Universidade Federal de Santa Maria
Ci. e Nat., Santa Maria v.42, Special Edition: Micrometeorologia, e19, 2020
DOI:10.5902/2179460X46842
ISSN 2179-460X
Received: 02/06/20 Accepted: 02/06/20 Published: 28/08/20
Special Edition
Índices termodinâmicos durante a campanha GOAmazon2014/5 e comparação com dados da reanálise ERA-Interim
Thermodynamic indexes during the GOAmazon2014/5 campaign and comparison with ERA-Interim reanalysis data
Matheus Tolentino da Silva I
Henrique de Melo Jorge Barbosa II
Theotonio Mendes Pauliquevis Júnior III
I Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: matolentino.silva@gmail.com.
II Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: hbarbosa@if.usp.br.
III Universidade Federal de São Paulo, Diadema, Brasil. E-mail: theotonio.pauliquevis@unifesp.br.
RESUMO
Os índices termodinâmicos LCL, LFC, CINE e CAPE caracterizam a instabilidade atmosférica e, dessa forma, dão subsídios ao estudo da formação de nuvens e da convecção, fenômenos estes importantes para o ciclo hidrológico e o balanço radiativo. Em vista disso, este trabalho faz uma análise da variação sazonal destes índices calculados a partir de radiossondas lançadas durante o experimento GOAmazon2014/5, bem como faz uma comparação com a reanálise ERA-Interim, tanto para estes índices como para os perfis sazonais de temperatura e umidade. A análise da radiossonda mostra que a mediana do perfil vertical de umidade relativa na estação seca foi menor em 2015 do que em 2014, promovendo LCLs mais altos (~50 hPa às 18 Z) e um CAPE menor (~50% mais baixo). A diferença deve-se a uma estação seca mais severa em 2015 do que em 2014. A comparação das sondagens com a reanálise revela que os valores modelados de LCL são compatíveis com aqueles observados apenas as 18 Z (viés médio de -10 hPa). Por outro lado, os valores de CAPE são totalmente incompatíveis (viés médio de -750 J/kg). Os resultados indicam uma deficiência da reanálise ERA-Interim em representar as condições termodinâmicas típicas sobre a floresta tropical Amazônica.
Palavras-chave: Amazônia; GoAmazon2014/5; Convecção; Índices termodinâmicos; Sazonalidade; Reanálise ERA-Interim.
ABSTRACT
The thermodynamic indexes LCL, LFC, CINE and CAPE characterize atmospheric instability, and allow the study of cloud formation and convection, important phenomena for the hydrologic cycle and the radiative balance. For this reason, this work makes a seasonal analysis of these thermodynamic indexes computed from radiosondes released during the GOAmazon2014/5 experiment. A comparison was made with ERA-Interim reanalysis for both these indexes and the temperature and relative humidity profiles. Analysis of radiosonde data shows that the median vertical profile of relative humidity in the dry season was lower in 2015 when compared to 2014, resulting in higher LCL (~50 hPa at 18 Z) and lower CAPE (~50% lower). The difference stems from a more severe dry season in 2015 when compared with 2014. The comparison with the reanalysis reveals that modeled LCL values are only compatible with observed ones at 18 Z (mean bias -10 hPa). On the other hand, CAPE values are always incompatible (mean bias -750 j/kg). Results indicate that ERA Interim poorly represents the thermodynamic conditions over the Amazon rainforest.
Keywords: Amazon; GoAmazon2014/5; Convection; Thermodynamic indexes; Seasonality; ERA-Interim Reanalysis.
