Universidade Federal de Santa Maria
Ci. e Nat., Santa Maria v.42, e59, 2020
DOI:10.5902/2179460X36394
ISSN 2179-460X
Received 15/01/19 Accepted: 02/04/20 Published:26/08/20
Geo-Sciences
Governança e gestão comunitária das águas
Governance and community management of waters
Jane Márcia MazzarinoI
Luciana TurattiII
Eduardo PericoIII
Laura Barbieri de OliveiraIV
I Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES. RS, Brasil - janemazzarino@univates.br
II Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES. RS, Brasil - lucianat@univates.br
III Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES. RS, Brasil – perico@univates.br
IV Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES. RS, Brasil – laura.oliveira@universo.univates.br
RESUMO
A crescente complexidade que as questões ambientais assumem no cenário global delimita a necessidade de estudos científicos sobre as relações da sociedade com temas que tendem a assumir importância cada vez maior na vida humana. Este artigo tem como objetivo caracterizar a situação dos recursos hídricos na América Latina e,especificamente, no Brasil, apontando aspectos para a gestão compartilhada das águas, a partir de um estudo de caso que aprofunda a compreensão das relações comunitárias dos recursos hídricos. Toma-se como base duas categorias de análise: as fontes de informação e a observação de problemas. A partir do estudo empírico são vislumbrados cenários amplos relativos à governança na gestão comunitária das águas. O método é qualitativo e baseia-se nas pesquisas bibliográfica e de campo, está baseado em entrevistas semi-estruturadas com diversos atores sociais do município de Marques de Souza, inserido na Bacia Hidrográfica Taquari-Antas, RS, Brasil..
Palavras-chave: Recursos hídricos; Gestão comunitária; Conflitos; Governança; Método qualitativo
ABSTRACT
The increasing complexity that environmental issues assume on the global stage delimits the need for scientific studies on the relationships of society with themes that tend to assume increasing importance in human life. This article aims to characterize the water resources situation in Latin America and, specifically, in Brazil, pointing out aspects for shared water management, based on a case study that deepens the understanding of community relations of water resources. It is based on two categories of analysis: sources of information and observation of problems. From the empirical study, broad scenarios on governance in community water management are envisaged. The method is qualitative and is based on bibliographical and field research, based on semi-structured interviews with several social actors in the municipality of Marques de Souza, inserted in the Taquari-Antas Hydrographic Basin, RS, Brazil.
Keywords: Water resources; Community management; Conflicts; Governance; Qualitative method
1 INTRODUÇÃO
Os aglomerados sociais que dão surgimento às cidades estão invariavelmente relacionados com o acesso aos recursos hídricos, seja por necessidade vital, pela beleza cênica, por estratégia de defesa, pela possibilidade de subsistência ou devido a necessidades culturais (ZINATO, 2005). Todos os povos têm forte ligação com a água, a qual faz parte de rituais sagrados, tradições e cerimônias, muitas vezes com sentido atrelado à purificação, por outro lado, também tem sido motivo de disputas (SHIVA, 2006).
Também desde a antiguidade buscam-se ações de saneamento que propiciem condições favoráveis ao desenvolvimento de uma vida saudável, com água potável, alimentos, terrenos adequadamente preparados para a construção de habitações e para os equipamentos coletivos. Mas o desenvolvimento do capitalismo industrial e o processo de urbanização acelerado elevaram os impactos negativos causados pelo ser humano no ciclo hidrológico (VARGAS, 1999).[1]
Os principais problemas relacionados à crise da água são a intensa urbanização, o aumento da demanda pela água, a diminuição do acesso à água potável devido ao aumento da contaminação e eventos hidrológicos extremos (enchentes, secas, deslizamentos). Soma-se a isso a falta de divulgação e de ações consistentes dos governos para o desenvolvimento da sustentabilidade ambiental com relação aos recursos hídricos. (TUNDISI, 2008).
Para definir corretamente a noção de escassez de água é preciso analisar as demandas de uma territorialidade regional específica. Os usos sociais dos recursos hídricos têm como grandes categorias de utilização social: alimentação e higiene; a produção industrial; geração de energia; irrigação; navegação; pesca e lazer; evacuação e diluição de esgotos; drenagem e controle de enchentes; luta contra incêndios; preservação do ambiente aquático e da paisagem (VARGAS, 1999).
Os problemas hídricos estão relacionados a estes usos, os quais sustentam e são sustentados pelos modelos de desenvolvimento, com suas consequências, e que estão intrinsecamente atrelados às ações decorrentes das ambições e necessidades humanas (ZINATO, 2005). Apesar da perspectiva do desenvolvimento sustentável buscar limitar as ações do homem a partir de seus possíveis impactos ambientais, atualmente, os problemas causados pelo crescimento da população e seus modos de consumo seguem desafiando técnicos, cientistas e gestores públicos. Para Zinato (2005), devem ser criadas estratégias integradas para o seu enfrentamento, já que a água conecta todos e está vinculada à qualidade de vida.
O objetivo do presente estudo é investigar aspectos que possibilitem a gestão compartilhada das águas, a partir de um estudo de caso que aprofunda a compreensão das relações comunitárias com este recurso. Para isto, será contextualizada a situação das bacias hidrográficas na América Latina e no Brasil e, especificamente a Bacia Hidrográfica Taquari-Antas, onde se insere o município de Marques de Souza, que ocupa parte do território da sub-bacia do Forqueta.
2 MÉTODO
A pesquisa é, quanto aos fins, exploratória, já que seu objetivo é proporcionar maior familiaridade com as construções socioculturais sobre a questão hídrica no território da Bacia Hidrográfica Taquari-Antas, a fim de torná-las mais explícitas ou construir hipóteses. Também define-se como pesquisa descritiva por caracterizar determinado fenômeno, a partir de técnicas padronizadas de coleta de dados, como as entrevistas (GIL, 2007). A pesquisa bibliográfica e de campo formam os eixos principais do estudo.
Optou-se pelo método qualitativo porque a intenção é privilegiar os significados que emergem na comunidade de Marques de Souza, região central do Rio Grande do Sul, Brasil, em relação ao tema dos recursos hídricos, não havendo preocupação com a representatividade numérica, mas sim com o aprofundamento da compreensão das relações entre a comunidade e os recursos hídricos. Contemplaram-se as formas do saber local, como é retratado, demarcado e representado, assim, vasculharam-se materiais relativos à experiência humana e ao repertório dos sujeitos enquanto formas simbólicas disponíveis na comunidade onde se realizou o estudo empírico (GEERTZ, 1978 e 1999).
A investigação qualitativa é uma observação de primeira mão sobre o comportamento humano, em que o investigador se coloca como reconstrutor da realidade objeto da investigação, sem buscar leis ou generalizações, e sim particularidades, singularidades e diversidade de compreensão sobre determinado fenômeno, o que requer entrevistar pessoas que vivem diferentes situações (GOLDEMBERG, 1998).
