Universidade Federal de Santa Maria

Ci. e Nat., Santa Maria v.42, Special Edition: Micrometeorologia, e27, 2020

DOI:10.5902/2179460X47025

ISSN 2179-460X

Received: 05/06/20  Accepted: 05/06/20  Published: 28/08/20

 

by-nc-sa 


Special Edition

 

Avaliação da esteira de turbulência gerada por um parque eólico teórico na região do Pampa Gaúcho utilizando o modelo WRF

 

Evaluation of the turbulence wake generated by a theoretical wind farm in the Pampa Gaucho region using the WRF model

 

Eduardo Stüker I

Franciano S. Puhales II

Luiz D. Medeiros III

Felipe D. Costa IV 

 

I Universidade Federal do Pampa, Alegrete, Brasil. E-mail: eduardostuker@gmail.com.

II Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Brasil. E-mail: franciano.puhales@ufsm.br.

III Universidade Federal do Pampa, Alegrete, Brasil. E-mail: luizmedeiros@unipampa.edu.br.

IV Universidade Federal do Pampa, Alegrete, Brasil. E-mail: fdenardin@unipampa.edu.br.

 

 

RESUMO

Este estudo tem por objetivo principal analisar a influência de um parque eólico sobre as variáveis que controlam o escoamento atmosférico na camada limite atmosférica. O período simulado foi todo o ano de 2008, utilizando uma simulação de controle com o modelo Weather Research and Forecasting (WRF) e o com parque eólico (o modelo WRF com o módulo Fitch, que parametriza a influência de aerogeradores no escoamento atmosférico), ambas utilizando a parametrização de camada limite Yonsei-University (YSU). A partir da simulação de controle é feita a validação do modelo, utilizando dados observacionais coletados em duas estações automáticas do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) nos municípios de Alegrete-RS e Quaraí-RS. O parque eólico idealizado nesse trabalho possui 100 aerogeradores de 3 MW de potência com 120 m de altura e com rotor medindo 125 m de diâmetro. Apesar da velocidade do vento responder de maneira adequada, a temperatura e a turbulência do escoamento próximo à superfície diminuem. A análise da dependência da turbulência próximo à superfície com a estabilidade vertical indica que a turbulência que está sendo gerada pelas turbinas não está chegando até a superfície. Esse problema pode estar relacionado com a parametrização de camada limite escolhida.

Palavras-chave: Energia eólica; Modelagem atmosférica; Parametrização de turbulência.

 

 

ABSTRACT

The main objective of this study is to analyze the influence of a wind farm on the variables that control the flow in the atmospheric boundary layer. The simulated period was the whole year of 2008, using a control simulation performed with the Weather Research and Forecasting model (WRF), and the wind farm model (the WRF model with the module Fitch, which parameters the influence of wind turbines on atmospheric flow). Both simulations using the Yonsei-University (YSU) boundary layer parameterization. From the control simulation is made the validation of the model, using observational data collected in two automatic stations of the National Institute of Meteorology (INMET) in the cities of Alegrete-RS and Quaraí-RS. The wind farm idealized in this work has 100 wind generators of 3 MW of power with 120 m in height and with rotor measuring 125 m in diameter. Although the wind speed responds adequately, the temperature and turbulence of near-surface runoff decrease. Analysis of the dependence of near-surface turbulence with vertical stability indicates that the turbulence being generated by the turbines is not reaching the surface. This problem may be related to the chosen boundary layer parameterization.

Keywords: Wind energy; Atmospheric modeling; Turbulence parameterization.

 

 

1 Introdução

A energia eólica é vista como uma das mais promissoras fontes de energia renováveis, caracterizada por uma tecnologia madura, principalmente nos países desenvolvidos, onde as fontes de energia renováveis são, atualmente, uma das principais áreas de investimentos e pesquisas. Além de trazer uma vantagem ambiental, na perspectiva econômica, a energia eólica também é promissora, pois tem apresentado custos competitivos quando comparados aos custos de fontes convencionais de energia elétrica. Ao produzir eletricidade a partir da energia dos ventos, os parques eólicos contribuem para a melhoria global da qualidade do ambiente. Entretanto, as restrições estão cada vez mais presentes na definição do layout de um parque eólico, incluindo a sua localização, e nos cuidados durante a sua construção e exploração, para que tenha uma máxima eficiência e uma mínima interferência no meio ambiente. (MONTEZANO, 2012; CARVALHO et al., 2013).