1 Introdução
Os índices termodinâmicos (ITs), como o LCL (Nível de Condensação por Levantamento), LFC (Nível de Convecção Livre), CINE (Energia de Inibição de Convecção) e CAPE (Energia Potencial Convectiva Disponível) caracterizam a instabilidade atmosférica e subsidiam o estudo da formação de nuvens e da convecção. Eles podem ser derivados a partir de perfis termodinâmicos obtidos por meio de radiossondas (observação) ou modelos atmosféricos (reanálises). Entretanto, medida in-situ de ar superior são limitadas espacialmente a algumas regiões do mundo, e temporalmente a alguns lançamentos por dia (tipicamente 0Z e 12Z), devido ao seu custo. Desse modo, validar os dados da reanálise cria confiabilidade estatística para o uso de perfis termodinâmicos derivados de modelos (reanálise) para regiões com pouca disponibilidade de observações, como é o caso da região amazônica. As radiossondas utilizadas neste trabalho foram lançadas a cada 6 horas (0, 6, 12 e 18 Z) durante o experimento GOAmazon2014/5 no sítio T3 em Manacapuru-AM (MARTIN et al., 2016). Esses dados também foram utilizados por Collow, Miller e Trabachino (2016), que realizaram estudos dos ITs ao longo de 2014.
Neste trabalho foi feita a análise dos ITs e dos perfis médios de temperatura (T) e umidade relativa (RH), com ênfase nos períodos chuvosos (Jan-Mar) e secos (Ago-Out). Foram estudadas diferentes abordagens no cálculo do LCL a partir dos dados das sondagens, e comparou-se então com dados de referência disponibilizados no repositório da University of Wyoming (2019). Por fim, comparamos os resultados observacionais com aqueles obtidos pela aplicação da mesma metodologia nos perfis termodinâmicos da reanálise ERA-Interim (Dee et al., 2011).
2 Metodologia
As radiossondas utilizadas durante o experimento GOAmazon2014/5 são do tipo Vaisala modelo RS92-SGP. As sondas, acopladas em balões meteorológicos, foram lançadas na atmosfera sobre o sítio T3 (3º12'46.70''S, 60º 35'53.0''W; 49 m) nos horários meteorológicos padrão (0Z, 6Z, 12Z e 18Z). Detalhes sobre o sistema de sondagem utilizado no ARM Mobile Facility 1 pode ser encontrado em Holdridge et al. (2011), e os dados estão disponíveis no ARM Data Center (http://dx.doi.org/10.5439/1021460).
Figura 1 – Diagrama termodinâmico ilustrativo. Adaptado de: https://www.meted.ucar.edu/mesoprim/tephigram
As variáveis da reanálise foram adquirida pela página eletrônica do Centro Europeu de Previsão do Tempo (ECMWF) e são do tipo 4D (altitude, longitude, tempo e pressão). As coordenadas utilizadas em nossa análise (3 S, 60 W) foram escolhidas dentro da sua resolução espacial, o mais próximas possíveis do sítio T3 em Manacapuru.
Para a intercomparação (reanálise/radiossonda) dos perfis verticais de T, RH e Q, foi necessário considerar as diferentes resoluções verticais. Para harmonizar as diferentes resoluções verticais entre reanálise e radiossonda (25 hPa e 1 hPa, respectivamente) a comparação foi feita usando médias dos valores da radiossonda em torno dos valores padronizados de altitude da reanálise (±10 hPa), sendo o desvio padrão nossa estimativa da incerteza. Ao subtrairmos os perfis (reanálise - radiossonda), e tomarmos os valores médios por estação e horário, foi feita também a propagação de incertezas.
O LCL foi calculado a partir da equação documentada na página eletrônica da University of Wyoming (2019), que utiliza como dados de entrada os valores médios de T e RH em uma camada atmosférica próxima à superfície. Se, por um lado, os valores de LCL reportados pela página de referência utilizam uma camada de espessura de 500 metros, neste trabalho testamos a influência de utilizar camadas de outras espessuras: 0-500m (padrão de referência), 50-500m, 0-350m e 50-350m. A partir do caminho da parcela de ar no diagrama termodinâmico foram obtidos, por métodos numéricos, o nível de convecção livre (LFC) e as energias potenciais disponíveis e de inibição (CAPE e CINE) pela integração das áreas mostradas na figura 1.