Para compreender que problemas relacionados aos recursos hídricos são identificados por moradores da Bacia Hidrográfica Taquari Antas, optou-se por realizar um estudo no município de Marques de Souza, território sobre o qual o grupo de pesquisadores dispunha de dados aprofundados decorrente de aproximações anteriores, e por estar inserido na sub-bacia do Forqueta, um dos rios que margeia o município. Esta sub-bacia tem sido estudada pelo grupo de pesquisa coordenado pelo professor Educardo Périco da Universidade do Vale do Taquari desde 2002 (OLIVEIRA, PERICO, MAZZARINO, 2017; OLIVEIRA et. al, 2015; PERICO, CEMIN, MOHR, 2012; ROSA, PERICO, 2017; STROHSCHOEN et.al., 2009). Estes estudos, no entanto, careciam de investigação mais densa sobre aspectos socioculturais.
Selecionaram-se moradores com atuação social diversa que possibilitassem analisar perspectivas variadas relacionadas às indagações da pesquisa. Foram aplicadas entrevistas individuais estruturadas com 36 perguntas abertas, as quais possibilitavam aprofundamento na coleta dos dados. A amostra caracterizou-se como não probabilística, por acessibilidade (selecionaram-se informantes por facilidade de acesso e sem levar em conta procedimentos estatísticos), e por tipicidade (representativos da população-alvo sobre a qual se quis aprofundar a compreensão da realidade socioambiental).
Participaram 34 moradores selecionados pela diversidade de inserção social e geográfica: moradores das áreas rural e urbana, empresários, presidentes de sociedades de água, produtores rurais, homens e mulheres, pescadores, líderes religiosos, gestores públicos e técnico agrícola. A coleta cessou devido à percepção por parte dos pesquisadores de redundância nas respostas, como cabe a um estudo qualitativo (GOLDEMBERG, 1998).
Para o tratamento dos dados observou-se a proposta de Moraes (2007) denominada análise textual. Os materiais linguísticos e discursivos emergentes nas entrevistas passaram por um processo de desconstrução, para em seguida realizar-se sua reconstrução, a fim de se evidenciarem novos entendimentos sobre o fenômeno investigado. Desta forma, foram sintetizados os elementos e dimensões mais recorrentes e, também, os menos recorrentes.
Ao longo do tratamento dos dados coletados por meio das entrevistas formaram-se duas categorias de análise: fontes de informação e problemas ambientais, as quais estão relacionadas a algumas dimensões do processo de gestão das águas.[2] Para Moraes (2007) categorizar é produzir uma ordem a partir de um conjunto de materiais desordenados, classificando-os, a fim de construir a estrutura de compreensão e de explicação dos fenômenos investigados.
Na discussão dos resultados evidenciaram-se fortemente lógicas discursivas relativas a duas marcas ou matrizes culturais predominantes: comunicacional e crítica-reflexiva. Mazzarino (2013), baseada em autores dos estudos culturais latinoamericanos como Martin Barbero (1997), define as matrizes culturais como marcas incrustadas na experiência social dos sujeitos, oriundas dos universos simbólicos diversos nos quais cada um circula. Estas marcas são ativadas nas interações sociais. E guiam processos de significação e ressignificação, concretizando-se nos modos de dar sentido ao cotidiano.
Os elementos constituintes destas marcas, identificados nos relatos decorrentes das entrevistas, foram tratados como representativos dos processos culturais em construção na comunidade objeto do estudo, já que expressam modos de ver e fazer das pessoas que nela vivem, não se tendo a pretensão de generalizá-los.
3 A QUESTÃO HÍDRICA NA AMÉRICA LATINA
Estudos sobre a situação da gestão dos recursos hídricos na América Latina apontam algumas semelhanças, mas muitas distinções, especialmente no que se refere à qualidade e à disponibilidade dos mananciais hídricos. A América Latina é uma das regiões com uma das maiores disponibilidades hídricas. Tem 26% do total da água do planeta para atender às demandas de 6% da população mundial. Contudo, enfrenta sérios problemas de abastecimento devido aos diferentes tipos de ambientes, que variam entre alguns dos lugares mais úmidos e os desertos mais secos do planeta; e ao elevado índice de poluição causada pela intensa urbanização das últimas décadas. Estes fatores levam a uma crescente dependência do uso de fontes subterrâneas (PASTORE et al., 2012).
Segundo Sader (2005) algumas zonas do continente sofrem secas tão duras, que 25% do continente é considerado árido ou semi-árido. Portanto, mesmo com tanta disponibilidade de água, a América Latina é um dos maiores cenários de luta pelo recurso hídrico. Conforme o autor, a primeira batalha ocorreu na Bolívia, quando os serviços de água do país mais pobre da América do Sul foram privatizados e em Cochabamba o preço da água aumentou brutalmente[3] . Outras zonas do continente travam lutas similares, caso da Argentina, do Uruguai, do Chile, da Guatemala e do México (SADER, 2005).
Na revisão de estudos feitos sobre a realidade da Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Cuba, Equador, México, Peru, Venezuela e Brasil, constatou-se que a situação dos recursos hídricos na América Latina possui características comuns em muitos de seus países. Há grande disponibilidade do recurso, mas a distribuição desigual entre a população. Há áreas com grande abundância de água que possuem pouca população, enquanto zonas com menos disponibilidade têm maior densidade demográfica e, ainda, encontram-se regiões áridas e semiáridas. Há poluição pelas atividades antrópicas, principalmente pela falta de tratamento de esgotos nas residências e nas indústrias, e pelos agrotóxicos utilizados na agricultura. Ocorre o aumento da demanda do recurso, pelo crescimento populacional e pelo alto índice de consumo das atividades agrícolas irrigadas. Também se eleva a utilização de mananciais subterrâneos e há crescente preocupação com a qualidade da água que se dispõe. Além disso, está em curso o processo de descentralização da gestão dos recursos hídricos, principalmente por comitês de bacias hidrográficas, pela gestão comunitária ou outras formas associativas (PASTORE et al., 2012; BARRAU, 2012; IRIARTE e DEL PRADO, 2009; BASUALTO et al., 2009; ROJAS, 2009; REYES et al., 2012; LÒPEZ, 2009; TORREGROSA et al., 2012; KUROIWA, 2012; GONZÀLEZ e MATOS, 2012; JACOBI et al., 2009).
O país detém 12% da água doce do planeta, sendo que a disponibilidade deste recurso varia ao longo do território, devido à sazonalidade e aos tipos de biomas (JACOBI et al., 2009). A distribuição da população influencia enormemente na disponibilidade deste recurso, como é o caso da Região Hidrográfica Amazônica que detém 74% dos recursos hídricos superficiais e é habitada por menos de 5% da população brasileira (CNRH, 2003).[4] As regiões Sul e Sudeste possuem alta densidade demográfica, além da intensa concentração industrial, mas detém apenas 12,5% dos recursos hídricos (JACOBI et al., 2009). Segundo Tundisi (2008), enquanto um habitante do Amazonas tem disponível por ano 700.000 m³ de água, um habitante da Região Metropolitana de São Paulo tem 280 m³.
