Universidade Federal de Santa Maria
Ci. e Nat., Santa Maria v.42, Special Edition: Micrometeorologia, e31, 2020
DOI:10.5902/2179460X53155
ISSN 2179-460X
Received: 13/08/20 Accepted: 13/08/20 Published: 28/08/20
Special Edition
Modelagem Matemática da Taxa de Armazenamento de Energia em Área de Floresta da Amazônia
Mathematical model of above-ground thermal energy storage rates in a central Amazonian rainforest
Anne Cristiny Santos de MendonçaI
Alessandro Augusto dos Santos MichilesII
I Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Manaus, Brasil. E-mail: anne.demendonca@outlook.com.
II Universidade do Estado do Amazonas, Manaus, Brasil. E-mail: alemichiles@gmail.com.
Estimou-se a taxa de armazenamento
total de energia (S) sobre uma área de floresta de terra firme da Amazônia, por meio
de medições diretas de saldos dos fluxos de calor (S Obs) assim
como por metodologias logradas por Michiles (2009), nas quais empregaram-se
cálculo numérico (S Num) e funções harmônicas simples (S Mod),
esta última, em consequência da heterogeneidade e biodiversidade da Floresta
Amazônica, dos erros e das dificuldades inerentes às medições, aplicou-se uma
quantidade reduzida de dados. Fizeram-se uso de um conjunto de informações
florestais e de variáveis meteorológicas coletadas durante a estação seca de
2003, no decorrer do programa LBA (Experimento de Larga Escala da Biosfera
Atmosfera na Amazônia), mediante sistemas instalados numa torre
micrometeorológica de alumínio, montada na Reserva Biológica do Cuieiras. Nesse
período, selecionaram-se dias com pouca perturbação atmosférica e sem
precipitação pluviométrica. Em termos máximos médios diários, apresentou as maiores
magnitudes, chegando até 200 W m-2, enquanto que
e
permaneceram com
valores mais baixos, cerca de 62 e 108 W m-2, respectivamente. Por
volta de 17 e 18 h, iniciou-se o processo de liberação de energia, com todas as
taxas tornando-se negativas, alcançando magnitudes mínimas diárias entre -45 e -67 W m-2.
Palavras-chave: Floresta Amazônica; Armazenamento de Energia; Fluxos de Calor.
The total above-ground
thermal energy storage rate (S)
over
an area of a “terra firme” forest site in central Amazonia, Brazil, were
estimated through of the direct measurements of heat flux componentes (S
Obs) as well as through methodologies proposed by Michiles (2009), in
which numerical analysis (S Num) and simple harmonic functions (S Mod)
were applied, this last one, due to heterogeneity and biodiversity of the
Amazon rainforest, of difficulties and errors related with measurement, a
limited range of data were used. Were determined, during dry season of 2003, a
set of forest information and meteorological variables measured through systems
installed in a micrometeorological tower, assembled at Reserva Biológica do
Cuieiras. In this period, days without rainfall and with little atmospheric
disturbances were selected. In the daily average maximum behavior, showed the highest
magnitudes, reaching up to 200 W m-2, while
and
remained with lower
values, about 62 and 108 W m-2, respectively. About 5 and 6 pm
(local time), the energy release process was started, with all rates becoming
negative and the daily average minimum behavior reached values between -45 and -67 W m-2.
Keywords: Amazonia rainforest; Energy Storage; Heat flux.
1 INTRODUCTION
As florestas tropicais desempenham um papel fundamental no funcionamento do clima regional e global, devido à sua proximidade à linha do Equador e à sua imensa extensão, já que cobrem em torno de 60 % das áreas florestadas, encerrando 17,6 milhões de km2, o que equivale a cerca de 13 % da totalidade da área de superfície continental. Desta área, aproximadamente 40 % é correspondente à Floresta Amazônica, a qual hospeda o mais extenso bloco de floresta tropical úmida do mundo (CARSWELL ET AL., 2002; DIXON ET AL., 1994; MALHI E GRACE, 2000).
