Universidade Federal de Santa Maria

Ci. e Nat., Santa Maria, v. 43, e96, 2021

DOI: 10.5902/2179460X62716

ISSN 2179-460X

Recebido: 08/11/2020 • Aceito: 29/09/2021 • Publicado: 28/01/2022

Geociências

MAPEAMENTO E AVALIAÇÃO DAS NASCENTES DA ÁREA URBANA DO MUNICÍPIO DE NÃO-ME-TOQUE/RS

MAPPING AND EVALUATION OF SOURCES OF THE URBAN AREA OF THE MUNICIPALITY OF NÃO-ME-TOQUE/RS

Elisa Schuster I

Patricia Inês Schwantz II

Marta Martins Barbosa Prestes III

Robson Evaldo Gehlen Bohrer IV

Daniela Mueller de Lara V

 

I Especialização em Gestão e Sustentabilidade Ambiental, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Especialização em Gestão e Sustentabilidade Ambiental, Unidade Alto da Serra Botucaraí em Soledade, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-6136-4137 - elisaschuster6@hotmail.com

II Engenheira de Bioprocessos e Biotecnologia, Universidade Federal de Santa Maria, Programa de Pós-Graduação em Administração Pública, Santa Maria, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-1110-7490 - patyschwantz1991@gmail.com

III Professora Adjunta, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Unidade Alto da Serra Botucaraí em Soledade, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-2673-3902 - marta-barbosa@uergs.edu.br

IV Professor Adjunto, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Unidade em Três Passos, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-2001-8983 - robson-bohrer@uergs.edu.br

V Professora Adjunta, Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, Unidade Alto da Serra Botucaraí em Soledade, RS, Brasil

https://orcid.org/0000-0002-2244-1793 - daniela-lara@uergs.edu.br

 

RESUMO

A água é um recurso natural essencial para a sobrevivência e manutenção dos seres vivos. Este estudo teve como objetivo realizar um mapeamento e análise da qualidade ambiental das nascentes urbanas localizadas no município de Não-Me-Toque/RS, através de análises macroscópicas, microbiológicas e avaliação do nível de preservação. Foram mapeadas 17 nascentes e com a análise macroscópica observou-se que 41% (7) estão aterradas devido ao uso e ocupação do solo no município, 18% (3) foram caracterizadas em classe C (nível razoável de preservação) e 6% (1) em classe B (nível bom de preservação). Em relação as análises físico-químicas e microbiológicas, devido a impossibilidade de acesso a três nascentes (N1, N6 e N15) e aterramento de outras sete (N3, N4, N5, N9, N10, N16 e N17), foi possível realizar análises da água em apenas 6 nascentes (N13, N08, N12, N14, N16 e N17). Todas as nascentes analisadas apresentam níveis de oxigênio dissolvido aceitáveis, e, N12, N14 e N16 apresentam níveis de pH abaixo do estabelecido na Resolução do Conama nº 357/2005. As nascentes N8, N13, N14 e N16 apresentaram coliformes fecais, enquanto N13 e N17 apresentaram E. coli. Quanto ao nitrogênio, identificou-se a presença acima do permitido em N12 e N17.

Palavras-chave: Preservação ambiental; Recursos hídricos; Nascentes

ABSTRACT

Water is an essential natural resource for the survival and maintenance of living beings. This study aimed to perform a mapping and analysis of the environmental quality of urban springs located in the municipality of Não-Me-Toque/RS, through macroscopic, microbiological analyses and evaluation of the level of preservation. Seventeen springs were mapped and with the macroscopic analysis it was observed that 41% (7) were grounded due to land use and occupation in the municipality, 18% (3) were characterized in class C (reasonable level of preservation) and 6% (1) in class B (good level of preservation). In relation to the physicochemical and microbiological analyses, due to the impossibility of access to three springs (N1, N6 and N15) and grounding of another seven (N3, N4, N5, N9, N10, N16 and N17), it was possible to perform water analyses in only 6 springs (N13, N08, N12, N14, N16 and N17). All the analyzed springs present acceptable dissolved oxygen levels, and, N12, N14 and N16 present pH levels below those established in Conama Resolution 357/2005. Sources N8, N13, N14 and N16 presented fecal coliforms, while N13 and N17 presented E. coli. As for nitrogen, the presence above the permitted in N12 and N17 was identified.

