Universidade Federal de Santa Maria

Ci. e Nat., Santa Maria v.42, ed. esp.: meteorologia, e8, 2020

DOI:10.5902/2179460X55309

ISSN 2179-460X

Received: 22/09/20   Accepted: 22/09/20  Published: 30/09/20

 

 

Previsão de Curto e Curtíssimo Prazo

 

Uso de sensoriamento remoto via satélite na identificação de rastros de destruição por tornados em um evento de tempo severo no Rio Grande do Sul

 

Use of remote sensing via satellite in the identification of tornado damage paths in a severe weather event in Rio Grande do Sul

 

Murilo Machado Lopes I

Ernani de Lima Nascimento II

 

I Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Brasil. E-mail: lopesmurilo.rs@gmail.com.

II Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, Brasil. E-mail: ernani.nascimento@ufsm.br.

 

 

RESUMO

O registro de tornados no Brasil aumentou nos últimos anos; porém, é provável que muitas ocorrências deste fenômeno sobre áreas desabitadas e/ou durante o período noturno deixem de ser confirmadas, especialmente em um país onde um sistema oficial de avaliação de danos causados por ventos intensos é inexistente. Este trabalho dá prosseguimento a iniciativas anteriores do emprego do sensoriamento remoto via satélite na identificação de trajetórias de danos causados por tornados. O evento analisado neste trabalho ocorreu entre a noite e a madrugada do dias 07 e 08 de junho de 2017 no norte-nordeste do Rio Grande do Sul e representa um exemplo de caracterização de danos significativos causados por tornados apesar da não confirmação visual dos fenômenos. São analisadas imagens geradas pelos satélites ambientais de órbita baixa das séries Landsat e Sentinel, assim como imagens disponibilizadas pelos satélites ambientais de finalidade comercial que compõem a base de dados do software Google Earth. Para auxiliar na identificação de danos sobre a vegetação densa também são usadas as ferramentas-web Global Florest Change e Global Florest Watch, que utilizam métodos objetivos para detectar alterações abruptas do estado da vegetação. Com base nestes produtos foi possível identificar sete rastros de danos por tornados no evento noturno de junho de 2017, ratificando o valor agregado pelo uso do sensoriamento remoto para a confirmação da ocorrência de eventos tornádicos.

Palavras-chave: Tornados; Rastros de danos; Sensoriamento remoto.

 

 

ABSTRACT

The number of tornado reports in Brazil has increased in recent years; nevertheless, it is likely that many occurrences over uninhabited areas and/or during night time hours remain unconfirmed, especially in a country devoid of official surveys of damage caused by intense winds. This work follows previous initiatives addressing the employment of remote sensing via satellite to identify damage paths associated with tornadoes. The nocturnal event analyzed in this study took place in north-northeast Rio Grande do Sul state from the night hours of 7 June 2017 into early morning hours of the following day, and represents an example of the characterization of significant damage caused by tornadoes despite the lack of visual confirmation of the phenomenon. Images produced by low-orbit environmental satellites of the Landsat and Sentinel series are analyzed, as well as imagery made available by the commercial-purpose environmental satellites that comprise the data base of Google Earth software. To aid in the identification of damage inflicted to dense vegetation, the web tools Global Florest Change and Global Florest Watch, which employ objective methods to detect abrupt modifications in the vegetation cover, are also utilized. Based on these products, it was possible to identify seven tornado damage tracks for the nocturnal event of June 2017, ratifying the value added by remote sensing products in the confirmation of tornadic episodes.

Keywords: Tornadoes; Damage tracks; Remote sensing.

 

 

1 Introdução

Como discutido em Silva Dias (2011), o registro de tornados no Brasil aumentou nos últimos anos. Isto deve-se a uma combinação de fatores que incluem o crescimento populacional e aumento da ocupação do espaço geográfico, a maior disseminação de dispositivos digitais de registro fotográfico e videográfico nos telefones celulares, e uma maior disponibilidade de meios de divulgação da informação (aumento das retransmissoras locais de TV, as redes sociais, os aplicativos para smartphones, etc). Ainda assim, é praticamente certo que o tornado continue sendo um fenômeno sub-notificado no Brasil. Esta afirmação justifica-se pelo fato do tornado apresentar curta duração e pequena extensão espacial, sendo, respectivamente, da ordem de minutos e da ordem de centenas de metros; p.ex., Wakimoto et al. (2018). Isto reduz as oportunidades para sua observação direta, especialmente à noite. Sistemas de sensoriamento remoto meteorológico, seja via satélite ou radar, conseguem identificar tempestades severas capazes de produzir um tornado, mas não fornecem uma confirmação inequívoca do fenômeno (exceção feita às situações fortuitas em que a assinatura de danos por tornado, ou tornado debris signature, é identificada com radares de dupla polarização; p.ex., Van Den Broeke e Van Den Broeke (2015)). Outro fator importante é que a avaliação pormenorizada de danos em locais atingidos por vendavais não é prática disseminada no Brasil, tarefa esta que poderia aumentar a confirmação da ocorrência de tornados no nosso país (Nascimento e Doswell III, 2006). A confirmação destes eventos, assim como também a confirmação de sua não-ocorrência, é importante para diversos fins, como a verificação da previsão meteorológica de tempestades severas, o melhor entendimento das condições atmosféricas que conduzem à formação de diferentes formas de tempo severo, e a alimentação de bancos de dados de episódios de tempestades severas e tornados, úteis para estudos de climatologia, mitigação de desastres naturais e elaboração de mapas de ventos intensos para planejamento de obras de engenharia (Vallis et al., 2019).