No campo de estudos sobre vegetação e clima, Marques Filho et al. (2005), retrata que as trocas de energia e de massa entre coberturas vegetais e a atmosfera têm reguladores próprios na vegetação associados aos aspectos estruturais e fisiológicos que a caracterizam. As relações energéticas que originam e sustentam esses intercâmbios são dirigidas por uma fonte primária de radiação solar externa e independente, complementada pela radiação interna de ondas longas dos elementos vegetais e do solo subjacente à cobertura. Dessa forma, destaca-se a intensa evapotranspiração e a liberação de calor latente, como dois fatores essenciais relativos à região Amazônica. De acordo com Marengo et al. (2009), as florestas bombeiam o calor latente para a atmosfera, com o intuito de equilibrar o intenso aquecimento da superfície por radiação. O vapor de água liberado é uma das principais fontes de umidade, contribuindo para geração de precipitação regional e, durante o verão do Hemisfério Sul, a extensa convecção tropical transporta o calor latente para a troposfera, distribuindo-o para as zonas temperadas, fornecendo uma forte fonte de calor troposférico para a circulação global atmosférica.
O clima da região é o resultado da combinação de vários fatores, sendo que a disponibilidade de energia solar, por meio do balanço de energia em superfície (BES), é o elemento de maior importância. Destarte, segundo Michiles e Gielow (2008), a análise deste balanço em florestas é necessária para a compreensão dos processos climáticos envolvidos com os componentes da vegetação e de seus efeitos em diversas escalas espaciais e temporais, e merecida consideração, deve ser dirigida à taxa de armazenamento de energia (TAE) no volume ocupado pelas partes constituintes da vegetação e pelo ar adjacente, pois a mesma pode aparecer como um termo importante para o fechamento deste balanço, particularmente em curtos períodos de tempo, menores que um dia. Entretanto, é particularmente difícil, e suscetível a muitos erros, medir as trocas de energia numa floresta tropical, em circunstância da notável heterogeneidade em espécies e tamanhos de árvore (MONTENY ET AL., 1985). Neste contexto, a importância da Floresta Amazônica no controle do clima tem estimulado diversos estudos nas últimas décadas, mediante desenvolvimento de modelos físico-matemáticos e de experimentos de campo, com o intuito de se obterem informações mais precisas sobre as contribuições da região para as trocas de energia com a atmosfera e, sobretudo, de identificar as mudanças derivadas de atividades humanas sobre esses processos.
O principal objetivo deste trabalho foi determinar a TAE total do sistema termodinâmico solo-vegetação-atmosfera, para dias com pouca perturbação atmosférica e sem precipitação pluviométrica, por meio de modelagem matemática simplificada, cálculo numérico, e pelo saldo dos fluxos de calor medidos em floresta de terra firme, especificamente, na Reserva Biológica do Cuieiras (Rebio Cuieiras). Os objetivos específicos foram calcular a TAE total: i) a partir de dados de temperatura do ar e do tronco modeladas via funções harmônicas simples; ii) via cálculo numérico, utilizando medidas de temperatura do ar e do tronco coletadas na floresta; iii) utilizando medidas diretas de densidades de fluxo de calor e saldo de radiação, coletadas na Rebio Cuieiras, durante a estação seca de 2003.
2 Metodologia
Os dados foram coletados durante o Experimento de Larga Escala
da Biosfera Atmosfera na Amazônia (“Large Escale Biosphere-Atmosphere
Experiment in Amazônia” – LBA), entre 1º de setembro de 2003 e 31 de maio de
2004, por meio de quatro sistemas instalados numa torre micrometeorológica de
alumínio, de 54 m de altura, na Reserva Biológica do Cuieiras, descrita como
torre K34 por Araújo et al. (2002), situada cerca de 50 km a noroeste da cidade
de Manaus-AM, na Amazônia central. A interface solo-vegetação-atmosfera foi
dividida em camadas de espessuras diferentes, onde os níveis em que se
realizaram as medições das temperaturas do ar foram 5,2; 15,6; 28,0; 35,5; 42,5
e 51,1 m. Já as temperaturas dos troncos foram coletadas em 1,5; 9,0 e 18,0
metros, porém em cada altura, instalaram-se sensores em três profundidades radiais
do tronco: que foram 0,5; 3,0 e 10,0 cm. Além disso, obtiveram-se dados
referentes ao saldo de radiação (em 48,0 m), fluxo de calor no solo (5,0 cm
abaixo da superfície do solo) e densidades de fluxo turbulento de calor
sensível e calor latente (em 53,1 m), todos em .