Keywords: Environmental preservation; Water resource; Springs

1 INTRODUÇÃO

A água é um recurso natural essencial para a sobrevivência e manutenção dos seres vivos. Da mesma forma, as nascentes são indispensáveis para a concepção e sustentabilidade dos rios, mas, com a degradação das mesmas, o percurso de água pode ser prejudicado. Portanto, se não houver ações de proteção das nascentes, a vazão de água disponível será menor e os cursos d’água podem secar, prejudicando a qualidade das águas e afetando todos os seres vivos que dependem deste recurso para sobreviver (SILVA et al., 2020). Segundo Schwantz et al. (2019), os processos contínuos de urbanização, assim como fragmentações do solo a partir de práticas agrícolas, são fatores que agravam a degradação dos ambientes naturais, aumentando assim a necessidade de preservação e recuperação das nascentes de água.

Conforme o Código Florestal Lei nº 12.651/2012, alterada pela Lei nº 12.727, de 17 de outubro de 2012, que no Art. 4º, inciso IV, estabelece que as nascentes devem ter arbóreos nativos em um raio mínimo de 50 metros de preservação em seu entorno (BRASIL, 2012). Portanto, a falta de áreas de proteção permanente junto aos recursos hídricos facilita a ação antrópica, contribuindo para a escassez e degradação da qualidade do recurso hídrico. Além disso, o processo de urbanização sem o devido planejamento tem influência direta na dinâmica das nascentes, contribuindo para a contaminação e desaparecimento das mesmas. Segundo Vivian et al. (2019), a atuação severa na fiscalização de áreas de APPs pode minimizar os impactos ambientais e a ocupação desordenada de lugares impróprios, possibilitando a preservação dos recursos naturais.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU, 2015), caso não sejam tomadas providências para preservar as fontes de água potável e mudar o padrão de consumo, dois terços da população global poderão sofrer com escassez de água doce até 2025. Com a intensificação das pressões antrópicas sobre o ambiente, as Áreas de Preservação Permanente – APP’s estão submetidas a grandes extensões de degradação, observando-se assim um processo de substituição das paisagens naturais das nascentes por outros tipos de uso e ocupação da terra (EUGENIO, 2011). Em razão disso, de acordo com Soares (2011), os principais desafios dos órgãos ambientais fiscalizadores são em relação a ausência de procedimentos uniformizados e da infraestrutura necessária para se apurar com o devido rigor as agressões ao meio ambiente.

Na perspectiva moderna de gestão do território, toda ação de planejamento, ordenação ou monitoramento do espaço deve incluir a análise dos diferentes componentes do ambiente, incluindo o meio físico-biótico, a ocupação humana, e seu inter-relacionamento (CÂMARA; MEDEIROS, 2006; SCHWANTZ et al., 2019; SILVA et al., 2020). Ainda, conforme Viel et al., (2013), as geotecnologias podem ser aplicadas como ferramentas para realização dessa análise, assim como, para tomada de decisão, controle e manutenção dos recursos hídricos, a partir da junção e sobreposição de vários planos de informação em que é necessário ter a localização como principal parâmetro.

Dessa forma, é nítido que as APP’s têm papel de abrigar a biodiversidade e promover a propagação da mesma, assegurando a qualidade do solo e garantindo o armazenamento de água em condições favoráveis de quantidade e qualidade. Adicionalmente, possui uma grandiosa relação com o bem-estar humano, colaborando com a população que vive em seu entorno, contribuindo para a sadia qualidade de vida assegurada no Art. 225 da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988).

Diante da importância dos recursos hídricos e, consequentemente, da proteção das nascentes, este trabalho teve como objetivo realizar uma identificação e análise detalhada da qualidade ambiental das nascentes urbanas localizadas no município de Não-Me-Toque (Rio Grande do Sul), cujas coordenadas geográficas de latitude são 28° 27' 28'' Sul e de longitude são 52° 49' 19'' Oeste. Alguns estudos similares já foram realizados no município de Soledade (Rio Grande do Sul) por Vivian et al. (2019) e Santos (2019) e corroboram com os estudos propostos no município de Não Me Toque/RS. Além disso, este estudo visa despertar na comunidade o interesse em fomentar políticas públicas voltadas para a preservação e recuperação das nascentes.

