Universidade Federal de Santa Maria

Ci. e Nat., Santa Maria, v. 43, Ed. Esp. UFV, e15, 2021

DOI: 10.5902/2179460X67002

ISSN 2179460X

Recebido: 21/07/2021 • Aceito: 29/09/2021 • Publicado: 05/11/2021

Uma avaliação de estratégias para determinar a temperatura na entrada de trocadores de calor solo-ar

An evaluation of strategies to determine the inlet temperatures of Earth-air heat exchangers

Eduardo de Sá Bueno NóbregaI

Ana Maria Bersch DominguesII

Juliana CostiIII

Ruth da Silva BrumIV

Jairo Valões de Alencar RamalhoV

Régis Sperotto QuadrosVI

I Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-0069-2687 – eduardosbnobrega@gmail.com

II Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-2218-5491 – berschdomingues@hotmail.com

III Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0001-6220-2343 – ju.costi@gmail.com

IV Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-4657-1354 – ruthdasilvabrum@gmail.com

V Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-4995-285X – jairo.ramalho@ufpel.edu.br

IV Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-9720-8013 – regis.quadros@ufpel.edu.br

RESUMO

Os trocadores de calor solo-ar (TCSA) representam uma opção promissora para reduzir a carga de aquecimento/resfriamento das edificações. Basicamente, os TCSA utilizam dutos subterrâneos, onde o ar circula a fim de trocar calor com o solo. O modelo analítico proposto neste trabalho considera, dentre outros fatores, a temperatura do ar na entrada do duto, no solo e na saída do sistema. Assim, este trabalho abordará duas formas de determinar a temperatura do ar de entrada, uma fornecida pela Estação Agro climatológica de Pelotas e a outra baseada nos dados de reanálise ERA-Interim. As comparações têm demonstrado eficiência entre ambas as maneiras.

Palavras-chave: Modelagem analítica; Temperatura do ar; Trocadores de calor solo-ar

ABSTRACT

Earth-air heat exchangers (EAHE) represent a promising option to reduce heating or cooling loads of buildings. Basically, EAHE use underground ducts, where the air circulates to exchange heat with the ground. The analytical model proposed here considers, among other factors, the air temperature in the soil and also at the inlet and outlet of the ducts. In particular, this paper addresses two ways to determine the inlet air temperature, one provided by the Agrometeorological Station of Pelotas and the other based on ERA-Interim reanalysis data. Comparisons have shown efficiency between both ways.

Keywords: Analytical modeling; Air temperature; Earth-air heat exchangers

1 INTRODUÇÃO

Com sua dimensão continental, o Brasil possui uma considerável heterogeneidade climática, variados tipos de solo e topografia (Assad e Pinto, 2004). Na região sul do país, tendências climáticas observadas em escala global e regional foram constatadas, num período de sessenta anos (1950-2009). Notou-se, assim, que a temperatura mínima média anual do Rio Grande do Sul sofreu um incremento linear de 0.16ºC por década, no período de 1913 a 2003 (Berlato e Cordeiro, 2017).

Levando em conta a redução de geração de insumos poluentes ao meio ambiente e as constantes mudanças climáticas que estão ocorrendo, os trocadores de calor solo-ar (TCSA) surgem como um sistema capaz de aproveitar a energia térmica presente na camada superficial do solo (subsolo) o qual pode absorver (em períodos quentes) ou ceder (em períodos frios) calor para o ar que escoa no interior dos dutos enterrados a uma certa profundidade (Rodrigues et al., 2015), conforme a figura 1. Mais detalhes sobre o estado da arte dos TCSA podem ser obtidas em Agrawal et al. (2019). Além disso, Domingues et al. (2021) apresenta um balanço da pesquisa brasileira recente em TCSA.

Sendo assim, este trabalho apresentará um modelo analítico para TCSA, validado através dos dados experimentais obtidos por Vaz (2011) na cidade de Viamão, no Rio Grande do Sul. A curva que descreve a temperatura do ar na entrada do TCSA, instalado em uma região do município de Pelotas/RS, foi determinada através dos dados obtidos na Estação Agro climatológica de Pelotas (EAP) (Santos, 2016) e será comparada com a curva gerada através dos dados de reanálise ERA-Interim (Copernicus e Copernicus, 2020).

