Universidade Federal de Santa Maria
Ci. e Nat., Santa Maria, v. 41, e12, 2019.
DOI: http://dx.doi.org/10.5902/2179460X33752
Received: 18/07/2018 Accepted: 24/01/2019
Section Education
O uso de geometria dinâmica e da investigação matemática na validação de propriedades geométricas
The use of dynamic geometry and mathematical investigation in the validation of geometric properties
Lucas de Souza BarbosaI
Cinthya Maria Schneider MeneghettiII
Cristiana Andrade PoffalIII
I Escola Estadual de Educação Básica Osmar da Rocha Grafulha, Pelotas, RS, Brasil.
lucas.sbarbosa@live.com
II Universidade Federal do Rio Grande - FURG, Rio Grande, RS
cinthya.schneider@gmail.com
III Universidade Federal do Rio Grande - FURG, Rio Grande, RS
cristianaandrade@furg.br
Resumo
Este artigo apresenta uma atividade sobre Geometria Espacial de posição usando o software GeoGebra, fundamentada na Investigação Matemática. A Geometria Dinâmica, através de softwares, torna-se uma ferramenta para a formação de uma imagem mental dos objetos abstratos e motivação para introduzir a ideia de justificar suas propriedades estudadas por meio de argumentos exteriores ao software. Aliada a Geometria Dinâmica, a Investigação Matemática norteia os possíveis caminhos para a construção de conjecturas e justificativas e enfatiza que, conjecturar e procurar propriedades são tão importantes quanto demonstrá-las, já que mostra a Matemática como um conhecimento em construção e favorece a evolução cognitiva da relação entre percepção e abstração. A atividade foi aplicada e observou-se que, a partir dela, o aluno consegue formular conjecturas e desenvolver habilidades de argumentação lógica e formal que são essenciais para construir entes geométricos a partir de suas propriedades.
Palavras-chave: Geometria. Investigação matemática. Geometria dinâmica.
Abstract
This paper presents an activity on Geometry of position using GeoGebra software, based on Mathematical Investigation. The Dynamic Geometry, through software, becomes a tool for the formation of a mental image of abstract objects and motivation to introduce the idea of justifying its properties through arguments external to software. Allied to Dynamic Geometry, Mathematical Investigation guides the possible ways to construct conjectures and justifications and emphasizes that conjecture and looking for properties are as important as demonstrating them, since it shows the Mathematics as a knowledge in construction and favors the cognitive evolution of the relation between perception and abstraction. The activity was applied and it was observed that, from it, the student can formulate conjectures and develop logical and formal argumentation skills that are essential to construct geometric objects from their properties.
Keywords: Geometry. Mathematical investigation. Dynamic geometry.
A Geometria deveria estar presente durante toda a formação de um aluno na Matemática da Educação Básica. Ela serve como base histórica para o desenvolvimento da Matemática como a conhecemos hoje. Um exemplo dessa ideia é o capítulo da história da Matemática sobre o surgimento das Geometrias conhecidas como não euclidianas. Documentos oficiais fazem indicações nesse sentido, por exemplo Brasil (2006) cita que a Geometria deve preparar o aluno não só para lidar com problemas do cotidiano, mas também “apreciar a faceta da Matemática que trata de teoremas e argumentações dedutivas”. Segundo Brasil (2004),
O ensino de Geometria no ensino fundamental está estruturado para propiciar uma primeira reflexão dos alunos através da experimentação e de deduções informais sobre as propriedades relativas a lados, ângulos e diagonais de polígonos, bem como o estudo de congruência e semelhança de figuras planas. Para alcançar um maior desenvolvimento do raciocínio lógico, é necessário que no ensino médio haja um aprofundamento dessas ideias no sentido de que o aluno possa conhecer um sistema dedutivo, analisando o significado de postulados e teoremas e o valor de uma demonstração para fatos que lhe são familiares. (Brasil, 2004, p.123)
No entanto, o ensino-aprendizagem de Geometria, sendo parte do ensino da Matemática, ainda é defasado no Brasil. Evidências disso são as pesquisas que indicam as dificuldades dos estudantes ingressantes no Ensino Superior, na área das Ciências Exatas. do Amaral Rodriguez et al. (2015) faz um panorama dessas pesquisas no país, destacando várias fragilidades no conhecimento básico dos alunos e nas concepções de Matemática desses discentes. Desde 1996, Gravina (1996) já pesquisava o caso específico da Geometria, e relatava que o grande número de reprovações nas disciplinas de Geometria Plana e Espacial era devido ao déficit de raciocínio lógico dedutivo e à falta de capacidade de generalização apresentada pela maioria dos estudantes ingressantes no curso de Licenciatura em Matemática. A atividade proposta neste artigo visa incentivar o aluno a formular conjecturas e, a partir disso, desenvolver habilidades de argumentação lógica e formal que são essenciais para construir entes geométricos a partir de suas propriedades e ainda generalizar as mesmas.
Existem diferentes dificuldades para o ensino-aprendizagem de Geometria. Um dos obstáculos está ligado ao histórico do Ensino da Geometria no Brasil. Segundo a trajetória do ensino de Geometria no Brasil traçado por dos Santos e Nacarato (2014), os anos 1970 e 1980, sob influência do Movimento Matemática Moderna, os conteúdos de Geometria passaram aos capítulos finais e focados principalmente na linguagem, e não na compreensão dos conceitos, juntamente da visão de que esses tópicos eram irrelevantes para a formação do aluno. Os autores ainda apontam que o fato de o Brasil ser essencialmente agrícola no século XX e por ter uma grande taxa de analfabetismo, o quase inexistente ensino de Geometria era basicamente utilitarista, limitando-se ao cálculo de áreas e de volumes.
Outra dificuldade no ensino de Geometria é intrínseca à sua natureza como forma de conhecimento. Para vencê-la é necessário entender como é formado o conhecimento geométrico, além de descobrir ferramentas e metodologias que podem ser usadas para aprimorá-lo. O conjunto de ferramentas que é sugerido corresponde à Geometria Dinâmica, softwares que possibilitam construir entes geométricos a partir de suas propriedades e, após manipulá-los para observar diversas configurações possíveis. A Figura 1 exibe a janela de visualização 3D de um dos mais conhecidos softwares de Geometria Dinâmica: o GeoGebra, que é utilizado na atividade proposta sobre Geometria espacial de posição. Como metodologia, é apresentada a Investigação Matemática, que se propõe a levar o espírito investigativo próprio dos cientistas para a sala de aula de Matemática.
Na próxima seção é apresentado o Conceito Figural. Ele permite uma reflexão entre as dificuldades de representação de entes geométricos devido as diferenças entre um desenho (com suas imperfeições) e as propriedades gerais de uma figura que representa uma classe genérica de objetos.
2 A Representação dos Entes Geométricos: o Conceito Figural
A Geometria Euclidiana é considerada a melhor representação do espaço habitado pelo homem. Mesmo com essa distinção, seu ensino é problemático, pois os objetos de estudo são, em última análise, abstratos. Segundo Carvalho (2005), as figuras perfeitas da Geometria existem num mundo de ideias, e as propriedades que regem essas figuras são estabelecidas por um sistema axiomático, sendo um exemplo deste.
Assim, para aprender Geometria é necessário entender definições, propriedades, teoremas sobre seus elementos, que podem ser representados e encontrados no mundo real, mas essas são apenas representações imperfeitas de objetos abstratos. Com isso, para que os alunos tenham real contato com a natureza da Geometria, é necessário que eles assimilem que as representações apresentam defeitos e que é preciso alcançar um certo grau de abstração para realmente operar sobre elas. Para abstrair é preciso criar imagens mentais dos entes geométricos e das proposições que são estudados.