O trabalho pioneiro de Dyer (1988) mostrou que a fotogrametria e o sensoriamento remoto via satélite podem ser usados com sucesso na detecção de trajetórias de danos associados aos tornados, principalmente sobre regiões de vegetação arbórea permanente. A passagem de um tornado provoca alterações abruptas nas características da superfície vegetada, incluindo suas propriedades refletoras nas faixas visível e do infravermelho-próximo do espectro eletromagnético (Bentley et al., 2002). De fato, a utilização de imagens de satélites ambientais de órbita baixa já mostrou resultados muito promissores na detecção de rastros deixados por tornados, ventos intensos e até granizadas extensas (Bentley et al., 2002; Yuan et al., 2002; Segele et al., 2005; Parker et al., 2005; Jedlovec et al., 2006), e foi apontada por Edwards et al. (2013) como uma importante abordagem complementar, ou até mesmo alternativa, na análise de danos. Por exemplo, Shikhov e Chernokulsky (2018) empregaram imagens de satélites ambientais na detecção de trajetórias de tornados em regiões da Europa, enquanto que Yuan et al. (2002), nos Estados Unidos (EUA), utilizaram o cálculo do normalized difference vegetation index (NDVI) a partir de imagens do satélite Landsat anteriores e posteriores ao tornado de 3 maio de 1999 para determinar a sua trajetória. Além dos satélites de monitoramento e pesquisa ambiental de agências governamentais, como os das séries Landsat, Sentinel e Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres (CBERS), existem cada vez mais opções de fontes de imagens de alta resolução advindas dos satélites de fins comerciais, como, por exemplo, os que alimentam a base de dados do software Google Earth. Para algumas regiões do mundo a resolução espacial destas imagens é da ordem de poucas dezenas de centímetros (p.ex., Atkins et al. (2014)).

No Brasil, além do trabalho pioneiro de Dyer (1988), outros estudos já exploraram a utilização de imageamento remoto  via satélite na caracterização de destruição causada por ventos intensos gerados por tempestades severas, incluindo-se tornados. Em Marcelino et al. (2007) os autores empregaram imagens do sensor mapeador temático do satélite Landsat 5 no auxílio à caracterização de uma trilha de danos gerada por um tornado no estado do Rio Grande do Sul (RS). Naquele trabalho, a técnica de subtração de imagens de diferentes bandas do espectro eletromagnético coletadas posteriormente e anteriormente ao evento foi utilizada. Técnica semelhante também foi empregada com sucesso por Nascimento e Anabor (2015) na análise de danos conduzida para o caso de um tornado na cidade de Xanxerê, no oeste de Santa Catarina. Fora do contexto tornádico, mas ainda associado à detecção de rastros de destruição causados por vendavais, imagens de satélite da série Landsat foram amplamente empregadas em Negrón-Juárez et al. (2010, 2017, 2018) na identificação de clareiras abertas na Floresta Amazônica devido a atuação de tempestades convectivas.

Colaborando com a continuidade destas iniciativas, o presente estudo tem como objetivo verificar, com o auxílio de imagens de satélites ambientais, se tornados foram a causa de danos mais significativos observados em alguns dos municípios atingidos por tempestades severas no norte-nordeste do RS entre o final do dia 7 e o início do dia 8 de junho de 2017. Naquela ocasião, cerca de dez cidades foram atingidas por fenômenos locais destrutivos de origem convectiva, com a confirmação de quatro mortes (G1 RS, 2017) e diversos danos associados a queda de granizo e a ventos intensos. Alguns destes fenômenos locais produziram danos condizentes com a passagem de tornados apesar da ausência da confirmação visual direta dos mesmos. Deste modo, a utilização de imagens disponibilizadas pelos satélites ambientais de órbita baixa torna-se particularmente relevante para a caracterização do fenômeno atmosférico responsável pela destruição.

 

 

2 Metodologia

O desenvolvimento do trabalho seguiu três etapas principais. Primeiramente, foram identificados os locais que registraram os danos mais significativos causados por ventos durante a passagem das tempestades severas no norte do RS entre a noite do dia 07 e a madrugada do dia 08 de junho de 2017. Esta etapa foi conduzida com base em informações obtidas da mídia associadas ao evento, como por exemplo G1 RS (2017). Os municípios atingidos e suas localizações são informados na figura 1.