Figura 1 – Desenho esquemático de um sistema de TCSA

Fonte: Autores (2020)

2 MODELAGEM ANALÍTICA DO TCSA

A eficiência do trocador de calor é expressa através da equação 1, com a função exponencial representando a parte adimensional da equação denominada Número de Unidades de Transferência (De Paepe e Janssens, 2003). Assim:

𝜀 = 1 − 𝑒−𝑁𝑈𝑇

(1)

onde o NUT é calculado através da seguinte fórmula:

(2)

com sendo o coeficiente de transferência de calor convectivo;𝐴𝑠, a área superficial do tubo; 𝑚̇𝑝, a vazão mássica do ar e 𝑐𝑝𝑎𝑟 o calor específico do ar. Uma outra maneira de determinar a eficiência do TCSA é através da equação 3:

(3)

em que 𝑇𝑎𝑟𝑠 e 𝑇𝑎𝑟𝑒 são, respectivamente, as temperaturas do ar na saída e na entrada do duto e 𝑇𝑠𝑜𝑙𝑜 é a temperatura do solo junto às paredes do tubo. Isolando a incógnita 𝑇𝑎𝑟𝑠, é possível obter um modelo analítico para a temperatura do ar na saída do trocador de calor solo-ar:

(4)

onde 𝜀 é calculado através da equação 1. Para validar o modelo analítico, este foi comparado com os dados experimentais de Vaz (2011) e com os resultados do modelo numérico introduzido por Brum et al. (2013), sendo publicado em Nóbrega et al. (2020).

3 APLICAÇÃO DO TCSA EM PELOTAS (PRIMEIRO ESTUDO DE CASO)

Foi realizado um estudo de caso na região chamada de Trevo do Contorno, cujas coordenadas geográficas são 31º45’24.8’’S e 52º26’2.6’’O. A empresa FUNDACON – Fundações e Construções, localizada no município de Pelotas, forneceu os dados da sondagem de simples reconhecimento, ou sondagem SPT (Teste Padrão de Penetração) deste local, realizada no ano de 2016. Com isto, verificou-se que até 4.30m de profundidade, o solo é do tipo argilo-arenoso vermelho. Considerou-se os casos limites de um solo homogêneo composto exclusivamente de argila ou areia, cujas propriedades termo físicas são apresentadas na tabela 1:

Tabela 1 – Propriedades termo-físicas do solo

Massa específica (𝝆)

Difusividade (𝒌)

Calor específico (𝒄𝒑)

Argila

1600 𝑘𝑔/𝑚3

0,25 𝑊/𝑚𝐾

890 𝐽/𝑘𝑔𝐾

Areia

1600 𝑘𝑔/𝑚3

0,30 𝑊/𝑚𝐾

800 𝐽/𝑘𝑔𝐾

Fonte: Autores (2020)

Além disso, através do boletim agro climatológico fornecido pela EAP, foram obtidos os dados da temperatura do ar nesta cidade. Utilizando a metodologia apresentada em Brum et al. (2015), estes dados foram ajustados por mínimos quadrados, sendo descritos pela função:

(5)

A figura 2 mostra as temperaturas médias diárias do ar em Pelotas em 2016, juntamente com a curva ajustada.

Usando a metodologia proposta por Ozgener et al. (2013), a temperatura do solo em uma profundidade 𝑧 (em 𝑚), para cada dia 𝑡 (em dia), pode ser estimada pela função:

(6)

onde e é a difusividade térmica do solo, que pode ser calculado a partir das propriedades mostradas na tabela 1.

Figura 2 – Médias diárias da temperatura do ar em Pelotas em 2016

Fonte: Autores

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

As figuras 3 e 4 ilustram, respectivamente, as temperaturas do ar na entrada e saída do TCSA. Nos dois casos, é possível observar os resultados supondo os dutos enterrados nas profundidades de 1, 2 e 3 m.

Figura 3 – Temperaturas de entrada e saída em três profundidades (solo argiloso)

Fonte: Autores (2020)

Outra maneira de determinar os dados referentes a temperatura do ar é através do uso de dados de reanálise atmosférica. Produtos de reanálise são gerados pela assimilação de dados observacionais em um período de tempo para a produção de condições iniciais em modelos. O projeto ERA-Interim, do European Centre for Medium-Range Weather Forecasts (ECMWF) usa a análise variacional 4D como técnica de assimilação, em uma grade espectral com truncamento triangular de 255 ondas, correspondendo a aproximadamente 80km, e um sistema de coordenadas verticais híbrido com 60 níveis e janela temporal de 12h. Este método realiza uma interpolação estatística no espaço e tempo entre a distribuição das observações meteorológicas e uma estimativa a priori obtida pelo modelo global do ECMWF. Isto é feito de forma que a física e a dinâmica do modelo certificam que as observações são usadas de uma forma meteorologicamente consistente (Simmons et al., 2006).