Além da disparidade de disponibilidade, os recursos de água doce da América Latina sofrem grandes problemas de contaminação. Nesse contexto, o Brasil, apesar de possuir grandes recursos de água doce, é o país que possui o maior índice de contaminação do continente, seja de origem química, industrial ou de mineração. Os maiores contaminadores de água são as grandes indústrias de alta tecnologia e a agricultura industrial (SADER, 2005). Além destas fontes, citadas pelo autor, há a contaminação biológica, decorrente em grande parte pela falta de saneamento. Quanto à demanda mundial de água doce duplica a cada 20 anos, a um ritmo duas vezes superior à taxa de crescimento da população (SADER, 2005). De acordo com dados de 2018 da Agência Nacional de Águas (ANA),
O principal uso de água no país, em termos de quantidade utilizada, é a irrigação (49,8%), seguida pelo abastecimento humano (24,4%) e pela indústria (9,6%). Juntos, representaram cerca de 85% da retirada total. Outras utilizações vconsideradas foram o atendimento aos animais (8,0%), as termelétricas (3,8%), o suprimento rural (1,7%) e a mineração (1,6%). A demanda por uso de água no Brasil é crescente, com aumento estimado de aproximadamente 80% no total retirado nas últimas duas décadas. A previsão é de que até 2030 a retirada aumente em 24%. O histórico da evolução dos usos da água está diretamente relacionado ao desenvolvimento econômico e ao processo de urbanização do País (ANA, 2020)[5].
Como a agricultura é o grande consumidor mundial de água, o primeiro risco é o da escassez quantitativa (TUCCI, 2001). O autor avalia que a tendência de agravamento da disponibilidade quantitativa de água é maior nas regiões áridas e semi-áridas e da disponibilidade quanti-qualitativa nas regiões de grande adensamento urbano e de uso agrícola. É preciso lembrar que a água utilizada nas cidades, indústrias e agricultura é descartada nos rios, contaminando-os (TUCCI, 2001).
Diversas obras hidráulicas foram construídas ao longo da história das civilizações, com o objetivo de reduzir a escassez da água, regulando a vazão e aumentando sua disponibilidade ao longo dos anos. Estas obras, muitas vezes, causam impactos irreversíveis ao meio ambiente (TUCCI, 2001).
Tundisi (2008) aponta como possíveis caminhos para solução de alguns problemas das águas a utilização de tecnologias adequadas, a eliminação de desperdícios e a introdução de reuso e reciclagem do recurso hídrico. O autor salienta, também, que a excessiva utilização de águas subterrâneas para irrigação, que em países e regiões áridas e semiáridas são muito mais rentáveis, provoca a diminuição do volume dos aquíferos, aumenta o custo de extração da água e de irrigação por hectare. Llamas e Martinez-Santos (2005) salientam que o déficit científico e tecnológico, a falta de informação, a inércia institucional, os interesses pessoais e a falta de novas instituições de gestão coletiva de aquíferos são os principais obstáculos para uma governança da água subterrânea adequada, seja em países ricos ou pobres.
No caso da gestão dos recursos hídricos no Brasil, é preciso ter em mente que esta ocorre ao longo da história de forma fragmentada e centralizada. É somente nos anos 1980 que iniciam os debates para a criação de um sistema integrado e descentralizado, que resultará na constituição das bacias hidrográficas.
Tratada como um bem particular pelo Código de Águas de 1934, é somente em 1988, com a Constituição Federal, que o Brasil atribui à água a denominação de “bem de uso comum do povo”, transformando-a em um bem público a partir de então. Os critérios de dominialidade foram estabelecidos no texto da Carta Magna, em específico nos artigos 20 e 26, que prevêem que o domínio das águas será da União ou dos Estados, considerando-se para tanto, a localização do manancial (BRASIL, 1988).
Com o objetivo de instituir uma política nacional para os recursos hídricos, em 1997 foi criada a Lei das Águas, nº 9.433, contemplando instrumentos que permitem o controle da qualidade e da quantidade de água, dentre os quais merecem destaque a outorga para o uso e a cobrança da água (BRASIL, 1997).
Ao tratar especificamente sobre a gestão de águas em territórios rurais, Martins (2006) afirma que as discussões que envolvem a governança nestes espaços dependem da capacidade dos atores sociais criarem redes de cooperação e interesse, como estratégias locais de desenvolvimento. Para o autor, o desenvolvimento rural e a gestão ambiental são vistos como momentos de um mesmo processo, pela necessidade moderna de geração de renda e uso sustentável dos recursos naturais. Assim, os problemas de gestão agroambiental demonstram políticas específicas criadas por autoridades comunitárias e geridas pelas próprias localidades.
Um dos eixos principais para o desenvolvimento de uma governança dos recursos hídricos é a participação do usuário, da iniciativa privada e do setor público, defende Tundisi (2008). Para enfrentar as consequências dos efeitos das mudanças globais nos recursos hídricos é preciso promover uma melhor governança e desenvolver tecnologias de gestão e monitoramento, ampliando a participação dos usuários e público em geral, a fim de dar maior sustentabilidade às ações, diz ele. No mesmo sentido, Machado (2003) entende que a gestão participativa eficaz se dá com processos contínuos e organizados de informação social.
Baseada na ecologia profunda, para Shiva (2006) as soluções para a crise da água não virão do mercado, mas de um encaminhamento ecológico, justo e democrático sobre este recurso, que retome o significado espiritual e cultural dos recursos hídricos, perdido a partir da Revolução Industrial.
Reconhecer o valor social e ecológico de uma fonte de recursos naturais leva ao uso equitativo e sustentável. Em compensação, considerar um recurso natural apenas em termos de seu preço de mercado, cria padrões de uso injusto e não sustentável […] a água tornou-se um grande negócio para as corporações, pois estas enxergam no aumento da escassez de água e da sua demanda um mercado sem limites. [...] a água é um bem comum e necessita de gerenciamento comunitário […] A posse da água nem sempre acarretou o envolvimento privado e do Estado. Por muito tempo, a água esteve sob o controle da comunidade. Por todo o mundo, sistemas complexos de conservação e de partilha da água garantiram a sustentabilidade e a acessibilidade a todos. O controle da comunidade indicava que a água era administrada localmente e como um recurso comum (SHIVA, 2006, 23, 35, 68).
Para Shiva (2006) a gestão das bacias hidrográficas precisa atender à necessidade atual de “combinar equidade e sustentabilidade com justiça” (p. 96). Já que se trata de uma necessidade básica como a comida, o que faz com que as fontes de recursos hídricos se transformem em “fontes de tensão social [...] O controle da água significa o controle sobre as pessoas” (p. 145), afirma. A autora defende o controle comunitário dos recursos hídricos. No entanto, escreve que nenhuma legislação nacional e internacional “responde adequadamente aos desafios políticos e ecológicos colocados pelos conflitos da água” (p. 94). No caso da Índia há exemplos em que o controle comunitário dos recursos hídricos, por meio da tomada de decisão coletiva, tem ajudado a evitar conflitos.