3 Resultados e Discussão
A partir dos dados de RH da radiossonda, observarmos um grande contraste entre a atmosfera durante as estações seca e chuvosa. Os efeitos dessa diferença na RH acarretaram mudanças significativas nos valores dos ITs. Os valores de RH próximos à superfície são importantes para a determinação do LCL (base da nuvem). Valores menores de RH promovem LCLs mais altos, visto que a parcela de ar formada na superfície precisa atingir altitudes mais elevadas para alcançar a saturação. Comparamos os perfis médios de RH das estações chuvosa e seca de 2014 e 2015 para o horário das 18 Z (14h local), quando a camada limite está bem desenvolvida. As figuras 2a e 2b mostram que os perfis verticais de umidade das estações chuvosa pouco diferiram entre 2014 e 2015. Por outro lado, o perfil da estação seca de 2015 mostrou valores claramente menores de RH do que a estação seca de 2014, indicando uma maior severidade desta estação em 2015. Essa diferença é mais notável em níveis médios (500 hPa), como pode ser observado nas figuras 2a e 2b. Essa diferença interanual pode ser explicada pelo pelas condições que estavam se configurando para a ocorrência do forte El Niño ao final de 2015 (BUENO, 2018).
Figura 2 – Perfis médios de RH (em cima) e temperatura (em baixo) para as estações chuvosa (ciano) e seca (vermelho) de 2014 (esquerda) e 2015 (direita). As regiões sombreadas delimitam o intervalo do percentil de 25th a 75th. A linha preta é a mediana
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Valores de temperatura próximos à superfície também são importantes para calcular o LCL. Fizemos a mesma análise sazonal para a temperatura às 18 Z, através dos perfis verticais das medianas. Observa-se nas figuras 2c e 2d que a diferença entre temperatura só é notável na superfície, pouco diferindo no restante da estrutura vertical da atmosfera acima de 800 hPa. A maior diferença sazonal foi observada em 2015, comportamento coerente com a maior diferença de RH observada na figura 2b.
Merece atenção mencionar que estamos utilizando observações das 18 Z porque nesse horário não há a presença de inversões de temperatura em camadas próximas da superfície. A figura 3 mostra inversões que frequentemente são observamos às 0, 6 e 12 Z. Já às 18 Z, a camada limite esta bem misturada e podemos observar um comportamento linear da temperatura até níveis muito acima de 500 m de altitude, como observado na figura 3c, quando até 1.5 km de altitude foi observado este comportamento linear. Estas inversões tem impacto nos valores de LCL e demais ITs, e por isso considerar diferentes camadas, entre 0 e 500m, como ponto inicial da ascensão da parcela irá produzir estimativas diferentes. Como pode ser visto na figura 4, utilizamos os intervalos 0-500m, 50-500m, 0-350m, 50-350m e comparamos com os valores obtidos da página eletrônica da universidade do Wyoming (que utiliza uma camada de 0-500m). As inversões causaram menor impacto às 18 Z. Um outro ponto interessante é que os valores de LCL obtidos pela metodologia documentada no repositório da Universidade do Wyoming não resultaram em valores exatamente iguais aos reportados na página eletrônica para o mesmo dia e hora, sugerindo algum possível critério de cálculo não documentado no algoritmo de estimativa de LCL.
Figura 3 – Diagramas termodinâmicos para o dia 11 de Agosto de 2015 obtidos por radiossondas lançadas as 06 (a), 12 (b) e 18 Z (c). Em azul e verde temos a temperatura ambiente e temperatura de ponto de orvalho respectivamente. Em preto esta o caminho da parcela de ar partindo de 250m
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Figura 4 – Comparação entre o LCL de referência (Wyoming) e aqueles obtidos considerando médias de T e RH em diferentes camadas. Os dados são da estação chuvosa de 2014 (acima) e 2015 (abaixo) como indicado. As categorias no eixo "x" representam: 1: Wyoming (0-500m), 2: 0-500m, 3: 50-500m, 4: 0-350m e 5: 50-350m
Através dos dados de RH e temperatura, e uma vez calculado o LCL, foram computados os valores de LFC, CINE e CAPE da maneira apresentada na seção de Metodologia. Na figura 5 mostra-se as séries temporais dos ITs (para LCL calculado utilizando a camada de 0-500m), para o horário das 18 Z. A figura 5a mostra que para a estação chuvosa de ambos os anos a altura do LCL pouco diferiu. Foi observada maior altitude de LCL em ambas as estações secas, sendo essa diferença maior no ano de 2015, atingindo até 125 hPa de diferença em relação a estação chuvosa, concordando com a estação seca mais severa em 2015, como discutido anteriormente.