Considerando que os dias com pouca perturbação atmosférica foi uma das premissas deste trabalho, designaram-se os meses de setembro e outubro de 2003, para descrever a estação seca para a Rebio Cuieiras. Contudo, nesse período houve precipitação e falhas no conjunto de dados coletados (em razão de frequentes problemas de funcionamento dos instrumentos instalados no sítio). Diante disso, para manter o rigor indispensável às análises realizadas nesta pesquisa, optou-se pelo não preenchimento artificial de falhas, reduzindo-se assim, o número de dias selecionados. Destarte, foram selecionados 10 dias típicos não necessariamente consecutivos, cujos dados estão completos, ou seja, dos 61 dias de medições da estação seca, apenas 10 dias apresentaram condições de pouca perturbação atmosférica nos quais não houve precipitação pluviométrica e/ou falha nos dados coletados.
2.1 Taxa de Armazenamento de Energia
O BES constitui um dos alicerces mais fundamentais da micrometeorologia de florestas moderna, evidenciando a chegada, a saída e o armazenamento de energia no volume ocupado pela vegetação e suas circunvizinhanças (FINNIGAN ET AL., 2001). A energia disponível para os processos físico-biológicos provém do Sol, porém, é por meio da superfície terrestre (floresta tropical, pastagem e/ou água), que ela é redistribuída para a atmosfera. Este processo denomina-se “partição de energia”. Portanto, é necessário conhecer e avaliar o BES, que é a contabilidade dos termos de troca energética sobre uma superfície de suficiente extensão horizontal (floresta ou pastagem) (GALVÃO, 1999). Para obter uma equação simplificada para o balanço de energia em uma superfície ideal, quando não há advecção e fazendo uso do conceito de volume de controle, Arya (2001) assumiu que essa superfície se refere a uma interface muito pequena entre dois meios, não considerando massa e capacidade térmica. Os fluxos de energia devem fluir para dentro e para fora de tal superfície sem que ocorra perda ou ganho devido à superfície. Assim, baseada no princípio da conservação da energia, a equação do BES pode ser escrita, de maneira simplificada, como:
|
(1) |
na qual é a TAE (ou variação da energia
interna, na primeira lei da termodinâmica) no interior da vegetação;
é o
saldo de radiação;
e
são os fluxos turbulentos
verticais de calor sensível e de calor latente devido à evapotranspiração, com
e
representando, respectivamente,
o calor latente de vaporização da água e densidade de fluxo de massa de vapor
de água;
é o fluxo, por condução, de
calor no solo. Todos os termos da equação acima são em
, sendo que, separadamente,
e
são dados, respectivamente, em
e
.
De acordo com Michiles (2009), a TAE é definida, como a taxa de
variação temporal de energia (dada em
) armazenada num volume
, causada pelo fluxo de calor
que ocorre através da superfície
externa desse volume, por unidade de área de solo
:
|
(2) |
na qual 𝜌 é a massa específica, 𝑐 é o calor específico, e 𝑇 é a temperatura da substância que compõe o volume 𝑉. Dessa forma, neste trabalho foram utilizados três métodos para determinação da TAE na floresta. O primeiro foi realizado a partir da equação do BES (Eq.1), empregando os valores do saldo de radiação, dos fluxos turbulentos verticais de calor sensível e de calor latente, e do fluxo de calor no solo medidos diretamente na floresta de interesse. Os outros dois processos tiveram como base a equação 2, entretanto um deles trata-se de uma abordagem analítica, na qual as séries de temperatura do ar e dos troncos serão obtidas mediante modelagem matemática e, por fim, a variação da energia interna também foi lograda por meio de métodos numéricos.
2.1.1 Modelagem Matemática das Séries de Temperatura
Sendo a temperatura no instante 𝑡,
observou-se que, para dois dias diferentes, é possível obter duas curvas que
não são, em geral, as mesmas. Estas curvas são chamadas trajetórias do processo
físico que está sendo observado, no qual cada trajetória denomina-se série
temporal. Portanto, para dias sem precipitação pluviométrica e pouca
perturbação atmosférica (Figura 1a), foi possível aproximar as séries
de temperatura do ar e dos troncos por meio da função harmônica, dada por:
|
(3) |
na qual ,
e
são, respectivamente, a
temperatura média, a amplitude (diferença entre os valores máximo e mínimo da
temperatura), e o ângulo de fase. A grandeza
é chamada frequência angular e
possui a dimensão do inverso do tempo, ou seja,
, com 𝜏 correspondente ao período do movimento
(24 horas).