Tendo-se caracterizado a situação dos recursos hídricos na América Latina e no Brasil, apontando aspectos para a gestão compartilhada das águas, conforme a primeira parte do objetivo do artigo, busca-se, no próximo capítulo aprofundar a compreensão das relações comunitárias com a água a partir do estudo de caso do município de Marques de Souza, inserido na Bacia Hidrográfica Taquari-Antas. Para isto descreve-se este território ambiental.
4 BACIA HIDROGRÁFICA TAQUARI ANTAS: CONTEXTO EMPÍRICO
Antes do Brasil instituir a Lei das Águas, o Rio Grande do Sul já possuía sua própria política de recursos hídricos, a Lei Estadual nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994, que adotava o critério das bacias hidrográficas como forma de gestão dos recursos hídricos[6] (RIO GRANDE DO SUL, 1994).
O órgão gestor da bacia é um colegiado de entidades representativas dos diferentes segmentos da sociedade e dos órgãos do Governo. Suas principais funções, segundo a Lei, são: propor objetivos de qualidade das águas, aprovar o plano de ações, definir valores a serem cobrados pelo uso da água e compatibilizar os interesses dos diferentes usuários[7].
Este estudo interessa-se especialmente pela relação que tem com os recursos hídricos os habitantes do território que compreende a Bacia Hidrográfica Taquari/Antas, a qual abrange 119 municípios, onde vivem 1,3 milhões de pessoas, na região nordeste do estado do Rio Grande do Sul. Trata-se de uma área de 26.428 quilômetros quadrados, que ocupa 9% da extensão do estado mais ao sul do Brasil[8] (COMITÊ DE BACIA HIDROGRÁFICA TAQUARI-ANTAS, 2012).
Os usos da água nesta região são para abastecimento público, abastecimento industrial, irrigação, dessedentação de animais, navegação comercial, recreação, pesca comercial e geração de energia elétrica (FEPAM, 2011). A Bacia caracteriza-se pelo alto índice de industrialização e pelo predomínio de produção primária, diferenciando-se no cenário estadual pelo alto índice de desenvolvimento socioeconômico. No entanto, o crescimento desordenado trouxe problemas hídricos, como a contaminação decorrente dos esgotos domésticos, da criação de animais e da utilização de agrotóxicos ( OLIVEIRA, PÉRICO, MAZZARINO, 2017)
A situação ambiental dos rios que compõem a bacia hidrográfica do Forqueta vem sendo analisada nos últimos anos, do ponto de vista biológico, abrangendo estudos de cobertura vegetal e de qualidade da água. Diversos estudos indicam, com relação à cobertura vegetal, que já passou a fase crítica do desmatamento para abertura de áreas para agricultura e pecuária. Estudos sobre a estrutura da paisagem da bacia indicam que entre 1989 e 2008 a área florestada sofreu um acréscimo de 79,9%, ou seja, um incremento médio de 6,7% ao ano (PÉRICO et al., 2011). As alterações observadas no tamanho dos fragmentos de mata possibilitam levantar a hipótese de que houve o abandono de áreas anteriormente ocupadas para fins agropastoris. Todos os municípios da bacia em questão apresentaram uma redução de população na zona rural e um aumento de população na zona urbana (ROSA, PERICO, 2017). Deve-se considerar que este aumento não leva em conta os movimentos migratórios que devem ter ocorrido em relação à capital do Estado e a outros municípios de maior porte. Esta tendência pode ser observada na variação da utilização do uso e ocupação da terra nos dois períodos. Estudo de Ducatti e Périco (2015) aponta que as classes de vegetação campestre, solo exposto e lavoura sofreram redução de 29,89%, 52,20% e 50,59%, respectivamente, o que pode indicar o abandono das áreas e consequente aumento das classes de vegetação secundária (55,73%), áreas urbanas (41,04%) e Floresta Ombrófila Mista (82,21%). Segundo o estudo, o aumento da Floresta Estacional Decidual não foi proporcional, provavelmente porque sua localização em áreas planas facilitou a plantação de floresta industrial (Pinus sp. e Eucaliptus sp.), que está aumentando na região.
Criado em 1995, Marques de Souza localiza-se na região centro-leste do Rio Grande do Sul, no Vale do Taquari, a 143 Km de Porto Alegre. Possui 125,2 km² de área territorial. Seus moradores são, em sua maioria, descendentes de origem alemã e italiana, mantendo costumes destas etnias. Dos seus 4.349 habitantes, mais da metade vivem na área rural. O Índice de Desenvolvimento Socioeconômico (Idese) médio do município em 2014 era de 0,71. Abaixo da média no Rio Grande do Sul que no mesmo ano era de 0,75. Compõe este índice de Marques de Souza dados relativos à renda 0,66; educação 0,61 e saúde 0,85. (FEE, 2014).
Quanto ao saneamento, em relação ao esgoto, tanto na zona rural quanto urbana, são utilizadas a fossa séptica e o sumidouro, com filtro, "quando necessário", segundo o informante da Prefeitura Municipal de Marques de Souza. Para os resíduos sólidos não há coleta seletiva. Eles são coletados duas vezes por semana e enviados para aterro sanitário em outro município. Em relação à coleta, tratamento e distribuição de água, na área rural há as sociedades de água, associações de moradores que usufruem da água captada em poços artesianos (mediante compartilhamento das despesas), a qual é tratada pelo município com cloro, cabendo sua distribuição também à Administração municipal. Na área urbana a Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) é responsável pelo tratamento (feito com fluoretação e cloro) e distribuição.
No município predomina a produção de milho, soja, feijão e trigo. Na pecuária destacam-se a produção leiteira, a avicultura e a suinocultura, setores responsáveis pela economia. Estes produtores, em sua maioria, segue a tendência de trabalhar de forma integrada à indústria. Em menor escala se produz fumo e frutas (PREFEITURA MUNICIPAL DE MARQUES DE SOUZA, 2017).
O município é banhado por dois rios que o margeiam: Fão e Forqueta, afluentes da Bacia Hidrográfica Taquari-Antas. Em suas margens há seis campings que recebem, para veraneio, moradores e turistas de vários municípios da região e do Estado (PREFEITURA MUNICIPAL DE MARQUES DE SOUZA, 2017). Portanto, os moradores têm forte ligação com a água, a qual faz parte de sua cultura. De acordo com o diagnóstico realizado pelo Comitê de Bacia Hidrográfica Taquari/Antas, a qualidade da água na sub-bacia do Forqueta foi enquadrada como classe três[9].
5 RESULTADOS
Este capítulo relata de forma descritiva os dados levantados nas entrevistas realizadas com os 34 informantes, classificando os dados e separando-os conforme as categorias de análise propostas para o estudo. A análise dos resultados se fará no capítulo seguinte.
5.1 Fontes de informação
Esta categoria foi construída a partir das respostas às seguintes questões da entrevista individual estruturada: onde você obtém informações sobre a questão da água, quais fontes confia mais ou menos, quais meios de comunicação acessa informação sobre água e se nos grupos sociais que participa tratam sobre a questão.