Deseja-se que, através de um desenho ou uma figura com vários elementos geométricos, sejam assimiladas definições e propriedades que correspondem a uma classe inteira de figuras. É nessa assimilação de imagens mentais que residem alguns problemas do ensino aprendizagem de Geometria. Gravina (1996) já apontava que é comum livros e manuais inserirem, após definições de entes geométricos, como exemplo, ilustrações de determinado objeto, mas com características específicas que não
Figura 1 – Janela de Visualização 3D.
são parte oficial da definição. Por exemplo, triângulos de modo geral são acutângulos com um dos lados paralelos a base da folha (ou a linha do texto). Quadrados e retângulos têm representações semelhantes. Com isso, essas propriedades são incorporadas à definição e à imagem mental que se faz da figura. Para verificar isso, basta solicitar a maioria das pessoas que desenhe um quadrado ou um triângulo e verificar suas características (o próprio leitor pode fazê-lo agora). Alguns exemplos disso podem ser vistos na Figura 2.
Figura 2 – Representação de alguns triângulos com um lado alinhado com a base em (Iezzi et al., 2013, p.271).
Segundo Giraldo et al. (2013), é preciso diferenciar as imagens de objetos geométricos em desenhos e figuras. Os primeiros são imagens particulares, com características dadas no enunciado de uma questão, por exemplo. Já as figuras são a “representação genérica de uma classe de objetos matemáticos, que compartilham um conjunto comum de propriedades”. Assim, devem-se usar figuras (preferencialmente mais de uma) para representar triângulos e quadrados para tornar claro que sua definição é dada apenas a partir de algumas de suas características, que independem de particularidades como tamanho e posição. Um exemplo desse caso é a Figura 3. Quando um aluno notar que uma imagem é uma figura, não um desenho, ocorre a abstração da ideia do ente matemático estudado, tornando possível a sua representação mental para generalizações a seu respeito.
Um estudo semelhante do caso das representações que produzem imagens mentais foi proposto por Fischbein (1993) apud Gravina (1996). Segundo esse autor, as imagens geométricas têm duas componentes. O componente conceitual consiste no conjunto de palavras, sejam elas faladas ou escritas, que definem as propriedades do objeto estudado. Esse conjunto de palavras (ou símbolos) pode variar de acordo com o grau de formalismo do sistema axiomático adotado. O componente figural é semelhante
Figura 3 – Figura do triângulo retângulo em (Iezzi et al., 2013, p.259).
ao conceito de desenho proposto por de Giraldo et al. (2013) e consiste nas propriedades de natureza visual, como formato, posição na folha e dimensões do objeto. Um exemplo dos erros de interpretação produzidos pelo conceito figural é o caso da tangência entre duas circunferências. É comum, segundo Ribeiro (2013), os alunos assumirem que “círculos tangentes se interceptam em infinitos pontos”, pois a representação de componentes figurais dessa situação dificilmente consegue exibir o único ponto de intersecção entre essas circunferências. Com a progressão dos estudos em Geometria, como aquela que se impõe a estudantes no Ensino Médio, vários objetos interagem em um mesmo desenho, cada um com suas componentes conceitual e figural.
Assim, é na interpretação do desenho que se desencadeia o raciocínio que deduz a propriedade. As duas dificuldades destacadas por Gravina (1996) ao estudar um desenho consistem na percepção de configurações simples dentro de configurações complexas, que servem de “elos” no desencadeamento lógico-dedutivo e o controle do desenho para que características únicas da representação não sejam incorporadas às propriedades da figura. Para sanar esse tipo de dificuldade, acredita-se que o aprendizado de Geometria deve caminhar para a harmonização dos dois componentes de uma figura, levando o aluno à compreensão do que é característica do objeto estudado e, portanto, pode ser utilizado como hipótese, e o que é apenas determinado pelo seu componente figural.
Uma vez que as características dos objetos estudados estejam bem compreendidas, é possível avançar para a etapa da justificativa das propriedades desses objetos. Algumas possibilidades de validação, bem como seus diferentes níveis, são apresentadas na próxima seção.
3 A validação do conhecimento matemático
Outro aspecto do conhecimento geométrico que é responsável pela sua complexidade é a maneira como as propriedades são validadas, ou seja, a justificativa que as tornam verdadeiras. Não apenas em Geometria, mas em toda a Matemática, o veredito sobre uma sentença ser verdadeira ou falsa vem de uma cadeia de uma argumentação lógica-dedutiva que é conhecida como prova ou demonstração. Segundo Ordem (2015), é comum professores de Geometria validarem teoremas e proposições para seus alunos apresentando alguns exemplos de situações em que tal propriedade é verdadeira. No mesmo trabalho, o autor destaca que esse tipo de validação pode levar os estudantes a pensar que o método empírico é o único que torna as proposições matemáticas verdadeiras, o que nunca é verdade. O professor deve destacar, em sua prática, o poder da generalidade argumentativa de uma demonstração e afastar a sugestão de que casos particulares servem para demonstrar ou ainda que a demonstração é apenas um exercício para treinar a mente.
No entanto, não é recomendável simplesmente apresentar toda uma teoria axiomática sem estimular o aluno a desenvolver o raciocínio lógico presente de cada passo da demonstração. Geralmente, quando são solicitadas, demonstrações são sempre sobre afirmações verdadeiras, nunca sobre afirmações que devem ser refutadas ou cuja veracidade deve ser decidida pelo aluno. Esse último caso é clássico da escola tradicional: o aluno recebe passivamente a demonstração como um conhecimento acabado, não participando de sua construção. O trabalho de um Matemático não é apenas demonstrar, é também procurar propriedades não evidentes, prática essa que está muito distante do cotidiano em sala de aula. Assim, conjecturar e procurar propriedades é tão importante quanto demonstrá-las, já que mostra a Matemática como um conhecimento em construção. Por exemplo, para escrever a definição de retas paralelas no espaço a partir do conceito de retas paralelas no plano, o estudante pode investigar a existência de tais retas com o uso do GeoGebra, conforme proposto na questão 6 da Atividade apresentada na seção 6, e ilustrada na Figura 4.
Como ilustrado no parágrafo anterior, a introdução da ideia de demonstração ou prova em Matemática deve ser feita com cuidado. Por isso, alguns estudiosos defendem tipologias de provas, cada uma delas com níveis de cognição, que levam ao aluno a compreender o sentido e a importância de uma demonstração. Uma classificação dos níveis de prova é proposta por Balacheff (1987) apud Ordem (2015). Esse autor as divide em dois níveis principais, e cada nível em subníveis. O primeiro nível consiste das Provas Pragmáticas, que ocorrem quando a sustentação da prova depende de recursos de ação, observação de figuras, construção e manipulação das mesmas. Um exemplo desse tipo de justificativa é quando se diz que dois triângulos são semelhantes quando um é ampliação (ou redução) do outro. Dividem-se as provas pragmáticas em 3 níveis: Empirismo Ingênuo, Experiência Crucial e Exemplo Genérico.
Figura 4 – Retas paralelas no espaço.
O próximo passo na evolução da tipologia de prova proposta por Balacheff (1987) apud Ordem (2015) são as Provas Intelectuais. Nesse caso a prova de uma propriedade é fundamentada em proposições anteriores e suas implicações, comumente escritas em linguagem matemática. Os dois níveis em que se dividem são: Experiência Mental e o Cálculo Simbólico.
Além da verificação a respeito dos níveis em que se encontram os alunos quanto a essa tipologia, é importante fazer o máximo para avançá-lo, como escreve ORDEM, op. cit., p.101,
a evolução das provas pragmáticas para as provas intelectuais e demonstração não é só marcada por uma evolução de características linguísticas, mas também pelo status e natureza dos conhecimentos. As provas pragmáticas apoiam-se em saberes práticos, essencialmente envolvendo a ação, enquanto as provas intelectuais exigem que tal conhecimento seja tomado como um objeto de reflexão ou debate (...) Nesse nível, as ações interiorizadas tendem a generalidade, desprovidas de concretização particular, constituindo-se na gênese cognitiva da demonstração.
A Figura 5 apresenta a tipologia de prova proposta por Balacheff (1987) num esquema.
Figura 5 – Tipologia de provas por Balacheff.