A partir da Figura 1b, nota-se que a série de temperatura do ar
observada (dados medidos) por diferentes instrumentos, na Rebio Cuieiras,
correlaciona-se melhor durante períodos com baixa perturbação atmosférica. Esta
conjuntura confirmou-se por meio do ajuste linear entre os dados e o
coeficiente de determinação relacionado (Figura 1c), com
este último, conforme Barroso et al. (1987), sendo utilizado para medir a
qualidade do ajuste linear simples, sendo
. Logo, quanto mais próximo o
coeficiente de determinação estiver da unidade, melhor será o ajuste.
Figura 1 – Perfil médio do dia 06/09/2003 referente aos: (a) saldos de radiação observados; (b) temperaturas do ar observadas e modeladas, para intervalos de meia hora; (c) ajuste linear entre valores horários de temperaturas do ar observados e modelados, coletados na altura de 5,2 m
Fonte: Autor, 2018.
Seja ; para a realização do cálculo da
variação da energia interna dos termos acima do solo, a partir da equação 2, e
de dados de temperatura do ar e do tronco modelados via equação 3, fez-se
necessário obter regressões polinomiais pelo método dos quadrados mínimos,
entre as funções 𝑇′(𝑡) obtidas
mediante o modelo matemático e os níveis de referência
relacionados, com o objetivo de
encontrar coeficientes
tais que a função
se aproximasse ao máximo de
no intervalo
. Ou seja:
|
(4) |
com . Dentro do critério dos
quadrados mínimos, segundo Ruggiero et al. (1997), os coeficientes
são os que minimizam a função.
Geometricamente, isto significa que a área entre as curvas 𝑇′(𝑡) e 𝑓(𝑧) é mínima.
Entretanto, dentre as componentes de na biomassa, a TAE nos troncos é
a mais difícil de estimar visto que esta depende de medições de temperatura
verticais e radiais, e exigem-se informações a respeito da distribuição das
espécies e de sua biomassa, das propriedades térmicas e das dimensões dos
troncos que compõem a floresta. Além disso, em florestas naturais, há um grande
número de espécies de árvores que reverte numa larga banda de dimensões
espaciais e propriedades térmicas de tronco. Desta maneira, quando não se
dispõem de medidas de perfil de temperatura nos troncos
), o método mais simples é aproximar
usando diretamente a temperatura
do ar. Observando o perfil diário apresentado na Figura 2a, nota-se que há uma
relação de fase e amplitude entre as medições de temperaturas dos troncos e
temperaturas do ar, na Rebio Cuieiras. Portanto, a partir dessas relações,
foram modeladas, conforme ilustrado na Figura 2b, a série temporal de
, para cada dia selecionado. Observa-se
a eficiência dessa aproximação por meio do ajuste linear entre os valores de
temperatura do tronco observados (medidos) e os valores de
modelados, e da obtenção do
coeficiente de determinação igual a 0,90 (Figura 2c).
Figura 2 – Perfil médio do dia 06/09/2003 referente à: (a) relação de fase e amplitude entre temperaturas do ar e do tronco observadas; (b) temperaturas do tronco observadas e modeladas; (c) ajuste linear entre valores horários de temperaturas do tronco observadas e modeladas, na altura de 9,0 m e profundidade radial de 0,5 cm
Fonte: Autor, 2018.
2.1.2 Métodos Numéricos
Ao tentar representar um evento do mundo físico por meio de um
método matemático, raramente se tem uma descrição correta desse fenômeno.
Normalmente, são necessárias várias simplificações do mundo físico para que se
tenha um modelo. Assim, neste estudo, foram utilizados recursos numéricos para
encontrar soluções “aproximadas” das componentes de a fim de comparar os resultados
com aqueles obtidos via modelagem matemática simplificada. A avaliação do
modelo foi realizada por intermédio da obtenção dos coeficientes linear (ponto
de interceptação do eixo das ordenadas), angular (inclinação da reta) e de
determinação
, de regressões lineares entre os
valores de meia hora das densidades de fluxos de calor, modelados e numéricos.
