias carbônicas e isomeria, o que abrange boa parte da base conceitual da Química Orgânica.

Na subcategoria ‘Radioatividade’, foram encontradas 9 palavras e 9 sinais-termo. Nesse sentido, destaca-se a pesquisa de Pereira (2017) que se dedicou exclusivamente à criação de sinais-termo dessa temática.

Para a composição da categoria ‘Energia’, encontramos 8 palavras e 9 sinais-termo, temos o trabalho de Carvalho (2017) que contribuiu com a maioria dos termos apresentados.

A categoria ‘Nome de Cientistas’ apresentou apenas 2 palavras e 2 sinais-termo, sendo esses: John Dalton e Albert Einstein. O autor que trouxe esses dois nomes foi Costa (2014) e os sinais-termo foram desenvolvidos com base em características marcantes de cada cientista: John Dalton referindo-se ao daltonismo que possuía e de Albert Einstein referindo-se a sua foto clássica com a língua de fora, como na Figura 16.

Figura 16 – Exemplo do sinal-termo encontrado para Albert Einstein

Fonte: Elaborada pelas autoras (2020).

Discute-se nesse ponto a necessidade de sinais-termo para os/as cientistas que se dedicaram a estudos da Química, visto que devem ser trabalhados em sala de aula para que aspectos históricos e filosóficos da ciência não sejam diminuídos por suposições acerca do imediatismo de descobertas e pesquisas científicas, conforme discutido por Kosminsky e Giordan (2002, p. 3):

[...] é no bojo de atividades realizadas em sala de aula que os estudantes podem se transformar em agentes sociais e históricos de seu tempo e podem, portanto, constituir significados apropriando-se de elementos da linguagem científica e de seus procedimentos, o que lhes dá a oportunidade ímpar de atribuir valor às formas de pensar e agir do cientista. Neste sentido, quando os elementos da cultura científica puderem ser “vivenciados” pelos estudantes, será possível avaliá-los e confrontá-los com outras formas de pensar e agir, típicas de outras culturas e que também estão presentes na sala de aula.

Para que o estudante surdo tenha possibilidades de compreender o mundo com base em conceitos científicos, torna-se fundamental o uso de estratégias em sala de aula que sejam favoráveis a esse aluno, além do acesso à expressão mais utilizada pelos indivíduos e assegurada por lei: a comunicação.

Conclusão

Com o propósito de investigar como as pesquisas se debruçam sobre o desenvolvimento e divulgação de sinais-termo químicos, a análise Estado da Arte provocou diversas reflexões acerca da comunicação no contexto da comunidade surda e o Ensino de Química.

A busca nos bancos de dados CAPES e BDTD apresentaram o enfoque ainda inicial nas pesquisas dessa área, apesar do número restrito de sinais-termo químicos divulgados e da promulgação de leis que garantam o uso da Libras em ambiente escolar. Dessa forma, apenas nove pesquisas contemplaram a investigação, sendo a primeira publicada em 2011.

Ao observar a que programas de mestrado as pesquisas estavam vinculadas, notou-se que os profissionais da área do ensino de ciências estão preocupados com o processo de ensino e aprendizado de estudantes surdos, porém, a problemática da padronização de sinais-termo afeta diretamente a produção e divulgação de materiais na área. Esse obstáculo também dialoga com a diferença entre a quantidade de palavras e sinais-termo encontrados para o contexto químico. As 286 palavras sinalizadas não abrangem toda a linguagem Química e/ou científica abordada nas escolas, sendo necessário que mais estudos se dediquem a essa área.

Palavras comumente utilizadas na Química como átomo e elétron apresentaram diversos sinais-termo distintos entre si dificultando a busca de sinalização pelos TILS e alunos surdos e, por conta da não formação científica, esses sujeitos não identificam pormenores que afetam o conceito trazido pelo sinal-termo (RIEGEL, 2016). Ainda, a maioria da sinalização descreve objetos e compostos do cotidiano acentuando suas características físicas ou visíveis, como forma, brilho e dureza. Elementos da Tabela Periódica e nome de cientistas foram pouco explorados apesar da necessidade da abordagem histórica e filosófica da ciência em sala de aula e apresentação dos diferentes elementos descobertos até os dias atuais.

Os glossários foram analisados com base em Tuxi (2015), que descreve a importância do bilinguismo na organização do material, bem como a composição de verbetes por: entrada (palavra), descrição e contexto. A maioria das pesquisas encontradas não contemplou esses três parâmetros além de disponibilizar as informações principalmente em Língua Portuguesa, dificultando a consulta de estudantes surdos. Diversos recursos foram apresentados e podem vir a ser aprimorados ao longo do tempo a partir da evolução de tecnologias, como o uso de imagens, acesso a vídeo por link ou QR code e, além de contemplar informações em texto escrito, utilizar recursos que possibilitem a leitura e escrita para a língua de sinais, como o sistema ELiS e SignWritting.

Nas pesquisas que houve o desenvolvimento de sinalização, em maioria, participaram diferentes profissionais ligados a diferentes áreas: professores de Química, professores de Química bilíngues, professores de Libras, TILS, comunidade e estudantes surdos. Como apresenta Stadler (2019), diversos profissionais auxiliam no planejamento, conceituação, gramaticalização e percepção visual e espacial que os sinais-termo químicos em Libras requerem. A participação da comunidade e alunos surdos é fundamental, visto que esses lutam pela ampliação da visibilidade de seus indivíduos e buscam formas de ensino que propiciem sua aprendizagem de acordo com sua interação com o mundo pela língua de sinais.

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Notas

1 Para que o sistema ELiS pudesse ser escrito a partir do teclado de computadores, um novo design de letra (visografemas) foi desenvolvido. Os visografemas são divididos em quatro grupos: configuração de dedos, orientação da palma, ponto de articulação e movimentos (BARROS, 2016).

 

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