A classificação de Balacheff exibe um processo em que o conceito de prova ou demonstração é aprimorado pelo aluno, até chegar no nível de Prova Intelectual, aceito pela comunidade dos Matemáticos. Harel e Sowder (1998) apud Ordem (2015) propuseram um sistema que avalia as várias maneiras de convencimento de um aluno a respeito de uma propriedade. Essas maneiras não dizem respeito apenas ao conhecimento matemático, mas a qualquer afirmação cuja validade esteja em jogo. Os autores propõem uma tipificação baseada em “esquemas de prova”, onde provar significa averiguar, persuadir e convencer, seja uma comunidade, outro indivíduo ou a si próprio a respeito da veracidade de uma afirmação. Os esquemas propostos dividem-se em três tipos, cada um deles “representa uma fase no desenvolvimento cognitivo, a capacidade intelectual no desenvolvimento matemático dos alunos” Ordem (2015), op. cit., p.102. Os três esquemas propostos são: Esquemas de Prova de Convicção Externa, Esquemas de Prova Empírica e Esquema de Prova Analítica (subdividido em Provas Transformacionais e Provas Axiomáticas).
Notam-se algumas correlações entre as duas tipologias de provas propostas. O primeiro nível de prova de Harel e Sowder não é considerado por Balacheff, enquanto que o Empirismo Ingênuo e a Experiência Crucial correspondem aos esquemas de provas empíricas proposto por Harel e Sowder. O caso do exemplo genérico corresponde às provas transformacionais de Harel e Sowder por partilharem características como generalidade e inferência lógica a partir de algum ponto da teoria. O esquema de provas analíticas corresponde às provas intelectuais de Balacheff. Esses dois critérios de classificação de provas permitem verificar e fazer evoluir o nível cognitivo dos processos de validação não apenas dos alunos, mas dos seus respectivos professores, provocando-os a refletir sobre a melhor maneira de convencer os alunos da validade de uma proposição. Uma opção para provocar nesses alunos o sentido de investigação e o trabalho de um matemático é a Investigação Matemática, metodologia para a sala de aula descrita na próxima seção.
Investigar significa, segundo da Ponte et al. (2005), formular questões de interesse cujas respostas não estão totalmente prontas ou organizadas e procurá-las de modo fundamentado e rigoroso. Os cientistas trabalham usando esse tipo de metodologia em problemas que estão na fronteira do conhecimento, com objetivo de expandi-lo. Nada impede que em sala de aula se façam investigações a respeito de temas mais elementares, pertinentes aos currículos escolares e ao conteúdo que o professor objetiva ensinar. O trabalho de investigação feito pelos matemáticos é um caso à parte das demais ciências. São formuladas conjecturas, que em seguida são testadas, e finalmente são provadas. Enquanto os esquemas de prova supracitados caminham para levar o aluno a testar (caso das provas empíricas) e demonstrar proposições (provas intelectuais ou analíticas), a investigação matemática permite que o mesmo elabore suas próprias conjecturas, para depois validá-las (ou verificar que são incorretas).
A história da Matemática mostra que obter demonstrações ou soluções para alguns problemas pode ser demorado e muitas vezes pode levar a um tipo de conhecimento inesperado, como aconteceu com a Geometria Euclidiana, em que a busca pela prova do quinto postulado proposto por Euclides levou à descoberta de outras possibilidades de Geometria. Assim, ao propor uma aula de investigação, o professor pode estabelecer pontos de partida à validação, mas pode ser que os alunos encontrem resultados diversos. Essa particularidade da Investigação Matemática faz com que os estudantes mobilizem seus recursos cognitivos e afetivos com a intenção de atingir um objetivo, ou seja, aprender.
A Investigação Matemática ocorre, de modo geral, em quatro etapas. Primeiro, são exploradas, reconhecidas e formuladas questões acerca da tarefa proposta. Em seguida são organizados os dados já disponíveis (teoria prévia) e são formuladas conjecturas. Após a realização de testes, essas conjecturas são refinadas. O último passo consiste em validá-las, e é nesse momento em que os alunos expressam a que nível de validação do conhecimento Matemático foram expostos. Os passos de uma investigação matemática podem ocorrer simultaneamente, mas o passo final deve ser obrigatório, não importando o nível de validação alcançado pelos alunos.
A melhor ferramenta para avaliar o processo investigativo e como os alunos validam o conhecimento matemático é por meio de um registro escrito da atividade de investigação. Esse registro pode ser feito após a discussão dos alunos a respeito das propriedades por eles aferidas, pois segundo da Ponte et al. (2005) op. cit. “a aula de matemática, habitualmente, não é um lugar em que os alunos estejam habituados a comunicar suas ideias nem a argumentar com seus pares“. É a partir da análise desses materiais que o professor pode planejar os próximos passos no sentido de contribuir para a maturação do aluno quanto à demonstração. Outra vantagem do registro escrito dos alunos é o desenvolvimento da sua redação matemática, que no caso da investigação, pode ser trabalhada de forma natural com os alunos, já que a escrita vem do seu pensamento. Ao escrever o conhecimento que já sistematizou, o aluno o ressignifica e provavelmente nota alguns detalhes importantes da teoria que só com a ideia interiorizada é incapaz de notar imediatamente. Na Atividade proposta, subseção 7.1 constam as questões propostas para o registro, isto é, passo final do processo investigativo.
No caso específico da Geometria, a investigação desenvolve várias capacidades, entre elas “a visualização espacial e o uso de diferentes formas de representação, evidenciar conexões matemáticas e ilustrar aspectos interessantes da história e da evolução matemática” (da Ponte et al., 2005, p.71). Investigações geométricas exibem uma Geometria que vai além dos tradicionais métodos que usam da memorização de fórmulas e exercícios de determinados tipos. Além disso, atividades investigativas em Geometria podem ser propostas nos mais diversos níveis de ensino, basta ter o cuidado de selecionar um recorte de investigação adequado para cada nível. Um exemplo disso, na Atividade 6, ocorre quando os alunos notam que, sob diferentes ângulos, as figuras exibidas no GeoGebra parecem ter propriedades diferentes.
Para apoiar as investigações matemáticas existe um conjunto de ferramentas denominadas TICs, Tecnologias de Informação e Comunicação. Essas ferramentas foram destacadas por Fiorentini e Lorenzato (2006) no seu levantamento sobre tendências de pesquisa em Educação Matemática. A difusão e o acesso a tecnologias como computadores, televisão, internet, lousas digitais e até calculadoras levaram investigadores a tentar criar metodologias para o ensino de Matemática, tanto para professores quanto para alunos. Essas metodologias não se limitam unicamente aos temas tradicionais, mas também mostram possibilidades de temas diversos, como fractais e análises estatísticas mais complexas. Há uma crença entre pais, alunos, professores e sistemas de governo, que “as novas tecnologias são uma panaceia para solucionar os males da educação atual” Fiorentini e Lorenzato (2006). Mas alerta-se que as investigações nesse sentido ainda não chegaram a conclusões satisfatórias, e que sua implementação só será possível quando existirem profissionais qualificados para usá-las da melhor maneira adequada. Os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (BRASIL (2000)), na área de Matemática e suas tecnologias, recomendam que um objetivo do ensino de Matemática seja favorecer o uso de tecnologias, não apenas as já tradicionais citadas nesse parágrafo, mas toda tecnologia que possa vir a surgir. Além disso, sugerem aprender a trabalhar nos ambientes cooperativos gerados pelas novas tecnologias, onde juntas pessoas complementam seus próprios trabalhos e de outros, com intuito da produção e desenvolvimento do conhecimento. Na próxima seção aborda-se o uso do software GeoGebra como exemplo de tecnologia para o ensino de Geometria.
