Universidade Federal de Santa Maria
Ci. e nat., Santa Maria, v. 42
Commemorative Edition: Statistic, e06, 2020
DOI: http://dx.doi.org/10.5902/2179460X40464
Received: 10/10/2019 Accepted: 13/10/2020
Statistics
AVALIAÇÃO DA QUALIDADE DO LEITE “IN NATURA”: UM ESTUDO DE CASO
“IN NATURA” MILK QUALITY ASSESSMENT: A CASE STUDY
Jiane Toller da RochaI
Angela Pellegrin AnsujII
Enio Junior SeidelIII
Fernando de Jesus Moreira JuniorIV
Angela Isabel dos Santos DulliusV
Jonas Pedro FabrisVI
I Universidade Federal de Santa Maria, Brasil; e-mail: jianetoller@gmail.com;
II Universidade Federal de Santa Maria. Brasil. e-mail: angelaansuj@yahoo.com;
III Universidade Federal de Santa Maria. Brasil. e-mail: enioseidel@gmail.com;
IV Universidade Federal de Santa Maria, Brasil; e-mail: fmjunior777@yahoo.com.br;
V Universidade Federal de Santa Maria. Brasil. e-mail: angeladullius@gmail.com;
VI Programa de Pós-Graduação em Propriedade Intelectual- Universidade Federal do Sergipe; e-mail: jpfabris@hotmail.com
RESUMO
Existe uma crescente preocupação dos consumidores quanto à qualidade dos produtos lácteos e, sobretudo da segurança alimentar. Assim, este estudo objetivou avaliar a qualidade do leite “in natura” fornecido à uma Usina de Laticínios utilizando o Controle Estatístico do Processo. Os dados foram obtidos das planilhas fornecidas pela Usina no período de setembro de 2004 a maio de 2005. Coletou-se 1696 amostras de leite entregue por 75 fornecedores das quais foram analisadas as variáveis: água excedente em percentual, acidez em graus Dornic e teor de gordura em percentual. Para a análise dos dados foi utilizada a estatística descritiva e o Controle Estatístico do Processo que permite monitorar um conjunto de dados por meio de gráficos. Nesta análise foi utilizado o gráfico p, o qual leva em conta a fração de dados não-conformes. Os resultados mostraram na estatística descritiva que a média do grau de acidez e do teor de gordura estão dentro dos limites aceitáveis. Porém, a média do percentual de água excedente é alta, ficando fora dos limites aceitáveis. No que se refere ao gráfico de frações não-conformes as três variáveis apresentaram pontos fora dos limites de controle.
Palavras-chave: Usina de Leite; Controle Estatístico do Processo; Gráficos de Controle.
ABSTRACT
There is a consumers’ increasing worry as for the quality of milk products, above all, the food safety. So, the objective of this study was to assess milk quality “in natura” supplied to a Dairy Factory by utilizing the Statistical Process Control. The data were obtained from the spreadsheets provided by the Dairy School Factory from September 2004 to May 2005. It was collected 1,696 milk samples delivered by 75 producers. From these milk samples the variables exceeding water in percentage, acidity in Dornic degrees, and fat content in percentage, were analyzed. For the data analysis the descriptive statistics and the Statistical Process Control that allows monitoring a data set through graphics. In this analysis, the graphic p is used. It takes into account the fraction of nonconforming data. In the descriptive statistics, the outcomes showed that the average of the degree of acidity and the fat content are within the acceptable limits. However, the mean of the percentage of exceeding water is high, staying off the acceptable limits. As regards to nonconforming fraction graphic, the three variables presented points out of the control limits.
Key words: Milk Plant; Statistical Process Control; Graphic of Control.
1. INTRODUÇÃO
A preocupação com a qualidade de seus produtos e a manutenção da competitividade tornou-se um constante desafio para as empresas. No setor leiteiro não é diferente, pois vem se modernizando para produzir mais e com qualidade a fim de tornar-se mais competitivo no mercado. Além disso, existe uma crescente preocupação dos consumidores quanto à melhoria da qualidade e, sobretudo, da segurança alimentar (LOPES e CARRARO, 2002).