Figura 5 – Séries temporais dos índices termodinâmicos (LCL, LFC, CINE e CAPE) calculados a partir do LCL obtido por médias na camada de 0-500m. As curvas mostram os valores diários e uma média móvel de 10 dias, de 1/jan/2014 à 31/dez/2015
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Também observamos altitudes mais elevadas de LFC para ambas estações seca, o que é um efeito esperado devido ao LCL também estar em altitudes mais elevadas. Isso significa que a parcela tem que ter mais energia inicial para alcançar níveis mais altos da atmosfera, antes que o calor latente liberado na condensação seja suficiente para sustentar a convecção.
Os valores de CINE foram, de maneira geral ao longo do período investigado, baixos e apresentando baixa variabilidade, inclusive sazonal. Portanto, a energia de inibição da convecção não pode ser responsável pela diferença na atividade convectiva entre as estações seca e chuvosa. Os valores de CAPE foram muito maiores, e ainda que a convecção profunda na Amazônia não dependa exclusivamente de CAPE (pois há convecção profunda com valores de CAPE baixos), é digno de nota a diferença significativa de CAPE e CINE. A figura 5d também mostra que, em 2014, o CAPE é máximo na estação seca (Ago/Out). Porem, em 2015, observamos o contrário, pois seu valor decai na estação seca. Esse comportamento também pode estar associado as condições pré El Niño de 2015.
Um ponto importante a se destacar é que por mais que a frequência de chuvas durante a estação chuvosa seja maior (MACHADO et al., 2018), os maiores valores de instabilidade atmosférica foram observados na estação seca de 2014 (figura 5d), o que contribui para a presença de tempestades mais severas durante esse período conforme observado por Collow, Miller e Trabachino (2016), que analisam dados da mesma campanha (GOAmazon2014/5).
4 Comparação com dados da reanálise ERA-Interim
Feito o estudo observacional (radiossondas), foi feita a comparação com resultados obtidos pelo produto da reanálise ERA-Interim. A importância da validação dos dados da reanálise está na possibilidade de substituírem os perfis de radiossonda quando ausentes, visto que a reanálise tem dados do mundo todo desde 1979. Para comparar os dois conjuntos de dados, utilizamos o ponto de grade da reanálise mais próximo do sítio experimental, no caso, nas coordenadas 3 S, 60 W.
Figura 6 – Perfis verticais das diferenças de temperatura entre a reanálise e a radiossonda (Δ = Reanálise - Radiossonda) para às 18 Z, nas estações chuvosa (esquerda) e seca (direita)
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A figura 6 mostra as diferenças de temperatura entre reanálise e radiossonda para as estações seca e chuvosa às 18 Z. Os mesmos vieses são observados nos anos de 2014 e 2015, demonstrando que a reanálise erra de maneira sistemática nos dois anos. Entretanto é difícil justificar esse enviesamento. Uma fonte significativa de incerteza é a resolução vertical da reanálise nos níveis mais baixos da atmosfera, de 25 hPa. Esta resolução, que faz com que apenas três pontos na vertical sejam utilizados para cálculo da temperatura e RH médio na camada 0-500m, é insuficiente para considerar adequadamente os processos de trocas de energia entre superfície e camada limite sob vegetação amazônica, e provavelmente é a principal razão dessa diferença entre observações e reanálise.
