Universidade Federal de Santa Maria

Ci. e Nat., Santa Maria v.42, Special Edition: Micrometeorologia, e12, 2020

DOI:10.5902/2179460X45354

ISSN 2179-460X

Received: 02/06/20  Accepted: 02/06/20  Published: 28/08/20

 

by-nc-sa 


Special Edition

 

Picos na velocidade do vento e sua relação com aumentos em fluxos de escalares na atmosfera tropical noturna: Estudo de caso

 

Wind speed peaks and their relationship with the increase of scalar flows in the tropical night atmosphere: a case study

 

Francisco Otávio Miranda I

Leonardo Deane de Abreu Sá II *

Celso von Randow III

Fernando M. Ramos IV

Antônio O. Manzi V

 

I   Universidade do Estado do Amazonas, Parintins, Brasil. E-mail: ffarias@uea.edu.br.

II Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, Brasil. E-mail: leodeane@uol.com.br.

III Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, Brasil. E-mail: cvrandow@gmail.com.

IV Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, Brasil. E-mail: fernando.ramos@inpe.br.

V Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, Brasil. E-mail: aomanzi@gmail.com.

* Retired

 

 

RESUMO

Foram investigados alguns aspectos físicos relacionados à ocorrência de picos intensos na velocidade do vento indutores de instabilidade (aqui abreviados por picos de vento PV) noturnos na atmosfera tropical acima de floresta. Tais fenômenos causam fortes variações nos sinais turbulentos, ocorrência de regimes de turbulência forte, além de aumentos significativos nos fluxos de escalares. Foi verificado que esses eventos que ocorrem durante regimes de turbulência forte podem ser precedidos e sucedidos por oscilações de baixa frequência nas variáveis ambientais e que o aumento significativo nos fluxos de escalares verificado está associado à existência de um valor máximo relativo da velocidade do vento (). São aplicados procedimentos aos dados aqui utilizados de modo a possibilitar a construção de diagramas em espaços de fase a fim de melhor analisar o aumento na amplitude das oscilações de baixa frequência observado antes da eclosão do PV, bem como a diminuição da amplitude verificada após o PV. São utilizados os diagramas de fase supramencionados para a obtenção de ciclos repulsores e atratores, os quais respectivamente antecedem e sucedem ao PV. Também são utilizadas imagens de radar meteorológico para melhor investigar o fenômeno atmosférico estudado.

Palavras-chave: Picos de vento; Camada Limite Noturna; Fluxos de Escalares; Floresta Amazônica; Espaço de Fase.

 

 

ABSTRACT

Some physical aspects related to the occurrence of nocturnal instability-inducing intense peaks in wind speed (here abbreviated by PV.) in the tropical atmosphere above forest were investigated. Such phenomena cause strong variations in turbulent signals, occurrence of strong turbulence regimes, and significant increases in scalar fluxes. Was found that these events that occur during strong turbulence regimes can be preceded and succeeded by low frequency oscillations in environmental variables and that the significant increase in scalar fluxes observed is associated with the existence of a relative maximum wind speed value (). Procedures are applied to the data used here to enable the construction of phase space diagrams in order to better analyze the increase in amplitude of low frequency oscillations observed before PV outbreak, as well as the decrease in amplitude after PV. The aforementioned phase diagrams are used to obtain repulsor and attractor limit cycles, which respectively precede and succeed the peaks in wind speed. Weather radar images are also used to further investigate the studied atmospheric phenomenon.

Keywords: Wind peaks; Nocturnal boundary layer; Scalar flows; Amazonian forest; phase space.