Neste sentido Murphy e Boor (2000), afirmam que a qualidade dos produtos lácteos depende de cuidados desde a fonte de produção, até a mesa do consumidor. A contaminação do leite pode ocorrer devido ao estado de saúde do animal, à falta de higiene e limpeza durante a ordenha e à utilização de equipamentos inadequados. Por isso, é de extrema importância o controle de qualidade envolvendo cada etapa de produção, de forma a garantir um produto final com qualidade.
O Ministério da Agricultura, na década de 90, demonstrou sensibilidade à problemática ao criar o grupo de trabalho extra-oficial composto por fiscais federais experientes e por professores universitários que resultou na proposta inicial do Programa Nacional para Melhoria da Qualidade do Leite (PNMQL). Os objetivos do referido grupo de trabalho foi desenvolver estratégias para melhorar a qualidade do leite brasileiro, e propor mudanças na legislação e na administração do sistema de qualidade do leite (BRANDÃO, 2002).
Em 2002 foi criada a Instrução Normativa (IN) 51/2002 que entrou em vigor a partir de julho de 2005 para as regiões Sul, Sudeste e Centro-oeste. Entre os regulamentos técnicos introduzidos nessa legislação, está a fixação de requisitos mínimos de qualidade que deve apresentar o Leite Cru Refrigerado nas propriedades rurais. Entre outros pontos, a lei estabelece a obrigatoriedade de refrigeração do leite na propriedade (máximo de 7°C) e transporte de leite a granel (PIVARO, 2005).
O objetivo desta normativa é fixar as condições sob as quais, o Leite Cru Refrigerado, independentemente do seu tipo, deve ser coletado na propriedade rural e transportado a granel, visando promover a redução geral de custos de obtenção e, principalmente, a conservação de sua qualidade até a recepção em estabelecimento submetido à inspeção sanitária oficial. Também descreve o procedimento da coleta de Leite Cru Refrigerado a Granel que consiste em recolher o produto em caminhões com tanques isotérmicos construídos internamente de aço inoxidável, através de mangote flexível e bomba sanitária, acionada pela energia elétrica da propriedade rural, pelo sistema de transmissão ou caixa de câmbio do próprio caminhão, diretamente do tanque de refrigeração por expansão direta ou dos latões contidos nos refrigeradores de imersão (BRASIL, 2002).
Devido à importância e à necessidade de se obter leite com qualidade e segurança para o consumidor objetivou-se neste estudo avaliar a qualidade do leite “in natura” fornecido à Usina Escola de Laticínios da Universidade Federal de Santa Maria, utilizando o Controle Estatístico do Processo (CEP).
2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1. Leite
O leite é um produto que faz parte da alimentação da maioria dos brasileiros, seja na forma “in natura” ou através de seus derivados. Por isso, os cuidados com sua segurança e qualidade deve ser um fator primordial.
Segundo Richter, Ledford e Murphy (1992), a qualidade microbiológica dos alimentos é determinada pelas suas condições higiênico-sanitárias. Além disso, a qualidade do leite depende também da sua composição, como o teor de gordura e os minerais. Alguns fatores como a genética, idade do animal, manejo de ordenha, nutrição e doenças podem alterar a composição do leite e comprometer sua qualidade. Conforme Tronco (1996, p. 188), “o teor de gordura é um dos componentes que sofre maior variação se compararmos com os demais componentes do leite”. A autora afirma que isto ocorre devido a fatores fisiológicos como raça do animal, alimentação, estação do ano, entre outros; e não fisiológicos como desnate parcial ou total e adição de água no leite.
A qualidade do leite depende, além de outros fatores, de medidas governamentais que contemplem toda cadeia produtiva. Por isso, a legislação brasileira criou a Instrução Normativa 51/2002 (IN 51) do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) que trouxe consideráveis mudanças na monitoração da qualidade do leite ainda na propriedade rural. “Para a IN 51/2002, o objetivo principal é aumentar a qualidade do leite para melhor atender ao consumidor e viabilizar as exportações” (NOAL, 2006, p. 30).
Entre outros pontos, a lei estabelece a obrigatoriedade de refrigeração do leite na propriedade (máximo de 7°C) e transporte de leite a granel (PIVARO, 2005). Os equipamentos de refrigeração que devem ser utilizados para o resfriamento do leite, segundo a Normativa é o tanque de refrigeração por expansão direta com temperatura igual ou inferior a 4°C, e o tanque de refrigeração por imersão, com temperatura igual ou inferior a 7°C.