O rápido crescimento de parques eólicos em muitos países levou à questionamentos sobre seus impactos sobre o meio ambiente, principalmente sobre as mudanças na velocidade do vento, da temperatura e pressão atmosférica próximo da superfície. Ressalta-se que muitos parques eólicos têm sido desenvolvidos em terras agrícolas, podendo afetar o desenvolvimento das plantações. Ainda, cabe destacar que estudos observacionais diretos dos impactos dos parques são difíceis por causa da natureza tridimensional e multi-escalar da turbulência de cada turbina e do parque eólico como um todo. Além disso, é difícil projetar experimentos locais com controles apropriados para observar o efeito de parques eólicos. Dessa forma, modelagens em micro e mesoescala têm sido realizadas, utilizando experimentos em túnel de vento, simulações de grandes turbilhões (do inglês Large Eddy Simulations - LES) e modelos atmosféricos de previsão de tempo (CHAMORRO; PORTÉ-AGEL, 2009; CHAMORRO; PORTÉ-AGEL, 2010; CHAMORRO; PORTE-AGEL, 2011; FITCH; OLSON; LUNDQUIST, 2013; STEVENS; GAYME; MENEVEAU, 2014, entre outros).

A partir da versão 3.3 do modelo atmosférico Weather Research and Forecasting (WRF) esta disponível o módulo Fitch para a parametrização da influência de turbinas eólicas no fluxo atmosférico. Com esse módulo é possível modelar parques eólicos e obter maior compreensão da interação entre a camada limite atmosférica (CLA) e os aerogeradores, permitindo analisar o impacto da presença desses no escoamento local e a sua capacidade de afetar, por exemplo, a agricultura na região afetada pela esteira gerada pelas turbinas eólicas do parque (FITCH et al., 2012).

Nesse contexto, esse estudo tem por objetivo principal analisar a influência de um parque eólico sobre as variáveis que controlam o escoamento atmosférico na CLA, utilizando a parametrização proposta por Fitch et al. (2012) no modelo WRF. Para tanto, foram realizadas simulações para o ano de 2008, utilizando dados da reanálise meteorológica Climate Forecast System Reanalysis (CFSR). As divergências de fluxo turbulento foram parametrizados utilizando a parametrização de camada limite (PCL) Yonsei-University (YSU), a qual calcula as divergências de fluxo turbulento para a CLA e acima dela, sendo esse um dos motivos para que ela seja considerada uma das mais modernas parametrizações de camada limite. 

 

 

2 Metodologia

O WRF é um modelo atmosférico de mesoescala não hidrostático para previsão numérica de tempo e clima. Seus conceitos físicos são baseados na conservação de massa, explicitando as variações de energia, momentum e umidade do ar. É um modelo aberto e flexível, com código fonte disponibilizado livremente para o uso operacional e de pesquisa, sendo desenvolvido através da parceria de importantes institutos dos Estados Unidos da América (SKAMAROCK et al., 2008). O modelo esta dividido em quatro etapas: pré-processamento (WRF Pre-processing System, WPS), assimilação dos dados, processamento (WRF) e pós processamento com ferramentas de visualização. 

 