O ajuste ideal é representado pelos valores 0, 1 e 1 para os coeficientes
linear, angular e de determinação, respectivamente.
Nesta conjuntura, a partir de medições das séries de temperatura do ar e do tronco, coletadas na floresta de interesse, foi calculada a aproximação de derivadas por meio de diferenças finitas centradas, isto é:
|
(5) |
em que é a diferença entre as
temperaturas subsequente e antecedente, em um intervalo de tempo
. Em situações práticas,
geralmente não se dispõe de um modelo analítico, de uma função a ser integrada,
mas sim de uma tabela de pontos, tornando-se necessária a aplicação de
procedimentos numéricos. Destarte, com base nos resultados das derivações
estimadas em cada instante 𝑡,
as integrais foram logradas utilizando a regra dos trapézios composta, como a
seguir:
|
(6) |
ou seja, a integral de no intervalo
foi aproximada pelas áreas dos
trapézios de base menor
, base maior
e alturas das camadas
horizontais
de espessuras variáveis
. Entretanto, tendo em vista que
a temperatura do tronco se altera com os níveis de profundidade radiais
e com os níveis de altura
em que foram instalados os
instrumentos na árvore (escolhida a partir de informações de Oliveira et al.,
2008), a derivada aproximada, fazendo uso de diferenças finitas centradas,
torna-se:
|
(7) |
por conseguinte, tem-se, primeiramente, a integração em cada
raio de tronco , no intervalo [0,𝑅], e seus
respectivos níveis de altura na qual foram encontradas as áreas
referentes a cada anel
concêntrico de tronco
, obtidas pelo método dos
trapézios, por meio da equação:
|
(8) |
em que,
|
(9) |
em seguida, com o processo de integração, análogo ao anterior, e
a partir de cada área determinada, tomando o intervalo
[0,
], e seus respectivos fatores de
correção
, foram logrados os volumes de
tronco relativos a cada camada horizontal de tronco
, na qual
é a variação de altura dessa
camada. Assim:
|
(10) |
3 Resultados e Discussão
Para os resultados observados (medidas diretas das densidades de
fluxo de energia), numéricos e modelados, utilizaram-se as abreviações “Obs”,
“Num” e “Mod”, respectivamente, todos referentes ao conjunto de dias
selecionados. Por meio do princípio da conservação da energia e da utilização
de dados das densidades de fluxo de calor, empregou-se a equação 1, com a
finalidade de se obter a TAE total observada, , para intervalos de meia hora,
correspondente aos 10 dias selecionados. Assim, fez-se uso de medidas diretas
do saldo de radiação (
) e das densidades de fluxo
turbulento de calor sensível (
), de calor latente (
), e de calor no solo (
), coletadas na Rebio Cuieiras.
Quanto ao cômputo da TAE modelada
e numérica
, empregaram-se os valores
horários de temperatura, obtidos por meio da modelagem matemática e dos métodos
numéricos, respectivamente, na equação 2.
Na Figura 3, apresentam-se os perfis médios diários das taxas de
armazenamento, ,
e
. Em geral, observa-se que
se comporta de uma maneira
similar a
, com exceção do fluxo de energia
ter sido invertido aproximadamente três horas antes de
, ainda durante o ciclo noturno,
e que a magnitude mínima de
teve um acréscimo em torno de 40
%, ao passo que a amplitude máxima foi reduzida cerca de 50 % em relação a
. À vista disso, no que concerne
ao saldo diário de energia absorvida pela floresta,
alcançou valores próximos de
zero, indicando que, praticamente toda energia absorvida foi, posteriormente,
liberada, enquanto que
, denotou um fluxo convergente,
com saldo diário em torno de 0,4
, ou melhor, a energia armazenada
excedeu a energia liberada. Este fato ocorre normalmente, em dias com elevados
valores de saldo de radiação solar.
Figura 3 – Perfis médios diários das taxas de armazenamento de
energia numérico , modelado
e observado
Fonte: Autor, 2018.