A Legislação define leite cru refrigerado como sendo o leite oriundo da ordenha completa, ininterrupta, em condições de higiene, de vacas sadias refrigerado a uma temperatura máxima de 7°C na propriedade rural/tanque comunitário e 10°C no estabelecimento processador e transportado até um posto de refrigeração de leite ou estabelecimento industrial em carro-tanque isotérmico.
Quanto à qualidade do leite cru refrigerado são observados alguns requisitos na IN51/2002 para que seja comercializado. Entre eles: ausência de resíduos de antibióticos; ausência de neutralizantes da acidez e reconstituintes de densidade e requisitos físico- químicos conforme Tabela 1. Esses requisitos devem ter um controle diário, para a qualidade do leite, quando do seu recebimento no estabelecimento beneficiador.
Tabela 1 – Requisitos físico-químicos do leite.
Requisitos |
Limites |
Matéria gorda, g/100g |
Teor original, com mínimo de 3,0 |
Densidade relativa a 15/12 C g/ml |
1,028 a 1,034 |
Acidez titulável, g ácido lático/100 ml |
0,14 a 0,18 |
Extrato seco desengordurado, g/100g |
Mínimo 8,4 |
Índice Crioscópico máximo |
-0,530ºH(equivalente a -0,512°C |
Proteínas, g/100g |
Mínimo 2,9 |
Água excedente |
0 a 3% * |
Fonte: Adaptado da Revista Indústria de Laticínios Nova Legislação de Produtos Lácteos: Revisada, Ampliada e Comentada (LERAYER et al., 2002, p. 201).
*Limites atribuídos pela Usina, conforme Ansuj (2000).
Conforme Ansuj (2000), acidez é um requisito que influencia fortemente na porcentagem de rejeição do leite recebido dos fornecedores. Para Chaves (1993), Santos (1996), Giordano (1996) e Rego (1996), a preocupação com a segurança de um produto alimentício deve começar durante seu desenvolvimento. Para que o leite cru refrigerado possua a qualidade desejada devem ser seguidas algumas orientações para a coleta, transporte e descarga. Conforme a IN51/2002, o tempo entre a ordenha e seu recebimento no estabelecimento beneficiador deve ser de no máximo 48 horas, com recomendações de que seja feito em 24 horas. Se o estabelecimento realiza a recepção de diferentes tipos de leite, deve ser primeiro descarregado o leite tipo B ou utilizar plataformas separadas para a recepção.
A qualidade do leite é medida de acordo com suas características físico-químicas, levando em consideração o aspecto, sabor, cor, odor, ausência de neutralizantes da acidez e reconstituintes de densidade, requisitos microbiológicos, contagem de células somáticas e resíduos químicos. Quanto ao leite cru refrigerado a IN 51/2002 estabelece algumas características que devem ter o controle. Esse controle, segundo a normativa, envolve a realização dos testes de temperatura, o teste de alizarol, acidez titulável, índice crioscópico, densidade relativa, teor de gordura, pesquisa de fosfatase alcalina (quando a matéria-prima for proveniente de usina e/ou fábrica), pesquisa de peroxidase (quando a matéria-prima for proveniente de usina e/ou fábrica), pesquisa de neutralizantes da acidez e de reconstituintes da densidade.
A contagem de células somáticas (CCS) no leite é uma ferramenta utilizada há várias décadas para controlar e prevenir a mastite nos rebanhos leiteiros. De acordo com Souza et al. (2008), se a CCS estiver acima de 200.000 células/ml, há pelo menos um quarto mamário da vaca leiteira infectado por patógenos específicos da mastite, como Staphylococcus aureus e Streptococcus agalactiae. A partir da implantação da IN51/2002 a análise da CCS, de contagem bacteriana total (CBT) e composição de todo leite cru deve ser feita todo mês e em laboratórios credenciados do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento.
2.2. Controle Estatístico do Processo
A maioria dos fatores que influencia a qualidade dos processos e dos produtos/serviços finais pode ser controlada nas diversas etapas de produção pela utilização de ferramentas de gestão da qualidade. Segundo Wagner e Rosa (2003), essas ferramentas fornecem informações precisas sobre a natureza das variações de padrões de controle pré-estabelecidos e seus possíveis reflexos na qualidade dos produtos/serviços, bem como linhas de ação em relação a produtos que não atendam aos padrões acordados entre a empresa e o cliente.