2 mATERIAIS E MÉTODOS

A metodologia abordada nesta pesquisa incluiu natureza exploratória, descritiva e experimental. Primeiramente, realizou-se a consulta bibliográfica em artigos, teses e dissertações, para conhecimento sobre tema abordado. Conforme Gil (2008), as pesquisas exploratórias têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou para construir hipóteses. A pesquisa descritiva, segundo Triviños (1987), exige do investigador uma série de informações sobre a pesquisa, descrevendo os fatos e fenômenos de determinada realidade. Já a pesquisa experimental, para Gil (2008) consiste na determinação de um objeto de estudo, selecionando as variáveis capazes de influenciá-lo, definindo as formas de controle e observação dos efeitos que a variável produz no objeto.

Deste modo, o estudo seguiu um planejamento dividido em três etapas, conforme ilustrado na Figura 1.

Figura 1 — Etapas do planejamento metodológico.

Fonte: Autores (2020)

A primeira etapa consistiu na descrição da área de estudo e mapeamento das nascentes. Destaca-se que as nascentes estudadas estão localizadas na área urbana do município de Não-Me-Toque/RS. O município possui uma área geográfica de 361.689km², com cerca de 17886 habitantes sendo, principalmente, descendentes de alemães, italianos, holandeses e uma parcela de portugueses. Não-Me-Toque integra a mesorregião Noroeste Rio-Grandense, situado na região do Planalto Médio (Microrregião do Alto Jacuí), no centro norte do Estado do Rio Grande do Sul, a 282 km de Porto Alegre e o município tem em sua principal geração de renda a indústria de máquinas agrícolas (IBGE, 2021). A partir do mapa urbano hidrográfico disponibilizado pelo Departamento de Meio Ambiente do município, foi possível iniciar o mapeamento das nascentes com a identificação dos locais visita in loco das mesmas. Foram localizadas 17 nascentes, posteriormente identificadas com a letra N (nascente) seguida de um numeral (1 a 17) para melhor discussão dos resultados.

A segunda etapa foi composta pela caracterização ambiental. Para avaliação do nível de preservação das nascentes identificadas, realizou-se análises para observação dos impactos ambientais e parâmetros macroscópicos seguindo o método proposto por (Dias, 1988) e pelo Guia de Avaliação da Qualidade das Águas (2004) e adaptado por Gomes et al. (2005), que resulta nas informações apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1 - Descrição dos itens utilizados para o cálculo do Índice de Impacto Ambiental em nascente.

ITEM

DESCRIÇÃO

Coloração da água

Com uso de recipiente transparente para coleta e verificação da cor

Odor da água

Com uso de recipiente para coleta e verificação do odor

Lixo ao redor

Presença de lixo na região das nascentes

Materiais flutuantes

Presença de objetos na superfície da água

Espumas e Óleo

Presença na superfície da água

Esgoto

Presença de emissários e a sua distância da nascente

Vegetação

Caracterização próxima a nascente e classificação quanto à preservação (Alto grau de degradação, Baixo grau de degradação e Preservada)

Uso por animais

Evidencia de uso por animais (presença, pegadas, fezes).

Uso por humanos

Evidência de utilização por humanos (trilhas, presença de bombas de sucção, irrigação de hortas e plantações)

Proteção do local

Existência de algum tipo de proteção ao redor da nascente, por barreiras naturais, artificiais e sua caracterização.

Residências

Quantificação aproximada da distância, em metros da nascente até as residências, estabelecimento comercial ou industrial maios próximo.

Tipo de área de inserção

Se a nascente está localizada em área que visa à preservação local.

Fonte: Adaptado de Gomes et al (2005)

Para dar continuidade a caracterização ambiental foi utilizada ainda a metodologia proposta por Gomes et al. (2005) mostrada na Quadro 2.

Quadro 2 — Quantificação da análise dos parâmetros macroscópicos.