A segunda etapa consistiu de uma checagem prévia de bancos de imagens de satélites ambientais setorizadas sobre as áreas onde os danos por ventos foram identificados. Nesta etapa foram identificadas trilhas de alteração da cobertura vegetal empregando-se as ferramentas-web desenvolvidas em suporte às iniciativas Global Forest Watch (GFW; www.globalforestwatch.org/) e Global Forest Change (GFC; earthenginepartners.appspot.com/science-2013-global-forest), esta última mantida pelo Laboratório Global Land Analysis and Discovery da University of Maryland. Estas plataformas-web contém informações de monitoramento da extensão da cobertura arbórea global, avaliando ganhos e perdas de área vegetada com uma resolução espacial de 30 m com base na atualização das imagens dos satélites da série Landsat sobre cada região. O algoritmo empregado nestas ferramentas é baseado em Hansen et al. (2013), que elaboraram um algoritmo computacional de aprendizado supervisionado que contrasta áreas de vegetação permanente e regiões de remoção da vegetação arbórea. Esta abordagem conta também com um algoritmo supervisionado desenvolvido por Hansen et al. (2016) que inclui um sistema de alerta quando ocorre uma mudança da extensão da vegetação sendo detectada pelas imagens continuamente atualizadas do satélite Landsat. O alerta funciona com base em uma árvore de decisão que leva em conta métricas de cobertura de vegetação dos três anos anteriores baseadas nas imagens do Landsat, e só é disparado quando duas novas imagens consecutivas (sobre a mesma região) destacam a diminuição da cobertura arbórea. A ferramenta que produz os alertas de mudança de cobertura vegetal é o GFW, enquanto o GFC considera a remoção anual da vegetação arbórea, muitas vezes complementando áreas não detectadas na verificação de intervalos menores de tempo pelo GFW. Estas ferramentas ressaltam a identificação espaço-temporal de alterações significativas em dossel florestal a partir de um método objetivo e foram empregadas com sucesso na detecção de rastros de destruição por tornados no estudo de Shikhov e Chernokulsky (2018).

No contexto do presente trabalho, as duas ferramentas-web citadas acima auxiliaram na detecção de mudança de cobertura vegetal dentro dos setores de rastros de danos identificados na primeira etapa de levantamento. O resultado desta informação cruzada foi usada então para orientar a ação da terceira e última etapa, que consistiu de inspecionar diretamente as imagens dos satélites ambientais para aqueles setores destacados simultaneamente pelas duas etapas anteriores. A análise destas imagens serviu então para confirmar (ou discriminar) o caráter da mudança da vegetação: se de origem natural ou associada a alguma atividade humana (Baumann et al., 2014). Sendo de origem natural, buscou-se finalmente avaliar se o rastro de destruição correspondia ao de tornado(s). As imagens foram obtidas dos seguintes satélites: Landsat 8 (da National Aeronautics and Space Administration e do United States Geological Survey), Sentinel 2 (da European Space Agency), Worldview-3, IKONOS e Geo-Eye 1 (da Digital Globe), e SPOT-5 (da Airbus Defense and Space). Os quatro últimos são satélites comerciais de onde são extraídas as imagens usadas no software Google Earth, também empregado neste estudo.

O Landsat 8, lançado em 2013, tem embarcado o sensor Operational Land Imager (OLI) com 30 m de resolução. Já o satélite Sentinel 2 conta com o imageador Multispectral Instrument (MSI) com resolução de 10 m, estando operacional desde junho de 2015 com período de revisita de 5 dias. Os dados do satélite Landsat foram obtidos através do catálogo de imagens disponível no Earth Explorer, do United States Geological Survey. Já as imagens do satélite Sentinel 2 foram obtidas através do EO Browser, uma plataforma online que permite a visualização e a combinação das bandas espectrais do satélite. Foram empregadas composições RGB (bandas do canal vísivel) das imagens destes satélites na identificação de rastros de destruição através da mudança do albedo da superfície comparando-se imagens obtidas antes e poucos dias depois da ocorrência das tempestades severas. Este é o mesmo método empregado com sucesso por Shikhov e Chernokulsky (2018) para a identificação de tornados na Europa.

Também foram consultadas imagens de satélite de alta resolução disponíveis via o software Google Earth (www.google.com/earth/) (Curtis e Mills, 2012). As imagens no espectro visível que compõem o Google Earth possuem resoluções espaciais que dependem do satélite que as geraram, a saber: entre 0,8 m e 3,2 m, do satélite IKONOS; entre 0,40 m e 0,65 m, do satélite GeoEye-1; entre 0,46 m e 1,85 m, do satélite WorldView; entre 5 m e 10 m, dos satélites da série SPOT. Os imageadores embarcados nestes satélites permitem detectar a direção em que as regiões vegetadas ou construções foram tombadas ou afetadas pelo vento.

Finalmente, também foram analisados indicadores planos de posição (PPIs) da refletividade horizontal do radar meteorológico Doppler banda-S de Morro da Igreja/SC operado pelo Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DECEA) da Aeronáutica (latitude: 28.13oS; longitude: 49.47oO; altitude: 1805 m). O radar de Morro da Igreja completa uma varredura volumétrica a cada 10 min, contemplando 15 elevações, e com uma abertura de feixe de 1,98. Os PPIs analisados foram para a elevação de 0,5o da antena, dentro do raio de cobertura de 250 km, setor este que inclui o extremo nordeste do RS. Estas imagens foram empregadas para caracterizar melhor o deslocamento de algumas das células convectivas responsáveis pelos ventos destrutivos registrados no norte-nordeste do RS.