Uma das ferramentas de controle da qualidade muito utilizada pelas empresas é o Controle Estatístico do Processo (CEP), o qual utiliza técnicas estatísticas para medir a variabilidade do processo e manter a qualidade do produto de acordo com suas especificações. A implantação do CEP apresenta uma série de vantagens e benefícios: melhoria da qualidade do produto, melhoria na relação cliente-fornecedor, rastreabilidade do processo desde a matéria prima ao produto final, entre outras. As principais técnicas utilizadas no CEP são os gráficos de controle por variáveis e por atributos. Estes gráficos ou cartas têm como objetivo detectar desvios de parâmetros representativos do processo e identificar se o processo está ou não sob controle estatístico, reduzindo a quantidade de produtos fora de especificação e custos de produção. Conforme Juran e Gryna (1993), um processo está sob controle se todas as médias e amplitudes dos subgrupos de dados em análise encontram-se dentro dos limites de controle.
Segundo Paladini (2002), através dos gráficos de controle podem ser separados os efeitos da variabilidade causada pelas chamadas causas comuns ou aleatórias, ou seja, aquelas inerentes à natureza do processo produtivo, das causas especiais, ou aquelas derivadas da atuação de variáveis específicas e controláveis sobre o processo. Para Juran e Gryna (1993), as causas especiais podem ser descobertas, diagnosticadas e eliminadas, porém, as causas aleatórias não podem ser removidas sem mudanças drásticas no processo.
O controle estatístico é implantado por meio de um ciclo no qual são coletados dados do processo, realizadas análises e posteriormente apresentadas propostas de melhorias para atingir melhores patamares no processo produtivo. Na primeira etapa as cartas de controle são preparadas para a coleta dos dados e estas são entregues para a produção. Os dados são então levantados e a partir de uma análise gráfica (ou mesmo utilizando testes estatísticos) verifica-se se existem causas especiais atuando no processo, caso existam, deve-se identificá-las e eliminá-las até que o processo esteja sobre controle. Uma vez garantido o controle, esses gráficos são utilizados para a geração de índices futuros de desempenho (JURAN; GRYNA, 1993).
Os gráficos de controle por variáveis baseiam-se em medições de escala contínua, já os gráficos de controle por atributos baseiam-se em uma classificação descontínua, ou seja, na verificação da presença ou ausência das características de qualidade de um produto.
Segundo Montgomery (2004), os gráficos de controle por variáveis para três desvios-padrões com amostras de tamanho n e média das médias são obtidos através do cálculo dos limites de controle. Esses limites são calculados através das equações (1), (2) e (3) plotando-se os pontos em gráficos onde tem-se um Limite Central de Controle (LC), um Limite Superior de Controle (LSC) e um Limite Inferior de Controle (LIC). Para a utilização desses gráficos deve-se inicialmente verificar a normalidade dos dados por meio de testes estatísticos, como o teste Qui-Quadrado, Kolmogorov-Smirnov, Lilliefors, entre outros.
= Limite Inferior de Controle (LIC) (1)
= Linha Central (LC) (2)
= Limite Superior de Controle (LSC) (3)
No item 2.2.1 é abordado o gráfico de controle para atributos por ser a principal ferramenta de análise deste estudo.
2.2.1 Gráfico de controle para atributos
As características da qualidade que não podem ser representadas numericamente são chamadas de atributos e classificadas como conformes ou não-conformes.
Nos gráficos de controle podem ser consideradas várias características da qualidade em conjunto, sendo que a unidade que está sendo analisada será classificada como não-conforme caso deixe de corresponder a especificação em qualquer uma das características.
Estudos relacionados a produtos não-conformes utilizando os gráficos de controle são constantemente realizados por pesquisadores. Entre eles, Tronco (1996), utilizou os gráficos de controle para analisar a não conformidade do teor de gordura do leite pasteurizado integral tipo C de uma Usina de Laticínios. A partir deste estudo, a autora confirmou a eficácia destes gráficos como um sistema preventivo em processos de pasteurização do leite. Também, na pesquisa de Seidel et al. (2011), na mesma Usina, os gráficos de controle para a fração de não-conformes mostraram-se adequados para avaliar a qualidade do leite.