A análise dos dados obtidos aponta que as fontes de informação mais acessadas pelos informantes referem-se a quatro tipos: 1) midiáticas: televisão, rádio, jornais, internet (livros), revistas, propagandas. 2) sociais de proximidade: grupos de bocha, futebol, dança; família; conversas na comunidade; boca a boca. 3) organizações não governamentais de natureza técnica e educativa: conselhos, comitê de bacia, sindicatos, órgãos representativos de agricultores, escolas e universidade (em reuniões, palestras, seminários, cursos). 4) organizações governamentais: órgão de assistência técnica rural do Estado, prefeitura e Companhia de Abastecimento de Água e Saneamento (Corsan).
As fontes midiáticas rádio e televisão foram as mais lembradas entre todos os tipos. As fontes citadas como mais confiáveis foram, por ordem, as midiáticas (televisão, rádio, jornais, internet), sociais de proximidade (família; conversas pessoais), governamentais (técnicos, órgão públicos, autarquias), não governamentais (universidade, escola, professor e técnicos). Como fontes menos confiáveis apareceram o grupo de futebol (social de proximidade), a televisão e o rádio (midiáticas).
Os meios de comunicação foram indicados tanto como mais confiáveis quanto como menos confiáveis. Os informantes deixam entrever que desconfiam de manipulação: “é difícil confiar”, “notícia é sempre questionável”, “a mídia aceita tudo o que divulgam, não é bem a realidade”. Os entrevistados afirmam que muitos fatos divulgados pelos meios de comunicação “não condizem com a realidade”; “A televisão não pode distorcer tanto porque a imagem ajuda a contar,” segundo um informante. “Confio desconfiando, preciso fazer uma leitura crítica”, diz outro.
Observa-se que as sociedades de água não foram lembradas como fontes de informação. A formação de sociedades de água refere-se a um processo de gestão dos recursos hídricos bastante comum nas áreas rurais do Vale do Taquari, onde cada localidade consome a água de uma mesma fonte, seja ela de poço artesiano ou vertente. As sociedades de água começaram a ser fundadas em 1985 e a última em 1997. Os fundadores das sociedades foram os próprios moradores, com o auxílio das prefeituras de Lajeado (município que é o pólo urbano da região) e/ou de Marques de Souza e do Estado. Na maioria das sociedades os moradores entraram com a mão de obra e algumas com o rateio dos custos da infraestrutura, como os encanamentos. As prefeituras e o Estado ajudaram com as horas de máquinas para a perfuração dos poços, abertura das valas e ofertaram a bomba, a caixa de água e as tubulações. O que motivou a fundação das sociedades de água foi a necessidade de acesso de água de qualidade nas residências, com tratamento e encanamentos adequados. A utilização de fontes naturais, como poços, vertentes, riachos e o rio também impulsionaram a formação de sociedades, pois durante a estiagem, estes mananciais secavam, fazendo com que muitos moradores ficassem sem água e tivessem que se deslocar até outras localidades em busca do recurso hídrico.
Outros grupos sociais, que alguns entrevistados afirmaram pertencer, não foram citados como fontes de informação: associação de moradores, clubes de mães, grupos de idosos, comunidade escolar, sociedade de cantores e coral.
Quanto aos aspectos mais pautados pelas fontes de informação que abordam a questão da água são classificados em três tipos: econômico, de saúde e higiene e, por último, consumo. Econômico refere-se a gastos com a água, cobrança de taxa para tratamento com cloro, pagamento pelo uso da água. Quanto ao aspecto relativo à saúde e higiene os entrevistados fazem alusão à relação entre água e saúde, cloro na água e consequências para a saúde, lixo e sujeira na água, qualidade, contaminação por agrotóxicos, gosto da água. Quanto ao consumo as pautas referem-se à falta de água, ao desperdício e à necessidade de cuidar desse recurso.
Quatro tipos de temas aparecem como mais pautados pelas fontes: ecológicos, legais, de saúde e de gestão. Ecológicos referem-se à construção de cisternas para captação e armazenamento de água da chuva, preservação de fontes, rios, matas e da água. Legais tratam da obrigação sobre o uso do cloro na água, uma preocupação que têm para evitar multas. Saúde refere-se à presença de impurezas e ao cloro na água. No tema gestão incluem-se a falta de água, prestação de contas, formas de evitar sanções e conscientização dos usuários para evitar desperdício.
5.2 Problemas ambientais relacionados à água
As perguntas da entrevista que geraram esta categoria de análise foram: que problemas em relação à água observa, quais causas, quais considera mais e menos graves, suas consequências, relação entre estes problemas e outros ambientais.
Observou-se forte preocupação dos entrevistados com a poluição e com a contaminação crescente por agrotóxicos, dejetos, animais e mosquitos, assim como a consequente perda de qualidade para o consumo humano. Ao mesmo tempo percebem um aumento de demanda devido à superpopulação e a elevação dos custos de tratamento e de distribuição. Outra preocupação é com a diminuição dos cursos naturais da água e com o aumento na incidência das catástrofes ambientais, decorrentes da falta de cuidado com os recursos naturais (o que relacionam com o plantio de eucaliptos, retirada de mata ciliar, poluição, contaminação de poços, falta de educação ambiental). Um dos informantes atribui ao tratamento da água com cloro a causa de “doenças na população”.
As respostas dos informantes sobre as causas dos problemas relacionados à água apontam para a percepção da falta de planejamento dos gestores para atender ao crescimento populacional e as suas demandas, além da ocupação humana desordenada dos territórios, sem o consequente investimento em saneamento e em políticas ambientais. Entendem que houve, também, uma desordenada perfuração dos poços, excesso de retirada da mata ciliar dos rios, além de formas diversas de poluição que contaminam as fontes de água. Associado a isto está o descaso e o desinteresse da população com estas questões, falta de representatividade comunitária nos órgãos de decisão e a pouca circulação de informação educativa ambiental no município.
As consequências destes problemas previstas pelos entrevistados serão: doenças, necessidade de comprar água, aumento no seu valor, escassez futura, má formação fetal por contaminação por agrotóxicos, falta de água potável, desequilíbrio biológico e a falta de alimentos de qualidade.
Os problemas da água são percebidos, principalmente, em relação aos agrotóxicos, ao desmatamento, ao lixo, ao crescimento urbano, à sede, à fome, à saúde, às queimadas, à poluição do ar, à morte de animais, às enchentes e à crescente produção de dejetos.
Questionados sobre o que se dispõem a fazer para minimizar os problemas ambientais que identificam, afirmaram: não desmatar/reflorestar, informar outros/educar, denunciar, fiscalizar, ajudar em eventos, atualizar sistemas produtivos, se responsabilizar, alertar as pessoas, separar os resíduos, cuidar, não desperdiçar, evitar queimadas e não usar agrotóxicos. Além destas respostas surgiram as seguintes: “Não há o que fazer”, “O problema é os outros”, ou então consideram que cabe ao órgão de assistência técnica rural fazer algo. Assim, as soluções apresentadas pelos entrevistados para que uma relação mais sustentável com a água se concretize deixa entrever diferentes lógicas:
a) Técnica/ecológica: para a relação com a água ser mais respeitosa é preciso tratar esgotos, construir cisternas, separar e reciclar o lixo, preservar a mata ciliar, evitar o uso de agrotóxicos.
b) Cultural: devem ocorrer campanhas educativas, de responsabilização, conscientização para mudança de hábitos cotidianos (para evitar desperdícios e o uso de produtos que agridam o meio ambiente); é preciso trabalhar sobre a percepção da relação água/saúde/qualidade de vida. É importante aprender com antepassados, com os povos indígenas. “Infelizmente as tragédias é que conscientizam”.
c) De controle: é preciso fazer cumprir leis, tributar/multar, limitar a quantidade de água por pessoa.
e) Resolutiva: os problemas precisam ser detectados para resolvê-los.