Em relação à RH às 18 Z (figura 7a e 7b), o máximo de erro da reanálise ocorre em altas altitudes, aproximadamente a partir de 400 hPa. Porém, como há uma diferença pequena de umidade específica (Q) nestes níveis atmosféricos (figura 7c e 7d), do ponto de vista de conteúdo de vapor, os erros nas camadas mais baixas são mais relevantes. Próximo à superfície, a diferença de RH entre reanálise e radiossonda se aproxima de zero, demonstrando que a reanálise representou bem os valores nesse horário, exceto na estação seca de 2015.
O maior erro da reanálise em relação à umidade específica ocorre na superfície. Ainda assim, nesse nível, as diferenças são pequenas, chegando a no máximo -1 g/Kg no pior caso (estação seca de 2014). Não há um padrão nas diferenças observadas nas duas estações analisadas, como foi o caso para T e RH. Durante a estação chuvosa, a reanálise tem um viés seco em níveis médios (500 hPa) e em superfície (1000 hPa), e úmido em 800 hPa. Já na estação seca, o comportamento nos anos de 2014 e 2015 foram completamente diferentes. Curiosamente, o menor viés foi na estação seca de 2015, que foi afetada pelo El Niño.
Aplicamos a mesma metodologia para calcular os índices termodinâmicos aos dados da reanálise, ou seja, utilizar valores médios de T e RH em diferentes espessuras (0-100m, 0-300m e 0-500m) de camada como dado de entrada para o algoritmo de cálculo dos ITs e realizamos uma comparação com as observações, incluindo um ajuste linear pelo método dos mínimos quadrados, para cada um dos horários, para verificar a correlação entre os dois conjuntos de dados. Esta comparação é mostrada na figura 8.
Figura 7 – Perfis verticais das diferenças de umidade relativa (RH) e umidade específica (Q) entre a reanálise e a radiossonda (Δ = Reanálise - Radiossonda) para às 18 Z, nas estações chuvosa (esquerda) e seca (direita)
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Figura 8 – Ajustes lineares para cada horário, de todos os valores ao longo dos dois anos (2014 e 2015) de LCL calculado com valores médios de T e RH de (a) 0 a 100, (b) 0 a 300, e (c) 0 a 500 metros
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Para o LCL calculado para a camada 0-100 m, nota-se uma melhor correspondência entre reanálise e radiossonda, com coeficientes angulares mais próximos de 1, para o horário das 18Z (figura 8a e tabela 1). Este é um resultado coerente com o observado nas figuras 7a e 7b, que mostram que à superfície a diferença reanálise-radiossonda de RH é menor nesse horário, o que nos faz hipotetizar que quando os valores de RH sonda/reanálise concordam, os valores de LCL também terão boa concordância - mesmo que ainda com uma certa discrepância em temperatura (figuras 6a e 6b). Portanto, acertar o valor de RH é essencial para que a reanálise reproduza LCLs compatíveis com os observados. Nos outros horários (0Z, 6Z e 12Z), em que a RH do modelo é mais discrepante na superfície, os coeficientes angulares e lineares dos ajustes de LCL (0-100m) não são compatíveis com 1 e 0 respectivamente (vide tabela 1).
Tabela 1 – Coeficientes angulares (C.A) e lineares (C.L) dos ajustes da figura 8
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0 – 100 m |
0 – 300 m |
0 – 500 m |
Horário |
C.A e C.L |
C.A e C.L |
C.A e C.L |
00 Z |
0.46(1); 531(13) |
0.72(2); 270(18) |
0.75(2); 229(22) |
06 Z |
0.37(2); 630(18) |
0.72(3); 280(26) |
0.82(4); 175(33) |
12 Z |
0.51(2); 483(20) |
0.70(3); 297(27) |
0.78(4); 206(34) |
18 Z |
0.98(1); 22(11) |
0.90(1); 89(13) |
0.87(2); 114(18) |
Conforme utilizamos camadas maiores (0-300m e 0-500m) para calcular o LCL (figuras 8b e 8c), os erros de T e RH da reanálise, em cada horário, tendem a se compensar, e os coeficientes angulares dos ajustes das 0, 6 e 12 Z aumentam de 0.3-0.5 para 0.7. Porém, para esses horários (0, 6 e 12 Z), os coeficientes lineares, apesar de menores, continuam incompatíveis com 0 (tabela 1). Como a performance da reanálise mostrou-se melhor para o intervalo de 0-500m, possivelmente pela sua baixa resolução vertical, analisamos a seguir as séries temporais dos ITs calculados para esta camada.