 

 

1 Introdução

A ocorrência de fenômenos intensos com grandes máximos na velocidade do vento têm sido observado em vários sítios experimentais da floresta amazônica, inclusive durante a noite, os quais podem estar associados à presença de downdrafts oriundos de forte atividade convectiva na atmosfera tropical (GARSTANG E FITZJARRALD, 1999; BETTS et al., 2009; FARIAS, 2017; OLIVEIRA, 2020). O Aprofundamento do conhecimento de tais fenômenos, além de ser importante para a obtenção de representações mais realistas dos fenômenos da atmosfera tropical acima de floresta, também poderá oferecer informações valiosas para uma melhor estimativa de fluxos turbulentos, processos químicos envolvidos na interação floresta-atmosfera, além de contribuir para melhorar a previsão de fenômenos tais como correntes de densidade, além de outros que ocorrem na camada limite noturna amazônica (FARIAS, 2017). Estudam-se aqui as características de um PV e sua assinatura nas séries temporais medidas a 48,15 metros de altura, na torre K34 construída na floresta amazônica. Busca-se verificar os efeitos da ocorrência destes PV’s nas concentrações e nos fluxos destes escalares à superfície. A análise efetivou-se a partir da observação da ocorrência de fenômenos que culminaram com regimes de fortes rajadas de vento (FARIAS 2017; OLIVEIRA, 2020) simultaneamente a variações súbitas das demais variáveis turbulentas. Parte-se de um caso particular, começando-se com a aplicação de ajustes simples, mas que posteriormente servirão para fornecer “insight” para a escolha de parâmetros mais adequados a serem incorporados a uma equação diferencial que represente de modo aproximado o fenômeno em estudo (tendo como base as sugestões de MARTENS, 1984). Os fenômenos estudados manifestam-se à superfície com fortes quedas de temperatura e aumento na razão de mistura de Ozônio (BETTS et al., 2002a; GERKEN et al., 2016). Sugere-se que os máximos e mínimos da velocidade do vento horizontal observados correspondam aos máximos e mínimos de uma oscilação sob efeitos de amortecimento subcrítico e que tal amortecimento surge quando há aumento da distância entre a fonte geradora que modula as oscilações com maiores amplitudes da velocidade do vento e a posição em que as medidas são registradas. De acordo com Farias (2017) é possível verificar oscilações de baixa frequência que surgem nas séries temporais em decorrência tanto da aproximação quanto do afastamento de uma nuvem convectiva suficientemente profunda. A seguir é apresentada uma hipótese de como processos convectivos intensos causariam oscilações de baixa frequência em séries temporais turbulentas.

 

1.1 Hipótese: Oscilações de baixa frequência causadas por processos convectivos intensos

Aqui será apresentada uma hipótese de como convecção profunda poderia induzir oscilações de baixa frequência em séries temporais medidas à superfície e posteriormente associar tais oscilações às perturbações observadas nas séries temporais e nos fluxos de escalares.

A ideia é que, se uma nuvem suficientemente profunda se aproximar de um ponto de medição, esta irá produzir oscilações de baixa frequência nas séries temporais cuja amplitude (a princípio) aumenta no decurso do tempo. Posteriormente à sua passagem, no entanto, essa amplitude das oscilações de baixa frequência irá diminuir gradativamente à medida que a nuvem se afasta do ponto de medição. Vale lembrar que estas oscilações serão mais bem observadas se o eixo de deslocamento da nuvem se aproximar de forma frontal da torre (FARIAS, 2017). Em casos que a nuvem se aproximar de modo oblíquo tais oscilações se tornam menos visíveis nas séries temporais. Um esquema adaptado de Farias (2017) é mostrado na Figura 1. Neste esquema, o ponto “P” marcado por uma seta indica aquilo que o autor classificou como “bacia convectiva”, na qual os efeitos induzidos por uma nuvem fortemente convectiva atingiriam seu máximo valor. O autor, no entanto, representou naquele momento os efeitos associados a apenas uma das bordas dessa bacia, ou seja, borda que representava os efeitos que precediam a eclosão (entenda-se por eclosão o ponto em que ocorre a maior variabilidade das variáveis turbulentas) de um fenômeno intenso que causa um grande aumento na velocidade do vento, que era objetivo daquele estudo.