O estudo demonstrou, ainda, que a preocupação dos moradores foi intensificada após a catástrofe (enchente) ocorrida no ano de 2010. Tal fato, no entanto, indica que a preocupação com os recursos hídricos poderia não ter atingido tais níveis caso a enchente não tivesse ocorrido. Ou seja, apesar da relação dos moradores com a água ter se intensificado, ainda fica caracterizada uma visão antropocêntrica deste bem, já que a preocupação com os recursos naturais surge preponderantemente em função destes atingirem ou se relacionarem com a vida humana. Isto se verifica quando as preocupações relacionadas à água dizem respeito à potabilidade, à higiene, aos parâmetros para o consumo, etc. Ou seja, fatores que interferem diretamente na vida humana.
6 DISCURSOS E SUAS MATRIZES CULTURAIS
Tendo apresentado os resultados dos dados obtidos por meio das entrevistas, neste capítulo aprofundam-se as duas matrizes culturais que permeiam os discursos dos informantes – comunicacional e crítica-reflexiva - apontando-se algumas propostas para a gestão comunitária das águas, tendo-se em vista a construção de um processo de governança hídrica.
Quanto à matriz comunicacional, relacionada às fontes de informação e modos de interação comunitária, aponta para o papel paradoxal que as fontes midiáticas assumem na comunidade: sendo as mais presentes, são as que gozam de maior e também de menor confiança. Ficou demonstrada por alguns informantes que as contradições nas respostas sobre a credibilidade das fontes midiáticas podem estar vinculadas ao sentimento de confiança/desconfiança em relação ao comunicador.
Outro elemento refere-se à ausência das sociedades de água e do Comitê de Bacia como fonte de informação sobre este recurso (apenas um informante citou o Comitê de Bacia), constituindo-se este fato um elemento que deixa entrever a falta de comunicação comunitária em relação às questões hídricas, mesmo quando percebidas como problemáticas. Tal fato indica a dificuldade em se acessar tais informações ou até mesmo a falta destas.
Os dados apontam para a possibilidade de se investir em meios de comunicação, no Comitê de Bacia e nas sociedades de água como mediadores de informação. A mídia porque é a mais citada e os outros porque, mesmo pouco citados, têm uma relação de proximidade ao menos física com os usuários de água, com forte potencial para a comunicação face a face sobre as questões dos recursos hídricos. O Comitê é a instância de participação democrática para a gestão das águas que, teoricamente, tem poder deliberativo. As sociedades de água constituem-se como espaço de poder local para a gestão do recurso hídrico, equilibrando as demandas.
Apesar de os entrevistados reconhecerem diversos tipos de fontes, seus relatos indicam que sentem necessidade de mais circulação de informação sobre questões econômicas, de saúde, legais, de viés ecológico, sobre consumo e sobre a gestão das águas.
Esse cenário impõe um novo papel para os meios de comunicação e para os gestores públicos. É primordial que os meios de comunicação ultrapassem os interesses mercadológicos e passem a exercer uma função social. As orientações gerais acerca do papel da mídia foram traçadas no artigo 221 da Constituição Federal de 1988, o qual prevê em seu texto que a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão devem dar preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, o que inclui a informação educativa ambiental.
Considerando que os meios de comunicação são concessões do Poder Público, os mesmos encontram-se obrigados a respeitar tais preceitos, orientados para o bem comum, pois a falta de informações ou o repasse de informações desencontradas afetam a percepção acerca das questões ambientais.
Em relação à matriz crítica-reflexiva, que sintetiza a análise de elementos relacionados aos modos de significar os problemas ambientais atrelados à água, observa-se que a preocupação com a qualidade da água para a sobrevivência humana a partir do trabalho rural predomina sobre aquelas que têm cunho ecológico, preventivo, conservacionista. E apontam a necessidade de que haja planejamento e gestão ambiental para o enfrentamento dos problemas citados, maior cuidado com os recursos hídricos, fortalecimento comunitário e circulação de informação.
Elementos das dimensões éticas, econômicas, comunicacionais, legais e ecológicas surgem como causas dos problemas ambientais relacionados à água, o que se explicita quando uma análise geral dos relatos aponta para as seguintes construções sociais: o homem é o causador dos problemas ambientais e está pagando por isso (o que está relacionado com a matriz judaico-cristã da culpa); há um agravamento da crise ambiental (e este sentido pode ser decorrente das construções midiáticas a que os informantes estão expostos); a lógica econômica é uma causa desta crise e grupos econômicos podem ser favorecidos com ela; a escola e a mídia são espaços privilegiados de circulação de informação ambiental (mas carecem de uma perspectiva sistêmica, como outros estudos dos autores deste artigo estão concluindo); são necessárias mudanças nas leis ambientais (para evitar o êxodo rural dos jovens; para ser flexibilizada e se adequar às realidades dos produtores[10] e fazer frente à impunidade); o desmatamento é uma das grandes causas dos problemas ambientais (significado que pode estar ancorado na ampla discussão que o país fazia referente ao Código Florestal); os problemas urbanos são menos visados que os problemas rurais; a questão ambiental já melhorou, mas cada um precisa responsabilizar-se e “fazer a sua parte”, pois, pouco se faz para resolver os problemas ambientais, preferindo-se investir em outros setores.
Observa-se que a preocupação dos entrevistados está coerente com o que foi detectado por Ducatti e Périco (2015), já que o plantio de árvores exóticas, em especial o eucalipto e o pinus, vem aumentando na região. Essas culturas permitem ao agricultor uma fonte de renda mais estável, menos trabalhosa e menos dependente das condições climáticas.
Outro problema grave citado pelos entrevistados refere-se à poluição das águas por dejetos animais. Este é um dos principais problemas da região e está também relacionado à destruição das matas ciliares. A região apresenta uma grande quantidade de propriedades dedicadas à suinocultura, boa parte localizada na beira dos rios e sem um sistema de tratamento adequado (PÉRICO et al., 2005).
Com relação à qualidade da água dos rios Forqueta, Forquetinha e Fão, um estudo preliminar foi realizado, utilizando análises físico-químicas (pH, temperatura, Demanda Biológica de Oxigênio (DBO), Demanda Química de Oxigênio (DQO), Oxigênio Dissolvido (OD) e presença de insetos bentônicos indicadores de qualidade ambiental, utilizando o Índice Biótico BMWP¹. Os resultados revelaram que todos os três rios apresentam, nos pontos coleta, água com qualidade “aceitável”. (STROHSCHOEN et al., 2009)[11] Portanto, o conhecimento empírico que os informantes da comunidade de Marques de Souza deram a conhecer aos pesquisadores estão estreitamente relacionados aos dados socioambientais apurados cientificamente por Périco et al., (2005); Périco et al., (2011) e Strohschoen et al., (2009).