Figura 4 – Temperaturas de entrada e saída em três profundidades (solo arenoso)

Fonte: Autores

Aqui, o local escolhido para obtenção dos dados referentes as temperaturas do ar é a Estrada da Cascata - BR392, com coordenadas geográficas 31º43’01.0’’S e 52º23’36.5’’O. Este local dista em torno de 7.8 km da região do Trevo do Contorno, podendo ser utilizado nesta análise, pois o raio de abrangência dos dados obtidos com o ERA-Interim é em torno de 15km. Assim, a função:

(7)

descreve a temperatura do ar obtida com os dados de reanálise. A figura 5 mostra as curvas ajustadas das temperaturas médias diárias do ar tanto para os dados fornecidos pela EAP quanto para os dados gerados pelo ERA-Interim.

Figura 5 – Médias diárias da temperatura do ar em Pelotas em 2016

Fonte: Autores

O erro entre as curvas foi calculado através de seu valor médio quadrático (RMS):

(8)

A temperatura do solo é expressa pela equação 9 e a figura 6 expressa as temperaturas do ar na entrada do TCSA, tanto para os dados oriundos da EAP quanto da reanálise ERA-Interim, além das temperaturas de saída do TCSA, considerando uma porção de solo arenoso e outra porção argilosa, respectivamente.

(9)

Figura 6 – Temperaturas de entrada e saída em três profundidades (solo arenoso e argiloso)

Fonte: Autores

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho apresentou um modelo analítico para TCSA aplicado na cidade de Pelotas, no Rio Grande do Sul. Em um primeiro estudo, foram utilizados os dados experimentais referentes à temperatura do ar na entrada do TCSA, fornecidos pela Estação Agro climatológica de Pelotas. Estes foram ajustados por mínimos quadrados, fornecendo uma equação que descreve a temperatura do ar no município, em 2016.

Utilizando os dados de reanálise ERA-Interim, foi obtida uma nova curva para os valores da temperatura do ar, podendo ser feito um comparativo entre as duas funções. O erro calculado através do valor médio quadrático destas curvas foi de 0.59ºC, demonstrando a precisão entre estas e os dados experimentais, evidenciando outra maneira eficiente na determinação da temperatura do ar na entrada do trocador de calor.

Agradecimentos

Eduardo Nóbrega e Ana Maria Domingues agradecem, respectivamente, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS) por suas bolsas de estudo. Todos os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (FAPERGS) pelas seguintes concessões: Edital 4/2019–ARD: Processo 19/2551-0001345-0 e Edital 05/2019–PqG: Processo 19/2551-0001964-5.

Referências

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CONTRIBUIÇÃO DE AUTORIA

1 – Eduardo de Sá Bueno Nóbrega

Investigação, Administração do projeto, Curadoria de dados, Validação, Escrita – primeira redação

2 – Ana Maria Bersch Domingues

Investigação, Administração do projeto, Curadoria de dados, Validação, Escrita – primeira redação

3 – Juliana Costi

Supervisão, Visualização de dados

4 – Ruth da Silva Brum

Administração do projeto, Supervisão, Escrita – revisão e edição

5 – Jairo Valões de Alencar Ramalho

Administração do projeto, Supervisão, Escrita – revisão e edição

6 – Régis Sperotto Quadros

Administração do projeto, Supervisão, Escrita – revisão e edição

Como citar este artigo

NÓBREGA, E.S.B.; DOMINGUES, A.M.B.; COSTI, J.; BRUM, R.S.; RAMALHO, J.V.A.; QUADROS, R.S. Uma avaliação de estratégias para determinar a temperatura na entrada de trocadores de calor solo-ar. Ciência e Natura, Santa Maria, v. 43, Ed. Esp. X ERMAC, e15, p.1-12, 2021. DOI 10.5902/2179460X67002. Disponível em: https://doi.org/10.5902/2179460X67002. Acesso em: 5 nov. 2021.