 

 

3 Resultados e discussões

A figura 1 informa a localização geográfica dos municípios do Rio Grande do Sul atingidos por ventos destrutivos durante o evento de tempo severo de 07 e 08 de junho de 2017, com base nos registros de destruição. Os danos relatados in situ incluíram vegetação alta tombada a partir da raiz ou decepada no tronco, veículos virados, e casas destruídas e/ou destelhadas. A figura 2 exemplifica o tipo de destruição relatada em três dos municípios afetados: Maratá, Charrua e Caxias do Sul. Os painéis (a) e (b) mostram danos registrados em Maratá, como casa de alvenaria parcialmente destruída, tombamento de um caminhão, e árvores decepadas. Destruição semelhante também foi registrada, respectivamente, em Charrua e Caxias do Sul, com o tombamento de árvores mostrado no painel (c) e o destelhamento e destruição parcial de residências no painel (d). Neste ponto é relevante informar que não foi objetivo deste trabalho buscar classificar a intensidade de tornados; isto é justificado pela ausência de elementos suficientemente detalhados para uma avaliação dos indicadores de destruição e de graus de destruição necessários para a aplicação da escala de Fujita aprimorada (McDonald e Mehta, 2006).

 

Figura 1 – Mapa do estado do Rio Grande do Sul informando a região de estudo (polígono vermelho). Os indicadores numerados sinalizam os municípios mais atingidos pelos ventos destrutivos no evento de tempo severo entre 7 e 8 de junho de 2017. A lista com a numeração correspondente aos municípios também é informada. Os tons de verde mais escuro indicam setores com maior densidade de vegetação natural. Mapa-base: Google Maps.

 

Figura 2 – Exemplos de danos registrados nos municípios mais atingidos pelos ventos intensos. Os painéis (a) e (b) mostram, respectivamente, fotografias de uma casa de alvenaria parcialmente destruída e de um caminhão tombado no município de Maratá (fotos de Nádia Gandino). O painel (c) evidencia a queda de árvores no município de Charrua (foto da Rádio Tapejara), e o painel (d) mostra o destelhamento de casas e a parcial destruição de algumas residências em Caxias do Sul (foto de Ricardo Daneluz)

 

Os danos identificados por esta primeira etapa foram georreferenciados com o auxílio do Google Earth. Partindo-se do levantamento dos setores com registros in situ de destruição, buscou-se, com as ferramentas-web GFC e GFW, uma sequência de faixas de danos na cobertura arbórea. Esta característica foi confirmada para 8 municípios, como exemplificado pela figura 3 para uma localidade no município de Capão Bonito do Sul. A imagem do Landsat 8, já pós-processada pelo algoritmo do GFW, refere-se a 22 de junho de 2017. Os pixels em rosa delimitam áreas onde mudança na cobertura da vegetação foi identificada em comparação com a imagem anterior ao evento de tempo severo.  Deve-se notar que estes setores não são contínuos dada     a heterogeneidade da vegetação e da ocupação do solo na região analisada. O algoritmo empregado pelo GFW foi concebido primordialmente para o monitoramento de alterações de vegetação arbórea de maior porte, como em florestas. Assim, no caso da região analisada neste estudo, apenas os fragmentos de vegetação mais alta (p.ex., capões isolados) danificados pelos ventos é que foram detectados nesta etapa intermediária, o que explica a descontinuidade dos pixels destacados na cor rosa. Contudo, é notória a disposição das áreas de alteração arbórea ao longo de uma trajetória linear com orientação NO-SE, que coincide com o deslocamento observado das tempestades severas durante aquele evento como caracterizado pelas imagens do satélite meteorológico geoestacionário GOES-13 (não mostradas) e por imagens de radar, a serem analisadas mais adiante.

 

Figura 3 – Região atingida por ventos intensos no município de Capão Bonito do Sul/RS. Painel (a): pixels em rosa correspondem aos pontos que perderam cobertura arbórea como detectado pelo algoritmo da ferramenta-web GFW entre os meses junho e julho de 2017. Uma escala de distância é fornecida no canto inferior direito da imagem; o polígono em azul indica a localização de uma propriedade onde houve destelhamentos (fonte: rádio "Tua Rádio"). O painel (b) refere-se à região dentro do polígono amarelo do painel superior e mostra uma imagem de alta resolução do Google Earth datada de 02/07/2017 e gerada pelo satélite SPOT-5. Esta imagem é centrada nas coordenadas 28o05’S e 51o25’O, e destaca o gradiente de danos na vegetação e o sentido de queda de algumas árvores; vide texto para mais detalhes

 

Composições RGB de imagens anteriores e posteriores ao evento meteorológico obtidas dos satélites Landsat 8 e Sentinel 2 (não mostradas) foram analisadas de maneira a verificar se a mudança da cobertura de vegetação era consistente com danos associados a ventos locais intensos, ao invés de atuação humana. Para esta etapa, as imagens dos satélites que alimentam o Google Earth também foram utilizadas, uma vez que disponibilizam uma resolução mais alta. Um exemplo do resultado deste procedimento é apresentado na figura 3b para a mesma localidade em Capão Bonito do Sul, porém mostrando a imagem do satélite SPOT-5 (disponibilizada pelo Google Earth) referente ao dia 02 de julho de 2017 e ampliada para o setor delimitado pelo polígono em amarelo no painel (a) da mesma figura. A imagem ampliada mostra árvores tombadas em direções distintas e seguindo um padrão convergente. Além disto, é possível perceber o forte gradiente horizontal da intensidade dos danos na vegetação dada a presença árvores de pé no canto sudoeste da imagem. Estas características combinadas são típicas de danos causados por tornados na vegetação.