PARÂMETRO

RUIM (1)

MÉDIO (2)

BOM (3)

Cor da água

Escura

Aparente

Verdadeira

Odor

Cheiro forte

Cheiro fraco

Sem cheiro

Lixo ao redor

Muito

Pouco

Ausente

Materiais Flutuantes

Muito

Pouco

Ausente

Espumas

Muito

Pouco

Ausente

Óleos

Muito

Pouco

Ausente

Esgoto

Presença

Evidências

Ausente

Vegetação (APP)

Ausente

Exótica

Nativa

Uso pela fauna (animais)

Presença

Evidências

Ausente

Uso antrópico(humanos)

Presença

Evidências

Ausente

Proteção do local (cercamento)

Ausente

Presente, mas com fácil acesso

Presente, mas com difícil acesso

Próximo de residências/ estabelecimentos

Menos de 50 metros

Entre 50 e 100 metros

Mais de 100 metros

Tipo da área de inserção

Informação ausente

Propriedade privada

Área protegida

Fonte: Adaptado de Gomes et al (2005)

As notas para cada classificação foram designadas de acordo com os parâmetros analisados: (1) Ruim, (2) Média e (3) Boa. Sequencialmente, para a classificação das nascentes realizou-se uma análise do grau de conservação avaliando os Quadros 1 e 2, seguindo as recomendações de Gomes et al. (2005), e com o somatório dos critérios tem-se os critérios apresentados no Quadro 3. No Quadro 3, as classificações são de acordo com a pontuação final obtida considerando para Classe A (Ótima), Classe B (Boa), Classe C (Razoável), Classe D (Ruim) e, por fim, Classe E (Péssima).

A partir dos Quadros 1 e 2, recomenda-se o Quadro 3 contendo informações que contribuem para classificação das nascentes, indicando a distribuição de pontos em relação à classificação do grau de preservação da nascente.

Quadro 3 — Classificação das nascentes quanto ao grau de preservação

Classe

Grau de Preservação

Pontuação Final*

A

Ótima

Entre 37 a 39 pontos

B

Boa

34 a 36 pontos

C

Razoável

31 a 33 pontos

D

Ruim

28 a 30 pontos

E

Péssima

Abaixo de 28

Fonte: Adaptado de Gomes et al. (2005)

Na terceira etapa realizou-se a coleta das amostras e análise da água. A coleta das amostras ocorreu nas nascentes mapeadas na área urbana do município para posterior realização das análises físico-químicas e microbiológicas, as quais foram desenvolvidas no laboratório da UERGS utilizando o Ecokit da empresa Alfakit@. Geralmente, a água contém diversos componentes, os quais provêm do próprio ambiente natural ou foram introduzidos a partir de atividades humanas. Para caracterizar a água, são determinados diversos parâmetros como indicadores da qualidade. Quando os indicadores alcançam valores superiores aos estabelecidos para determinado uso, indicam impurezas, e podem ser verificados por parâmetros físicos, químicos e biológicos (GLORIA; HORN; HILGEMANN, 2017).

As análises foram realizadas em duas etapas distintas. A primeira etapa utilizou-se o Ecokit Água Doce/Salgada, Modelo 6674 ALFAKIT@. Este kit permite fácil manuseio, ensaios in loco e apresentação dos resultados de forma didática para os parâmetros de potencial hidrogeniônico, turbidez, coliformes totais e Escherichia coli. É usado especialmente para a educação ambiental e a oportuna discussão sobre a questão da água potável, da necessidade do seu controle e da preservação das áreas de mananciais (SANTOS, 2019). Para esta etapa inicial, além dos parâmetros acima citados, realizou-se a medição de temperatura e oxigênio dissolvido com oxímetro portátil medidor oxigênio dissolvido (mod. vz8403az-marca AZ). As análises foram feitas em duplicata.

Para as análises de Coliformes Totais e Escherichia coli foi usada a cartela Colipaper petri que possui um meio de cultura em forma de gel desidratado. No processo de análise, a amostra foi filtrada e a cartela foi hidratada com água destilada estéril. A membrana filtrante, com as possíveis bactérias contaminantes da amostra a ser analisada foi então colocada sobre a superfície da cartela, proporcionando o contato dos microrganismos com os nutrientes. Após, as cartelas foram incubadas em estufa microbiológica por cerca de 17 horas com temperatura de 34 a 36°C. Posteriormente, realizou-se a leitura interpretando os resultados.