Uma classe muito especial das ferramentas desenvolvidas com tecnologia para o ensino de Matemática são as ferramentas de Geometria Dinâmica. Uma analogia que serve de justificativa para o uso desses ambientes é a seguinte:
Segundo um conhecido dito popular, uma imagem vale mais do que mil palavras. Em ambientes de Geometria Dinâmica são utilizadas literalmente centenas de imagens sobrepostas, que se articulam entre si e são manipuladas de forma interativa. Imagine, então, quantas ideias podem ser traduzidas, com o auxílio da geometria dinâmica! (Giraldo et al., 2013, p.114)
Os objetos são construídos a partir de propriedades ou relações entre eles. Após a construção, o usuário tem a possibilidade de movimentar elementos livres da configuração, gerando as “centenas de imagens” que são comentadas na analogia. Essa movimentação é conhecida como o recurso arrastar em softwares de Geometria Dinâmica como o GeoGebra. Ao usar esse recurso, as propriedades dos objetos são mantidas, mas a imagem se transforma. Ou seja, o componente conceitual se mantém, enquanto o componente figural se apresenta de várias formas. Com isso são amenizadas as dificuldades de representação geradas pelo uso de lápis e papel e as representações estereotípicas de livros didáticos.
O recurso arrastar nos ambientes de Geometria Dinâmica é objeto de vários estudos. Entre eles, Arzarello et al. (2002) afirma que o recurso mede aspectos do relacionamento entre a percepção e a teoria, seja ele invocado com um objetivo específico ou simples experimentação que pode levar a descoberta de propriedades interessantes. Ao verificar mudanças de formas já prontas ou sugeridas, o usuário pode observar invariantes geométricos, ou seja, propriedades que são mantidas pela figura independentemente da posição dos objetos livres. Também é possível que ao mover objetos criados aleatoriamente pela tela se explicitem propriedades antes ocultas pela estaticidade do desenho.
A Geometria Dinâmica também possibilita a produção de conjecturas, fase essencial da Investigação Matemática. Também permite testá-las, refiná-las ou mesmo refutá-las. Sob a perspectiva dos processos cognitivos de validação de propriedades, permite exploração na sua fase mais empírica, ao mesmo tempo em que pode servir de motivação para a introdução da necessidade de argumentos matemáticos. Giraldo et al. (2013) destaca que é possível construir atividades em que o simples uso de figuras pode levar a conclusões incorretas, sendo essa a motivação para introduzir a ideia de justificar a propriedade por meio de argumentos exteriores ao software.
A prática de uso de softwares de Geometria Dinâmica favorece a evolução cognitiva da relação entre percepção e abstração, percorrendo os caminhos propostos por Balacheff, Herel e Sowder. Na verdade, estudos do uso dessa categoria de softwares já produziram uma tipologia de cognição, expostas por Arzarello et al. (2002): no processo de ascensão, a observação e manipulação do desenho levam à teoria, através da observação de regularidades e invariantes. Já o processo de descensão, o conhecimento é prévio e a exploração serve para justificar, checar propriedades ou refutá-las. Esses processos variam de acordo com o tipo de atividade proposta ou podem aparecer numa mesma atividade, um em complemento do outro, dependendo do que o sujeito entende seja dado e o que sua percepção diz que deve ser procurado.
Para o caso especial da Geometria Espacial, as versões mais recentes do GeoGebra disponibilizam um modo de visualização em 3 dimensões de sólidos geométricos, planos e retas no espaço. É possível empregar, além do recurso de arrastar, uma ferramenta de visualização da figura sob vários ângulos. Esse material é um representante daqueles que dos Santos e Nacarato (2014) destacam no trecho:
o que propicia aumentar o nível de conhecimento sobre um sólido geométrico e as figuras planas que o compõem e estabelecer algumas propriedades está diretamente relacionado com a diversidade de materiais que o professor pode disponibilizar em sala de aula para o aluno manipular, desenhar, visualizar e visualizar, e, sobretudo, formar uma imagem mental sobre o objeto a ser estudado. (dos Santos e Nacarato, 2014, p.17)
Como já foi destacado, a formação da imagem mental de entes geométricos é muito importante em geometria, uma vez que os objetos dessa ciência são abstratos. Um exemplo de trabalho que pode ser realizado com Investigação Matemática é o uso da janela de visualização 3D do software GeoGebra para ensinar a Geometria Euclidiana Espacial a partir de seus axiomas. A partir de algumas construções e fazendo as perguntas adequadas, os alunos podem concluir sozinhos os axiomas de tal Geometria e não só desenvolver a Geometria no seu método axiomático, mas compreender como a Matemática floresceu como Ciência. Um exemplo de investigação desse tipo pode ser encontrado na Atividade apresentada na seção 6.
6 Atividade: Aplicações da Investigação Matemática e da Geometria Dinâmica para o Ensino de Geometria Espacial
A atividade proposta trabalha dentro da Geometria Espacial o conteúdo de Pontos, Retas e Planos no Espaço. Esse conteúdo costuma ser lecionado no 3o ano do Ensino Médio, na maioria dos Sistemas de Ensino. O público alvo desta atividade são alunos do Ensino Médio, ou mesmo do Ensino Fundamental antes de estudarem Poliedros e/ou Geometria Analítica no espaço. Para esta atividade estima-se a duração de 4 aulas de 50 minutos cada.
Para que os objetivos propostos para esta atividade sejam atendidos, os alunos devem ter conhecimentos de Geometria Plana, especificamente sobre os três entes primitivos Ponto, Reta e Plano e as posições relativas de duas retas. É importante apresentar aos alunos o conceito de Sistema Axiomático e o modo de trabalho do Matemático, especialmente o da área de Matemática Pura. Recomenda-se apresentar os axiomas como “Regras do Jogo” e os Teoremas como consequências dessas regras, que se tornam, por sua vez, novas regras. Destacam-se a condição de Consistência do Sistema Axiomático (um modelo axiomático é dito consistente quando dele não é possível chegar a uma contradição) e a de Suficiência (deve ser possível determinar a veracidade de uma afirmação a partir dos Axiomas e de proposições geradas a partir deles). Apesar do fato que as demonstrações são omitidas, enfatiza-se que é fundamental a compreensão de que os axiomas são necessários para a construção da teoria.
Os objetivos a serem alcançados com a atividade são:
· Apresentar a Geometria Espacial por meio de axiomas;
· Estimular a Investigação Matemática, incentivando os alunos a conjecturar propriedades das retas, planos e pontos no espaço;
· Usar dispositivos eletrônicos para melhor visualizar elementos primitivos da Geometria no espaço, sem que eles estejam em algum poliedro ou sólido geométrico;
· Explorar as posições relativas de retas e planos no espaço;
· Apresentar aos alunos o software GeoGebra, que pode ser uma ferramenta importante para estudos posteriores;
· Trabalhar com as limitações do software disponibilizado e da representação em duas dimensões de objetos que estão definidos no espaço;
· Comparar os resultados com os materiais habitualmente utilizados, por exemplo régua, compasso, papel e lápis;
· Explorar o emprego da linguagem matemática;
· Colaborar para a formação de imagens mentais e generalizações em Geometria;
· Evoluir a concepção de prova em Matemática, partindo do empírico para o teórico.
Na seção 7 descreve-se a atividade proposta.
7 Descrição e solução da Atividade
· Para cada questão proposta, use uma nova janela do GeoGebra, sem as construções anteriores. Para isso, no menu Arquivo, clique em Novo (alternativamente, abra uma Nova Janela a partir desse mesmo menu). Antes, porém, você pode salvá-las para revê-las usando o menu Arquivo>Gravar.
· Para abrir a janela de visualização 3D, clique em Exibir no menu superior, e em seguida em Janela de Visualização 3D.
Introdução às ferramentas do GeoGebra 3D
1. Plote 5 pontos, usando a Janela 3D. Para isso, com a ferramenta Ponto selecionada, escolha um local no plano cinza do sistema cartesiano e, em seguida, arraste o ponto até altura desejada.
2. Usando a ferramenta Reta, selecione dois pontos construídos no item anterior. Será construída a reta que passa por esses dois pontos. Faça esse procedimento para traçar mais duas retas.
3. Plote 3 planos. Para traçar planos, clique em Plano ou Plano por três pontos e em seguida, selecione três pontos. Note que os elementos aparecem separados por categoria na janela de álgebra, que pode ser usada para seleção de objetos (como pontos) também.