Os gráficos de controle para atributos mais utilizados são: a) gráficos de controle para a fração não-conforme ou gráfico “p”, os quais se referem à fração de itens não conformes ou defeituosos produzidos por um processo de manufatura; b) gráfico de controle para não-conformidade (defeitos) ou gráfico “c”, consideram uma unidade do produto que não satisfaz uma ou mais das especificações para aquele produto c) gráfico de controle para não conformidade por unidade, ou gráfico “u”, leva em consideração o número médio de não conformidade por unidade de inspeção. Neste trabalho será usado o gráfico p.
Para a construção do gráfico p, Montgomery (2004), apresenta os passos a serem seguidos: coletam-se amostras subsequantes de n unidades cada uma e calcula-se a fração amostral não-conforme . O cálculo da fração não-conforme é feito da seguinte maneira: para unidades não-conformes, i= 1, 2, 3... m e n= tamanho de cada amostra. Após, calcula-se a média da fração não-conforme usando a equação (4).
(4)
O passo seguinte, segundo Montgomery (2004), é o cálculo dos limites de controle do gráfico conforme as equações (5), (6) e (7), e a plotagem dos pontos () no gráfico. Entretanto, Paladini (2002) afirma que se < 0,10 a fórmula pode ser simplificada para .
A análise do gráfico é feita da seguinte forma: observam-se os pontos plotados, se permanecerem dentro dos limites de controle e não houver nenhuma seqüência de pontos sistemáticos, conclui-se que o processo está sob controle ao nível p. Se pelo menos um ponto se localiza fora dos limites de controle, ou ocorra uma seqüência de pontos sistemáticos conclui-se que o processo está fora de controle.
LSC = (5)
LC = (6)
LIC = (7)
De acordo com Montgomery (2004), quando quantidades diferentes de unidades fazem parte de cada subgrupo coletado, o gráfico de controle terá então um tamanho variável de amostra. Por isso, segundo o autor, há três abordagens para a construção deste gráfico:
1- limites de controle com largura variável: determina-se os limites de controle para cada amostra individual que se baseiem no tamanho específico da amostra. Então os limites de controle individuais superior, central e inferior são calculados conforme as equações (5), (6) e (7), respectivamente;
2- limites de controle com base em um tamanho médio de amostra: consiste em calcular os limites de controle usando as equações (5), (6) e (7), porém com n sendo substituído pelo tamanho médio da amostra , o que resulta em um conjunto aproximado de limites de controle;
3- gráfico de controle padronizado: utiliza-se quando o tamanho da amostra é variável, plotando-se os pontos em unidades de desvio-padrão. O Limite Central é zero e os Limites Superior Controle +3 e Inferior de Controle -3. A variável plotada no gráfico é calculada pela equação (8).
(8)
Para Triola (2005, p. 549), “um bem ou serviço é não-conforme se não corresponde às especificações ou exigências. Bens não conformes são às vezes descartados, reparados ou são classificados como “refugo”. O autor afirma que para construir um gráfico de controle para atributo, a média da fração defeituosa deve ser conhecida ou estimada. O gráfico p é um gráfico de controle usado para se monitorar a proporção p para algum atributo, e a fração média calculada é usada para marcar a linha central do gráfico.
Conforme Paladini (2002, p. 218), “fração não-conforme”, p, é a taxa de itens não-conformes em relação ao número total de itens num subgrupo”. Se os subgrupos não variam com relação ao tamanho médio em mais que 25% deve ser usado o tamanho médio dos subgrupos e não n para calcular os limites de controle.
O gráfico para atributos pode ser construído utilizando-se uma fração não-conforme ou uma unidade não conforme. Segundo Paladini (2002, p. 218), “uma distinção é feita entre uma fração não-conforme (por exemplo, um defeito) e uma unidade não conforme”. Uma não conformidade é única de acordo com alguma exigência; uma unidade não-conforme é um único item contendo uma ou mais não-conformidades.
Assim, pode-se verificar que o gráfico de controle para atributos é uma ferramenta da qualidade de simples aplicação que poderá ser utilizada pelas empresas para o controle da qualidade de seus produtos ou processos, favorecendo sua produtividade e competitividade.