A variação média de apresenta valores positivos
durante o dia, invertendo o sentido do fluxo durante a noite, com um desempenho
equivalente a
, apesar de possuir amplitudes
diferentes, especialmente no período diurno. Entretanto, denota valores
extremos entre 8 h e 14 h, variando cerca de 200
(Figura 3), ou seja, percebem-se
diversos picos, indicando um acelerado processo de armazenamento e liberação de
energia em um curto intervalo de tempo. Muito provavelmente, as variações
apresentadas por
, se deva ao fato de seus
componentes (
,
,
e
) terem sido medidos
separadamente em campo, podendo manifestar: i) medições ineficazes
relacionadas aos instrumentos, haja vista que alguns dispositivos tendem a
subestimar as densidades de fluxo energia; ii) aplicação de métodos
inadequados, como o método da covariância dos vórtices turbulentos (expostos na
literatura corrente), usado para obter indiretamente as densidades de fluxo
turbulento verticais de calor sensível e latente; iii) heterogeneidade
da superfície, visto que esta pode causar trocas de energia mediante escoamento
giratório e deslocamento de massa no sentido horizontal; iv) compreensão
incompleta do sistema físico, ao desconsiderar certos termos, como fluxos
advectivos, em consequência de limitações experimentais em campo.
Nas Figuras 5 e 6, têm-se as regressões entre e
, assim como por
e
, nas quais se utilizaram valores
diário e diurno, a fim de evidenciar particularidades entre os modelos em
diferentes momentos do dia. Diante disto, nota-se nos gráficos de dispersão, à
esquerda, que os pontos do diagrama estão mais afastados da reta de regressão,
ou seja, os valores de
estão
distantes dos valores de
. De fato, os coeficientes de
determinação obtidos foram de 0,23 e 0,07, respectivamente, para valores
diários e matutinos, sugerindo que apenas uma pequena parcela da TAE total
observada, pode ser compreendida por
, sendo que a parcela restante
refere-se a elementos não considerados em
.
Figura 4 – Regressões lineares diárias entre e
(à
esquerda) assim como por
e
(à
direita) referente ao conjunto de dias selecionados
Fonte: Autor, 2018.
Figura 5 – Regressões lineares diurnas entre e
(à
esquerda) assim como por
e
(à
direita) referente ao conjunto de dias selecionados
Fonte: Autor, 2018.
4 Conclusão
Em termos máximos médios diários, apresentou as maiores
magnitudes, chegando até 200
, enquanto que
e
permaneceram com valores mais
baixos, cerca de 62 e 108
, respectivamente. Por volta de
17 e 18 h, iniciou-se o processo de liberação de energia, com todas as taxas
tornando-se negativas, alcançando magnitudes mínimas diárias entre -45 e -67
. Verificou-se também, um fluxo
convergente de energia em,
e
, com saldos médios diários em
torno de 0,4
e 2,8
, nessa ordem, com
relativamente maior, visto que
manifestou diversos picos ao longo do ciclo diário. Já
, denotou amplitudes espelhadas,
evidenciando que praticamente toda energia absorvida pela floresta foi
liberada, isto é, atingiu um saldo médio diário de energia próximo de zero.
Para analisar as relações e comparar as saídas alcançadas pelo
modelo matemático proposto e por meio de medições diretas, aplicaram-se
regressões lineares simples, considerando como variável independente, para
períodos diurno e diário. Verificaram-se coeficientes de determinação
insatisfatórios em
para todos os ciclos, e que este
foi superestimado, com relação à
, correspondendo aproximadamente
ao triplo do armazenamento médio diurno de energia, enquanto
equiparou-se a 85 % de
, no mesmo período. Os resultados
obtidos entre
, modelado e numérico, foram bem
correlacionados no ciclo diário (
= 0,59) e diurno (
= 0,82), com exceção do período
noturno em consequência da inversão do fluxo de energia. À vista disso,
constatou-se que, na disposição de informações reduzidas de temperatura do ar,
e na ausência de perturbações atmosféricas e de dados de temperaturas de
tronco, o modelo matemático citado mostrou-se eficiente para o cálculo da TAE
total na Rebio Cuieiras, uma vez que, em totais diários e diurnos,
apresentou-se mais adequado a
numérico, enquanto somente uma
pequena parte de
pôde ser explicada por
.
Agradecimentos
Experimento de Larga Escala da Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
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