4. Utilize a ferramenta Girar Janela de Visualização 3D, segure e arraste o cursor para visualizar a construção sob diferentes ângulos.
Postulados
Questão 1. Postulado de Existência - Reta
a) Marque dois pontos no espaço e use a ferramenta Reta para construir a reta que passa por esses dois pontos.
b) Em seguida, selecione a ferramenta Ponto em objeto e marque pontos sobre a reta traçada anteriormente.
c) Quantos pontos é possível traçar nessa reta?
d) Usando a ferramenta Ponto, trace pontos que não estejam sobre a reta dos ítens anteriores. Quantos pontos é possível traçar fora dessa reta?
Solução 1. O objetivo da presente questão é levar o aluno a concluir que existem infinitos pontos em uma reta, bem como fora dela. A Figura 6 mostra a construção após o item b), enquanto que a Figura 7 mostra um exemplo da construção ao final da questão.
Figura 7 – Questão 1 - Conclusão
Questão 2. Postulado de Existência - Plano
a) Use a ferramenta Plano para construir um plano no espaço.
b) Em seguida, selecione a ferramenta Ponto em objeto e marque pontos sobre o plano traçado anteriormente.
c) Quantos pontos é possível traçar nesse plano?
d) Usando a ferramenta Ponto, trace pontos que não estejam sobre o plano construído. Quantos pontos é possível traçar fora desse plano?
Solução 2. Essa questão é análoga à primeira, mas com o plano no lugar da reta. Seu objetivo é mostrar que num plano, bem como fora dele, existem infinitos pontos. A Figura 8 mostra um exemplo de construção para o item b). A Figura 9 exibe uma visualização que permite observar com mais clareza pontos que estão ou não no plano.
Figura 9 – Questão 2 - Conclusão
Questão 3. Postulado de Determinação - Reta
a) Plote 3 pontos na Janela de Visualização 3D e trace algumas retas que contenham ao menos dois desses pontos.
b) Escolhendo 2 desses pontos, é possível que duas retas distintas contenham esses pontos?
c) É sempre possível construir uma única reta com três pontos quaisquer?
Solução 3. Nesse item serão construídas três retas, já que dificilmente serão escolhidos aleatoriamente três pontos colineares entre todos os pontos do espaço. Caso eventualmente sejam escolhidos pontos com essa característica, as questões ainda prevalecem, pois pode-se destacar, por exemplo, que a reta traçada é uma reta que passa por dois pontos, e o terceiro não foi necessário para sua construção no GeoGebra. O caso dos pontos não colineares é destacado na Figura 10.
Questão 4. Postulado de Determinação - Plano
a) Use a ferramenta Plano por três pontos para traçar um plano na janela de visualização 3D do GeoGebra.
b) É possível obter um plano distinto (ou seja, diferente) que contenha os mesmos três pontos?
Dica: Oculte o Plano criado no item a) clicando no pequeno círculo azul à esquerda desse plano na Janela de Álgebra. Use a ferramenta Plano ou Plano por três pontos para traçar outro plano que passa pelos pontos usados para construir o primeiro plano. Observe que os planos coincidem.
Solução 4. Semelhante à Questão 3, o objetivo dessa questão é mostrar que três pontos determinam um único plano. A Figura 11 exibe o plano construído usando três pontos e a Janela de Álgebra de acordo com a dica sugerida.
Questão 5. Postulado de Inclusão
a) Construa um plano usando a ferramenta Plano por três pontos.
b) Construa as três retas que passam por pares desses pontos.
c) As retas que você construiu estão contidas plano determinado pelos três pontos? Gire a janela de visualização, se necessário.
d) Trace um ponto fora do plano do item a), selecionando um ponto no plano cinza e o deslocando até a altura desejada. Construa reta que passa por esse ponto e um dos pontos do marcados em a).
e) Qual a intersecção entre a reta construída em d) e o plano construído no item a)?
Dica: Use a ferramenta Intersecção entre dois objetos para auxiliá-lo.
Solução 5. Nessa questão, espera-se que o aluno conclua que retas podem estar contidas em um plano (se contiver dois pontos nesse plano - item c), Figura 12) ou pode ter apenas um ponto em comum com o plano e, portanto, não estar contida no plano, como ilustra a Figura 13.
Figura 13 - Questão 5- Conclusão
Posições Relativas de Retas no espaço
Questão 6. Lembre que, no plano, dadas duas retas, há duas possíveis posições relativas entre elas: paralelas (quando elas não possuem um ponto em comum) e concorrentes (quando elas possuem um ponto de intersecção).
a) Em uma nova janela do GeoGebra, clique em Exibir e, em seguida, em Janela de visualização 3D (2D se a 3D for a que já estiver aberta). Se você estiver usando o GeoGebra 3D no Tablet, veja a versão alternativa para essa questão.
b) Marque 2 pontos na Janela de Visualização 2D e a reta que passa por eles. Veja que a mesma reta aparece na Janela de Visualização 3D.
c) Na Janela 2D, trace um ponto que não pertença a reta construída e trace uma reta paralela a essa usando a ferramenta Reta Paralela.Veja que o conceito de retas paralelas pode ser generalizado para o espaço. Qual é, então, a definição de retas paralelas no espaço?
Questão 6 Alternativa
a) Marque 2 pontos no na Janela de Visualização 3D e a reta que passa por eles.
b) Trace um ponto fora da reta construída.
c) Usando a ferramenta Reta Paralela, selecione o ponto traçado no item b) e a reta construída no item a).
d) É possível construir um plano que contenha as retas paralelas construídas no item c)?
Dica: use a ferramenta Plano e selecione as retas paralelas.
e) Qual condição deve ser adicionada à definição de retas paralelas no plano para que essa definição seja válida no espaço?
Solução 6. A Figura 14 mostra as janelas de visualização 2D e 3D lado a lado, com pontos construídos na janela 2D. Com isso é esperado que os alunos concluam que assim como existem retas paralelas no plano, existem retas paralelas no espaço. Além disso, essa generalização deve levar a concluir que duas retas paralelas no espaço devem estar contidas num plano. A questão 6 alternativa foi criada pois, apesar de estar disponível em tablets e smartphones com sistema operacional Android, o GeoGebra 3D é um aplicativo desvinculado do GeoGebra tradicional, ou seja, não é possível comparar as janelas de visualização lado a lado como é feito em computadores.
Figura 14 – Questão 6 - Janelas de visualização 2D e 3D lado a lado
Questão 7. Construindo Retas Reversas
Digite, no campo Entrada, x = 0. Essa equação vai gerar um novo plano no espaço. Trace, agora, três pontos, A, B e C no plano OXY (o plano cinza) e o ponto D no plano construído (sem que D esteja em ambos os planos). Trace a reta ←A→B e a reta
←C→D.
a) Qual a posição relativa dessas duas retas?
Dica: Para verificar se elas são concorrentes, utilize a ferramenta Intersecção entre dois objetos e veja se há pontos em comum.
b) Tente traçar o plano que contém ambas as retas usando a ferramenta Plano e selecionando as duas retas. Na versão para tablet e celular, o aplicativo não permite a seleção de duas retas reversas para intersecção.
c) As retas construídas são chamadas de retas reversas. Escreva uma possível definição para esse conceito.
Solução 7. Aqui, são construídas retas que não têm intersecção, porém não são paralelas. A ideia da construção é que como as retas estão contidas em planos diferentes e não são paralelas, elas devem ser reversas. A Figura 15 ilustra a situação, incluindo o ponto E, que aparece como indefinido, pois tentou-se construí-lo como a intersecção de duas retas reversas.