3. METODOLOGIA
O estudo foi desenvolvido na Usina Escola de Laticínios da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), localizada em Santa Maria, região central do Estado do Rio Grande do Sul. A Usina, além da pasteurização do leite, fabrica diversos produtos como: queijos, iogurtes, sorvetes, doce de leite, mousses, nata e manteiga. Essa pesquisa se caracteriza como um estudo de caso onde foi analisada a qualidade do leite “in natura” entregue à Usina Escola de Laticínios da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Para Chizzotti (1995, p. 102), “o estudo de caso é tomado como uma unidade significativa do todo e, por isso, suficiente para fundamentar um julgamento fidedigno quanto propor uma intervenção”.
Os dados foram obtidos das planilhas fornecidas pela Usina, no período de setembro de 2004 a maio de 2005. Coletou-se 1696 amostras de leite entregues por 75 fornecedores (subgrupos) das quais foram analisadas as variáveis: água excedente em percentual; acidez em graus Dornic e; teor de gordura em percentual. Cabe ressaltar que foi avaliada a qualidade do leite entregue somente pelos fornecedores e não a qualidade do leite comercializado pela Usina. Para a análise dos dados foi realizada, inicialmente, a análise descritiva, possibilitando a descrição, exploração e comparação das características do conjunto de dados. Após, foi utilizado o CEP, que permitiu avaliar o conjunto de dados por meio de gráficos de controle, utilizando-se o gráfico p, o qual leva em consideração a fração de dados não-conformes. O Software utilizado foi o Statistica 7.0.
4. ANÁLISE DOS RESULTADOS
4.1 Análise descritiva
A análise descritiva quanto ao percentual de água excedente no leite, o grau de acidez e o teor de gordura está apresentada na Tabela 2.
Tabela 2 – Estatística Descritiva.
N |
Média |
Desvio-padrão |
Mínimo |
Máximo |
C. V. (%) |
|
Água (%) |
1696 |
4,77 |
1,91 |
0,00 |
13,04 |
40,04% |
Acidez (° D) |
1696 |
16,37 |
1,43 |
8,00 |
21,00 |
8,73% |
Gordura (%) |
1696 |
3,49 |
0,90 |
0,00 |
9,21 |
25,79% |
* C.V. = coeficiente de variação
Observando-se os dados apresentados na Tabela 2, pode-se observar que o percentual médio de água excedente no leite é de 4,77%, considerado em média um valor alto (acima das especificações) e com um coeficiente de variação de 40,04%. A acidez média foi de 16,37ºD, estando dentro das especificações de adequação do leite, e o coeficiente de variação foi de 8,73%. O teor médio de gordura do leite foi 3,49%, considerado um valor médio dentro das especificações de qualidade, e o coeficiente de variação foi de 25,79%. Assim, apenas a acidez e o teor de gordura, em média, encontram-se dentro dos limites especificados pela IN51/2002 (Tabela 1).
Analisando-se os valores dos coeficientes de variação (CV) que, segundo Pagano e Gauvreau (2004), é uma medida de variabilidade relativa que relaciona o desvio-padrão e a média de uma variável, observa-se que a água excedente apresentou maior variabilidade se comparada as outras variáveis, mostrando um comportamento bem heterogêneo entre os produtores neste quesito.
Quando as amostras são analisadas individualmente, constatou-se que das 1696 amostras de leite coletadas 1298 (76,5%) estavam com percentual de água excedente acima de 3%, 85 amostras estavam com grau de acidez fora dos limites de especificação e 407 estavam abaixo do teor de gordura determinado. No estudo de Seidel et al. (2011), 1886 (76,4%) das 2469 amostras coletadas estavam adequadas em relação ao grau de acidez, indicando também que a maioria das amostras estava dentro das especificações de acidez. Além disso, os autores também observaram muitas amostras com água excedente acima de 3%.
4.2 Gráfico de Controle para a fração não-conforme
A fração média não-conforme é definida como a razão entre o número de amostras não-conformes e o total de itens inspecionados. Ela pode descrever uma única característica de qualidade ou mais características consideradas conjuntamente.