 

Figura 1 – Esquema hipotético para ilustrar como uma perturbação de baixa frequência poderia ser induzida pela presença de uma nuvem profunda na atmosfera tropical (Adaptado de FARIAS, 2017). O ponto P indica a região de maior variabilidade e que corresponde àquilo que Farias (2017) chamou de “bacia convectiva”

Fonte: Adaptado de Farias (2017).

Se esta ideia esquematizada na Figura 1 estiver razoavelmente correta, então deverá ser possível analisar este comportamento oscilatório induzido pela presença da nuvem a partir da construção de diagramas em espaço de fase. Tais diagramas podem ser construídos a partir das derivadas temporais dos sinais que consistem nas séries temporais em que as oscilações de baixa frequência são identificadas. A Figura 2 mostra os diagramas construídos a partir da oscilação representadas na Figura 1.

 

Figura 2 – Diagramas constituído a partir da oscilação de baixa frequência mostrada na Figura 1. (a) Ciclo completo em que no eixo horizontal consta o sinal  bruto e no eixo vertical a sua derivada temporal. (b) oscilação que representa a parte de um ciclo repulsor que se inicia na origem até o ponto “P” e (c) o ciclo atrator que se inicia em “P” até o final da série

Mapa colorido com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

 

O ponto “P” da Figura 1 representa o ponto de máxima perturbação e consequentemente o ponto de maior alteração em relação a um padrão atmosférico moderado. Pode-se então considerar esta mudança de padrão muito acima dos modos normais de variabilidade como um “Fenômeno muito intenso que leva ao surgimento de picos na velocidade do vento” induzido por essa nuvem convectiva. Ou seja, em alguns casos a máxima perturbação causada por uma nuvem convectiva suficientemente profunda coincide com a definição de Fenômeno extremo (de acordo com a definição de FARIAS, 2017). No entanto, deve-se fazer algumas considerações sobre a validade desta hipótese. A primeira é que o deslocamento da nuvem deve ser frontal à localização da torre, pois se não for assim os efeitos não serão detectados de modo claro pelo sensor na torre. Além disso, a nuvem deve ser suficientemente profunda para induzir tais efeitos. Estes efeitos de convecção profunda na região que causam perturbações características em grandezas meteorológicas medidas à superfície já foram descritos anteriormente (GARTANG et al., 1998; GARSTANG E FITZJARRALD, 1999; ZIPSER et al., 2006; COSTANTINO E HEINRICH, 2014). Agora se buscam casos em que estes efeitos possam ser detectados nas séries temporais e são estes resultados que serão apresentados a seguir.

 

 

2 Material e Métodos

Foram utilizadas séries temporais das componentes horizontais (u, v) e vertical (w) da velocidade do vento, temperatura, concentração de CO2 e concentração de vapor d’água amostrada a 10 Hz com anemômetros 3D (model CSAT3, Campbell Scientific Inc., Logan, UT) à altura de 48.15 metros acima do solo. As medidas foram realizadas na Torre experimental micrometeorológica K34, localizada na reserva do Cuieiras (60 km a norte/noroeste da cidade de Manaus-AM), como parte do projeto internacional GoAmazon 2014/15 (FUENTES et al., 2016). Para o estudo de caso foi selecionado o dia 13 de abril de 2014. Este foi o dia em que as oscilações de baixa frequência as quais se pretendia analisar foram identificadas de forma mais clara. As análises de cobertura de nuvens, foram realizadas  utilizando-se as imagens de radar do projeto CHUVA: disponíveis em com frequência de 12 minutos. Os tratamentos dos dados (para remoção de dados espúrios) foram realizados de acordo com Vickers e Mahrt (1997). Para o tratamento de suavização das séries temporais, utilizou-se um procedimento de filtragem passa-baixa que resultou em uma diminuição de 10% na amplitude de oscilação da série temporal. Para casos como os aqui analisados que envolvem a construção de diagramas em espaço de fase, a suavização da série temporal constitui-se em procedimento fundamental na identificação de estruturas de interesse. Informações especificas sobre graus de suavização apropriadas, recomenda-se consultar o trabalho de Izadi (2012).