2.1 Parametrização de Camada Limite e Camada Superficial

A parametrização YSU (Yonsei-University) - é uma baseada no esquema proposto por Hong, Noh e Dudhia (2006), que utiliza um fechamento de turbulência de primeira ordem não local, aplicando a correção do contra-gradiente à temperatura e à umidade. A YSU também possui um esquema de turbulência para a atmosfera livre, sendo outra vantagem que este possui, em termos computacionais, é que os coeficientes de difusão são calculados em função das variáveis superficiais (HONG; PAN, 1996). As relações de similaridade utilizadas pela parametrização de camada limite são baseadas na proposta de Troen e Mahrt (1986), as quais removeram inconsistências na aplicação da teoria de similaridade para a estimativa do contra-gradiente. O WRF utiliza diferentes módulos para as parametrizações de camada limite superficial de acordo com a parametrização de camada limite utilizado. Como nesse trabalho o esquema de turbulência usado foi o YSU, a parametrização de CS que o WRF usa é o MM5. O MM5 calcula funções de estabilidade utilizadas para a estimativa dos coeficientes de difusão de momentum, energia na forma de calor e umidade. Essas funções de estabilidade são baseadas nas relações de similaridade adimensionais, estabelecidas principalmente por Paulson (1970), Dyer e Hicks (1970) e Webb (1970), enquanto que a escala de velocidade convectiva  é determinada de acordo com Beljaars (1995). Os regimes de estabilidade são estabelecidos de acordo com Zhang e Anthes (1982). É importante destacar que, os regimes de estabilidade propostos por Zhang e Anthes (1982) estabelecem que para o número de Richardson maior que 0,2, a CS é completamente estável e a turbulência deixa de existir.

 

2.2 Simulação controle

As condições iniciais e de contorno utilizadas nesse trabalho são dados de reanálise meteorológica da CFSR (SAHA et al., 2010), para o ano de 2008. O modelo foi executado a cada 36 horas, sendo desconsiderados os dados de saída das primeiras 12 horas, resultando em um dia para cada rodada de simulação. Os resultados para os domínios 1 e 2 são escritos a cada 6 horas e para o domínio 3 de hora em hora. Os dias 16 e 17 de Fevereiro e 18 e 19 de Outubro apresentaram inconsistência nos dados de entrada do CFSR e foram desconsiderados.

Com o objetivo de analisar a influência de um parque eólico no escoamento atmosférico na região do pampa gaúcho, mais especificamente no município de Alegrete, que tem o maior potencial eólico por área do estado do Rio Grande do Sul (BACK et al., 2014), o centro do domínio estudado é estabelecido no ponto geográfico (29o 57’ 55,8"S; 56o 08’ 05,4"O), próximo à fronteira entre os os municípios de Alegrete, Uruguaiana e Quaraí (Figura 1). A Figura 1 ilustra a disposição dos domínios, onde o domínio maior fornece condições de limite para seus domínios internos. As principais condições iniciais são fornecidas pelos dados do CFSR. O domínio 1, maior domínio, medindo aproximadamente 1584 x 1264 km com resolução 16 x 16 km, o domínio 2, intermediário, mede 464 x 368 km com resolução de 4 x 4 km e o domínio 1 medindo 136 x 104 km com resolução de 1 x 1 km.

 

 

Figura 1 – Localização do centro dos domínios do WRF e os domínios de grade simuladas no WRF

""

 

2.3 Parque Eólico

O modelo é executado duas vezes para todo o período de análise: uma sem o parque eólico e outra com o parque eólico. Assim, pode-se comparar os dados, tendo a diferença entre os dois conjuntos de dados como resultado da influência do parque eólico.

A parametrização para parques eólicos representa os efeitos das turbinas na atmosfera, através da parametrização da redução do momentum no volume de controle, sendo que parte da energia mecânica extraída do escoamento é transformada em energia elétrica e parte é transformada em energia para turbulência, representada pela ECT. Em outras palavras, assume-se que a ECT tem como fonte, além do cisalhamento do vento (onde ela é adicionada ao escoamento pelas parametrizações da parametrização de camada limite do modelo), o fluxo de ar através turbinas (FITCH et al., 2012).

Fitch et al. (2012) parametrizaram o potência extraída (P) em cada aerogerador e a ECT por ele gerado conforme as equações (1) e (2), respectivamente.

(1)

(2)

Nas equações (1) e (2), os índices ,  e  são os pontos de grade do modelo e nível vertical do modelo, respectivamente.  é o número de aerogeradores por unidade de área,  é a seção transversal do rotor de cada aerogerador.