 

Figura 4 – Região atingida por ventos intensos no município de Maratá/RS. Painel (a): imagem do satélite Landsat pós-processada pelo algoritmo da ferramenta-web GFC, onde os pixels em rosa correspondem aos pontos que perderam cobertura arbórea para o ano de 2017 (ver texto para detalhes). Painel (b): imagem (composição de falsa cor) do satélite Sentinel 2 centrada em 29o30’S e 51o25’O para o dia 07/07/2017 ressaltando o mesmo domínio espacial exibido em (a); as setas amarelas destacam dois setores onde há um intenso gradiente horizontal no albedo da superfície; uma escala de distância é fornecida no canto superior direito da imagem. Em ambos os painéis as linhas vermelhas paralelas destacam a faixa com alteração substancial na vegetação

 

A análise acima, combinando o registro in situ de danos, pós-processamento de imagens de satélites ambientais pelas ferramentas-web GFC e GFW, e a inspeção mais detalhada das imagens de satélites nos setores de danos mais significativos, foi repetida para diversos pontos dos municípios indicados na figura 1. Com o uso da ferramenta de estimativa de distância do Google Earth foi possível estimar a largura máxima e o comprimento das trajetórias de destruição encontradas. Ressalta-se que somente foram consideradas as trajetórias que apresentaram configurações consistentes com o fenômeno tornado, como exemplificado para Capão Bonito do Sul. A maior trajetória de danos encontrada apresentou um comprimento de 18,8 km e é mostrada na figura 4, iniciando-se no município de Maratá e prosseguindo de NO para SE pelos municípios vizinhos de São José do Sul e Harmonia (localizados entre os indicadores 1 e 9 na figura 1). A trajetória de alteração da vegetação detectada pela ferramenta GFC é exibida na figura 4a; ela é linear e praticamente contínua. Na imagem correspondente à composição de falsa cor (bandas 4,3,2) do satélite Sentinel 2 (figura 4b), nota-se o mesmo rastro que se manifesta através de uma faixa de maior albedo, consistente com a queda das árvores. Nota-se que há um forte gradiente horizontal do albedo delimitando a superfície que foi modificada pela passagem dos ventos intensos, a qual apresenta um comprimento muito maior que a largura. A etapa de levantamento de danos registrados in situ encontrou, em pontos dentro desta trajetória linear, relatos da Defesa Civil do RS descrevendo residências destruídas, árvores decepadas e o tombamento de um caminhão. Quando as informações destas fontes distintas (i.e., in situ e remotas) são combinadas, as evidências da ocorrência de um tornado tornam-se mais fortes. Além disto, o uso das imagens de alta resolução disponíveis no Google Earth (não mostradas para este exemplo) foi fundamental para uma estimativa mais refinada da extensão do rastro no canto sudeste da figura 4. Nesta região a menor largura da trilha e a presença de povoamentos gerou descontinuidades no rastro detectado pelos algoritmos das ferramentas-web. Neste sentido, a análise complementar com as imagens de resolução mais alta advindas do Google Earth permitiu identificar residências destelhadas e a queda de árvores de maneira convergente dentro da trajetória de danos.

Outra região atingida pelos ventos destrutivos foi a localidade de Vila Oliva, distrito do município de Caxias do Sul. Da mesma maneira, partindo-se dos relatos de danos pela mídia, identificou-se com os algoritmos das ferramentas-web GFW e GFC uma trilha de vegetação modificada naquele setor (não mostrada). A figura 5 exibe uma imagem de 18 de julho de 2017 obtida do satélite Geo-Eye 1 (via Google Earth) setorizada sobre uma região identificada pelo algoritmo do GFW, assim como uma fotografia aérea tirada a partir de um ultraleve pelo piloto Daniel dal Magro (única fotografia aérea disponível para este estudo). A imagem de satélite e a fotografia cobrem a mesma área e demonstram uma faixa de danos alongada e de largura muito bem delimitada, com um forte contraste entre a vegetação intacta e a danificada. Como nos exemplos anteriores, a orientação desta faixa também é NO-SE, e com o comprimento muito maior do que largura. Com o uso do software Google Earth, a trajetória de danos ficou caracterizada com tendo comprimento de 6,39 km. Nesta localidade os relatos da Defesa Civil descreveram casas destruídas e um caminhão tombado; ou seja, indícios de velocidade do vento extraordinariamente alta. Estes aspectos combinados são condizentes com a passagem de um tornado.