Neste estudo, foi construído o gráfico de controle para a fração média não-conforme para cada característica da qualidade do leite. Foram tomados 75 subgrupos (referentes aos 75 fornecedores) cada um com tamanho variável e observado o percentual de itens não-conformes em cada subgrupo. Cada subgrupo representa um produtor que fornece leite para a Usina. Após, foi calculada a fração média de amostras não-conformes , a qual representa o Limite Central de Controle (LC). Também, foram calculados o Limite Superior de Controle (LSC) e o Limite Inferior de Controle (LIC) para cada amostra e, plotados os pontos nos seus respectivos gráficos. O gráfico p para o percentual de água excedente no leite está representado na Figura 4.
Figura 4 – Gráfico de controle para a o percentual de água excedente.
Observando-se a Figura 4, pode-se perceber que a fração média não-conforme foi 0,81 (LC) ou seja, 81% das amostras analisadas estão com percentual de água excedente acima de 3%. Considerando que cada amostra é de tamanho variável os Limites Inferior e Superior de Controle são individuais. Assim, podem-se observar dois pontos abaixo do Limite Inferior de Controle. Isso significa que o leite entregue pelos fornecedores correspondentes a essas amostras apresentam baixo percentual de água excedente, o que é bom para a qualidade do produto.
Em relação à sequência de pontos não há evidências de causas assinaláveis interferindo. Se, forem eliminados os dois pontos abaixo do limite inferior de controle, o processo parece operar de maneira estável. Portanto, os limites de controle podem ser adotados para monitorar a qualidade do leite, considerando o percentual de água. Entretanto, nota-se que a fração média não-conforme está bastante elevada. Assim, a qualidade do leite pode ser melhorada com a intervenção da gerência da Usina, exigindo dos fornecedores melhor qualidade do produto. Após a intervenção, sugere-se a coleta de novas amostras e a construção de novos gráficos de controle para monitorar a qualidade do leite. A Figura 5 mostra o gráfico de controle para o grau de acidez.
Figura 5 – Gráfico de controle para o grau de acidez.
Analisando-se a Figura 5, verifica-se que a fração média não-conforme encontrada foi 0,05 (LC), ou seja, em média 5% das amostras analisadas estão com acidez fora dos limites permitidos pela IN 52/2002. Dos pontos plotados neste gráfico, quatro estão acima do LSC. Esses pontos fora dos limites devem ser investigados para ver se existe alguma causa não-aleatória atuando na produção de leite, como por exemplo o tempo de armazenamento do leite na propriedade do produtor e/ou a forma de refrigeração. Em Seidel et al. (2011), foram observadas frações médias não-conformes de 0,17 e 0,30 para grau de acidez, nas estações da primavera e do verão, respectivamente, indicando também baixas frações não-conformes.
O gráfico de controle para o teor de gordura está representado na Figura 6.
Figura 6 – Gráfico de controle para o teor de gordura.
Pode-se perceber que a fração média não-conforme foi 0,25 (LC), ou seja 25% das amostras coletadas estão com percentual de gordura abaixo do estipulado na IN51/2002, que é de no mínimo 3%. Pode-se perceber, que cinco pontos estão acima do Limite Superior de Controle e dois pontos estão abaixo do Limite Inferior de Controle. Esses pontos fora dos limites devem ser investigados para ver se existe alguma causa não-aleatória atuando na produção de leite e afetando o teor de gordura, como por exemplo, o tipo de alimentação das vacas e o método de refrigeração.
Assim, dentre as características do leite que foram analisadas a maior fração média não-conforme foi a do percentual de água excedente no leite. Apesar da adição de água não causar mal para o consumo humano, o produto acaba perdendo qualidade. De acordo com Roquette et al. (2016), ferramentas estatísticas, como os gráficos de controle, devem ser usados para que se possa avaliar com mais eficiência os indicadores de qualidade do leite.
5. CONCLUSÃO
A água excedente apresentou-se, em média, fora das especificações estabelecidas pela Usina, ou seja, acima de 3%. Assim, sugere-se que seja feito um controle mais rigoroso junto aos fornecedores para que o percentual de água excedente no leite seja reduzido. Já a acidez e o teor de gordura apresentaram-se, em média, dentro dos limites de especificações estabelecidos.