Figura 9 – Séries temporais da diferença entre reanálise e radiossonda (Δ = Reanálise - Radiossonda) dos índices termodinâmicos (LCL, LFC, CINE e CAPE) às 18 Z, calculados a partir do LCL obtido por médias na camada de 0-500m. Valores diários e média de 10 dias indicados na figura
(a) |
(b) |
(c) |
(d) |
Pela figura 9, as séries temporais das diferenças reanálise - radiossonda dos índices termodinâmicos às 18 Z (médias de 10 dias) de LFC, CINE e CAPE, mostram que os valores da reanálise são muito diferentes dos valores obtidos pelas radiossondas. Os valores de LFC e CAPE (figura 9b e 9d respectivamente) da reanálise são predominantemente menores que aquelas da radiossonda ao longo dos dois anos. Notando que valores menores de LFC em unidade de pressão, equivalem a valores maiores em altitude. Ainda que 2015 seja um ano de El Niño, é interessante notar que essa diferença (de LFC e CAPE) é menor em relação a 2014. De maneira oposta o CINE é predominantemente maior, porém, como discutido anteriormente, seus valores são muito pequenos em comparação ao CAPE, se tornando um índice de pouca relevância na análise da convecção.
Por fim, é importante ressaltar que o CAPE da reanálise possui valores significativamente mais baixos que obtidos com dados da radiossonda. Em 2014, pode-se observar grande variabilidade em CAPE, com diferenças de até 1000 J/Kg. Porém, visto que obtivemos valores muito altos de CAPE para a radiossonda (figura 5d), é possível que o método de determinação do CAPE por meio dos perfis termodinâmicos não seja eficiente na região (Amazônia central), visto que valores maiores que 2000 J/kg são elevados demais até mesmo para uma região marcada por convecção profunda como a Amazônia.
5 Conclusão
A equação utilizada para calcular o LCL pode gerar grande disparidade de valores, dependendo da espessura da camada atmosférica utilizada para tomarmos as médias de T e RH. Isto foi particularmente crítico para os horários das 0, 6 e 12 Z (figura 4), devido à presença de inversões térmicas próximas à superfície. Devido ao El Niño, 2015 passou por uma estação seca mais severa que no ano anterior (2014), resultando em valores menores de RH no perfil vertical. Consequentemente, a altitude de LCL deste período (estação seca de 2015) foi mais alta, e os valores de CAPE, mais baixos. Como observado neste trabalho e por Collow, Miller e Trabachino (2016), 2014 possui CAPE mais alto na estação seca, porém, em 2015 observamos o oposto devido às condições pré El Niño.
Tanto em 2014 como em 2015, os perfis verticais de T, RH e Q gerados pela reanálise ERA-Interim diferem de maneira sistemática das observações (radiossondas), embora possamos notar algumas diferenças na estação seca como a da figura 7d (próximo a superfície). A reanálise acerta consideravelmente os valores de RH na superfície as 18 Z, e isso acarretou em boa concordância de LCLs calculados utilizando uma camada próxima a ela (0-100m) nesse horário. Por fim, os valores de CAPE gerados pela reanálise se mostraram totalmente incompatíveis com as radiossondas, com diferenças de até 1000 J/Kg.
Agradecimentos
Os autores agradecem o apoio da FAPESP para a realização deste trabalho através do processo 2017/05613-1.
Referências
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