 

Figura 5 – Painel (a): imagem pós-evento (18/07/2017) do satélite Geo-Eye em passagem sobre a localidade de Vila Oliva/RS, obtida do Google Earth e centrada nas coordenadas 29o12’S e 50o54’O. Painel (b): fotografia aérea realizada a partir de um ultraleve no dia 02/07/2017 na mesma localidade destacando o rastro linear de destruição na vegetação (autor: Daniel dal Magro); atente para a orientação da direção norte. O ponto e segmentos de reta amarelos em (a) indicam o ponto e ângulo de visada da fotografia aérea

 

Para fornecer algumas informações adicionais sobre o episódio registrado em Vila Oliva, a figura 6 mostra uma sequência de PPIs (elevação 0,5o) do campo de refletividade horizontal do radar de Morro da Igreja para o período em que células convectivas deslocavam-se no nordeste do RS. A destruição em Vila Oliva foi relatada como ocorrendo no meio da madrugada do dia 08/06/2020. De todos os setores com danos analisados, apenas o setor da região de Caxias do Sul contou com informações de radar disponíveis dada sua posição geográfica dentro do raio de 250 km de vigilância do radar de Morro da Igreja. A sequência de imagens mostra que duas células intensas, apresentando refletividades acima de 60 dBZ, deslocavam-se de NO para SE na direção de Vila Oliva, representada pelo círculo preto nas imagens. Não foi possível determinar qual das duas células foi responsável (ou se ambas foram responsáveis) pelos ventos destrutivos relatados, porém o deslocamento das mesmas coincide com a orientação NO-SE dos rastros de danos reportados naquele evento. Dada a grande altura do feixe do radar nesta região, os baixos níveis das células não puderam ser amostrados; porém, é importante ressaltar que o modo convectivo foi de células isoladas e não uma Linha de Instabilidade, a qual geralmente favorece mais a ocorrência de rajadas de vento intensas em linha reta e sobre áreas mais amplas. De qualquer forma, é importante dizer que a confirmação do(s) evento(s) de tornado só foi realizada após a conclusão das etapas de análises de danos.

 

Figura 6 – Sequência de PPIs na elevação de 0.5o para a refletividade horizontal (dBZ) do radar do Morro da Igreja na madrugada do dia 08/06/2020 (horários informados em cada painel). O círculo vermelho informa a posição do radar, e as imagens referem-se ao modo de vigilância no raio de 250 km. As setas em preto indicam as células convectivas responsáveis pelos danos por vento intenso no Município de Caxias do Sul, e o círculo preto informa a localização do distrito de Vila Oliva. Os contornos do litoral do RS e da divisa RS-SC também são mostrados. (Fonte de dados: DECEA e Divisão de Satélites Ambientais do INPE)

 

Como último exemplo de rastro a ser discutido, o caso de Erebango/RS ilustra uma situação em que imagens de satélites ambientais obtidas apenas poucos dias após o evento de tempo severo podem auxiliar na caracterização de trajetórias de danos mesmo sobre superfícies de vegetação baixa. As figuras 7a e b mostram composições de falsa cor (compostas pelas bandas 4,3,2) do satélite Sentinel 2, setorizadas sobre uma região de danos detectada pelo algoritmo GFW, válidas para os dias 29/03/2017 (imagem sem cobertura de nuvens mais próxima do evento; painel (a)) e 17/06/2017 (painel (b), pós-evento). Entre as duas imagens existem várias diferenças de albedo da superfície, a maioria associada a mudanças do estágio de crescimento das culturas agrícolas; contudo, salienta-se, na imagem pós-evento, uma faixa estreita com orientação NO-SE apresentando maior albedo, mesmo em pontos cuja vegetação é mais rasteira (áreas em verde claro). Tipicamente, as condições de vegetação rasteira representam situações em que a caracterização de rastros de danos por tornados ou vendavais com imagens de satélites ambientais é dificultada. Neste exemplo a detecção foi possível dada a oportunidade que existiu em obter-se uma imagem sem nebulosidade poucos dias após o evento meteorológico, de modo que a assinatura da modificação das características radiativas espectrais das superfícies ainda era distinguível. Esta faixa se localiza dentro de um setor maior de vegetação modificada identificado pelos algoritmos GFC e GFW (não mostrado), indicando uma continuidade da trajetória de destruição na vegetação rasteira entre capões de vegetação mais alta também danificados.