A interpretação dos resultados obtidos com a técnica do Colipaper petri ocorreu a partir das cores pontuadas na cartela. Salienta-se que os pontos que apresentaram as cores violeta até azul são caracterizadas com a presença de Escherichia coli. Já os pontos com cores em tons de violeta até os tons de azul e tons róseos até tons vermelho são caracterizados com apresentação de Coliformes Totais. Em posse dos valores nos pontos, realizou-se, conforme requer a metodologia da técnica do Colipaper petri, a multiplicação do número de colônias pelo fator de correção 80. Por fim, estes resultados foram expressos em Unidades Formadoras de Colônias por mililitro (UFC/100mL).

Paralelo à execução das análises, foi desenvolvida uma planilha em Excel@ com objetivo de unificar em um local todos os resultados obtidos em cada nascente por coleta e por dados das amostras com análises realizadas. Foram considerados as informações em relação ao tipo de amostra, tipo de análise, local da coleta, data e hora da coleta, assim como, as coordenadas geográficas de cada nascente.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 Mapeamento e descrição da preservação das nascentes

A partir do mapa hidrográfico disponibilizado pelo Departamento de Meio Ambiente do município de Não-Me-Toque/RS, foram identificadas 17 nascentes no perímetro urbano e para o mapeamento e identificação do nível de preservação, estas foram caracterizadas por cores conforme apresentado na Figura 2.

Figura 2 — Mapeamento e identificação das nascentes do município de Não-Me-Toque/RS.

Fonte: Adaptado de Google Earth (2020)

As nascentes foram localizadas em todo o perímetro urbano do município de Não-Me-Toque/RS, identificadas com a letra N (nascente) seguida de um numeral (1 a 17). A nascente N1 localiza-se no Bairro São João, N9 no centro, N12 e N14 no bairro Industrial, N2 e N6 no bairro Stara, N10 no bairro Jardim, N13, N15 e N16 no bairro Santo Antônio, N3, N7 e N8 no bairro Ipiranga e N11 no bairro Martini, N17 no bairro Vila Nova e, por fim, N4 e N5 no bairro Martini.

Para cada nascente mapeada, foi feita a avaliação macroscópica e o somatório de pontos de acordo com a proposição metodológica. Salienta-se que quanto maior o somatório, melhor a condição macroscópica da nascente. Das 17 nascentes identificadas, foi possível verificar que N3, N4, N5, N9, N10, N16 e N17 (destacadas em cor marrom na Figura 2), estão aterradas devido a construções de moradias sobre as mesmas.

Dentre as demais nascentes mapeadas, foi possível constatar que três, N7, N11 e N12, destacadas em cor vermelho na Figura 2, obtiveram classificação como Classe E em grau péssimo de preservação (conforme o Quadro 3). Esta classificação está atrelada principalmente ao fato das nascentes estarem próximas de residências e, consequentemente, com ausência de APP. Porém, cabe ressaltar ainda que a falta de APP nas proximidades influencia diretamente na degradação do solo, e favorece a intensificação de resíduos descartados no entorno, materiais flutuantes, aterramento, presença de animais e humanos, além da existência de lavouras.

As nascentes N8, N13 e N14, destacadas em amarelo escuro na Figura 2, foram classificadas como Classe C em grau razoável de preservação. Observou-se que as mesmas se encontravam com pouca vegetação no entorno, sem odor, cor da água claras, sem resíduos e sem presença de espumas e óleos. Dentro todas as nascentes observadas, apenas a nascente N2, destacada em cor bege na Figura 2, possui presença de vegetação e ausência de odor, espumas, resíduos e presença de animais ou humanos, sendo a única com classificação como Classe B, em bom estado de preservação.

Em relação a nascente N1, destacada em cor cinza na Figura 2, devido essa estar em uma mata densa de vegetação não possui acesso. Já as nascentes N6 e N15, destacadas em cor preta na Figura 2, estavam localizadas em propriedades privadas e sem autorização de acesso. A Figura 2 apresenta os percentuais de acordo com o grau de preservação sugerido por Gomes et al. (2005).