Os fluxos cinemáticos turbulentos foram calculados a partir da equação (1):

(1)

em que  é a componente vertical da velocidade do vento e  é a variável à qual o fluxo deve ser calculado.

Utilizou-se também uma escala característica de velocidade turbulenta proposta por Sun et al. (2012) e que consta na equação (2), para estudar a sua  variabilidade em relação a aumentos expressivos do vento horizontal médio.

(2)

na qual  representa o desvio padrão de cada uma nas componentes da direção do vento.

 

 

3 Resultados e Discussão

Aqui são mostradas séries temporais turbulentas que apresentam comportamento típico de oscilações de baixa frequência em intervalos de tempo que antecedem e sucedem a ocorrência de um PV, conforme esquematizado na Figura 1. Posteriormente serão apresentados os comportamentos dos fluxos de escalares e diagrama (simplificado) de turbulência com o objetivo de mostrar que o valor máximo dessas grandezas coincide com a eclosão do PV.

 

3.1 Diagramas de fase e oscilações de baixa frequência

A Figura 3 mostra uma série temporal da componente horizontal da velocidade do vento em que um máximo pode ser verificado em torno das 0330 UTC. Esse ponto de máxima velocidade do vento ocorreu simultaneamente a variações bruscas em todas as variáveis turbulentas cujas medidas estavam disponíveis. Isso corrobora a ideia de que as variações bruscas em todos os sinais compartilham a mesma gênese (BETTS et al., 2002a).

 

Figura 3 – Série temporal da componente horizontal do vento. A linha na cor “vermelha” mostra as oscilações de baixa frequência que podem estar relacionadas à presença de convecção profunda

Uma imagem contendo vermelho, luz, pendurado, grupo

Descrição gerada automaticamente

 

Outro fato igualmente interessante mostrado na Figura 4 é que para este caso particular, as oscilações de baixa frequência (destacadas na cor “vermelha” na Figura 3) possibilitaram visualizar as oscilações propostas na Figura 2. Ou seja, foi possível reproduzir sob alguns aspectos as oscilações previstas na hipótese anteriormente apresentada.

 

Figura 4 – Diagramas constituído a partir da oscilação de baixa frequência da velocidade do vento. (a) Ciclo completo construído a partir das oscilações de baixa frequência apresentada na Figura 3. Nesta o eixo horizontal representa a série temporal suavizada da velocidade do vento (US) e no eixo vertical a sua respectiva derivada temporal. (b) ciclo repulsor que antecede o PV e (c) o ciclo atrator representando o comportamento das oscilações de baixa frequência pós-evento

 

É possível notar mudanças de direção do vento e uma mudança total de direção pós-evento. Essa mudança de direção observada no pós-evento pode estar indicando que o ponto de medição não está mais localizado na frente da nuvem, mas sim em sua retaguarda. Também na Figura 5 é possível observar uma mudança na intensidade do vento com breves modificações em sua direção, que culmina com uma mudança mais intensa por volta das 0200 UTC. Uma pequena redução tanto nas concentrações de CO2 quanto na de vapor d’agua podem estar relacionados a essa mudança de intensidade do vento, que antecede uma mudança mais brusca de intensidade e direção do vento que ocorre por volta das 0300 UTC. É possível ainda observar uma relação entre as oscilações de baixa frequência da Figura 3 e as danças de direção do vento da Figura 5.