A fração média não-conforme da água excedente foi elevada (81%), indicando que muitos fornecedores estão entregando leite com água excedente. Cabe ressaltar que tanto a água excedente, quanto a acidez e o teor de gordura, apresentaram pontos fora dos limites de controle, indicando que esses processos não estão sobre controle estatístico, impossibilitando a análise de capabilidade. Esses pontos fora de controle são causas especiais que devem ser investigadas e corrigidas para que o processo se torne estável, possibilitando um futuro estudo de capabilidade.
REFERÊNCIAS
ANSUJ, A. P. Melhoramento da qualidade de um processo de produção contínua utilizando técnicas estatísticas e os métodos de Taguchi. 2000. 128f. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) - Universidade federal de Santa Maria, Santa Maria, 2000.
BRANDÃO, S. C. C. Nova legislação comentada de produtos lácteos. Revista Indústria de laticínios. São Paulo, 2002.
BRASIL. Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Instrução Normativa Nº 51 de 18/09/2002.
CHAVES, J. B. P. Controle da qualidade total em laticínios. Revista do Instituto de Laticínios Cândido Tostes, v. 48, n 288, p. 25-33, 1993.
CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1995.
GIORDANO, J. C. Qualidade total. Engenharia de alimentos, v 1, n. 4, p. 20 – 26. 1996.
JURAN, J. M.; GRYNA, F. M. Controle da qualidade: métodos estatísticos clássicos aplicados à qualidade, v.6, São Paulo: Makron Books, 1993.
LERAYER, A. L. S. et al. Nova legislação de produtos lácteos: revisada, ampliada e comentada. São Paulo: Editora Revista Indústria de Laticínios, 2002.
LOPES, M. O; CARRARO, C. N. M. Levantamento do uso e detecção de resíduos de antimicrobianos no leite produzido na região Metropolitana de Curitiba-PR. Revista do Instituto de Laticínios Cândido Tostes, vol. 57, n. 327, p. 233 – 235, 2002.
MONTGOMERY, D.C. Introdução ao Controle estatístico da qualidade. 4.ed. Rio de Janeiro: LTC- Livros Técnicos e Científicos S.A., 2004.
MURPHY, S. C; BOOR, K. J. Trouble shooting sources and causes of high bacteria counts in raw milk. Dayre, Food and Environmental Sanitation. Vol. 20, n.8, p. 606 – 611, 2000.
NOAL, R. M. C. Ações de melhoria contínua para incrementar a qualidade e produtividade na cadeia do leite. 2006. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2006.
PAGANO, M; GAUVREAU, K. Princípios de Bioestatística. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004.
PALADINI, E. P. Avaliação estratégica da qualidade. São Paulo: Atlas, 2002.
PIVARO, J. Laticinistas para um mercado em evolução. Revista Indústria de Laticínios, n. 58. São Paulo, jul./ago. 2005.
REGO, R. A. Dimensões gerenciais do controle de qualidade. Engenharia de Alimentos, v 1, n. 5, p. 28-31. 1996.
RICHTER, R. L.; LEDFORD, R .A.; MURPHY, S. C. Milk and Milk Products. In: Compendium of Methods for the Examination of Foods. Vanderzant, C.: Splittstoesser, D.F. (eds). American Public Health Association, Washington, 1992.
SANTOS, J. A. HACCP é garantia da qualidade. Indústria de laticínios, v. 1, n.3, p. 16-20. 1996.
SEIDEL, E. J. et al. Métodos estatísticos aplicados à avaliação da qualidade da matéria-prima e classificação dos fornecedores de uma indústria de laticínios. Revista Produção Online, vol. 11, n. 1, p. 3-28, 2011.
SOUZA, G. N. de; BRITO, J. R. F; FARIA, C. G; MORAES, L. C. D; RUBIALE, L. Situação da CCS em relação a IN51 em rebanhos da Região Sudeste. Disponível em <www.cileite.com.br>. Acesso em 05 ag. 2008.
TRIOLA, M. F. Introdução à Estatística. Rio de Janeiro: LTC, 2005.
TRONCO, V. M. Proposta de melhorias na inspeção da qualidade do leite. 1996, 222f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 1996.
WAGNER, A.; ROSA, L.C. Controle estatístico do processo na produção de farinha de trigo. In: II SIMPOCAL, 03. Florianópolis, 2003.