Um parque eólico hipotético é adicionado ao WRF, no centro dos domínios, para que se possa analisar a sua influência no escoamento atmosférico. Esse parque possui 100 turbinas eólicas de 3 MW do modelo AW 125/3000 da Acciona Windpower. Com um rotor de 125 m de diâmetro, que varre uma área de mais de 12300 m2, essa turbina oferece maior desempenho para locais com ventos mais fracos, e possui torre de concreto de 120 m de altura e classe IEC III. Os 100 aerogeradores do parque estão distribuídos de forma simétrica formando uma quadrado de 10 x 10 aerogeradores a uma distância de 5 vezes o diâmetro do rotor (distância máxima recomendada por Fitch (2016),ou seja, 625 metros um do outro, ocupando, portanto, uma área aproximada de 32 km2.

 

2.4 Análise estatística

Para testar a hipótese de duas médias de conjuntos de dados diferentes ( e ) serem iguais, pode-se utilizar o teste t de Student, onde tem-se que: para duas amostras independentes o teste t de student pode ser realizado supondo que as amostras são provenientes de duas populações distintas, por exemplo X e Y, que possuem variâncias iguais, ou seja, . Isso significa que as variâncias amostrais e  são estimativas de um mesmo valor . Por conseguinte, pode-se combinar  e  a fim de obter um bom estimador para  que é dado pela equação 3.

(3)

Então, utiliza-se para o teste a variável aleatória , dado pela equação (4).

(4)

Esse teste tem distribuição de t de Student com nX + nY - 2 graus de liberdade (MELLO; PETERNELLI, 2013). 

 

 

3 Resultados e Discussão

A análise vertical da influência da presença dos aerogeradores na temperatura do escoamento é realizada através da análise dos perfis de temperatura. A Figura 2 mostra a diferença entre as Temperaturas, a 2 m, para as configurações WRF (simulação de controle) e WRF-WF (wind farm, ou com parque eólico) (Figura 2, painel superior esquerdo). É possível observar claramente que a diferença de Temperatura se dá principalmente na direção da esteira formada pelos aerogeradores. Além disso, a diferença Temperatura é mais significativa no ponto 3, que está localizado à montante do parque eólico. Os perfis verticais de Temperatura no ponto 1 (Figura 2, painel superior direito), não apresentam diferença significativa, pois esse está localizado a montante do parque. Assim como, os perfil verticais no ponto 2 (Figura 2, painel inferior esquerdo) não apresentam diferença significativa. Por outro lado, no ponto 3 (Figura 2, painel inferior direito), dentro da esteira, a diferença entre os perfis verticais de temperatura chega a aproximadamente são mais significativas, principalmente na altura do rotor (120 m de altura), chegando até uma diferença de no máximo 0,25 K. 

A Figura 3 mostra a influência da presença do parque eólico sobre o campo de temperatura, na região do menor domínio da grade do WRF. O teste t de Student (ou simplesmente teste t) foi realizado utilizando como valor de referência a temperatura média anual das simulações sem o parque eólico, e a outra amostra é a temperatura média anual das simulações com o parque eólico. É possível observar que as amostras possuem diferença em regiões distintas, entretanto, as maiores diferenças estão localizadas na região do parque e a jusante, na direção média da esteira resultante da presença das turbinas eólicas. É importante destacar, que o teste t não indica se a amostra foi subestimada ou superestimada, apenas se a diferença entre as amostras é significativa. Como discutido anteriormente, nas temperaturas à 2 m as diferenças foram pequenas, e geralmente nos casos com o parque eólico a temperatura foi menor que sem parque eólico.

 

Figura 2 – Diferença para a Temperatura, a 2 m, entre as configurações WRF e WRF-WF (linha vermelha, nas Figuras 4b-4d) e WRFWF (linha azul, nas Figuras 4b-4d) (Figura 4a), às 22h do dia 09 de novembro de 2008. Perfis verticais de temperatura no ponto 1 da Figura 4a (Figura 4b). Perfis verticais de temperatura no ponto 2 indicado na Figura 4ª (Figura 4c). Perfis verticais de temperatura no ponto 3 indicado na Figura 4a (Figura 4d)

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Figura 3 – Teste t-Student para a temperatura média a 2 m na região do menor domínio definido na grade do WRF