 

Figura 7 – Primeira linha: imagens de composição das bandas 4,3,2 do satélite Sentinel 2 referentes à data antecedente (29/03/2017; painel (a)) e posterior (17/06/2017; painel (b)) ao episódio de ventos destrutivos, setorizadas sobre um trecho do rastro de destruição no município de Erebango. Em (b) as setas amarelas destacam a trilha de destruição deixada na vegetação rasteira. O polígono amarelo em (a) corresponde à região que é ampliada nos painéis (c) e (d), os quais mostram imagens de resolução mais alta do satélite WorldView-3 (Google Earth) para as datas pré- e pós-evento informadas no canto superior direito de cada painel. A seta vermelha em (d) indica a vegetação arbórea diretamente afetada pelos ventos em contraste com a vegetação que permaneceu de pé, sinalizada pelas setas amarelas

 

A alteração da superfície descrita com as figuras 7a e b é perceptível também na comparação entre imagens de alta resolução geradas pelo satélite WorldView-3 (Google Earth) para os dias 28/10/2016 e 02/10/2017 (figuras 7c e d), respectivamente, anterior e posterior ao caso de tempo severo. Estas imagens estão ampliadas para o setor indicado por um polígono amarelo na figura 7a.  Apesar do grande intervalo temporal entre as duas imagens e o período de cerca de 4 meses entre a imagem pós-evento      e o episódio de ventos intensos, ainda é possível evidenciar, em comparação com a imagem pré-evento, uma faixa de árvores destruídas, indicada pela seta vermelha em 7d. Em contraste, ao norte e ao sul desta vegetação danificada, as setas amarelas salientam vegetação arbórea não danificada. Utilizando a escala de distância fornecida na figura, a largura da faixa de vegetação derrubada foi da ordem de algumas centenas de metros. Além disto, imediatamente à SE do setor indicado pela seta vermelha, nota-se também a ausência de algumas árvores em comparação com a imagem antecedente ao evento.

 

Figura 8 – Imagens centradas em 27o06’S e 49o42’O do satélite Landsat 8 anterior (painel a) e posterior (painel b) à provável ocorrência de uma microexplosão no município catarinense de Presidente Getúlio em 12/06/2018. Painel (a): imagem obtida no começo do mês junho de 2018, ainda sem alterações na vegetação; painel (b): imagem obtida no final do mês de julho de 2018 mostrando a região central (destacada pela linha tracejada) com albedo distinto devido à modificação causada pelo vento intenso na vegetação

 

O fato do comprimento da trajetória de danos ser bem maior do que sua largura é mais típica de tornados e difere do padrão de danos ocasionado por correntes descendentes intensas (microexplosões). Para efeito de contraste, a figura 8 é mostrada como um exemplo (não relacionado ao evento estudado neste trabalho) de danos ocasionados por uma provável microexplosão no município catarinense de Presidente Getúlio em 12/06/2018. As imagens referem-se ao satélite Landsat 8 para datas anterior (painel(a)) e posterior (painel (b)) ao evento. É possível notar que o setor afetado pelos ventos intensos e com derrubada de vegetação arbórea (representada pelo aumento de albedo) apresenta comprimento e largura semelhantes, seguindo uma estrutura aproximadamente circular, o que destoa dos padrões de trajetórias de danos aqui analisados.

 

Figura 9 – Distribuição espacial das trilhas de danos identificadas via sensoriamento remoto para o setor norte-nordeste do RS associadas ao evento de tempo convectivo severo de 07-08/06/2017. A numeração das trilhas segue a estipulada na tabela 1, sendo ordenada pela extensão do rastro. Os rastros 1 a 7 estiveram associados a tornados

 

Tabela 1 – Municípios com relatos de danos associados a ventos locais intensos ocorridos em 7-8 de junho de 2017 no RS. A extensão informada em km é o comprimento da respectiva trilha de danos estimado com os satélites ambientais. A ausência desta informação significa a não identificação de uma trilha de destruição via sensoriamento remoto apesar dos danos relatados em superfície. Para o município de Veranópolis não foi possível caracterizar a trajetória de destruição como sendo associada a um tornado

Município

Extensão aproximada (km)

1. Maratá/São José do Sul/Harmonia

18,8

2. Erebango

10,7

3. Espumoso/Soledade

10,0

4. Charrua/Tapejara

9,4

5. Capão Bonito do Sul

8,6

6. Colorado

7,3

7. Caxias do Sul

6,4

8. Veranópolis (*)

2,0

São Sebastião do Caí

-

Fontoura Xavier

-

Barros Cassal

-

 

Os mesmos procedimentos de análise descritos acima foram repetidos para todas as localidades onde danos foram registrados no norte-nordeste do RS. Estas localidades são listadas na Tabela 1 junto com os comprimentos das respectivas trilhas de destruição. Para as três últimas localidades não foi possível detectar uma trilha de destruição via sensoriamento remoto apesar da existência de relato de danos in situ. Já para a localidade de Veranópolis, para a qual uma trajetória de danos de 2 km foi confirmada pelo imageamento via satélite, não foi possível caracterizar a destruição como sendo associada a um tornado. A trilha no interior do município de Veranópolis localizou-se numa região de relevo acidentado e vegetação alta; esta última característica foi um fator que permitiu que os algoritmos das ferramentas-web GFC e GFW acusassem a alteração na cobertura da vegetação. Por outro lado, ao contrário do que foi observado nas demais trilhas de danos analisadas, nenhuma propriedade rural foi diretamente atingida, com os registros in situ limitando-se apenas a postes inclinados ou tombados. Além disto, a configuração espacial da região afetada guardou alguma semelhança com o que geralmente é atribuído à ocorrência de microexplosões (Fujita, 1981). A figura 9 exibe a distribuição espacial de todas as trilhas identificadas neste estudo. Reitera-se mais uma vez que a orientação NO-SE de todas os rastros coincidiram com o deslocamento observado das tempestades registradas durante o evento, como exemplificado na figura 6.