Figura 15 – Questão 7 - Retas Reversas
Questão 8. Retas Perpendiculares no Espaço
Construa retas perpendiculares no espaço (retas concorrentes que formam um ângulo reto):
b) Na Janela 3D do GeoGebra, trace dois pontos e a reta que passa por eles.
b) Em seguida, trace um ponto fora dessa reta.
b) Finalmente, use a ferramenta reta perpendicular (observação: a ferramenta a ser usada no tablet ou celular é Reta Perpendicular, cujo item mostra um plano e a reta perpendicular a ele) e selecione o ponto e a reta.
b) Para verificar a perpendicularidade, use a ferramenta Ângulo e selecione as duas retas.
b) Usando a ferramenta plano construa também o plano determinado pelas duas retas.
b) Um par de retas concorrentes estará sempre contido no plano determinado por elas?
Solução 8. A construção de retas perpendiculares substitui aqui a construção de retas concorrentes quaisquer com objetivo de abreviar a atividade, além de mostrar que retas concorrentes também estão sempre contidas num mesmo plano. Uma possível posição das retas perpendiculares é exibida na Figura 16, junto do plano que contém essas retas.
Figura 16 – Questão 8 - Retas Perpendiculares
Posições Relativas de uma Reta e um Plano no espaço
a) Trace dois pontos, A e B, na Janela 3D do GeoGebra.
b) Construa a reta ←A→B.
c) Trace cinco pontos fora da reta ←A→B em diferentes posições do espaço (Atenção! Não escolha pontos muito próximos.
d) Usando a ferramenta Plano, selecione um dos pontos marcados e a reta ←A→B. Faça isso para os demais pontos plotados. Quantos planos passam por uma reta?
Solução 9. É esperado concluir dessa questão que por uma reta passam infinitos planos. Por eventuais limitações de software e hardware que podem ser encontradas, foram solicitados apenas cinco pontos fora da reta, gerando cinco planos que a contém. A ideia é que o estudante note que assim como foram feitos cinco planos com cinco pontos, podem ser feitos infinitos planos com todos os pontos do espaço. A Figura 17 mostra a situação com os cinco planos.
Figura 17 – Planos passando por uma reta
Questão 10. Retas e Planos Paralelos
Já vimos que se uma reta tem dois pontos em um plano, então ela pertence a esse plano pelo item a da Questão 5. Também sabemos que uma reta pode ter um ponto em comum com um plano, também da Questão 5. Uma reta e um plano podem não ter pontos em comum?
a) Construa um plano definido por um ponto e uma reta e trace um ponto fora do plano construído.
b) Trace a reta paralela a reta usada para construir o plano passando pelo ponto fora dele.
c) Qual a intersecção entre a reta e o plano?
Dica: Utilize a ferramenta “Intersecção entre dois objetos”. Nesse caso dizemos que o plano e a reta são paralelos.
d) Escreva a definição de reta paralela a um plano.
Solução 10. Veja a Figura 18 de um exemplo da situação proposta. Aqui o aluno deve concluir que é possível que uma reta seja paralela a um plano. Novamente a utilização da ferramenta de intersecção de dois objetos se mostra útil para verificar que a intersecção é indefinida, ou seja, que não existe.
Posições Relativas de dois Planos
Questão 11. Intersecção de Planos
a) A intersecção de dois planos pode ser um único ponto? Tente construir dois planos cuja intersecção seja um único ponto no GeoGebra 3D.
b) Use a ferramenta Intersecção de duas Superfícies para verificar as intersecções dos planos.
c) Escreva uma propriedade sobre a intersecção de dois planos.
Solução 11. Nessa questão, o estudante é provocado a usar sua criatividade e as ferramentas do GeoGebra para criar um caso em que a intersecção entre dois planos seja um único ponto. Como é sabido, esta construção não é possível. Espera-se que após algumas tentativas com o uso da ferramenta de intersecção, o aluno conclua que a intersecção de dois planos é sempre uma reta.
Figura 18 – Questão 10 - Reta Paralela a um Plano
a) Construa um plano definido por três pontos e marque um ponto fora dele.
b) Usando a ferramenta Plano Paralelo construa um plano paralelo ao primeiro, passando pelo ponto fora dele.
Solução 12. Essa atividade mostra que existem planos paralelos e convida o aluno a escrever com suas próprias palavras a definição de planos paralelos. Com isso espera-se que o aluno também desenvolva a escrita em Matemática. A Figura 19 ilustra a situação.
Figura 19 – Questão 12 - Planos Paralelos
7.1 Questões de avaliação da atividade
Sugere-se completar uma tabela escrevendo, a cada linha, as conclusões de cada questão, de acordo com o que foi discutido durante a realização da atividade. Se necessário, revisar ou refazer as questões. Além disso, responder as questões:
1. Dados 2 pontos no espaço, quais e quantos elementos (retas, planos) podem ser construídos?
2. a) Dados os pontos A, B e C não colineares (ou seja, que não estão estão sob uma mesma reta) no espaço. Enumere as retas que podem ser construídos, fazendo também um breve roteiro de como construir esses elementos no GeoGebra.
b) Faça o mesmo do item a), para planos.
3. Dadas duas retas, r e s no espaço, quais são as possíveis posições relativas entre elas? Defina cada posição com suas palavras.
4. a) Se as retas da Questão 3 forem paralelas, é possível construir um plano a partir delas? Caso responda sim, escreva como você construiria o plano no GeoGebra.
b) E se elas forem reversas, é possível construir um plano que as contenha? Se a resposta for afirmativa, escreva como esse plano seria construído no GeoGebra.
5. a) Dados um plano α e uma reta r do espaço, quais as possíveis posições relativas entre eles?
b) Por uma reta passam quantos planos?
c) Escreva dois roteiros para a construção de planos concorrentes no espaço usando o GeoGebra.
6. Dados dois planos no espaço, quais são as possíveis posições relativas entre eles? Escreva a definição de cada posição com suas palavras.
7. Esboce as figuras para as questões 7, 9 e 11 usando apenas lápis, borracha e papel.
8. Quais as vantagens você notou ao usar o software, comparando-o com as figuras da questão 7? Se as figuras que você construiu estivessem em um livro didático, você acredita que seria capaz de visualizar as situações de maneira satisfatória?
Algumas das respostas dos alunos para as questões de avaliação da atividade são apresentadas juntamente com o relato e análise da aplicação na próxima seção.
8 Relato da Aplicação da Atividade e Análise de Resultados
A atividade proposta na Seção 6 foi realizada no período regular de aula, no Ensino Médio Politécnico da Escola Estadual de Educação Básica Osmar da Rocha Grafulha. A escola está localizada no Bairro Fragata da cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul. A atividade serviu como parte inicial dos estudos de Geometria Espacial, prevista no conteúdo programático do Terceiro Ano do Ensino Médio da escola mencionada. Nos períodos em que a atividade foi aplicada, a escola contava com um laboratório de informática com 11 computadores, 10 dos quais funcionam com sistema operacional Windows 7 e um deles com Windows XP.
A turma, que cursava no Terceiro Ano do Ensino Médio, era composta por 22 alunos frequentes com idades de 16 a 18 anos, 5 deles com alguma reprovação em anos anteriores. Antes da aplicação da atividade foi ministrada uma aula em que foram relembrados os conceitos básicos de Geometria. Durante essa aula os alunos foram questionados sobre seu contato com a Geometria anteriormente e a maioria relatou que não estudou ou não recordava ter estudado Geometria no Ensino Fundamental ou anos anteriores do Ensino Médio, corroborando as características do Ensino de Geometria no Brasil levantados na seção 1. A partir daí foram expostos os elementos da Geometria: Ponto, Reta e Plano, junto de algumas proposições fundamentais (conhecidas como postulados). Com o intuito de dar o aporte teórico necessário, isto é, a teoria prévia conforme sugere o processo de investigação matemática, foi explicado que tais elementos (ponto, reta e plano) e propriedades permitem o desenvolvimento de toda a Teoria da Geometria Euclidiana. Como a turma já havia estudado Geometria Analítica Plana, foram apenas lembrados sobre as posições relativas de retas no plano. Durante a exposição, os alunos pareceram interessados e faziam perguntas pertinentes. Quando perguntados a respeito dos conceitos expostos, a maioria dos alunos respondeu de forma satisfatória. A realização dessa aula teve origem na ideia de processo de descensão proposto por Arzarello et al. (2002), contribuindo para as variações dos níveis cognitivos do sujeito, do nível teórico para o nível perceptual. Já a atividade em si faz o caminho contrário, ascendendo o aluno dos desenhos para a teoria.