 

A análise vertical da influência da presença dos aerogeradores no escoamento é feita através da análise dos perfis de velocidade do vento médio. A Figura 4 mostra a diferença entre as velocidade do vento médio, a 10 m, para as configurações WRF e WRF-WF (Figura 4, painel superior esquerdo). É possível observar claramente que a diferença de velocidade se dá principalmente na direção da esteira formada pelos aerogeradores. Além disso, a diferença de velocidade é mais significativa no ponto 2, que está localizado exatamente no centro do parque eólico. Os perfis verticais de velocidade do vento no ponto 1 (Figura 4, painel superior direito), não apresentam diferença significativa, pois esse está localizado a montante do parque. Por outro lado, os perfil verticais no ponto 2 (Figura 4, painel inferior esquerdo) apresentam diferença significativa, principalmente na altura do rotor (120 m de altura), chegando até uma diferença de aproximadamente 4 m s-1. Da mesma forma, no ponto 3 (Figura 4, painel inferior direito), ainda dentro da esteira, a diferença entre os perfis verticais da velocidade do vento ainda são bastante significativas, entretanto, a região do perfil de maior diferença, se aproxima da superfície. Esse resultado está de acordo com os resultado experimentais encontrados por Chamorro e Porté-Agel (2009).

 

Figura 4 – Diferença para a velocidade do vento médio, a 10 m, entre as configurações WRF (linha vermelha, nas Figuras 4b-4d) e WRFWF (linha azul, nas Figuras 4b-4d) (Figura 4a), às 22h do dia 09 de novembro de 2008. Perfis verticais do vento médio no ponto 1 da Figura 4a (Figura 4b). Perfis verticais do vento médio no ponto 2 indicado na Figura 4ª (Figura 4c). Perfis verticais do vento médio no ponto 3 indicado na Figura 4a (Figura 4d)

 

Outra parte sensível da parametrização de turbinas eólicas no WRF é a reprodução do escoamento turbulento na presença do parque eólico.Pois, a energia mecânica do escoamento é convertida parte em energia eólica, parte em energia na forma de calor e turbulência na forma de energia cinética turbulenta. Conforme discutido previamente, a ECT é uma variável diagnóstica da PCL YSU, assim a variável de análise nesse trabalho é . Todavia, apesar do modelo apresentar diferenças na velocidade de fricção média para as configurações WRF e WRF-WF, não há acréscimo em  quando as turbinas eólicas são adicionadas nas simulações. Cabe lembrar que na PCL YSU,  é uma variável da camada superficial, ou seja, não é calculada em todos os níveis verticais. Ademais, os coeficientes de difusão dependem da escala de velocidade vertical utilizada para calcular os coeficientes de difusão e é calculada em termos de . Porém, assim como ocorre com a temperatura a 2 m, a velocidade de fricção diminui com a presença do parque eólico (Figura 5). A Figura 5 mostra a diferença de velocidade de fricção entre as configurações WRF e WRF-WF para o mês de outubro de 2008. É possível observar que na região do parque eólico  da configuração WRF chega a ser até 0,004 m s-1 maior que da configuração WRF-WF. A estrutura vertical da turbulência no escoamento na esteira é caracterizada pela presença de intensa mistura no topo e acima das pás das turbinas a jusante do escoamento, na esteira, e por mistura menos intensa próximo à superfície (CHAMORRO; PORTÉ-AGEL, 2009; CHAMORRO; PORTÉ-AGEL, 2010; CHAMORRO; PORTE-AGEL, 2011).

 

Figura 5 – Diferença entre as velocidades de fricção médias calculadas pela configuração WRF e WRF-WF para o mês de setembro de 2008. Os pontos púrpuras representam a localização das turbinas eólicas

 

 

A influência dos aerogeradores na estrutura vertical da turbulência do escoamento pode ser verificada a partir da análise da turbulência do escoamento em função da estabilidade do escoamento. Para determinar a influência da turbulência gerada pelas turbinas eólicas sobre o escoamento na camada superficial é definido um número de Richardson entre as variáveis do escoamento na camada superficial e as variáveis do escoamento na altura do rotor dos aerogeradores (RiCS-rot):

,

(5)

onde  é a temperatura média entre 2 m e a altura do rotor das turbinas (120 m),  é a diferença de temperatura entre 120 e 2 m,  e  são as diferenças nas componentes do ventos entre os níveis de 120 e 10 m.