Figura 3 — Percentuais de acordo com classificação das nascentes quanto ao grau de preservação.

Fonte: Autores (2020)

A partir da Figura 3, foi possível constatar que 41% das nascentes são caracterizadas como aterradas. Uma das principais motivações pode estar associada ao crescimento expansivo do município de Não-Me-Toque/RS. Além disso, a maior parte das nascentes são classificadas em condições péssimas, representando a 17% das nascentes, ou ainda, razoável que corresponde a 18%.

3.2 Análises físico-químicas e microbiológicas

Em relação as análises físico-químicas e microbiológicas, ressalta-se que devido a impossibilidade de acesso a três nascentes (N1, N6 e N15) e aterramento de outras sete (N3, N4, N5, N9, N10, N16 e N17), foi possível realizar análises da água em apenas 6 nascentes mapeadas. As nascentes analisadas foram: N13, N08, N12, N14, N16 e N17, e os resultados das análises são apresentados no Quadro 4.

Tabela 1 Resultado das análises físico-químicas e microbiológicas da água.

Parâmetros

Identificação das nascentes

Enquadramento dos parâmetros

Resolução Conama 357/2005

N08

N12

N13

N14

N16

N17

Oxigênio Dissolvido

9

9

6

7

7

8

6 a 9

E. Coli

A

A

P

A

 

A

 

P

Ausência em 100 mL

Coliformes Fecais

P

A

P

P

P

A

Ausência em 100 mL

pH

6,5

5,5

6,0

5

5

7,5

Entre 6,0 e 9,0

Nitrogênio Amoniacal

1,08

4,44

2,51

2,7

2,07

5,06

3,07 mg/L N

Legenda: A (Ausência na amostra analisada); P (Presença na amostra analisada).

Fonte: Autores (2020)

A partir dos dados exibidos na Tabela 1, constata-se que todas as nascentes analisadas apresentam níveis de oxigênio dissolvido de acordo com a Resolução 357/2005. Acredita-se que os resultados são consequência do excesso de matéria orgânica, causando a redução deste parâmetro. Porém, de acordo com Queiroz (2006), mesmo quantidades moderadas de matéria orgânica jogadas nas águas naturais podem resultar numa diminuição significativa do oxigênio dissolvido e, consequentemente, levar à mortandade de peixes e outras espécies.

As nascentes N8, N13, N14 e N16 apresentaram coliformes fecais na água. No entanto apenas as nascentes N13 e N17 apresentaram presença de Escherichia coli. De acordo com a CETESB (2009), a Escherichia coli é um microrganismo de origem exclusivamente fecal, estando sempre presente, em densidades elevadas nas fezes de humanos, mamíferos e pássaros, sendo raramente encontrada na água ou solo que não tenham recebido contaminação fecal. Nesse sentido, ressalta-se que durante a análise macroscópica foi possível observar a ocorrência de lançamentos de efluentes sanitários sem tratamento nas respectivas nascentes.

Por outro lado, as nascentes N12, N14 e N16 apresentam níveis de pH abaixo do estabelecido na Resolução do Conama nº 357/2005. Alves et al. (2008) ressalta que a variação de pH depende das relações existentes entre a matéria orgânica, rochas, ar e água e os seres vivos. Assim, é possível que estes valores estejam relacionados com a matéria orgânica em decomposição presente no entorno das nascentes. Segundo Câmara e Medeiros (2006), em casos de águas superficiais, valores de pH muito básicos podem vir a solubilizar agentes tóxicos, como por exemplo amônia, metais pesados, sais de carbonato, entre outros. O autor reforça ainda que valores muito baixos (menores que 6,0) tornam a água ácida e acabam interferindo nas concentrações de dióxido de carbono, ácido carbônico, entre outros.

Quanto ao nitrogênio, identificou-se a presença acima do permitido nas nascentes N12 e N17 atingindo valores de 4,44 mg/L N e 5,06 mg/L N, respectivamente. Destaca-se que, no meio aquático existem diversas fontes de nitrogênio podendo ter origem natural (proteínas, clorofila e outros compostos biológicos) e/ou origem das atividades humanas e animais (despejos domésticos e industriais, excrementos de animais e fertilizantes).