 

Figura 5 – Resultante temporal para a velocidade e direção do vento na altura de 48.15m. As setas pretas representam a intensidade e direção do vento e foram obtidas como resultante da combinação das componentes horizontais u e v da velocidade do vento. O círculo pontilhado marca o que deve ser a primeira variação significativa de direção e intensidade da velocidade do vento

Tela de celular com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

 

3.2 Variabilidade dos fluxos

Agora deve-se verificar se de fato ocorrem variações significativas nos fluxos de escalares à superfície ocasionados pelos efeitos acima descritos. A partir das Figuras 6 (a - f) é possível verificar os efeitos da ocorrência de um PV tanto nas concentrações quanto nos fluxos de escalares.

 

Figura 6 – Séries temporais e fluxos de escalares correspondentes ao período de eclosão do PV na atmosfera tropical. (a) Concentração de CO2, (b) concentração de vapor d’agua, (c) fluxo cinemático de CO2, (d) fluxo cinemático de vapor d’agua, (e) fluxo cinemático de temperatura e (f) fluxo cinemático momento

Tela de celular com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

 

Para a de concentração de CO2 (Figura 6a), os valores máximos ocorrem ligeiramente antes da eclosão do PV, em torno das 0300 UTC. É possível ainda verificar que o aumento tanto na concentração quanto nos fluxos de CO2 (Figuras 6 a, c) se iniciam quando as oscilações de baixa frequência (linhas “vermelhas” da Figura 3) começam a se intensificar por volta das 0245 UTC. No entanto, quando a velocidade do vento se intensifica ocorre uma redução na concentração de CO2, como previsto por Mafra et al. (2016).

No caso do vapor d’água pode-se verificar uma diminuição significativa na sua concentração ligeiramente antes do PV (Figura 6b), o que causa uma grande variabilidade nos fluxos deste escalar (Figura 6d). Reduções na concentração de vapor d’água como aquela mostrada na Figura 6b pode acontecer devido a intrusões do tipo “top down”, de ar mais seco e mais frio, oriundas do topo da Camada Limite Atmosférica Tropical (GARSTANG et al., 1998; GARSTANG E FITZJARRALD, 1999; BETTS et al., 2002; WISSMEIER E GOLER, 2009; COSTANTINO E HEINRICH, 2014; WANG et al., 2016). Estas intrusões de ar frio e seco oriundos do topo da Camada Limite Atmosférica podem estar relacionados à convecção profunda e para este caso, dois fatos importantes corroboram essa possibilidade. O primeiro é que simultaneamente ao máximo de velocidade do vento da Figura 3 e à máxima perturbação verificadas nas séries temporais das Figuras 6, ocorreram também queda significativa na temperatura (queda de ≈ 4 K) e aumento na razão de mistura de O3 (de 5 para 20 ppb). Estudos de transporte vertical de O3 da média troposfera para a superfície, durante a passagem de sistemas altamente convectivos acima de floresta, foram desenvolvidos por diversos autores (BETTS et al., 2002a; GERKEN et al., 2015 e WANG et al., 2016). Além disso, as imagens de radar da Figura 7 confirmam a presença de nuvens na região do sítio experimental durante a ocorrência do PV.

 

Figura 7 – Imagens de radar nas quais se verifica a cobertura de nuvens acima do sítio experimental em três horários distintos (entre as 0248 às 0400 UTC). O ponto na cor “preta” mostra a localização aproximada da torre experimental e a seta na cor “vermelha” mostra o sentido de deslocamento das nuvens

  

Fonte: https://www.youtube.com/user/projetochuva.

As variações para o fluxo cinemático de vapor d’agua (Figura 6d) e de temperatura (Figura 6e) não ficam concentradas apenas ao máximo PV, sendo possível verificar que os valores destas começam a se intensificar aproximadamente às 0245 UTC e alcançam uma condição “menos perturbada” por volta das 0500 UTC. Os fluxos cinemáticos de CO2 (Figura 6c) e fluxo cinemático vertical de momento (Figura 6f) também demonstram maior variabilidade nesse intervalo de tempo (0245 a 0500 UTC). Coincidentemente, este é o intervalo de tempo entre o início e o final das oscilações de baixa frequência representada pelos ciclos apresentados na Figura 4.