A primeira parte da atividade foi realizada durante uma aula de 50 minutos. Os 19 alunos que compareceram nesse dia e nos seguintes foram organizados em oito duplas e um trio. Os computadores já se encontravam equipados com a última versão disponível do GeoGebra para Windows. Os alunos foram apresentados ao software GeoGebra quando o abriram, momento em que foi explicado as funções das janelas de visualização e de álgebra e como elas permitiam construir objetos matemáticos. O mesmo procedimento foi seguido quando as duplas abriram a Janela de Visualização 3D, onde foram apresentados o plano z = 0 que serve como base para o traçado de pontos e os três eixos coordenados. O plano z = 0 é doravante identificado como “Plano Cinza”. No menu principal de ferramentas, foram explicadas as principais funções de cada botão, com objetivo de agilizar as construções contidas na atividade.
De forma independente e com supervisão do docente, a introdução da atividade foi completamente realizada no primeiro encontro. Os alunos puderam explorar e reconhecer as funções do software. Entre as dificuldades iniciais a que se destaca é que alguns alunos não criavam pontos no espaço, apenas no Plano Cinza, ou mesmo somente nos eixos coordenados. Foi solicitado que a janela de visualização fosse girada, para que essa peculiaridade fosse observada. Os alunos foram então instruídos a manter o cursor pressionado e a movimentá-lo até a altura desejada. Um fator que contribuiu para correção imediata das dificuldades foi a observação de colegas realizando a atividade já que alguns apresentavam uma naturalidade maior para lidar com o software (possivelmente por maior contato com informática em geral). A variedade de posições e visualizações das diferentes duplas também enriqueceu a atividade, com os alunos notando que, sob alguns ângulos, as figuras parecem ter propriedades diferentes, como nas visualizações na direção dos planos coordenados. Eles exploraram as diferentes localizações para os pontos no espaço (primeiro passo do processo de investigação matemática) reconhecendo a diferença entre pontos localizados no Plano Cinza e fora dele. Também tiveram interesse em modificar detalhes estéticos, perguntando se era possível esconder “as letras” dos elementos e mudar sua cor. Foi-lhes explicado como ocultar rótulos e mudar cores usando a janela de propriedade de cada objeto. Essas perguntas apareceram naturalmente, imediatamente depois do primeiro contato com o software.
Como alguns computadores eram antigos, houve dificuldades ao usar a Janela de Visualização 3D. As principais foram de ordem gráfica. Alguns computadores não permitiam a construção de vários planos, enquanto outros travavam ao tentar usar a ferramenta Girar Visualização, apresentando animações descontinuadas ou mesmo nenhuma animação. Os planos em alguns computadores só eram visíveis em algumas posições, devido a forma opaca e falhada como eram plotados.
Na aula seguinte de Matemática da turma deu-se a continuação da atividade, com as questões de 1 até 5. Apesar das duplas de alunos serem mantidas, o procedimento de aplicação dessa atividade foi diferente: o docente pesquisador lia a questão e aguardava todas as duplas construírem o que era proposto nela, enquanto ajudava alunos em eventuais dificuldades. Em seguida era realizada uma pequena discussão sobre a questão e os alunos escreviam uma generalização para ela numa tabela de avaliação da atividade. O principal contratempo encontrado pelos alunos foi a construção de pontos no espaço, como na aula anterior. Novamente interessados nos detalhes estéticos, os alunos debateram se era necessário manter os eixos coordenados e o plano cinza, testando essas opções. Alguns alunos preferiram deixar os eixos ocultos, mas todos preferiram deixar o plano cinza em todas as figuras.
Formular conjecturas, bem como refiná-las, são parte do segundo e terceiro passos do processo de Investigação Matemática e durante toda atividade ocorreram simultaneamente. O registro por escrito é o quarto e obrigatório passo no processo delineado por da Ponte et al. (2005), pois fornece uma forma de avaliação do processo de validação do conhecimento matemático. Mesmo sem que as demonstrações tenham sido apresentadas, acredita-se que a simples escrita de uma conclusão permite que aconteça a significação do conhecimento e a percepção de detalhes importantes sobre ele. Destaca-se que a discussão e posterior escrita da propriedade contribui para o processo de ascensão e descensão proposto por Arzarello et al. (2002).
A Figura 20 mostra as conclusões de uma dupla de alunos escritas na Tabela, após a discussão de cada atividade. Nota-se que as duas primeiras estão corretas e devidamente escritas, enquanto a terceira apresenta somente uma parte correta. A parte incorreta “dois pontos não passam numa mesma reta”, pode ter sido gerada por um problema de escrita, uma vez que, diferente das duas primeiras questões os alunos usaram a ideia de pontos passarem em uma reta, enquanto nas duas primeiras utilizam a noção de a reta conter pontos (usando a palavra tem). Esse tipo de diferença na linguagem traduz a dificuldade do processo de percepção para o teórico, ao mesmo tempo que mostra como os alunos ainda estão no nível pragmático proposto por Balacheff (1987), pois usam a noção de movimento em que a reta “passa” por um ponto, mesmo este sendo um objeto que “não caminha”.
Figura 20 – Conclusões das questões 1, 2 e 3 obtidas por alunos
A última parte da atividade foi realizada em duas aulas de 50 minutos, consistindo das questões 6 a 12 e a entrega do questionário de avaliação. O procedimento adotado foi o mesmo da aula anterior. A Questão 6 solicitava a exibição das janelas de visualização 2D e 3D lado a lado e alguns alunos tiveram dificuldades na organização da janela no software, e de localizar qual ponto deveria ser plotado em cada uma delas. A questão sobre retas reversas fez com que alguns discentes notassem que existia uma equação para planos também, da mesma maneira que existe para retas e circunferências na Geometria Analítica, novamente conjecturando a partir das questões propostas como aconteceu na primeira etapa da atividade. Na Questão 9, onde eram necessários cinco planos, alguns computadores que não haviam apresentado qualquer problema citado anteriormente travaram não para visualizar a figura, mas para girá-la. Algumas duplas escolheram também pontos muito próximos, dificultando a visualização da propriedade requerida,o que foi melhorado a partir de alguns testes. O restante das atividades ocorreu tranquilamente, sem episódios a destacar.
Nas questões 6, 7 e 8, que tratam das posições relativas das retas no espaço, a análise das Conclusões escritas na tabela revelou um aproveitamento, em termos de correção, de 100%. No entanto, nenhuma das duplas destacou que retas paralelas não têm pontos em comum, apenas que, no espaço, é necessário que elas estejam contidas em um plano. Acredita-se que o conceito de retas paralelas do plano tenha sido transportado para o espaço, por isso a não referência ao caso da intersecção. Um exemplo de resposta que evidencia isso é “Para que duas retas sejam paralelas no espaço elas precisam estar em um plano”. Isso mostra que, nesse momento já estava ocorrendo um processo de abstração da ideia de retas paralelas pelos alunos, mostrando a importância da primeira aula expositiva que antecedeu a aplicação da atividade. A Questão 7 foi a que mais produziu complementos em relação à resposta esperada. Além de destacar que essas retas não têm intersecção, todas as duplas ainda destacaram que não existe plano que as contenham. Quatro destacaram, ainda, que retas reversas não são paralelas (já que ambos pares desses tipos de retas não possuem intersecção). Seria necessário destacar qual dentre essas propriedades define retas reversas e quais são consequências dessa definição, para que o conceito fique bem definido, porém a capacidade de observar várias características numa configuração complexa é um destaque, haja vista a importância de tais construções expressas por Gravina (1996). A resposta mais geral, dentre as conclusões dadas pelos alunos, é: “Retas reversas não têm intersecção e não são paralelas. Não existe um plano que possa conter elas”. Análogo ao ocorrido para retas paralelas, nenhum aluno destacou que retas concorrentes tem apenas um ponto de intersecção. Quatro trabalhos destacaram que “existe (sic) retas concorrentes no espaço”, o que indica que os alunos generalizaram a condição de concorrência do plano para o espaço. Todas as duplas, exceto uma, destacaram que duas retas concorrentes no espaço sempre determinam um plano. A Figura 21 destaca o preenchimento da tabela por uma dupla de alunos.