Diante dos resultados apresentados, sugere-se a adoção de ações públicas voltadas para a preservação e recuperação das nascentes e o cumprimento da legislação vigente da qual prevê a presença de 50 m de APP para cada nascente conforme Código Florestal (Lei 12.651/2012). Ressalta-se que as nascentes analisadas necessitam de medidas de recuperação em caráter de urgência, assim como procedimentos de conservação e fiscalização municipal.

Conforme o Código Florestal Lei nº 12.651/2012, que no Art. 4º, inciso IV, estabelece que as nascentes devem ter arbóreos nativos em um raio mínimo de 50 metros de preservação em seu entorno (BRASIL; 2012). Portanto, é evidente que a falta de áreas de proteção permanente junto aos recursos hídricos facilita a ação antrópica, contribuindo para a escassez e degradação da qualidade do recurso hídrico. Além disso, o processo de urbanização sem o devido planejamento tem influência direta na dinâmica das nascentes, contribuindo para a contaminação e desaparecimento das mesmas. Segundo Vivian et al. (2019), a atuação severa na fiscalização de áreas de APPs pode minimizar os impactos ambientais e a ocupação desordenada de lugares impróprios, possibilitando a preservação dos recursos naturais.

Por fim, cabe enfatizar que todos os indicadores, sejam eles de qualidade ambiental com análises macroscópicas in loco ou através de análises físico-químicas e microbiológicas, contribuem para reafirmar que as práticas de preservação ambiental não são processos isolados, mas sim ações construídas em conjunto e que perpassam várias esferas da sociedade.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo traz evidências da importância do diagnóstico e mapeamento de nascentes localizadas no perímetro urbano do município de Não-Me-Toque (RS). Com base nos dados obtidos é possível afirmar que as maiores causas de degradação estão relacionadas à falta de vegetação nas Áreas de Preservação Permanente (APPs), o uso das nascentes para dessedentação animal (equinos e bovinos), presença de lavouras, descarte inadequado de efluentes domésticos, assim como aterramento e canalização das nascentes para loteamento e construção de moradias e outras edificações.

Ainda, se observa que que todas as nascentes apresentaram perturbações antrópicas e, sem a realização de estudos que indiquem a localização, avaliação do nível de preservação, diagnóstico ambiental (análises macroscópicas e microbiológicas), não se torna possível indicar ações e orientações sobre a preservação das mesmas, muito menos fomentar políticas públicas municipais.

Espera-se que os dados obtidos auxiliem no monitoramento a médio e longo prazo para a preservação das nascentes que são consideradas fundamentais para o aumento do fluxo dos cursos d’água, influenciando na quantidade e qualidade dos recursos hídricos. Além disso, são necessárias ações de conscientização e práticas de educação ambiental com os munícipes de Não-Me-Toque/RS, visando garantir proteção aos recursos hídricos e a biodiversidade do município.

Referências

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BEZERRA, C. G.; SANTOS, A. R.; PIROVANI, D. B.; PIMENTEL, L. B.; EUGENIO, F. C. Estudo da Fragmentação Florestal e Ecologia da Paisagem na Sub-Bacia Hidrográfica do Córrego Horizonte, Alegre, ES. Espaço & Geografia, Brasília, v. 14, n. 2, p. 257:277, 2011.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Texto consolidado até a Emenda Constitucional nº 100 de 26 de junho de 2019. Disponível em: https://www.senado.leg.br/atividade/const/con1988/con1988_26.06.2019/art_125_.asp. Acesso em: 18 de julho de 2020.

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Contribuições de autoria

1 – Elisa Schuster

Contribuição: Escrita – primeira redação, revisão e edição

 

2 – Patricia Inês Schwantz

Contribuição: Escrita - primeira redação, revisão e edição

 

3 – Marta Martins Barbosa Prestes

Contribuição: Escrita - revisão, supervisão e edição

 

4 – Robson Evaldo Gehlen Bohrer

Contribuição: Escrita - revisão, supervisão e edição

 

5 – Daniela Mueller de Lara

Contribuição: Escrita – Escrita - revisão, supervisão e edição