 

3.3 Diagramas de fase

É valido também destacar que a construção de diagramas em espaço de fase relacionando tanto os fluxos quando à concentração de CO2 da Figura 6 mostram tendências interessantes associadas à ocorrência do PV e seus efeitos tanto na concentração quanto no fluxo destes escalares.

Na Figura 8(a, b) verifica-se (como esperado) que o aumento na velocidade do vento horizontal aumenta a escala VTKE. Além disso, os valores máximos verificados neste diagrama das Figuras 7 (a, b) correspondem ao momento de máximo PV. No que se refere aos fluxos cinemáticos de CO2 e de vapor d’agua, verifica-se um aumento da velocidade do vento eleva os fluxos, mas que o valor máximo destes não corresponde ao máximo da velocidade do vento. É possível verificar que (em média) o fluxo cinemático máximo ocorre para uma velocidade média do vento de  e depois reduz significativamente para maiores velocidades. Isso corrobora os resultados de Mafra et al. (2016) segundo os quais em um primeiro momento o aumento na velocidade do vento age para aumentar os fluxos, mas que passado um tempo suficiente esse aumento na velocidade vai agir no sentido de reduzir a concentração de escalares e consequentemente os fluxos a ele associado.

Uma observação importante a ser feita é que a Figura 8a é uma representação simplificada (apenas para uma noite de dados) do diagrama de regimes de turbulência proposto por Sun et al. (2012). Nela verifica-se que os pontos com os maiores valores na relação  x  correspondem exatamente ao máximo PV. Este fato foi amplamente discutido por Farias (2017) em seu estudo sobre a ocorrência de fenômenos extremos na atmosfera tropical acima de floresta. Naquele estudo, Farias (2017) pode concluir que os regimes de turbulência “muito fortes” que ocorrem na atmosfera tropical estão (quase) sempre associados à ocorrência de Fenômenos extremos, fato este que é corroborado neste breve estudo.

 

Figura 8 – Diagramas de fase relacionando a velocidade média do vento horizontal com as médias das grandezas: (a) , (b) concentração de CO2, (c) módulo do fluxo cinemático de CO2, (d) módulo do fluxo cinemático de vapor d’agua

Mapa colorido com texto preto sobre fundo branco

Descrição gerada automaticamente

 

 

4 Conclusão

Aqui foi possível localizar oscilações de baixa frequência que exibem padrões de expansão e amortecimento das flutuações turbulentas em séries temporais de grandezas meteorológicas, as quais podem estar associadas à presença de forte atividade convectiva. Trata-se de uma proposta simples baseada em um estudo de caso, mas que poderá ser expandida para outros estudos associados (ou não) a picos de velocidade do vento.

No presente estudo conseguiu-se a partir de uma filtragem adequada reproduzir alguns aspectos da situação hipotética da Figura 1.

Verificou-se que tanto o aumento nas concentrações de escalares quanto os fluxos cinemáticos a estes associados podem surgir devido à ocorrência de um PV.

Outra consideração importante é a de que este estudo de caso corrobora os resultados de Mafra et al. (2016) quanto aos aumentos nos fluxos turbulentos e os resultados de Farias (2017) segundo o qual os regimes de turbulência “muito forte” na atmosfera tropical são (quase) sempre induzidos por Fenômenos muito intensos que elevam significativamente a velocidade do vento em um curto intervalo de tempo.

 

 

Agradecimentos

Os autores são gratos pelo suporte financeiro aos estudos de campo ao U. S. Department of Energy (grant SC0011075), à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM), e FAPESP (Processo número 2013/50529-8) e ao projeto The Large scale Biosphere-Atmosphere Experiment in Amazonia (LBA). Francisco Otávio Miranda é grato à Universidade do Estado do Amazonas pelo suporte financeiro [CSPROJ – 43097 e 53997].

 

 

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