 

 

4 Conclusões

Neste trabalho ficou ratificada a importância do imageamento ambiental com satélites de órbita baixa como uma ferramenta útil para melhorar o registro de episódios de tornados no Brasil.  Como consequência direta disto, ficou também caracterizada a sub-notificação de ocorrências de tornados uma vez que o evento noturno de tempo severo de junho de 2017 estudado aqui não contou com a confirmação visual de nenhum tornado e nem com uma análise de danos no local. Foi possível catalogar para este episódio um total de sete trajetórias de danos típicas de tornados através de uma combinação judiciosa de algoritmos objetivos e análises subjetivas de imagens de satélites ambientais de órbita baixa. É interessante notar que este evento guarda várias semelhanças com um outro episódio tornádico de inverno registrado no noroeste gaúcho um ano depois, em junho de 2018, para o qual imagens de satélites ambientais também foram úteis na caracterização das trajetórias de danos (Lopes et al., 2018). Desta forma o uso de sensoriamento remoto via satélite permite agregar aos bancos de dados de tempo severo um conjunto de eventos para os quais não há disponível imagens do fenômeno e nem análise de danos. Isto contribui para um melhor entendimento acerca da ocorrências de tornados no Brasil.

As ferramentas de monitoramento de alteração na cobertura florestal GFW (Global Florest Watch) e GFC (Global Florest Change) mostraram-se úteis em apontar trilhas lineares de alteração da cobertura vegetal que, no episódio aqui investigado, estiveram associadas à passagem de tornados. Como ponto de dificuldade encontrado, pode-se citar o fato de que a presença de lavouras intercaladas com a vegetação florestal nas regiões rurais gera descontinuidades nas trajetórias detectadas pelos algoritmos utilizados pelo GFC e GFW. No entanto, ao combinar esta informação com uma análise detalhada das imagens provenientes de diferentes satélites ambientais é possível caracterizar a natureza do fenômeno, seja pela disposição dos elementos danificados, seja pelo formato linearmente alongado e de largura bem delimitada da trajetória de danos (Shikhov e Chernokulsky, 2018). Jedlovec et al. (2006) verificaram que, dependendo da condição do uso de solo, danos com intensidade F1 ou superior na escala de Fujita podem ficar bem evidentes em imagens de satélites ambientais como o Landsat. Por outro lado, deve-se tem em mente que esta abordagem é limitada pela resolução espacial dos imageadores embarcados nos satélites. Assim, ocorrências de tornados de muito curta duração e/ou de baixa intensidade podem ser de difícil detecção.

Efetivamente os rastros catalogados neste trabalho apresentam fortes características tornádicas, sendo inconclusivo apenas o caso de Veranópolis que apresenta menos evidências. Assim, danos associados a correntes descendentes dentro deste trabalho poderiam estar associados aos locais onde não foi possível detectar rastros, como São Sebastião do Caí e Fontoura Xavier.

Como discutido em Negrón-Juárez et al. (2010, 2017, 2018), a destruição infligida pelos ventos sobre a vegetação mais alta e permanente também pode ser aplicada para a identificação de danos por outras formas de ventos intensos associados a tempestades severas. Para regiões de solo nu e vegetação rasteira, como é o caso do bioma Pampa no RS (que não é o bioma do setor estudado neste trabalho), esta abordagem pode se tornar bem mais limitada. É possível que a detecção de trajetórias de danos por ventos intensos nestas regiões ocorra apenas em situações específicas, quando a passagem do satélite sobre o setor de interesse acontece pouco após a ocorrência do evento meteorológico, permitindo a identificação de marcas em áreas de pasto, como exemplificado neste estudo no rastro de danos em Erebango.

Dando continuidade a este estudo, o procedimento de subtração de imagens entre o período anterior e posterior ao evento será aplicado para todas as trajetórias de danos identificadas. A análise de componente principais aplicada ao resultado desta subtração, como realizado em Yuan et al. (2002); Marcelino et al. (2007), também pode ser aplicada em trabalhos futuros para a extração de maiores informações dos rastros.

 

 

Agradecimentos

Os autores agradecem aos organizadores do II Encontro de Meteorologia do Estado de Santa Catarina pelo incentivo à publicação deste trabalho, e também ao piloto Daniel dal Magro pela cessão da fotografia obtida de um ultraleve sobre um rastro de destruição por ventos.Gostaríamos de agradecer à Divisão de Satélites Ambientais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (DSA-INPE) e, em particular, ao meteorologista Thiago Biscaro, por disponibilizarem os dados brutos de radar usados neste estudo. Também ao meteorologista Vitor Goede pelo auxílio na plotagem destes dados. Este trabalho é uma parte integrante do projeto de pesquisa "Análise da previsibilidade de tornados no sul-sudeste do Brasil através da modelagem numérica da atmosfera em escala de tempestade"financiado pelo Edital Universal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq 432741/2016-0). Agradecemos também às críticas e comentários realizados pelos revisores deste artigo que contribuíram para a melhoria do trabalho.

 

 

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