Figura 21 – Conclusão das questões 6, 7 e 8 na tabela preenchida por alunos
A questão 9 foi respondida satisfatoriamente por todos os alunos. A questão 10 apresentou seis definições satisfatórias quanto à posição relativa de retas e planos. As três respostas incorretas incluíram a generalização “Não existe uma intersecção entre um plano e uma reta” e “Não existe intersecção de uma reta paralela a reta paralela a um plano”. A primeira afirmação está incorreta, uma vez que generaliza um caso que é particular. A conclusão ficaria correta se fosse acrescentado “...paralela a ele”. Já a segunda conclusão pode ter sido induzida pela própria questão, já que nela a reta paralela ao plano é construída usando a relação de paralelismo de uma reta do plano e uma outra, que não está contida no plano. Além dessas observações, três trabalhos comentaram que “Uma reta paralela a uma reta do plano também é paralela ao plano”, sendo essa a única conclusão de uma dessas duplas, enquanto as outras duas incluíram também a propriedade da intersecção.
As questões 11 e 12 se referem às posições relativas de dois planos, sem considerar o caso da coincidência. Conclusões esperadas aparecem em todos os trabalhos, salvo algumas exceções. Na questão 11, todas as duplas concluíram corretamente que a intersecção de dois planos não pode ser apenas um ponto, mas sim uma reta. Entretanto, em um trabalho consta “A intersecção de dois pontos sempre vai dar uma reta” no espaço correspondente a questão 11, resposta essa que foi considerada correta, pois houve a troca da palavra planos por pontos. A questão sobre planos paralelos, 12, foi respondida de maneira satisfatória por todos os alunos, que destacaram que a intersecção de planos paralelos é vazia. A mesma dupla que fez a troca das palavras ponto e plano na questão anterior cometeu a inversão novamente, e uma outra dupla escreveu que “Dois planos paralelos não se intersectam, assim não possuem coeficiente angular”, o que é inesperado, primeiro, pois o foco da atividade não era a equação do plano, e segundo, pois a equação do plano exibida pelo GeoGebra no arquivo correspondente a questão é a equação paramétrica do plano, forma essa que não foi estudada nem para retas, nem para circunferências.
A Figura 22 exibe as respostas de alguns alunos para as questões 9, 10, 11 e 12, algumas delas discutidas nos parágrafos anteriores.
Figura 22 – Conclusão das questões 9, 10, 11 e 12
A realização de toda a atividade proposta tomou 4 períodos de 50 minutos de aula em uma turma de terceiro no do Ensino Médio. Apesar das limitações de ordem técnica devido ao laboratório desatualizado de uma escola pública, as atividades transcorreram com relativa tranquilidade. De maneira geral, de acordo com a metodologia adotada, em cada grupo de questões os estudantes com o auxílio do software exploraram e testaram construções, com os dados disponíveis conjecturaram outras propriedades, realizaram testes e registraram suas conclusões. Na Tabela 1, pode-se observar o aproveitamento de cada questão.
Tabela 1 – Aproveitamento de cada Questão
Questão |
Respostas Esperadas |
Respostas Inesperadas |
Questão 1 |
9 |
0 |
Questão 2 |
9 |
0 |
Questão 3 |
6 |
3 |
Questão 4 |
9 |
0 |
Questão 5 |
8 |
1 |
Questão 6 |
9 |
0 |
Questão 7 |
9 |
0 |
Questão 8 |
9 |
0 |
Questão 9 |
9 |
0 |
Questão 10 |
6 |
3 |
Questão 11 |
8 |
1 |
Questão 12 |
7 |
2 |
A análise das conclusões escritas pelos alunos revelou que a atividade foi efetiva para o estudo de Geometria Espacial de modo geral. Além disso, salientou as dificuldades de representação, interpretação e lacunas de aprendizagem na Geometria, como as que foram levantadas e caracterizadas na seção 1. A dificuldade para generalização de definições básicas foi notada durante todo o desenvolvimento da atividade, mostrando que possivelmente estão no nível de Prova Empírica proposto por Balacheff (1987), especificamente no nível do Exemplo Genérico, pois a partir de atividades construídas e modificações realizadas pelos próprios alunos os levaram as conclusões. A linguagem usada por alguns alunos mostra o modo informal e distante da linguagem usual com o uso de palavras intuitivas e práticas para indicar fatos geométricos. O GeoGebra parece ter sido bem recebido pelos alunos, uma vez que a maioria das construções por eles propostas foram corretas, ajudando-os a chegar a conclusões corretas e explorar as diversas possibilidades de análise de configurações complexas.
Neste artigo foram levantados problemas no ensino e aprendizagem de Geometria e intrínsecos a ela. As principais dificuldades encontradas permeiam a representação dos objetos geométricos e a maneira como são justificadas as suas propriedades. A primeira ocorre quando há confusão entre componentes conceituais e figurais associados a cada propriedade e revela a importância da construção de imagens mentais para entes geométricos. A validação de propriedades em Geometria ocorre por meio de demonstrações e esse conceito pode ser trabalhado com os alunos. No entanto, apresentar uma demonstração sem que os alunos entendam o motivo de sua necessidade a torna inútil e desinteressante. É preciso que a ideia de demonstração seja construída, passando do empírico para o formal, como é proposto nas metodologias de prova pesquisadas. Para ajudar nesse processo, a Investigação Matemática e a Geometria Dinâmica são ferramentas que estimulam a formulação de conjecturas, seu refinamento e provocam o aluno a justificá-las. Além disso, softwares como o GeoGebra ajudam na superação das dificuldades de visualização mencionadas anteriormente.
Com a aplicação da atividade proposta apresenta-se a Geometria Espacial por meio de axiomas. Proporcionou-se aos alunos explorar diferentes formas de representar pontos, retas e planos, bem como utilizar a teoria matemática envolvida para formular conjecturas acerca de propriedades geométricas. Com o uso do software GeoGebra, foi possível trabalhar com a representação em duas dimensões de objetos do espaço, testar diferentes posições dos objetos a fim de colaborar para a formação de imagens mentais, refinar as conjecturas anteriores e estabelecer generalizações. Além disso, o registro escrito permite aperfeiçoar a escrita e linguagem matemática de acordo com o nível do estudante e contribuir para a evolução de prova em Matemática. Portanto, a atividade contempla as quatro etapas da investigação matemática de acordo com os objetivos propostos. Ao realizar uma atividade de investigação, respondendo as questões após experimentar a construção dos objetos com o software, o aluno é envolvido na construção do seu próprio conhecimento, mobilizando seus recursos afetivos e cognitivos para aprender. Os objetivos propostos foram alcançados, uma vez que a maioria dos alunos conseguiu conjecturar corretamente a partir das suas construções e registrá-las, passo fundamental para avaliar a atividade. Durante os últimos encontros, algumas duplas resolveram as questões rapidamente e ficaram descobrindo curiosidades sobre o GeoGebra, principalmente construindo sólidos geométricos e polígonos.
Os momentos de discussão sobre as conclusões de cada construção foram produtivos pois permitiram compará-las e argumentar diante de diferentes possibilidades de representação uma mesma figura, permitindo a generalização das propriedades e a construção de uma imagem mental correta para cada um dos entes geométricos estudados. Apesar de não exigir dos alunos demonstrações formais, a atividade é um passo na direção do trabalho de um matemático e proporcionou um contato diferente com a Matemática, com provas pragmáticas (construção, observação e manipulação das figuras), de acordo com o nível em que os alunos se encontravam. O processo de Investigação Matemática mostrou-se efetivo durante a aplicação da atividade, levando os alunos a questões que normalmente não seriam levantadas em sala de aula.
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