7 CONCLUSÕES
Diante da relação que a comunidade de Marques de Souza tem com as fontes de informação e dos problemas que observam em relação à questão hídrica no seu território, verificou-se que as lógicas que perpassam os discursos na comunidade são marcados pelas matrizes culturais comunicacional e crítica-reflexiva. A partir destas evidências, busca-se, de modo conclusivo, apontar elementos que possam contribuir para a construção de processos de governança comunitária das águas: autonomia, conflitos, redes de confiança, participação, capilarização, planejamento e comunicação midiática.
a) Autonomia - historicamente as comunidades detinham autonomia em relação à gestão e uso das águas (pelo uso de poços, vertentes, riachos, etc.), a qual está gradativamente sendo perdida, restando ainda um processo de autonomia representada pela força das sociedades de água (onde estas existem), que diante da legislação pode ser perdida devido a instrumentos de cobrança, outorga e formatos organizacionais impostos (como as concessões, comitês, etc.). Esta realidade aponta pra emergência de conflitos entre necessidades socioambientais e políticas com exigências legais. A água era um bem público, passou a ser um bem particular (Código de Águas de 1934), e somente em 1988 com a Constituição Federal voltou a ser um bem público. Ocorre que esta denominação de bem público, ou bem de uso comum, ainda não foi bem compreendida.
b) Conflitos - podem ser vislumbrados vários cenários conflitivos em relação aos recursos hídricos na comunidade estudada que poderão ser realidade em outras regiões do país: perda da autonomia pela gestão das águas; desconfiança em relação aos processos de tratamento; perspectiva de escassez frente a práticas agrícolas que afetam a oferta quantitativa do recurso e usos baseados no desperdício; maiores custos e disputas por menor quantidade e pior qualidade das águas (com a tendência de aumentarem as fontes de contaminação pelo uso de agrotóxicos e por dejetos animais e humanos); emergência de conflitos entre necessidades socioambientais e políticas diante das exigências legais e entre diferentes atores e grupos, de campos sociais diversos, que disputam vários tipos de capital: simbólico, hídrico, econômico, político, etc.
c) Protagonismo - o fato de o papel social mediar a relação dos atores com a água potencializa os presidentes de sociedades de água (onde existe esta configuração) a assumirem-se protagonistas na mobilização de processos de governança, o que requer a associação com outros atores sociais.
d) Redes de confiança - grupos sociais de proximidade, que figuram como espaços de sociabilidade e informação baseados na confiança, não foram lembrados de forma relevante como espaços que pautam temas relativos aos recursos hídricos nos seus encontros sociais. Esta falta de informação e de comunicação entre os atores potencializa o surgimento de conflitos.
e) Participação - a gestão centralizada, tanto dos comitês de bacias hidrográficas quanto das sociedades de água, ainda caracteriza estes órgãos gestores pelo seu uso instrumental: para acessar à água e não como instância de participação socioambiental e política efetiva sobre um bem comum e vital.
f) Capilarização - há falta de representatividade dos atores que representam os grupos sociais nos Comitês, os quais não circulam as informações em debate para seus representados, levantando-se a hipótese que seja um problema que se estende a vários grupos sociais dos comitês de bacias em diferentes territórios, mantendo-se a supremacia de fala e decisão aos órgãos legitimados historicamente.
g) Planejamento - emerge como necessidades mais urgentes a de planejamento para a gestão efetivamente comunitária dos recursos hídricos, com fortalecimento dos grupos sociais (algo ainda a ser construído a partir da sociedade civil e não apenas burocraticamente), maior circulação de informação e gestão de processos de comunicação entre os grupos e atores de diferentes campos sociais.
h) Comunicação midiática - observa-se um papel limitado dos meios de comunicação em relação à sua função pública, já que tendem a uma cobertura dos temas ambientais pouco plural em relação a pontos de vista e a fontes. Assim, faltam informações aos cidadãos sobre aspectos legais, sanitários, econômicos, ecológicos, de gestão e consumo hídrico, o que retroativamente afeta a comunicação sobre o tema nas comunidades.
A partir do estudo de caso, considera-se que um processo de construção de governança comunitária das águas requer a adoção das seguintes estratégias: identificação de formas para manter e/ou recuperar a autonomia da comunidade sobre a gestão e o uso das águas, respeitando-se os interesses coletivos; mediação de conflitos relacionados aos diferentes interesses e usos das águas; empoderamento das lideranças para que se assumam como protagonistas ambientais; ampliação das redes de comunicação ambiental entre os grupos sociais da comunidade, de modo a fortalecer os laços de confiança; preparação para a participação efetiva dos subcomitês de bacia nos debates do Comitê, o qual representa um espectro muito amplo de território e, portanto, uma diversidade de atores e de situações; capilarização das informações entre representantes no Comitê e seus grupos sociais de origem; planejamento participativo e baseado em processos de comunicação pública sobre os problemas hídricos; investimento na formação ambiental dos comunicadores midiáticos, para dar conta da complexidade que o tema das águas tem para a vida, em todas as suas formas.
Portanto, entende-se que uma nova cultura da água precisa brotar, a qual depende da compreensão do ser humano sobre a relação de interdependência que se estabelece entre ele e a natureza. Jonas (2008) afirma que na era da tecnologia, quando o homem chegou à onipotência de modo negativo, o primeiro dever relacionado ao comportamento humano coletivo está relacionado ao futuro da humanidade. E umbilicalmente ligado a este dever encontra-se o futuro da natureza, já que este se coloca como condição sine qua non para o futuro do homem. E pelas incongruências da vida, o futuro da natureza é de responsabilidade do próprio homem, quando esse se converteu em um perigo para a mesma e também para si próprio. Desse perigo nasce um novo dever que demanda, necessariamente, uma ética de conservação, de cuidado e de prevenção, segundo o autor.
[...] como productos surgidos de la naturaleza, debemos fidelidad al conjunto de sus creaciones con las que nos hallamos emparentados, entre las cuales la de nuestro proprio ser es su más alta cumbre, que, bien entendida, tomará bajo su cuidado todo lo demás (JONAS, 2008, 227-228).
A relação de total interdependência entre humanos e natureza no contexto contemporâneo refere-se ao entrecruzamento de direitos os seres vivos.
Assim como uma nova cultura, novas formas de organização precisam ser implantadas, de modo a envolver todas as partes interessadas e diretamente atingidas. Neste sentido, se torna relevante a construção de processos de governança ambiental, compreendida, segundo Jacobi (2012, p. 71) como o “exercício deliberado e contínuo de desenvolvimento de práticas cujo foco analítico está na noção de poder social que media as relações entre Estado, Sociedade Civil e Mercado”, onde tomadores de decisão e não tomadores de decisão são envolvidos em torno de um objetivo comum: no presente caso, a preservação dos recursos hídricos.