A Figura 6 mostra a comparação da dependência de com RiCS-rot entre as configurações WRF e WRF-WF, para os casos com estratificação estável . Os casos com estratificação estável foram escolhidos para esta análise devido a CLE possuir menor intensidade turbulenta, o que faz com que as perturbações causadas pelas turbinas eólicas, como o acréscimo de turbulência, sejam mais perceptíveis no escoamento (CHAMORRO; PORTÉ-AGEL, 2010). É possível observar na Figura 6 que com a configuração WRF-WF, para os mesmo valores de RiCS-rot, a intensidade local de é superior, indicando que devido a presença do parque eólico, há um aumento da turbulência no escoamento. O aumento na turbulência é mais sensível nos casos nos quais a estratificação térmica entre os dois níveis de análise é maior (casos mais estáveis), principalmente para RiCS-rot > 1,0. Nesse caso não há um número de Richardson crítico, todavia, o aumento da estabilidade atmosférica, conseqüente redução da turbulência, leva a diminuição da mistura e por esse motivo as maiores diferenças nos valores de entre as duas configurações ocorrem para os casos mais estáveis.

 

 

4 Conclusão

A partir das simulações com a configuração com o parque eólico, foi possível observar que houve um ligeiro decréscimo (menos de 1 oC, na temperatura a 2 m. Esse resultado está em desacordo com os principais resultados da literatura, pois as parametrizações para turbinas eólicas consideram que a energia mecânica do escoamento é transformada em energia na forma de calor, o que causaria um acréscimo na temperatura, e também em turbulência, na forma de energia cinética turbulenta (ECT). Uma das possíveis causas para esse comportamento é que a parametrização de turbulência usada no modelo, a PCL YSU, é uma PCL com fechamento de primeira ordem não local, onde as difusividades turbulentas de momentum e energia na forma de calor são estimadas em termos das variáveis da camada superficial. Já nas componentes de vento e na velocidade média do vento o efeito da presença das turbinas eólicas é diretamente sentido, através da diminuição do momentum por unidade de massa, que é possível observar tanto na velocidade do vento à 10 m e também no perfil vertical da velocidade do vento. Por outro lado, assim como acontece com a temperatura, a turbulência próximo à superfície diminui ao invés de aumentar. Uma análise da estrutura de estabilidade vertical do escoamento, através de um parâmetro de estabilidade definido entre a camada superficial e a o nível dos rotores, indica que a turbulência que está sendo gerada pelo movimento das turbinas eólicas não está sendo transportada até os níveis mais baixos da atmosfera. Entretanto, uma análise detalhada da estrutura vertical do escoamento é necessária para confirmar essa hipótese.

 

Figura 6 – Comparação da dependência de com RiCS-rot , para os casos com estratificação estável. A linha vermelha representa a configuração WRF e a linha azul representa a configuração WRF-WF

 

Os problemas elencados anteriormente podem estar relacionados com a PCL utilizado nas simulações, que utiliza um esquema de fechamento não local. Ademais, devido ao fechamento utilizado na PCL não há uma equação prognóstica para ECT. Cabe ressaltar que essas hipóteses necessitam de confirmação, e essa confirmação é objetivo de trabalhos futuros. 

 

 

Agradecimentos

Os autores agradecem às agências CAPES (Coordenação de Pessoal de Nível Superior), ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) (FDC Auxílio no 313022/2018-6) e à Universidade Federal do Pampa pelo suporte financeiro. As simulações numéricas foram realizadas no cluster computacional adquirido com recursos do Edital 02/2014 - PqG (Edital Pesquisador Gaúcho) da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e no Servidor computacional adquirido com recursos do Edital Universal-CNPq 01/2016 (Processo no 426409/2016/7). 

 

 

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