Para além de Jacobi entendemos que, mais do que o envolvimento de entes como o Estado, a Sociedade Civil e o Mercado, a governança ambiental pode ser definida como aquela onde a sociedade encontra espaços comunitários e instâncias de representação para que possa, de forma voluntária, estabelecer formas cooperativas e participativas de gestão das águas, compreendidas como um patrimônio natural partilhado.
A governança comunitária está intrinsecamente relacionada à prática da cidadania e às relações comunitárias. Sua importância cresce quando o capitalismo passa a identificar-se cada vez mais com a regulação baseada na ciência e na técnica, o que desencadeou o desenvolvimento hipertrofiado do Estado e do mercado em detrimento da comunidade, como analisa Santos (2001).[12] O exercício da cultura política, neste contexto, é uma qualidade pessoal e coletiva que fundamenta novos exercícios e formas de cidadania e subjetividade. “Politizar significa identificar relações de poder e imaginar formas práticas de as transformar em relações de autoridade partilhada” (SANTOS, 2001, 271). O autor distingue quatro espaços políticos estruturais para o exercício da autoridade partilhada: da cidadania, doméstico, da produção e mundial.
A nova cidadania tanto se constitui na obrigação política vertical entre os cidadãos e o Estado, como na obrigação política horizontal entre cidadãos. Com isto, revaloriza-se o princípio da comunidade e, com ele, a ideia da igualdade sem mesmice, a ideia de autonomia e a ideia de solidariedade (SANTOS, 2001, 277-278).
Sem o exercício da cultura e da autoridade partilhada não é possível a governança hídrica, a qual permanecerá hibernando como uma potência adormecida. O despertar da governança comunitária das águas se dará com a construção de uma ligação mais próxima entre os cidadãos e os Comitês de Bacia Hidrográfica que, por sua vez, constituem-se em um elo de ligação com outras estruturas e instituições em torno dos recursos hídricos.
Este estudo de caso contribui apontando oito estratégias para a construção de processos de governança comunitária das águas. Estas estratégias precisam ser desenvolvidas no âmbito dos comitês e subcomitês de bacia para avançar em relação ao presente arranjo institucional, que mal se efetiva como representativo.
Shiva (2006) refere que é preciso recuperar a dimensão sagrada da natureza, mas agora permeada pela cultura política, isto porque a dessacralização da natureza gerou uma crise que podemos denominar como crise eco civilizacional, que em seu próprio movimento vai dar origem a processos criativos para se reviver o elo fundamental entre humano e natureza.
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[1] Segundo a Lei nº 11.445/2007, considera-se saneamento básico o conjunto de serviços, infra-estruturas e instalações operacionais de: a) abastecimento de água potável; b) esgotamento sanitário; c) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos; d) drenagem e manejo das águas pluviais urbanas. Disponível em https://www.ana.gov.br/todos-os-documentos-do-portal/documentos-sre/alocacao-de-agua/oficina-escassez-hidrica/legislacao-sobre-escassez-hidrica/uniao/lei-no-11-445-2007-saneamento-basico/view
[2] [2] Os elementos que compõem estas categorias estão identificados quando se procede sua análise.
[3] [3] O caso de Cochabamba repercutiu consideravelmente na história da privatização da água na América Latina. Em decorrência de dívidas contraídas pelo governo boliviano com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, houve uma determinação de privatização de vários setores, dentre eles o de serviços públicos de água. A corporação que assumiu os serviços foi a Bechtel de São Francisco, que se reservou inclusive o direito sobre a água da chuva. O povo formou um grupo organizado para manifestação, que no embate com policiais resultou em dezenas de feridos e um morto. Como conseqüência a empresa se retirou do país, o contrato foi cancelado e as águas voltaram para as mãos do Estado.
[4] [4] A Resolução n. 32 do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), de 15 de outubro de 2003, define a divisão hidrográfica nacional em 12 regiões.
[5] Os dados estão disponíveis em http://conjuntura.ana.gov.br/usoagua
[6] [6] Bacia hidrográfica é uma unidade geográfica compreendida entre divisores de água, é um espaço de terreno limitado pelas partes mais altas de montanhas, morros ou ladeiras, onde existe um sistema de drenagem superficial que concentra suas águas em um rio principal ligado ao mar, a um lago ou a outro rio maior.
[7] [7] Os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade estão estabelecidos na portaria do Ministério da Saúde nº 518/2004.
[8] [8] O Rio Taquari é um dos principais rios da Bacia Hidrográfica Taquari-Antas, a qual está inserida na Região Hidrográfica Atlântico Sul. Esta região tem grande importância para o País pelo seu desenvolvimento econômico e por abrigar expressiva densidade demográfica. Seus principais rios são: Camaquã, Capivari, Itajaí, Jacuí e Guaíba.
[9] [9] A Resolução CONAMA 357/2005 prevê quatro classes de enquadramento, sendo Classe especial: águas destinadas ao abastecimento para consumo humano, com desinfecção; a preservação do equilíbrio natural das comunidades aquáticas; e a preservação dos ambientes aquáticos em unidades de conservação de proteção integral. Classe 1 - destinadas ao abastecimento para consumo humano, após tratamento simplificado; a proteção das comunidades aquáticas; a recreação, a irrigação de hortaliças e frutas ingeridas cruas. Classe 2: destinadas ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional; proteção das comunidades aquáticas; a recreação de contato primário, a irrigação de hortaliças, plantas frutíferas e de espaços naturais de uso público, a aquicultura e a pesca. Classe 3: ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional ou avançado; a irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras; a pesca amadora; à recreação de contato secundário; e a dessedentação de animais. Classe 4: águas que podem ser destinadas apenas a navegação e a harmonia paisagística (MMA 2013, texto digital)
[10] [10] Caso do Código Florestal, que mesmo após a sua alteração em 2012, ainda trabalha com conceitos gerais, não contemplando em seu texto a realidade dos ecossistemas locais.
[11] [11] O índice BMWP utiliza os macroinvertebrados bentônicos. Este índice ordena as famílias de macroinvertebrados aquáticos em 9 grupos, seguindo um gradiente de menor a maior tolerância dos organismos quanto à poluição orgânica. A cada família se fez corresponder uma pontuação, que oscila de 10 a 1, sendo que as famílias mais sensíveis à contaminação recebem as pontuações maiores, chegando, em ordem decrescente, até 1, onde estão aquelas mais tolerantes.
[12] [12] Santos (2001) vislumbra que a subjetividade se reafirma em detrimento da cidadania e da emancipação, um consequência da supremacia do mercado perante o Estado. Portanto, como consequência da “constelação ideológica-cultural” da transição do século XX para o XXI. O autor caracteriza a modernidade pelo jogo de forças entre três pilares da regulação (Estado, mercado e comunidade) e três dimensões da emancipação (racionalidades moral-ética do direito, cognitivo-experimenta-insturmental da ciência e da técnica, estético-expressiva das artes e da literatura). Santos se refere ao princípio de comunidade trazida por Rousseau, que tem a potência da participação, da solidariedade, da cooperação e da autonomia.